UnB: projeto de organização, pronunciamento de educadores e cientistas

Coluna Lido para Você

Universidade de Brasília: projeto de organização, pronunciamento de educadores e cientistas e Lei nº 3.998, de 15 de dezembro de 1961 / Darcy Ribeiro (org), – Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2011, 160 p.

Obra organizada por Darcy Ribeiro.

Em seguida à edição da Lei n. 3998, de 15 de dezembro de 1961, que autorizou o Poder Executivo a instituir a Fundação Universidade de Brasília, Darcy Ribeiro fez publicar em 1962 o seu texto, numa edição especial patrocinada pelo Ministério da Educação e Cultura, contendo pronunciamentos de educadores e cientistas sobre o texto da lei e o projeto de organização da nova universidade.

Para Darcy, não tinha o Brasil uma verdadeira tradição universitária a defender e preservar, porque a universidade brasileira, a rigor, diferentemente do que ocorrera em outros países das Américas nos quais elas foram criadas desde o século XVI, somente em 1920, já no século XX, será instituída.

Com a UnB, segundo ele, é que se dará mais propriamente, a instauração do que se poderia designar de universitário para conferir tal estatuto ao nosso ensino superior. Criar, pois, uma universidade em Brasília, constituiu-se numa dupla oportunidade. Primeiro, por reconhecer que, sendo Brasília um cidade criada no centro do país e nela instalado o governo da República, se tornaria inevitável nela instituir um núcleo cultural a que não poderia faltar uma universidade. Depois, para atender à urgência de dotar o país, na etapa de desenvolvimento em que se lançava, de uma universidade que tivesse “o inteiro domínio do saber humano e que o cultive não como um ato de fruição ou de vaidade acadêmica, mas com o objetivo de, montada nesse saber, pensar o Brasil como problema”.

Tratava-se de projetar, para atender a essas condições, a universidade necessária e esta era, dizia ele, a tarefa da Universidade de Brasília e para isso ela havia sido concebida e fora criada.

O Beijódromo, no Campus Darcy Ribeiro. Foto: Wikimedia Commons

Quando da instalação da Fundação Darcy Ribeiro – o Beijódromo (2010), no Campus da UnB (Campus Darcy Ribeiro), em 2010, encontrei essa edição rara no acervo de obras do próprio Darcy expostas para a inauguração. Logo me acudiu fazer uma re-edição do texto, em estilo de celebração e submeti a ideia à Comissão UnB 50 Anos (que eu, então Reitor criei para programar o Jubileu da UnB), que imediatamente acolheu a indicação.

Na edição do texto que agora é relançado, com o selo da UnB 50 Anos (1962-2012), e com meu prefácio, o próprio Darcy Ribeiro expõe o projeto de organização da UnB e sua singularidade institucional. Mas, para aferir o alcance desse projeto, ele traz para a publicação pronunciamentos de vários educadores que haviam se manifestado sobre a proposta da Universidade de Brasília e que haviam sido reunidos pelo professor Paulo Duarte na Revista Anhembi, por ele dirigida, em seus números 126, 127 e 128, referentes aos meses de maio, junho e julho de 1961. São depoimentos preciosos que servem à melhor compreensão da proposta e ao acolhimento que ela recebeu por parte da inteligência brasileira. Assinaram esses depoimentos Almeida Júnior, Jayme Abreu, Florestan Fernandes, Milton da Silva Rodrigues, Anísio Teixeira, Jairo Ramos, Fernando Henrique Cardoso, Leopoldo Nachbin, José Leite Lopes, Celso Furtado, Paulo Sawaya, Maria Yedda Leite Linhares, Oracy Nogueira, Osvaldo Gusmão, Walter Osvaldo Cruz e Jacques Dannon.

Certamente, muito terá se perdido a partir das sucessivas interrupções e retomadas desse belo e generoso projeto, que nunca se deixou descolar de seu impulso utópico originário. Quando se examina o texto da lei que autoriza a instituição da fundação, incumbida de criar e de manter a Universidade de Brasília, melhor se afere esse movimento. Criado para ser autônomo, sustentável, público mas não estatal, o novo ente recebe a atribuição de inovar, no mais profundo sentido experencial, a ponto de poder organizar seu regime didático, inclusive de currículo de seus cursos sem restar adstrito às exigências da legislação geral do ensino superior (art. 14).

Assim, por ocasião do cinqüentenário da UnB, pensando o seu projeto várias vezes interrompido, conforme mostrou Roberto Salmeron, é importante revê-lo em sua originalidade e compreendê-lo com o apoio das percepções que dele tiveram os seus mais próximos contemporâneos, para melhor orientar suas possibilidades atuais, no salto em que, alem de necessária, conforme preconizava Darcy, ela se faça também emancipatória (SOUSA JUNIOR, José Geraldo de (Organizador). Da Universidade Necessária à Universidade Emancipatória. Brasília: Editora UnB, 2012).

Essa me pareceu então, a boa razão para o relançamento da obra, na data em que se registra 50 anos de edição da Lei n. 3998, de 15 de dezembro de 1961, antecipando as celebrações do jubileu da própria UnB, a partir de 21 de abril de 2012.

Foto: Wikimedia Commons

Por isso retorno  Darcy Ribeiro como a uma fonte para lembrar que a pedra fundamental da educação e princípio da Universidade de Brasília, que ele fundou, reside em que “(…) o Brasil não pode passar sem uma universidade que tenha o inteiro domínio do saber humano e que o cultive não como um ato de fruição erudita ou de vaidade acadêmica, mas com o objetivo de, montada nesse saber, pensar o Brasil como problema. Esta é a tarefa da Universidade de Brasília. Para isso ela foi concebida e criada.” (RIBEIRO, Darcy. Universidade para Quê?. Brasília: Editora UnB, 1986, p. 6).

Por isso, em Darcy, a Universidade de Brasília foi concebida como uma universidade necessária, pensada em seu projeto como uma instituição que pudesse se vincular à nação, para cumprir funções que contribuíssem para o desenvolvimento do pais e para atribuir ao caráter do saber acadêmico a condição de responder a desafios emergentes das expectativas de renovação social.

Apesar de interrupções, algumas dramáticas como relata Roberto Salmeron, esse projeto generoso permaneceu como horizonte para orientar a obstinada retomada do percurso histórico da UnB. E é notável constatar, nesse trânsito, que ela jamais se deixou alienar socialmente, nem por elitismo, nem por corporativismo, nem por incapacidade paralisante de se interrogar e de questionar as condições de produção de conhecimento e de manter atenção aos interrogantes sociais acerca de seu papel (SOUSA JUNIOR, José Geraldo de. Da Universidade Necessária à Universidade Emancipatória. DARCY – Revista de Jornalismo Científico e Cultural da Universidade de Brasília. Brasília: UnB/SECOM, n. 10, abril e maio de 2012, p. 6).

E é esse projeto que se atualiza utopicamente, de modo que a universidade necessária assim denominada por Darcy Ribeiro, se faça também emancipatória, o que significa dizer, também solidária, comprometida com um conhecimento não diletante, ao contrario, fundado na responsabilidade coletiva de sua produção e na conviccão de uma ética de redistribuição, que inclua e emancipe, tal como procurei reafirmar, teórica e politicamente (SOUSA JUNIOR, José Geraldo de (Organizador). Da Universidade Necessária à Universidade Emancipatória. Brasília: Editora UnB, 2012).

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José Geraldo de Sousa Junior é Articulista do Estado de Direito, possui graduação em Ciências Jurídicas e Sociais pela Associação de Ensino Unificado do Distrito Federal (1973), mestrado em Direito pela Universidade de Brasília (1981) e doutorado em Direito (Direito, Estado e Constituição) pela Faculdade de Direito da UnB (2008). Ex- Reitor da Universidade de Brasília, período 2008-2012, é Membro de Associação Corporativa – Ordem dos Advogados do Brasil, Professor Associado IV, da Universidade de Brasília e Coordenador do Projeto O Direito Achado na Rua.
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