O PT e as eleições municipais

Coluna Democracia e Política

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Partido dos Trabalhadores

Fonte: commons wikimedia

Eleições Municipais

Antonio Lavareda e Helcimara Telles, em A lógica das eleições municipais (FGV, 2016), reúnem 34 especialistas em campanhas eleitorais para apontar os fatores que influenciaram as eleições municipais de 2012 e tirar lições para as próximas eleições de 2016.  Eles colocam o problema de que, se o voto retrospectivo e o voto econômico ditam as chances de continuidade do partido no poder nos pleitos presidenciais, eles  ainda valem para as disputas eleitorais locais? Para os autores não porque chegou a hora de dizer que fazer equivaler “o local ao nacional é insuficiente e insustentável”.

No âmbito municipal, reconhecem os autores, muitas variáveis da dominação tradicional ainda se fazem valer. Os autores as enumeram: prestígio das lideranças locais, força dos governadores, temas provincianos, compadrio e o fato de que muitas das relações entre as lideranças se dão mais por elementos impessoais do que por fatores ideológicos. Isso estimula o surgimento de diversas estratégias de campanha:”Elas mesclam recursos de mobilização tradicional – visita aos eleitores, participação em festividades que celebram os rituais de vida e  morte, o corpo a corpo, o uso do carro de som – às mais novas tecnologias de informação, como o uso das redes sociais para compartilhar desde o programa do candidato, passando pelos boatos e o “disse me disse”, tão comuns para a avaliação , construção e desconstrução dos candidatos a vereadores e prefeitos”.

A questão é que até as variáveis da dominação tradicional estão ameaçadas. As próximas eleições municipais estão colocando no ar muitas variáveis que superam a lógica dada pelas eleições majoritárias. Isto porque as eleições de 2012 vieram no embalo de um contexto econômico ainda positivo das eleições anteriores, onde a opinião pública estava satisfeita com o país e com o governo Lula. Os laços que candidatos tinham com aquele governo fortaleceu  determinadas candidaturas, e prefeitos e vereadores enfatizaram os benefícios do vínculo com o governo federal. Fazer a campanha politico do modo tradicional dava certo. A previsão é que agora não dê. Os eleitores querem mais.

Fonte: Commons Wikimedia

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A razão é que a partir do surgimento de escândalos no interior do governo Dilma Roussef e a crise do impeachment de seu segundo governo, a lógica que predominava desde 2008 se inverteu. Agora, boa parte dos candidatos buscará distância das politicas do governo federal  e do PT. A crise econômica, o governo interino de Michel Temer e a previsão de medidas impopulares, no entanto, também faz com que muitos candidatos optem também por recusar qualquer ligação com ele. Os candidatos, ao contrário das eleições passadas, também pouco poderão capitalizar com o governo estadual, porque este também enfrenta sua própria quota de rejeição popular devido as greves e ao parcelamento de salários impostos ao seus servidores.

 

Eleições 2016

Serão as eleições de 2016 as do fim do partidarismo e da ideologia? É claro que não. Ainda que muitos candidatos a Prefeito, mesmo no horizonte da esquerda, reivindiquem autonomia e critiquem o “Dilma-lulismo”(?), a tendência é que se aprofunde o critério que serviu em 2012 para guiar as eleições municipais: a insatisfação com a administração e os candidatos a Prefeito que representam o continuísmo. Nesse aspecto, pequenos partidos como o PSOL tendem a ganhar vantagem sobre partidos tradicionais de esquerda como o PT. Isso não significa, no entanto, eleição ganha: cabe aos candidatos petistas, por que exerceram administração por anos da capital, recuperar os elementos históricos de sua administração a seu favor. Por isso o contexto local é mais complexo.

Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr - Agência Brasil

Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr – Agência Brasil

Na capital isso significa enfrentar, mais uma vez, o fantasma do antipetismo. Uma das vantagens é a possibilidade de que ele esteja mais fraco e a esquerda seja capaz de tirar lucro das ferramentas de internet. Entretanto, e esta é uma das bases da obra de Lavareda & Teles,  a capacidade de visitar o local de moradia do eleitor, de enfrentá-lo em seus espaço, de responder a suas criticas, é ainda um fator importante para garantir eleição. Internet só não basta. Por essa razão, a esquerda deve estar atenta: partidos tradicionais como o PTB e o PDT, nesse aspecto saem em vantagem e a previsão é que tenham suas cadeiras ampliadas nas Câmaras Municipais. Como tais partidos ainda praticam a “velha política”, isto é, a política tradicional, estando presentes na periferia, é preciso verificar se  o eleitor já não é capaz de discernir seu discurso populista. Acredito que sim, mas será capaz de ceder as formas irracionais da politica? Tais partidos sabem disto e suas lideranças já estão, como é possível observar pelas redes sociais, realizando rituais de comensalidade com o eleitor – conceito antropológico que serve para descrever a prática dos “galetos de final-de-semana”.

Um dos fatores essenciais para a guinada da esquerda será a forma como dará ressonância a insatisfação local com politicas do governo interino de Michel Temer. De certa forma, é terrível reconhecer que na perversão em que se transformou o chamado “jogo politico”, é preciso que o governo Temer piore para que a esquerda tenha uma chance de governar. Nesse sentido, projetos como o do vice-prefeito Sebastião Melo (PMDB), ainda o próprio seja um administrador eficiente, tende a perder popularidade, não pelas obras que deixou de completar na capital, mas pela iluminação que, tanto a nível federal como estadual, seu partido joga sobre o candidato. Por outro lado, a esquerda representada por PT e PSOL, ao disputarem pleitos num contexto de oposição, perdem por até agora não terem conseguido recuperar setores da classe média que já integraram suas bases. O que fazer?

Primeiro, encarar o desafio de que a disputa eleitoral de 2016 terá pouca relação com as eleições de 2012. Segundo os dados de Lavareda, o ano de 2008 foi o “ano celestial da reeleição de prefeitos no Brasil”, quer dizer, foi o ano em que 67% do candidatos prefeitos se sagraram vitoriosos. Esse percentual foi significativo nas eleições seguintes (2012), mas reduziu-se para 55%.  Na minha opinião, este indicador será reduzido ainda mais nesta eleição, alijando candidatos no governo ou ligados a base do governo municipal. As chances de quem está correndo por fora são por isto maiores. Lavareda aponta que as capitais são implacáveis com seus prefeitos. Enquanto que em 2008, 95% dos candidatos ocupantes do cargo se reelegeram, na eleição seguinte, 2012, apenas 50% se reelegeu.

 

Qual o desafio da esquerda?

O de construir uma opinião pública informada das contradições da atual politica federal e estadual capitaneada pelo PMDB/PSDB. É o que chamo “estratégia do arrependimento”: após o impeachment e a eleição de governos de centro-direita nos municípios, é preciso que a esquerda tenha energias  – ainda que tal tarefa pareça impossível – para buscar  o seu voto nas camadas que apoiaram o golpe. Pelo seu arrependimento. Numa conjuntura em que está evidente o desrespeito dos direitos sociais e trabalhistas pelos partidos de centro direita, é a hora em que a compreensão das diferenças deve ser o mote das campanhas eleitorais. A competição municipal, ainda que não queira, terá de evocar o que acontece nas esferas estadual e nacional para se efetuar.

Primeiro, porque a esquerda deverá tirar proveito do mal estar e do pessimismo do eleitor a razão para oferecer suas candidaturas de oposição. Isso significa que propostas de esquerda terão de mostrar não apenas sua crítica às politicas adotadas pelo governo interino de Michel Temer ou pelo Governo José Ivo Sartori, como também seu distanciamento das politicas de ajustamento liberal promovidas pelo Governo Dilma – o que é mais difícil para a esquerda de modo geral.

Prefeitura de Porto Alegre

Fonte: commons wikimedia

Os candidatos, por outro lado, deverão, para convencer o eleitor, apresentar dados das finanças da Prefeitura, das formas que preveem de financiamento para as promessas que oferecem aos eleitores. O envolvimento dos eleitores pode ainda ser tradicional mas mesmo rituais de comensalidade não são mais suficientes para garantir voto. Há inúmeras propostas ainda frágeis de governo sendo construídas e os poucos recursos exigem estratégias inovadoras.
O sentimento de insatisfação está no ar e a visão de uma Prefeitura de cofres vazios já é sensível para o eleitor. A crise nacional levou a um esvaziamento dos cofres das Prefeituras e ao parcelamento de salários e reajuste de salários de servidores públicos, que também são eleitores, é fonte de posição bem critica com relação ao atual governo.

Essas eleições devem ter uma participação maior dos partidos nacionais. Como eleição intermediária, isto é, como ocorre no meio de um mandato presidencial, é a eleição que preparará o terreno para a próxima eleição presidencial. Nesse sentido, buscar uma vitória de um partido de esquerda – qualquer um que seja – deve ser um objetivo dos partidos de oposição.

É preciso sinalizar que, para o próximo governo federal, está mudando a correlação de forças.

Se a população não está satisfeita com o governo interino de Michel Temer, é justamente a próxima eleição municipal a hora de começar a caminhada para a sua mudança. Não é que a lógica nacional determine a local, ela modifica as condições de disputa local.

Ela mostra que frente a desagregação nacional de direitos é preciso reagir localmente.

Se a esquerda conquistar cidades importantes, tem grandes chances de conseguir, no próximo pleito federal, eleger um presidente que possa recuperar aquilo que Temer não destruiu. O terceiro turno das eleições não foi o golpe que levou Temer a Presidência, mas pode ser as eleições municipais que podem preparar sua derrocada. Ao contrário, Labareda aposta na remoção dos candidatos do Partido dos Trabalhadores nas próximas eleições, pois tiveram sua imagem “arranhada” pelo ajuste fiscal produzido pela presidente Dilma Roussef e pela Operação Lava Jato, que aceleraram o deslocamento de jovens da sigla para outros partidos, inclusive, em direção ao centro-direita “Muito provavelmente ocorrerá no geral com o PT em 2016, a redução  de sua participação em números de prefeituras conquistadas”, afirma Lavareda (p. 35).

O prognóstico vale para Porto Alegre? Acredito que não. O PT já está afastado do poder desde 2005, isto é, há mais de dez anos. E ainda que haja uma fragmentação politica expressiva a nível local, o PT terá de apostar naquilo que a política tem de menos, a memória do eleitor. Quer dizer, o PT só terá chance se chegar a Prefeitura se convencer de que,  o que fez no período em que foi governo foi superior ao executado por seus opositores. Curiosamente, o lugar onde o PT foi o primeiro partido a perder poder local  pode iniciar o caminho da recuperação da esquerda. Uma visão, é claro, otimista, mas não custa tentar.

 

 

downloadJorge Barcellos é Articulista do Estado de Direito, responsável pela coluna Democracia e Política – historiador, Mestre e Doutor em Educação pela UFRGS. É chefe da Ação Educativa do Memorial da Câmara Municipal de Porto Alegre e autor de “Educação e Poder Legislativo” (Aedos Editora, 2014). Escreve para Estado de Direito semanalmente.

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