107ª Conferência Internacional do Trabalho

Coluna Assédio Moral no Trabalho

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107ª Conferência Internacional do Trabalho

Realizou-se em Genebra, Suíça, entre os dias 28 de maio a 8 de junho último, a 107.ª Sessão da Conferência Internacional do Trabalho.

Foto: Anamatra

Foto: Anamatra

Reunindo milhares de pessoas, representantes de trabalhadores, empresários e governos dos 187 países membros da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em pauta, questões como desemprego no mundo, combate ao trabalho infantil e ao trabalho escravo, violência contra mulher nos locais de trabalho e assédio laboral dentre outros.
No caso do Assédio Moral no Trabalho, a meta para encerrar qualquer violência demanda a união de governos, trabalhadores e empregadores.
Todos devem ter responsabilidades para prevenir a violência e o assédio no local de trabalho, bem como o direito ao trabalho, livre de violência e assédio.
Em que pese o comprometimento, percebeu-se que uma preocupação seria definir violência e assédio, sendo significativo desafio não apenas por causa de entendimentos subjetivos e interpretações, mas também porque diferentes respostas legais à violência e ao assédio seriam necessárias.
Inicialmente pode-se compreender Violência e Assédio da seguinte maneira:

“A violência no trabalho é o exercício da força física no local de trabalho que causa ou pode causar danos, ferimentos ou doenças; assédio no local de trabalho é o indesejado comportamento em um local de trabalho que poderia ser razoavelmente esperado para ofender, humilhar ou intimidar; (…) Enquanto a violência envolve atos criminosos, o assédio poderia potencialmente representar um espectro mais amplo de comportamentos, incluindo formas não-físicas de violência, que exige um conjunto mais nuançado de respostas e remédios”.

Também precisa ser melhor estabelecido o nexo com o local de trabalho, bem como as concepções “empregador” e “trabalhador” a exigirem uma análise mais aprofundada.
Além da indispensabilidade de uma regulamentação – Convenção e Recomendação –, educação, mudança cultural e relações entre pares são fatores importantes ao abordar a violência e o assédio no local de trabalho.
A violência e o assédio no mundo do trabalho constituiu uma violação grave dos direitos humanos, que viola a capacidade de exercer os direitos trabalhistas fundamentais, e que é incompatível com o trabalho decente e uma ameaça à dignidade, à segurança, à saúde e ao bem-estar de todos.
A violência e o assédio no mundo do trabalho afeta todas as ocupações e setores da atividade econômica, incluindo os setores público e privado, bem como os ambientes de trabalho informais, criando um impacto negativo nos trabalhadores, empregadores, suas famílias, seu ambiente de trabalho, economias e sociedade.

Abrangência mundial da questão

Campanhas globais de mídia social sobre violência e assédio contra as mulheres – #MeToo, # YoTambién, #BalanceTonPorc e #NiUnaMenos – mostram quão urgente e relevante é a discussão para o mundo do trabalho. Mulheres trabalhando em sets de filmagem, em redações, na política encontravam-se encurraladas, levando tanto tempo para denunciar o assédio. Pense por conseguinte, como a situação é ainda mais desafiadora para as trabalhadoras domésticas, na agricultura, nas fábricas de vestuário, indústria hoteleira e de transportes e, particularmente em locais de trabalho masculinizados.

Foto: Agência Brasil

Foto: Agência Brasil

As citadas revelações mostram como a violência e o assédio são difundidos e tolerados no mundo do trabalho, e suportados por um grande número de mulheres a fim de obter ou manter um emprego, receber seus salários, serem promovidas, etc.
Violência e assédio nunca devem ser aceitos como parte do trabalho. Nem o silêncio das vítimas é condição de trabalho.
Vale salientar que, até o momento, nenhum instrumento da OIT abordou a violência e o assédio como seu principal objetivo e enfoque, nenhum definiu tal conduta, e nenhum forneceu orientações claras sobre as etapas necessárias para abordar a violência e o assédio.
Assim, a adoção de uma Convenção completada por uma Recomendação é fundamental com o fito de estabelecer padrões mínimos para os governos, bem como empregadores e trabalhadores e suas organizações tudo para terminar com a violência e o assédio.
Contudo, ainda que a violência e o assédio afetem a todos no mundo do trabalho, nem todos são afetados da mesma maneira e na mesma escala. Alguns arranjos de trabalho e setores podem exacerbar o risco de violência e assédio no mundo do trabalho. As dimensões de gênero, por exemplo, precisam de instrumentos próprios.
Um estudo publicado em 2015 revelou que, na União Europeia, 14 por cento dos trabalhadores declararam estar sujeitos a violência ou assédio no local de trabalho, com mulheres desproporcionalmente afetadas.
O custo econômico da violência contra mulheres e meninas pode chegar a 1,2% e 3,7% do produto interno bruto (PIB). As mulheres são mais propensas que os homens a tornarem-se vítimas de assédio sexual. Assim, 75% das mulheres em altas posições sofreram assédio sexual e mais de 60% das mulheres que trabalham no setor de serviços haviam sido submetidas a ele.
Lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros, intersexuais e queer (LGBTIQ) e ainda, migrantes foram muitas vezes atingidos desproporcionalmente.
Também, o representante do Serviço Público Internacional (PSI) observou que, embora a violência e assédio afetem os trabalhadores em todos os setores representados pelas federações sindicais, alguns são particularmente agredidos. Dos 20 milhões de trabalhadores do setor público, destacou-se que trabalhadores do setor de saúde enfrentam a violência no trabalho, não apenas como resultado da intensidade de trabalho, mas também nas mãos de terceiros, como pacientes ou familiares. Nos círculos da justiça, da tributação e fiscalização pública, a violência no trabalho pode resultar da sua interação com o público, especialmente em lidar com assuntos delicados como inspeções, emissão de sanções e multas e processos.
Com relação aos serviços públicos, enfatizou-se a importância de reconhecer que os Estados também são empregadores e que o instrumento proposto exige a inclusão dos empregadores do setor público. O instrumento deve ressaltar a importância da liberdade de associação e negociação coletiva, fazendo referência à Liberdade de Associação e Proteção do Direito de Convenção da Organização, 1948 (nº 87), o Direito de Organização e Negociação Coletiva Convenção, 1949 (nº 98), a Convenção sobre Relações Trabalhistas (Serviço Público), 1978 (nº 151), e a Convenção de Negociação Coletiva de 1981 (nº 154).
Enfim, qualquer novo instrumento deve promover princípios-chave, tais como uma abordagem sensível ao gênero, um foco na prevenção e medidas necessárias para melhorar a execução, incluindo a proteção das vítimas de intimidação e revitimização, bem como apoio e assistência adequados.
Além disso, os instrumentos precisam estar voltados para o futuro e serem capazes de resistir ao teste do tempo, particularmente por novas formas de violência e assédio que podem emergir.

Participação do Brasil na Conferência

De relevo, durante a 107ª. Conferência Internacional do Trabalho, o Brasil particularmente manifestou-se.

Foto: Crozet/Pouteau/OIT

Foto: Crozet/Pouteau/OIT

O governo do Brasil ressaltou que, a violência e o assédio no local de trabalho repercutem sobre saúde, igualdade de gênero e prosperidade, e que portanto, coloca sérios obstáculos à realização de qualquer desenvolvimento de trabalho decente ou justiça. Considerando que mulheres e minorias são, em geral, desproporcionalmente afetadas, uma maior preocupação sobre a perspectiva de diversidade deve ser tomada. Oportunizam-se agora a sensibilização e o debate.
Com efeito, os resultados da 107ª Conferência Internacional do Trabalho foram promissores: um Comitê perfilhou projeto de resolução para colocar um item intitulado “Violência e assédio moral no mundo do trabalho” na ordem do dia da próxima sessão ordinária com vista à adoção de uma Convenção complementada por uma Recomendação.
Neste projeto, esboçaram-se primordiais ideias, das quais, ressalto:

“DEFINIÇÕES
3. Para os propósitos destas normas:
(a) o termo “violência e assédio” no mundo do trabalho deve ser entendido como uma gama de comportamentos e práticas inaceitáveis, ou ameaças, quer seja uma ocorrência única ou repetida, que visam, resultar, ou provavelmente resultará em problemas físicos, psicológicos, sexuais ou dano econômico, e inclui violência baseada em gênero e assédio;
(b) a violência baseada no gênero e o assédio devem ser entendidos como violência e assédio dirigidos a pessoas por causa de seu sexo ou gênero, ou afetando pessoas de um determinado sexo ou gênero desproporcionalmente e inclui assédio sexual;
c) o termo “trabalhador” deve abranger pessoas de todos os setores, tanto na economia formal e informal, e se em áreas urbanas ou rurais, incluindo funcionários, conforme definido pela legislação e prática nacionais, bem pessoas que trabalham independentemente do seu estatuto contratual, treinamento, incluindo estagiários e aprendizes, demitidos e suspensos trabalhadores, voluntários, candidatos a emprego e candidatos a emprego.
4. A violência e o assédio no mundo do trabalho devem abranger situações ocorrendo no curso de, relacionado com ou resultante do trabalho:
a) no local de trabalho, incluindo os espaços públicos e privados onde são locais de trabalho;
(b) em locais onde o trabalhador é pago, faz uma pausa para descanso ou uma refeição, ou usa
instalações sanitárias e de lavagem;
c) quando se desloquem de e para o trabalho;
(d) durante viagens ou viagens relacionadas ao trabalho, treinamento, eventos ou atividades sociais;
e) através de comunicações relacionadas com o trabalho, possibilitadas por informações e tecnologias de comunicação; e
(f) no alojamento fornecido pelo empregador.
5. Vítimas e perpetradores de violência e assédio no mundo do trabalho podem ser empregadores e trabalhadores, e seus respectivos representantes, e terceiros, incluindo clientes, prestadores de serviços, usuários, pacientes e o público.

PROPOSTA DE CONCLUSÕES COM VISTA À CONVENÇÃO
(…)
7. Cada Membro que ratificar a Convenção deve reconhecer o direito a um mundo do trabalho livre de violência e assédio e, de acordo com a legislação e circunstâncias nacionais, adotar, em consulta com os representantes, organizações de empregadores e de trabalhadores, uma abordagem inclusiva, integrada para a eliminação da violência e do assédio no mundo de trabalho que inclui:
(a) Proibição por lei todas as formas de violência e assédio;
(b) Afirmação de que as políticas relevantes abordem a violência e o assédio;
c) Adoção de uma estratégia global para implementar medidas destinadas a prevenir e combater a violência e o assédio;
(d) Estabelecimento e fortalecimento da aplicação e monitoramento de respectivos mecanismos;
(e) Garantia do acesso a recursos e apoio às vítimas;
(f) Prevenção de sanções;
(g) Desenvolvimento de ferramentas, orientação, educação e treinamento, e consciência; e
h) Garantia dos meios eficazes de inspeção e investigação dos casos de violência e assédio no local de trabalho através da fiscalização do trabalho ou outros órgãos competentes.”

Congratulações! Esperemos os próximos capítulos…

Referência:

Disponível em: http://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/—ed_norm/—relconf/documents/meetingdocument/wcms_631807.pdf. Acesso em: 09 jun. 2018.

 

Ivanira
Ivanira Pancheri é Articulista do Estado de Direito, Pós-Doutoranda em Direito Penal pela Universidade de São Paulo (2015). Graduada em Direito pela Universidade de São Paulo (1993). Mestrado em Direito Processual Penal pela Universidade de São Paulo (2000). Pós-Graduação lato sensu em Direito Ambiental pela Faculdades Metropolitanas Unidas (2009). Doutorado em Direito Penal pela Universidade de São Paulo (2013). Atualmente é advogada – Procuradoria Geral do Estado de São Paulo. Esteve à frente do Sindicato dos Procuradores do Estado, das Autarquias, das Fundações e das Universidades Públicas do Estado de São Paulo. Participa em bancas examinadoras da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo como Professora Convidada. Autora de artigos e publicações em revistas especializadas na área do Direito. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Penal, Processual Penal, Ambiental e Biodireito.

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