A ministra Cármen Lúcia, presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), realizou na manhã desta sexta-feira (18) uma visita surpresa ao Presídio Central de Porto Alegre (RS), para fiscalizar as condições atuais de custódia dos 4,9 mil presos recolhidos num local projetado para abrigar no máximo 1.905 pessoas.
Esta é a terceira visita de inspeção do sistema penitenciário realizada pela presidente do CNJ e do STF, que pretende percorrer todos os estados brasileiros. A inspeção começou pelo Rio Grande do Norte, em 21 de outubro, onde a ministra visitou presídios em Mossoró e Natal. Depois, no dia 5 de novembro, Cármen Lúcia visitou o complexo penal da Papuda, no Distrito Federal.
Em Porto Alegre, durante cerca de uma hora, a ministra pôde confirmar, in loco, como a superlotação tornou-se problema crônico do Presídio Central, que piora ao longo das décadas ao desafiar decisões judiciais de interdição e deteriorar a segurança pública no Rio Grande do Sul.
Parte da comitiva foi impedida de acompanhar a ministra em uma das galerias, pois os presos se espalharam pelos corredores devido à falta de espaço dentro das celas, permanentemente abertas. Foi por esse motivo que, em dezembro de 2013, a Comissão de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) emitiu medidas cautelares, determinando ao Estado brasileiro que reassumisse o controle das galerias e pavilhões que se encontram sob comando dos próprios presos e reduzisse a superlotação da unidade prisional, entre outras providências.
“O problema principal é o número excessivo de presos, sem condições, portanto, de dar cumprimento integral ao que foi determinado pelo STF, ou seja, fazer com que as pessoas estejam lá em condições de dignidade. O que alguns disseram é que não há sequer espaço físico para que todos possam deitar e dormir”, afirmou a ministra Cármen Lúcia em entrevista coletiva à imprensa em Porto Alegre, após a visita.
Mesmo com capacidade para apenas 16 presos, as celas são divididas por grupos de 25 a 30 homens, segundo o diretor do presídio, tenente-coronel Marcelo Gayer. Parte da população carcerária já foi condenada, mas a maioria (57%) ainda não foi julgada. De acordo com relatórios dos mutirões carcerários realizados pelo CNJ no estado, ao não separar provisórios de condenados, o estabelecimento penal diminui as chances de ressocialização da massa carcerária.
Mercado de trabalho
Durante a manhã, a ministra conversou com presos que participam de um projeto com foco no Presídio Central, o “Direito no Cárcere”, coordenado pela advogada Carmela Grüne. A maioria deles cobrou ajuda do poder público, em face das dificuldades em ingressar no mercado de trabalho após cumprir pena. Esse é o motivo, de acordo com as falas de muitos internos, que explica tamanha reincidência no crime. “Quando se entra no mercado de trabalho, a gente concorre com pessoas que não foram marginalizadas e excluídas da sociedade como nós. É por isso que o preso é mais vulnerável e volta a ser mão de obra do crime. O crime não é uma facção, não é uma pessoa que coordena. O crime é uma situação social, que é viva, é orgânica e trabalha por conta própria“, afirmou um dos detentos.
Recomendações ignoradas
Em 2014, o relatório do Mutirão Carcerário do CNJ recomendou ao governo do estado do Rio Grande do Sul que fosse fixado um prazo máximo para a desocupação definitiva do presídio, reiterando decisão da Justiça do Rio Grande do Sul de 1995. Tanto as recomendações do CNJ como a decisão judicial vêm sendo ignoradas até o momento.
A direção do presídio admite que, devido principalmente à superlotação, consegue oferecer atividades de ressocialização apenas para 2 mil dos quase 5 mil presos. Os demais são atendidos por psicoterapeutas, mas passam o dia ociosos e sem a oportunidade de remir a pena, que é reduzida em um dia a cada três trabalhados, de acordo com a lei.
A infraestrutura do local, construído em 1959, mostrou-se bastante deteriorada. Dos espaços acessados pela ministra Cármen Lúcia na visita desta sexta-feira, a exceção foi o setor de saúde, equipado com gabinetes odontológicos e farmácia abastecida. Em um dos pátios visitados foi possível observar calhas transbordando esgoto.
Sugestões
Após a inspeção, uma audiência pública foi realizada no Foro Central de Porto Alegre com representantes do sistema de justiça e da sociedade civil para colher propostas de melhoria para a situação prisional do Rio Grande do Sul. Entre as sugestões registradas pela presidente do CNJ e do STF, destacou-se um pedido por mais investimento no tratamento de dependentes químicos no sistema prisional.
Veja, a seguir, vídeo da TV Justiça sobre a visita ao presídio no RS.
Fonte: CNJ