O partido que nega o seu nome

por Jorge Barcellos –  Doutor em Educação pela UFRGS

No dia 3 de agosto, o Plenário da Câmara Municipal de Porto Alegre viu uma cena insólita, a de um vereador negar os princípios do partido ao qual preside. O Presidente da Força Sindical do Rio Grande do Sul,  vereador e presidente estadual do partido Solidariedade, Claudio Janta, propôs no Plenário do legislativo da capital o desconto da hora “parada” dos funcionários do legislativo. A “hora parada”, a que se referia o vereador, era relativa a o período de uma hora que o movimento dos servidores do legislativo pararam a Casa para chamar a atenção dos vereadores para sua pauta de reivindicações. Naquele dia, eles ocuparam as galerias do Plenário da Câmara Municipal,  para se manifestar em defesa de suas reivindicações. O vereador ficou incomodado com a manifestação e pediu o desconto da hora de trabalho dos servidores, a “hora parada” a que se referia o vereador, era a hora em que os servidores estavam em luta sindical no plenário!. Se não trabalham, supõe o vereador, não deveriam ganhar seu salário. O vídeo está disponível em (https://www.youtube.com/watch?v=0MAJ5J5y9Dc&feature=youtu.be).

O curioso é que Claudio Janta sempre foi defensor dos salários dos trabalhadores. Em seu artigo “A politica de cortar salários”, o Presidente do Solidariedade critica o “Pacote de Maldades “do governo federal justamente por excluir milhares de trabalhadores ao atacar seus salários ”Agora, empresas ficam autorizadas a reduzir a jornada e, proporcionalmente, os salários em até 30%“, criticou o vereador (http://solidariedaders.org.br/presidente/artigo-a-politica-de-cortar-salarios/). A critica, no entanto, não se aplica a defesa dos servidores da Câmara Municipal de Porto Alegre, a quem o Presidente do Solidariedade sugere justamente a “maldade” que critica, a de cortar salários. Nada mais contraditório com os próprios escritos do vereador.

A proposta também contradiz a história do militante sindical. O líder do Solidariedade participou de momentos históricos como importantes do pais como o movimento das Diretas Já em defesa da democracia. Agora toma uma atitude considerada autoritária pelo Sindicato contra os servidores. Claudio Janta, que também esteve no  primeiro Congresso Nacional da Classe Trabalhadora (Conclat), evento histórico para a organização sindical brasileira, parece desconhecer que os servidores públicos também são trabalhadores com direito a sua pauta de reivindicações e a organizarem de suas lutas como um trabalhador qualquer.

A atitude do vereador também contradiz os princípios do Partido do qual é o Presidente no Rio Grande do Sul. No Portal do Solidariedade (solidariedade.org.br) pode-se ler” Uma das principais propostas do Solidariedade é defender quem vive e precisa do trabalho – sejam empregados ou empregadores”. E, a segunda diretriz do partido é  justamente a ”valorização do trabalho humano”, ambos principios rasgados pelo gesto do vereador. Outra bandeira do partido é a redução da carga horária de trabalho de 44 para 40 horas semanais sem redução de salário. Se o lema do partido é a valorização do trabalho e do trabalhador, como pôde o sindicalista defender o desconto da hora para servidores em luta politico-sindical?

A atitude é contrária ao próprio significado do termo solidariedade, que o partido carrega. Solidariedade é o sentimento de pessoas que se sentem unidas porque compartilham as mesmas obrigações, interesses e ideais. Quer dizer, se haviam trabalhadores em luta junto ao Plenário, a expectativa dos servidores era de que o Partido Solidariedade apoiasse estes trabalhadores, ao contrário, sugeriu sua punição. Porquê?

Porque o Solidaridade  é um partido marcado pela duplicidade: para os holofotes, para a grande mídia, se diz um defensor do trabalhador, mas é incapaz de reconhecer como trabalhadores os servidores públicos. Quer dizer, o Solidariedade é um partido que nega o seu nome, que é capaz de sugerir atitudes repressivas aos trabalhadores na busca de seus direitos como se fosse um partido patronal. Nada mais contraditório. Cabe a Direção Nacional do Partido ouvir seu representante regional e tomar as medidas que achar cabíveis porque a história do partido merece uma atitude melhor de sus membros.

O Sindicâmara vem negociando sua pauta de reividicações desde 6 de maio de 2015, data de sua data base, conforme o Sindicato dos Servidores da Câmara Municipal de Porto Alegre (www.sindicamara.com.br). A pauta, produto de extenso debate do Conselho de Representantes de Classes e aprovado por uma Assembléia Geral inclui questões referentes a implantação do ponto eletrônico, a necessidade urgente de regularizar a situação das horas-extras, alterações pontuais na Lei 5811/86 (atual Sistema Classificado de Cargos e Funções), a fim de que sejam ajustadas, sem perdas aos servidores, as gratificações setoriais e as gratificações por insalubridade, reformatando as gratificações para cada um dos três níveis de escolaridade dos cargos efetivos, a fim de minimizar as diferenças existentes. Por fim, e não menos importante, a pauta incluía o reajuste de maio realizado conforme acordado no ano passado. Se o Solidariedade quiser ser mesmo solidário, seria bom que valorizasse os trabalhadores do legislativo, ao invés de assumir uma posição patronal e leonina contra seus servidores.

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