O papel das forças armadas: democracia como dever militar

Coluna Direito Militar  e Casos Práticos, por Alexandre de Oliveira, articulista do Jornal Estado de Direito

 

 

 

     

      A Constituição Federal de 1988 prevê no título V a defesa do Estado e das Instituições Democráticas e neste título se encontra o artigo 142 que prevê a missão das Forças Armadas na democracia, veremos neste artigo que a intervenção Militar requerida hodiernamente em passeatas e o uso retórico por políticos como bravatas constituem fugas do dever militar.

      Os deveres militares emanam de um conjunto de vínculos morais e jurídicos que ligam o militar à Pátria e à Instituição, dessa forma demonstraremos como a Democracia esta entrelaçada a estes valores militares.

      No percurso de dois séculos tivemos oito Constituições (1824, 1891, 1934, 1937, 1946, 1967, 1969 e 1988), nossa atual constituição mais que a separação e estruturação de poderes erigiu a liberdade e os direitos humanos em seu querer constitucional, para isso os Militares Federais são funcionários especiais que se destinam à defesa da Pátria, garantia dos poderes constitucionais e por iniciativa de qualquer destes da lei e da ordem.

      A democracia é um dever jurídico e uma necessidade internacional estando no rol das três prioridades mundiais que são a paz, desenvolvimento e a democracia. Podemos afirmar que a democracia é direito e bem jurídico tutelado pela vontade dos povos, sendo um dever militar a sua proteção.

      Estruturamos este artigo diluindo o teor do artigo 142 da constituição nos tópicos: Democracia, neste veremos que apesar de ser um sistema polissêmico a democracia não é uma palavra indeterminada, sendo prioridade internacional a sua defesa e esta relacionada a diversos valores militares.

      Os direitos humanos serão vistos como pilar da democracia, em resumo teremos a proteção da democracia como dever militar.

      Por fim aliamos alguns valores militares das Forças Armadas aliando a legislação como salvaguarda para democracia.

Democracia

      Democracia esta intrinsecamente ligada a instituições fortes e direitos humanos, por esse fato quando se associa democracia apenas a uma forma de governo que garanta eleições, limitando democracia a troca de governantes estamos diante de uma definição simplória que limita democracia a um conjunto de regras e condutas ligadas a representação política.

      Democracia é um sistema polissêmico que busca liberdade, igualdade e proteção dos direitos humanos que são elementos essenciais do conceito de dignidade humana. A democracia possui duas dimensões na vida prática que são democracia social e a sociedade democrática.

      A democracia social é um quadro de condições que realizam a igualdade de oportunidades, esse quadro de condições é dado pela liberdade civil e a liberdade política.

      São chamadas liberdades civis os direitos conferidos a todos os cidadãos de assumirem e externar livremente suas convicções mais pessoais, sem sofrer perseguição de qualquer governo, instituição ou grupo étnico ou social. Elas estão possivelmente entre as maiores conquistas do ser humano moderno, que hoje dispõe destas garantias após séculos de confrontos com regimes autoritários e conscientização da população sobre garantias não-negociáveis, que necessitavam ser implantadas i.

      As liberdades civis estão no âmago do ser humano podemos citar como direitos nascentes dessas liberdades o direito a segurança, consciência ou pensamento, liberdade religiosa, liberdade de expressão, liberdade de associação e de reunião, a privacidade e o devido processo legal.

Já as liberdades políticas:

      Consistem nas oportunidades que as pessoas têm para determinar quem deve governar e com base em que princípios, além de incluírem a possibilidade de fiscalizar e criticar as autoridades, de ter liberdade de expressão política e uma imprensa sem censura ii.

      Liberdades políticas estão ligadas a possibilidade de escolha e acompanhamento fiscalizatório das autoridades eleitas seja pessoalmente ou por meio da imprensa sem censura.

Já a sociedade democrática é entendida como:

      Uma ordem socioeconômica e política que garante àqueles que a ela estão submetidos uma certa forma de igualdade que podemos denominar “igualdade moral”. O adjetivo “moral”, nesse caso, tem o sentido de indicar que se trata de uma igualdade de status e não exatamente de uma igualdade socioeconômica do tipo que, possivelmente, os socialistas clássicos tinham em mente. a igualdade moral a que me refiro é assegurada quando os arranjos institucionais básicos de uma sociedade devotam a seus cidadãos, independentemente de quanto dinheiro ou riqueza cada um tem ou de qual é o nível de escolarização ou a posição ocupacional que cada qual tenha alcançado, uma forma de tratamento igual que só possível àqueles que têm direitos iguais iii.

      Essas duas externalidades da democracia fundamentam a cidadania que é a expressão política da liberdade como possibilidade do cidadão alcançar o exercício do poder.

      A história nos mostra que pelo caminho democrático presidentes podem se tornar ditadores, chegando a conduzir nações a conflitos armados, essa ameaça é um dos motivos fez que a comunidade internacional buscar o modelo democrático como parâmetro de identidade nacional, por ser um sistema político mais suscetível a controles.

      Se pela democracia pode se chegar a ditadura, nos perguntamos o que pode impedir esse caminho? O que obsta uma democracia se tornar uma ditadura é o compromisso das instituições com sua Constituição que deve incorporar os direitos humanos como direitos fundamentais e deve possuir tecitura aberta aos tratados internacionais.

                                          Instituições comprometidas com a tradição constitucional.

      Todo o ordenamento jurídico decorre do processo legislativo, a democracia é um sistema contratual onde se criam direitos, deveres, sistemas de controle e estabelece a renovação política.

      O Brasil possui uma Constituição dirigente e no seu artigo 3º encontramos os objetivos fundamentais da Republica Federativa do Brasil que são um verdadeiro plano de governo para uma democracia vejamos:

      Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

      I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;

      II – garantir o desenvolvimento nacional;

      III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

      IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

      A eficácia desse plano de governo se dá quando as instituições de um pais e seus cidadãos encaram a Constituição como um contrato de concretização da democracia é por meio desta se estabelece o Estado Democrático de direito, sendo o objetivo das normas constitucionais permitir a solução dos conflitos internos de um país sem a necessidade do uso da força, por esse fato a organização e separação dos poderes no sistema de freios e contrapesos (checks and balances) é fundamental para harmonização do exercício do poder no Estado.

      Um preceito da ética militar é o cumprir e fazer cumprir as leis, os regulamentos, as instruções e as ordens das autoridades a que estiver subordinado. A autoridade maior de um país é a sua Constituição, sendo que ela qualifica o Estado como democrático, dessa forma cumprir e fazer cumprir à constituição é um preceito militar, pois a missão das Forças Armadas é resultante da percepção do legislador e por conseguinte da sociedade brasileira, logo é o sistema representativo que confere missão as Forças Armadas, e o marco legal para atuação das Forças Armadas é a própria Constituição.

Direitos humanos e os tratados internacionais.

      A inserção internacional do Brasil na contemporaneidade se deu principalmente pelo conjunto de princípios regentes nas suas relações internacionais que são a autodeterminação dos povos, não intervenção e prevalência dos direitos humanos, neste cenário internacional o Brasil adotou diversos artigos internacionais de proteção dos direitos humanos, presentes em organizações como a ONU e a OEA essas organizações pretendem promover e estimular o respeito aos direitos humanos, às liberdades fundamentais e a democracia.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos prevê:

      Artigo 21

      1.Toda a pessoa tem o direito de tomar parte na direção dos negócios, públicos do seu país, quer diretamente, quer por intermédio de representantes livremente escolhidos.

      2.Toda a pessoa tem direito de acesso, em condições de igualdade, às funções públicas do seu país.

      3.A vontade do povo é o fundamento da autoridade dos poderes públicos: e deve exprimir-se através de eleições honestas a realizar periodicamente por     sufrágio universal e igual, com voto secreto ou segundo processo equivalente que salvaguarde a liberdade de voto.

      A Constituição Brasileira de 1988 incorporou diversos direitos humanos no seu artigo 5º dando-os feição de direitos fundamentais, sendo que a democracia dá feição ao Estado que possui como fundamentos a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político

      Há consenso que democracia é uma necessidade mundial para desenvolvimento das nações e nos tratados e resoluções adotam-se cláusulas democráticas e os tribunais internacionais como a Corte Interamericana de Direitos Humanos por meio de suas decisões obrigam os sujeitos internacionais a respeitarem valores democráticos e os direitos humanos, sendo a autodeterminação dos povos indicador da soberania popular no plano externo.

      Nos tratados internacionais encontramos regras democráticas que visão fortalecer o Estado de Direito com observação dos Direitos Humanos e da democracia.

      A Carta da Organização dos Estados Americanos reconhece que a democracia representativa é indispensável para a estabilidade, a paz e o desenvolvimento da região, e que um dos propósitos da OEA é promover e consolidar a democracia representativa, respeitado o princípio da não-intervenção.

      Os povos da América têm direito à democracia e seus governos têm a obrigação de promovê-la e defendê-la.

A democracia é essencial para o desenvolvimento social, político e econômico dos povos das Américas iv.

      Em 1991, a OEA aprovou a Resolução nº 1.080, destinada a autorizar a Secretaria e o Conselho Permanente desse órgão a agir imediatamente sempre que houvesse um interrupção irregular do processo democrático ou o impedimento de funcionamento do poder democrático ou o impedimento de funcionamento do poder democraticamente eleito em qualquer país-membro da organização.

      Em 1992 o Protocolo de Washington emendou a Resolução nº1.080 para permitir a suspensão, por votação de dois terços de seus membros, de pais que houvesse derrubado seu governo pela força. Em 2001 a OEA retificou a Carta Democrática Interamericana que da os contornos do que seja democracia.

      A democracia no cenário internacional é vista como um valor que confere confiança mutua as nações, isso porque o regime democrático capacita a população para posse das instituições e práticas fortes e disseminadas para assegurar expectativas de mudança pacíficas, já que possuem mecanismos políticos compartilhados, que facilitam a resolução de conflitos e restringem enfrentamentos armados.

      Um das características marcantes do Militar é a dedicação e fidelidade à pátria, isso engloba defender a honra, integridade e instituições, dessa forma é relevante a imagem do País perante a comunidade internacional, sendo a democracia uma expressão internacional que projeta o pais no exterior, dessa forma a democracia deve ser protegida pelos Militares, pois é uma expressão nacional que projeta o pais no exterior, lembremos a imagem ruim que o Brasil projetou sendo o último pais do mundo a abolir a escravidão.

      Soldados Brasileiros lutam pela paz e democracia em diversos países, sendo motivo de destaque no cenário internacional devido às missões de paz da ONU, essas missões buscam estabelecer a paz e democracia.

      O Brasil tem ocupado cada vez mais destaque no cenário de operações de paz sob a égide das Nações Unidas.

      Em diferentes regiões do globo, uma força militar de mais de 95 mil capacetes azuis, cujas missões são lideradas pelo Departamento de Operações de Paz (DPO), atua para resolver conflitos da melhor forma possível: por vias pacíficas. Desse quantitativo cerca de 250 brasileiros, dentre militares das Forças Armadas e Policiais, Militares dos estados brasileiros, contribuem para promover ou manter a paz em regiões de conflito v.

      As Forças Armadas dispõe de um documento chamado Livro Branco de Defesa Nacional (LBDN) é o mais completo e acabado documento acerca das atividades de defesa do Brasil. Abrangente, visa esclarecer a sociedade brasileira e a comunidade internacional sobre as políticas e ações que norteiam os procedimentos de segurança e proteção à nossa soberania, este documento esta previsto na Lei Complementar 97, de 9 de junho de 1999, vejamos qual é a visão estratégica dos Militares Federais sobre os Direitos Humanos:

      A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi adotada e proclamada pela resolução 217 A (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas, em dezembro de 1948. Esse documento foi confeccionado para ser o ideal comum a ser atingido pelos povos de todas as nações, que devem promover o respeito aos direitos e liberdades expressos na Declaração. Busca, ainda, adotar medidas progressivas, de caráter nacional e internacional, para assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universal e efetiva 52. O artigo 5o da Constituição Federal consagra os princípios elencados na Declaração Universal dos Direitos Humanos, com ênfase na igualdade de todos perante a Lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo aos brasileiros e estrangeiros residentes no país a inviolabilidade dos direitos à vida, liberdade, igualdade e propriedade 53. A Declaração Universal dos Direitos Humanos e a Constituição Federal são documentos que garantem o respeito aos Direitos Humanos nas diversas atividades desempenhadas pelo Ministério da Defesa, seus comandos militares e órgãos subordinados vi.

      Vemos assim que as Forças Armadas possuem total conhecimento da importância dos direitos humanos, inclusive buscam a sua aplicação por meio de orientação do Ministério da Defesa que emite uma diretriz que estabelece as regras de engajamento — procedimentos operacionais ou normas gerais de ação que orientam a conduta individual e coletiva da tropa empregada, inclusive em operações não convencionais, que observam fielmente os preceitos legais vigentes no País, os quais constituirão fator limitativo de liberdade de ação durante a autodefesa e a legítima defesa.

      A sociedade democrática esta ligada as estruturas do estado que garantam que o ser humano seja fim e não meio para das razões de Estado.

      A democracia traz um conteúdo ético de valores compartilhados internacionalmente que são entendidos como conquistas de um estado progressivo de nossa cultura que busca a efetivação dos direitos humanos, vejamos como esses valores são expressos na Carta Democrática Interamericana.

      Artigo 3

      São elementos essenciais da democracia representativa, entre outros, o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais, o acesso ao poder e seu exercício com sujeição ao Estado de Direito, a celebração de eleições periódicas, livres, justas e baseadas no sufrágio universal e secreto como expressão da soberania do povo, o regime pluralista de partidos e organizações políticas, e a separação e independência dos poderes públicos.

      Artigo 4

      São componentes fundamentais do exercício da democracia a transparência das atividades governamentais, a probidade, a responsabilidade dos governos na gestão pública, o respeito dos direitos sociais e a liberdade de expressão e de imprensa.

      A subordinação constitucional de todas as instituições do Estado à autoridade civil legalmente constituída e o respeito ao Estado de Direito por todas as instituições e setores da sociedade são igualmente fundamentais para a democracia vii.

      Vejamos estes valores decompostos em elementos e componentes atuam no fortalecimento da participação do cidadão, busca pela igualdade, tolerância política, prestação de contas, transparência da gestão, eleições livres e justas regulares, liberdade, direitos humanos, pluripartidarismo e Estado de Direito.

      A democracia no Brasil dá feição ao Estado que possui como fundamentos a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político.

      Feitos esses esclarecimentos vamos tratar de alguns valores militares e como esses se interligam com a democracia.

Alguns valores Militares

Do militar se exige um amor incondicional da profissão e esse amor é dado por diversos atributos, como:

      Amar a Força Militar a qual pertença, cada força Militar possui tradição e conjunto de símbolos que criam o sentimento de pertencimento a algo maior que é ter fé na sua nobre missão de defesa da pátria, garantia dos poderes constitucionais, a lei e ordem, cooperando com o desenvolvimento nacional e a defesa civil.

      Nos tempos contemporâneos vimos que a democracia esta na tríade de prioridades mundiais que são a paz, desenvolvimento e a democracia, o amor incondicional a profissão de nossos Militares fazem que eles lutem pela democracia em diversos países participando de operações internacionais, assim seria um contrassenso lutar pela democracia alheia não vivendo num pais democrático.

      As forças militares possuem no seu território a mais nobre de todas as missões que é a garantia dos poderes constitucionais tornando as instituições cada vez mais fortes para o desempenho democrático no exercício do poder.

      Uma pergunta que deve se passar, se os Militares possuem como dever a democracia, porque as instituições Militares não são democráticas?

      Devemos responder essa pergunta separando o ser de sua finalidade, uma instituição Militar se organiza pela cadeia de comando, a hierarquia militar é a ordenação da autoridade, em níveis diferentes, dentro da estrutura das Forças Armadas. A ordenação se faz por postos ou graduações, já disciplina é a rigorosa observância e o acatamento integral das leis, regulamentos, normas e disposições que fundamentam o organismo militar e coordenam seu funcionamento regular e harmônico.

      Ser Militar é exercer um ofício que se condiciona e autolimita para cumprimento de sua missão, não se consegue imaginar numa operação militar que soldados discutam se devem ou não atacar o fronte, o exercício do Comando pelo Superior que deve decidir à hora do ataque.

      Dessa forma ser militar é estar condicionado pela hierarquia e disciplina, mas a destinação, finalidade dos Militares é dada pelo sentir Constitucional que possui como base a crescente universalização dos valores da democracia e do respeito aos direitos humanos.

Foto: Ascom BM

      Ser Militar é esta sob forte controle disciplinar e hierárquico, considerando ser o Presidente da República o chefe supremo das Forças Armadas, poderia o presidente ordenar o fechamento de instituições como o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal alegando que não consegue governar com esses órgãos?

      Poderia também o presidente alegar que manifestações pacificas contra seu governo atentam contra a lei e a ordem e por isso mobilizar tropas militares para efetuar prisões de manifestantes?

      Como dizemos no início do artigo a ditadura pode ser alcançada por formas democráticas, por isso é necessário que as Instituições, inclusive as Militares tenham consciência do querer Constitucional, ordens como essas são crimes devendo as Forças Armadas recusarem o cumprimento e as demais instâncias com Congresso Nacional, Procuradoria Geral da República e Supremo Tribunal Federal apurarem o crime de responsabilidade o Presidente.

      A função constitucional das Forças Armadas é garantir os poderes Constitucionais e são instituições que devem observam os direitos humanos dessa forma algo que tenha função de garantidor jamais poderá atentar contra a existência do garantido. Em um país a autoridade suprema é a sua Constituição que toda autoridade faz compromisso de proteger e preservar.

      Constituição Federal do Brasil nos seus artigos 85 e 86 estabeleceu órgãos e procedimentos para a apuração da responsabilidade do Presidente da República e a Lei de Segurança Nacional ( Lei 7.170, de 14 de dezembro de 1983) prevê os crimes que lesam ou expõem a perigo de lesão o regime representativo que dita:

      Art. 1º – Esta Lei prevê os crimes que lesam ou expõem a perigo de lesão:

      I – a integridade territorial e a soberania nacional;

      Il – o regime representativo e democrático, a Federação e o Estado de Direito;

      Ill – a pessoa dos chefes dos Poderes da União.

      Art. 17 – Tentar mudar, com emprego de violência ou grave ameaça, a ordem, o regime vigente ou o Estado de Direito.

      Pena: reclusão, de 3 a 15 anos.

      Art. 18 – Tentar impedir, com emprego de violência ou grave ameaça, o livre exercício de qualquer dos Poderes da União ou dos Estados.

      Pena: reclusão, de 2 a 6 anos.

      E os Comandantes Militares ao descumprir a ordem do Presidente não estariam incursos no crime de recusa de obediência?

O Código Penal Militar no Capítulo V artigo 163 dita:

      Recusar obedecer a ordem do superior sobre assunto ou matéria de serviço, ou relativamente a dever imposto em lei, regulamento ou instrução:

      Pena – detenção, de um a dois anos, se o fato não constitui crime mais grave.

      Devemos lembrar que o dever imposto em lei aos Militares é a garantia dos poderes constitucionais, dessa forma não configura crime de insubordinação a recusa de obediência da ordem do Presidente de fechar o Congresso e o Supremo Tribunal Federal, crime se configuraria para os Militares que cumprirem a lei.

      A constituição criou mecanismo de auto defesa para situações como essas visando salvaguardar a democracia e suas instituições previu a perturbação da ordem constitucional e do Estado democrático previsto no inciso XLIV do artigo 5º que dita:

      Constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e os Estado Democrático;

      Devemos lembrar que a política é a ciência do possível, o autor desse dispositivo o Deputado Carlos Alberto Oliveira (PDT-RJ) teve que retirar do texto a proibição de anistia para que o mesmo obtivesse aprovação com o resultado de 281 votos favoráveis, 120 votos contra e 20 abstenções.

      Devemos lembrar que a legislação penal militar não exige do militar obediência cega, o militar deve obedecer às ordens objetivamente legitimas, ordens ilegítimas devem ser recusadas, pois as baionetas devem ser inteligentes.

      E a segunda ordem do presidente, poderia mobilizar tropas contra manifestações pacificas contra seu governo alegando violação a garantia da lei e da ordem?

      A resposta é não, a nossa constituição já incorporou diversos direitos humanos transformando em fundamentais que legitimam passeatas pacificas vejamos: estão previstos no artigo 5º da nossa constituição: a liberdade de expressão, IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; a liberdade de reunião XVI – todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente; a liberdade de associação XVII – é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar.

Devemos lembrar que a garantia da Lei e da Ordem esta regulamentada na Lei Complementar 97/99, e seu §2 artigo 15 dita:

      A atuação das Forças Armadas, na garantia da lei e da ordem, por iniciativa de quaisquer dos poderes constitucionais, ocorrerá de acordo com as diretrizes baixadas em ato do Presidente da República, após esgotados os instrumentos destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, relacionados no art. 144 da Constituição Federal.

      Devamos observar que a Lei e ordem esta ligada à Segurança Pública regida pelo artigo 144 da Constituição cujo objetivo é a incolumidade das pessoas e do patrimônio. A atuação das Forças Armadas, na garantia da lei e da ordem, por iniciativa de quaisquer dos poderes constitucionais, ocorrerá, após esgotados os instrumentos destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, relacionados no art. 144 da Constituição Federal.

      Devemos observar também o detalhe que a garantia da lei e da ordem é por iniciativa de quaisquer dos poderes constitucionais, podendo ser usada somente após esgotados os instrumentos relacionados no artigo 144 da Constituição Federa isso quer dizer que não é uma ato ao arbítrio, pois necessário que se passe pelos filtros da necessidade, proporcionalidade e adequação da medida para se garantir os direitos humanos.

      Talvez o leitor possa concordar com o Presidente e dizer, não confio nessas instituições e o Presidente esta certo, para manter a governabilidade é melhor governar sozinho.

      Devemos lembrar que a democracia é um sistema que prevê a renovação caso o cidadão não esteja satisfeito com o Congresso, por falta de identidade representativa, ele tem o maior poder de todos que é usar as urnas para oxigenar o sistema.

      Já em relação ao Judiciário, devemos lembrar que ele não é órgão eleito para garantir a sua maior virtude que é ser um poder contra majoritário, garantir os direitos da minoria e respeitar os direitos previstos na constituição nem sempre e algo que agrada a maioria, mas foi a Constituição é o contrato social a que todos estamos submetidos.

      Mas caso surja para um leitor uma solução como esta: Os Militares podem tomar o poder até apaziguar a situação e posteriormente devolver aos Civis?

      Devemos recordar que o Estado Democrático de direito permiti a solução dos conflitos internos de um país sem a necessidade do uso da força, por meio da sua organização e separação dos poderes no sistema de freios e contrapesos harmonizando o exercício do poder no Estado.

      Nossa Constituição rígida protege as instituições tornando impossível a supressão da democracia, pois a cidadania consiste na prerrogativa do exercício dos poderes políticos expressão mais ampla do significado de liberdade.

      Encerramos nossa artigo buscando demonstrar que intervenções militares já são atos arbitrários repudiados pela comunidade internacional e que democracia se liga inteiramente a defesa dos direito humanos. Mas sabemos que a luta pelo poder não se encerra em uma batalha, a arte da guerra sempre busca novos equipamentos e estratégias, hoje os golpes militares estão sendo substituídos por golpes brancos em que o aparato democrático é usado com finalidades outras que não preservação do status activus do cidadão.

      Trocaram se as baionetas pela guerra jurídica, trocaram as trombetas pelo alarde da imprensa, assim os cidadãos passivos marcham provocando revoluções que nada mais é que golpes brancos contra a democracia.

i SANTIAGO, Emerson. Liberdades civis. 2020. InfoEscola – Navegando e aprendendo. Disponível em: https://www.infoescola.com/direito/liberdades-civis/. Acesso em: 13 abr. 2020.

ii Amartya Sem apud: ENRICONI, Louise. LIBERDADE POLÍTICA: temos autonomia para agir?. TEMOS AUTONOMIA PARA AGIR?. 2017. Politize!. Disponível em: https://www.politize.com.br/liberdade-politica-temos-autonomia-para-agir/. Acesso em: 13 abr. 2020.

iii DIAS, Maria Salete Souza de Amorim e Rodrigo Rodrigues. DIMENSÕES TEÓRICAS E PRÁTICAS DA QUALIDADE DA DEMOCRACIA. Revista Debates, Porto Alegre, v. 6, n. 3, p. 79-96, 01 set. 2012. Quadrimestral. Disponível em: file:///C:/ARTIGOS%20COLUNA/DIMENS%C3%95ES%20TE%C3%93RICAS%20E%20PR%C3%81TICAS.pdf. Acesso em: 13 abr. 2020.

iv ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Carta Democrática Interamericana, de 11 de setembro de 2001. Manifesto de afirmação da democracia representativa como a forma de governo compartida pelos povos das Américas. Carta. 1. ed. Lima, PERU, 11 set. 2001. v. 1, n. 1, p. 1-21. Disponível em: https://www.oas.org/pt/democratic-charter/pdf/demcharter_pt.pdf. Acesso em: 13 abr. 2020.

v BRASIL. MINISTÉRIO DA DEFESA. . Missões de paz. Disponível em: https://www.defesa.gov.br/relacoes-internacionais/missoes-de-paz. Acesso em: 16 abr. 2020.

vi BRASIL. MINISTÉRIO DA DEFESA. . Livro Branco da Defesa Nacional. Brasília: Ministério da Defesa, 2012. 182 p. Disponível em: https://www.defesa.gov.br/arquivos/estado_e_defesa/livro_branco/livrobranco.pdf. Acesso em: 17 abr. 2020.

vii ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Carta Democrática Interamericana, de 11 de setembro de 2001. Manifesto de afirmação da democracia representativa como a forma de governo compartida pelos povos das Américas. Carta. 1. ed. Lima, PERU, 11 set. 2001. v. 1, n. 1, p. 1-21. Disponível em: https://www.oas.org/pt/democratic-charter/pdf/demcharter_pt.pdf. Acesso em: 13 abr. 2020.

*Alexandre de Oliveira é Articulista do Estado de Direito, servidor do Superior Tribunal Militar, graduado em direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora, especialista em Direito Público Contemporâneo pela Universidade Federal de Juiz de Fora, especialista em Direito Penal e Processo Penal Militar pela Faculdade Integrada AVM e Mestrando em Direito Sociais e Processos Reivindicatórios do Centro Universitário IESB.

 

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