A luta por um direito emancipatório e transgressor

A arte e as Epistemologias do Sul – a luta por um direito emancipatório e transgressor

Coluna Poiesis – Encontros da Literatura e do Direito

Paola Cantarini Guerra*

 

 

RESUMO

O presente artigo pretende, em um primeiro momento, traçar algumas articulações em torno do pensamento de Boaventura de Sousa Santos ao propor a ecologia dos saberes, a tradução intercultural e as epistemologias do Sul em cotejo com o pensamento de Michel Foucault no que se refere à recuperação dos saberes sujeitados e à conjugação do saber científico ao saber popular.

Em um segundo momento, pretende analisar se seria possível postular por um outro Direito e outra política contra-hegemônicos, diante das quatro formas principais de fascismo social em que vivemos e em um regime capitalista.

Questiona-se como pode ser o Direito emancipatório e transgressor, como articular a arte à política sem que ocorra a estetização da política e a politização da arte, a partir da análise das epistemologias do Sul, recuperando experiências da vida que foram suprimidas, desperdiçadas ou negadas.

 

O presente artigo envolve as pesquisas desenvolvidas em sede de pós-doutoramento junto ao CES – Centro de Estudos Sociais, UNIVERSIDADE DE COIMBRA – Núcleo de Estudos sobre Democracia, Cidadania e Direito. Visa-se aqui, a analisar o uso não hegemônico do direito, o direito dos oprimidos, o direito socialmente relevante, aquele que não se reduz ao direito oficial. Neste sentido, afirma Boaventura de Sousa Santos a existência de um pluralismo jurídico interno e externo[1], a fim de podermos responder à questão essencial: como reinventar o Direito sem cair na agenda conservadora, como pode ser o Direito emancipatório e transgressor?

Além de um Direito abissal, de uma linha abissal que divide os excluídos e os oprimidos de um lado e de outro, uma pequena elite, também teríamos o pensamento abissal, de um lado os saberes científicos, os saberes considerados úteis, inteligíveis e visíveis, e de outro, os saberes e experiências tidos por inúteis, perigosos, ininteligíveis, suprimidos ou esquecidos.

Importa ainda questionar se haveria espaço para outras epistemologias ante a diversidade epistemológica existente, além das epistemologias dominantes, construídas sob a égide do colonialismo, do patriarcalismo e do capitalismo, ou seja, reconhecer que estas formas principais de dominação também abrangem uma dominação epistemológica, suprimindo os saberes dos povos colonizados, restritos à invisibilidade ou a espaços de subalternidade.

Analisaram-se quais as condições de um constitucionalismo transformador, a fim de tornar possível um Direito emancipatório, a exemplo de um novo “constitucionalismo experimental”, transformador, alheio aos conceitos típicos do constitucionalismo moderno, quais sejam, uniformidade, unidade e homogeneidade. Tal constitucionalismo experimental e transformador baseia-se nas ideias de constitucionalismo intercultural e plurinacional, pós-nacional, “transnacional”, “pluridimensional” e no surgimento de novos atores sociais coletivos, na maioria dos casos os povos indígenas ou as maiorias(?) minorias nacionais oprimidas, postulando pela transformação radical do status quo constitucional. Destaca Boaventura de Sousa Santos, como exemplos mais significativos desses processos as reformas constitucionais da Bolívia e do Equador.[2]

            Nesse sentido, pretendeu-se questionar se seria possível falar atualmente em um Direito emancipatório, vinculado à transgressão e às concepções de conhecimento e epistemologias ligadas às artes e aos conhecimentos sujeitados, aliados ao sujeito revolucionário, ou a uma resistência, tomando como ponto de partida a proposta de Boaventura de Sousa Santos de ser a Sociologia das Ausências um procedimento transgressivo, uma sociologia insurgente, e frisando a necessidade da transgressão e de uma subjetividade rebelde[3], com vistas a contribuir para a verificação de quais seriam as condições de um discurso transgressor.

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            No que segue, postula-se por uma epistemologia transgressora, liberta, tal como a utilizada por Boaventura de Sousa Santos no seu livro “O direito dos oprimidos”, visando ao desenvolvimento de uma sociologia empírica da retórica jurídica, utilizando-se de ideias e conceitos desenvolvidos pela filosofia europeia do Direito[4], e postulando por um tratamento sociológico exigente, condição para a produção da tese de doutorado pela Universidade de Yale, sendo esta a expressão do padrão de cientificidade então dominante. Nas palavras de Boaventura de Sousa Santos, utilizando-se de uma epistemologia transgressora, mas sem se deslocar de uma estratégia científica[5]:

(…) do que se trata é de utilizar o inestimável conhecimento sociológico obtido por técnicas de investigação sofisticadas, desenvolvidas sobretudo pela sociologia positivista, pondo-o ao serviço de estratégias científicas antipositivistas, depois de epistemologicamente transfigurado.

(…) acabei por adotar uma posição de compromisso, colocando-me a meio caminho entre objeto e sujeito da ciência e, portanto, numa posição intrinsecamente ambígua. (…) Cheguei à conclusão de que só violando as regras podia entender a realidade social e que quanto maior fosse a violação, mais profunda seria a compreensão. Apesar disso, continuava a seguir, quase compulsivamente, a regra de ouro da observação participante (…).[6] (…) A construção de uma práxis social alternativa justificava, a meu ver, a inevitável violação de algumas regras do método científico.[7]

Levando-se em consideração a teoria social e filosófica, reconhecendo-se a necessidade da interdisciplinaridade para uma cognição aprofundada do Direito, do ser humano e das transformações em curso, postula-se pela análise da relação entre a Arte e o Direito a partir da perspectiva sociológica de Boaventura de Sousa Santos, reconhecendo que a Arte possui um potencial de comprometimento com a prática social de transformação. Uma outra forma de produção do conhecimento, contrária às teorias sociais produzidas por países centrais e não periféricos e que levariam à reprodução das desigualdades entre Norte e Sul[8], e portanto, o reconhecimento de que tal conhecimento seja conjugado aos conceitos de hermenêutica diatópica, tradução e diálogo interculturais. Para romper com os cânones do pensamento ocidental dominante há a necessidade da criação. As ciências têm que ser transgressivas nas suas metodologias, ao contrário das metodologias dialógicas, extrativistas[9]. O artista seria, segundo tal análise, o único que conseguiria caminhar sobre a linha abissal e desta forma conseguiria olhar muito mais para frente e para trás em comparação com os cientistas. É o ato criador como experiência profunda dos sentidos, permitindo a libertação dos sentidos.

A proposta de hermenêutica diatópica de Boaventura de Sousa Santos assume todas as culturas como incompletas, abrindo-se ao diálogo, questão típica do multiculturalismo e do pluralismo, abandonando-se a ideia de que o outro é um estrangeiro, um inimigo ou uma ameaça, permitindo-se ir ao seu encontro, ampliando-se as vozes e os olhares. Daí a necessidade de uma igualdade que reconheça as diferenças e de uma diferença que não produza, alimente ou reproduza as desigualdades[10].

Após a análise de diversas obras de Michel Foucault e de Boaventura de Sousa Santos, verificou-se que ambas as propostas partem da análise crítica ao saber científico, contra a primazia de tal saber, tal como expõe Boaventura de Sousa Santos ao postular pelas cinco ecologias dos saberes em face das denominadas cinco monoculturas, ante a crise do pensamento hegemônico das ciências sociais, com fulcro na razão eurocêntrica e indolente. Trata-se da busca de alternativas ao que denomina de “epistemicídio”, a morte de conhecimentos alternativos e locais, e das experiências do mundo produzidas no “Sul”, tal como promovido pelo colonialismo[11], em sua tentativa de homogeneização do mundo, um dos cinco modos de produção de ausências em nossa racionalidade ocidental, a fim de se criar uma epistemologia do Sul, envolvendo a descolonização do saber. Destaca-se, pois, a proposta das epistemologias do Sul, contra-hegemônicas, partindo-se das experiências dos povos oprimidos, dos saberes destruídos ou tidos como inexistentes, envolvendo o diálogo horizontal entre os saberes, denominado de ecologia dos saberes, postulando-se pela indispensabilidade da transdiciplinaridade.            

Nesse contexto, a importância do pensamento de Foucault revela-se nas próprias palavras e considerações de Boaventura de Sousa Santos, pelo menos em dois momentos, no livro “Renovar a teoria crítica, e reinventar a emancipação social”, ao afirmar ser tal filósofo de grande importância, com seus estudos sobre a normalização para ver como se cria a exclusão[12], bem como nos livros “As bifurcações da ordem”[13], e “Epistemologias do Sul”[14], em suas palavras:

Vivemos num mundo pós-foucaultiano e, olhando para trás, damo-nos conta, de repente, de quão organizado era o mundo de Foucault. Segundo Foucault, coexistem nas sociedades modernas dois modos principais de poder social, por um lado o poder disciplinas, dominante, centrado nas ciências, e, por outro lado, o poder jurídico, centrado no Estado e no direito, e a conhecer um processo de declínio.[15]

Ambos os autores postulam por um novo Direito. Foucault, por um Direito não disciplinar e liberto do princípio da soberania, ante a farsa da concepção do ato jurídico fundador da sociedade e do Direito como base na cessão e no contrato, ante a farsa do contrato social e da teoria da soberania, a serem substituídos pela teoria da guerra, envolta na questão da luta de raças. Já Boaventura de Sousa Santos postula por um novo Direito e uma nova política contra-hegemônicos e pelo cosmopolitismo subalterno, bem como por um novo Direito internacional, mais democrático e mais participativo, ante a quebra do contrato social[16]. Argumenta, outrossim, que os conceitos associados à democracia liberal baseiam-se em uma ficção quanto a sua universalidade, quais sejam, cidadania, sociedade civil, direitos e contrato social[17].

É possível se falar em um Direito emancipatório, ante a constatação da dualidade abissal do Direito, mesmo sob a égide do sistema econômico neoliberal, privilegiando o direito as elites dominantes, onde verifica-se a bifurcação entre o direito dos 1% e o direito dos 99%, uma dualidade abissal do direito, um direito estatal oficial e um não estatal, e ante a discrepância entre o law-in-books e o law-in-action? Ou apenas podermos falar em movimentos, organizações e grupos cosmopolitas subalternos emancipatórios[18]? O Direito produzido por estes não seria, portanto, emancipatório? O Direito produzido pelos oprimidos ou um uso não hegemônico do direito hegemônico, como no caso da combinação criativa de novas práticas jurídicas e políticas permitindo que as instituições hegemônicas fossem utilizadas de forma não hegemônica[19], a revolução democrática da justiça através da luta e das estratégias jurídico-políticas de acesso ao Direito e à Justiça, com destaque para a luta pela terra dos trabalhadores rurais, pela terra indígena e pelas terras quilombolas, não transformam o Direito em emancipatório, já que neste caso o direito produzido está voltado à democratização do Estado e da sociedade[20]? Os exemplos de casos de justiça popular, tribunal popular, de luta nos Tribunais pelos indígenas, quilombolas e trabalhadores rurais, apesar de um pequeno número de vitórias, não são exemplos claros de tentativas por parte dos excluídos e oprimidos de encontrar formas alternativas de exercer o direito[21]? As vitórias contra o domínio de patentes de remédios no caso da Aids e do HIV, o movimento anti-sweatshop, seriam exemplos de lutas em prol de um direito emancipatório?

É possível, portanto, se falar em desocidentalizar a concepção de Direito, o radical des-pensar o Direito, o re-inventar do Direito para adequar-se às reivindicações dos grupos sociais subalternos[22]?

Podemos ainda falar em democracia real, e quais as condições de uma democracia “pós-abissal”, uma “democracia sem fim”, aliada a uma humanidade pós-abissal, livre das linhas abissais de exclusão abissal, desprovida das invisíveis zonas de sub-humanidade e de desumanidade[23], em sociedades politicamente democráticas mas socialmente fascistas[24], já que a democracia foi sequestrada pelas elites do poder aliadas ao capital financeiro global[25] ante a morte do contrato social?

Podemos ainda falar em Estado Democrático de Direito, ou este sobrevive apenas de forma oficial, pois ainda não foram suspensos oficialmente os direitos fundamentais e a nossa Constituição Federal[26], ainda vivemos em um Estado Democrático de Direito apenas porque simplesmente não fora decretada oficialmente a presença de um estado de exceção? Como afirma Boaventura de Sousa Santos[27]: “à medida em que a democracia se esvazia, o estado de exceção se normaliza e a cidadania desliza para a servidão”.

As artes poderiam ajudar na construção das epistemologias do Sul em uma democracia e um direito pós-abissais, ante suas características de transgressão e de singularidade, permitindo uma múltipla linguagem e perspectiva. A relação entre Direito e Arte revela-se a partir da proposta de Boaventura de Sousa Santos ao mencionar a imaginação sociológica do século XXI, propondo um exercício de imaginação epistemológica e de imaginação democrática[28], e neste sentido referida proposta poderia ser interpretada no sentido de se reconhecer como postulação epistemológica a natureza do conhecimento e da teoria como imaginárias, e portanto, ligadas necessariamente às artes e a tal forma de conhecimento prospectivo, voltando não a um tempo linear, cronológico, mas kairológico, abrindo-se com isso novos usos e possibilidades para o Direito e a política.

Assim, conjugando-se as artes à Sociologia e ao Direito, poderíamos, talvez, fugir ao problema de nossa cultura “logocêntrica”[29], destacando Boaventura de Sousa Santos demais culturas que valorizam o silêncio, a poesia e a espiritualidade. Neste sentido, a Arte poderá ajudar na descolonização dos discursos e dos imaginários envoltos com a colonialidade, considerando a produção artística como prática emancipatória da existência, possibilidade de uma resistência sensível e de uma estética da existência.

A Arte, sendo essencial à criatividade, nos ajudaria na tarefa de criarmos conceitos novos e nômades[30], bem como a fazer transgressões e a lutar contra o desperdício da experiência que o Ocidente impõe ao mundo e também a si mesmo, uma forma de postularmos por uma política amorosa, já que Eros envolve os conceitos de outricidade, do respeito pelo outro, pelo cuidado de si e também de outro, envolvendo, pois toda uma arte de viver, um “bem viver”.[31]

Da mesma forma, parte-se da análise acerca da necessidade de uma nova concepção dos direitos humanos, que reconheça e integre a diversidade cultural, de modo a permitir a reinvenção de tais direitos como uma linguagem de emancipação, nos termos de Boaventura de Souza Santos, de “hermenêutica diatópica”, um meio para realizar o diálogo intercultural entre as diversas concepções da dignidade humana, que reconheça a incompletude de todas as culturas, uma forma de se reinventar a emancipação social.  Busca-se assim realizar uma crítica aos direitos humanos e fundamentais, do ponto de vista da temática do multiculturalismo e do pluralismo jurídico, como abordagens necessárias na defesa de tais direitos e para a concretização de novas políticas públicas.

Um Estado Democrático de Direito deverá estar comprometido com o respeito aos direitos fundamentais de todas as parcelas da população, concretizados de forma efetiva por meio de políticas públicas. Neste sentido, no caso de inefetividade de tais direitos, na prática não estaríamos diante do Estado de Direito e sim de um estado de exceção, onde grande parcela da população se vê em uma situação de exclusão-inclusiva, ou de suspensão, conforme a conhecida análise de Giorgio Agamben, ou nas palavras de Boaventura de Sousa Santos, diante da emergência do fascismo social , em um período de instabilidade sistêmica, ou de crise sistêmica, crise paradigmática também denominada de “desmodernização” ou “contramodernização”, com o predomínio dos processos de exclusão com a imposição de formas abissais ou abismais de exclusão[32].

As epistemologias do Sul baseiam-se no reconhecimento mútuo, na compreensão intercultural e na inovação política com fulcro no respeito pela identidade e pela diversidade, apoiando as iniciativas que questionem e entrem em diálogo com a tradição epistemológica do Norte, em especial a proposta de novas metodologias e abordagens, com foco no “conhecer com”, ao invés do “conhecer sobre”[33].

O pensamento pós-abissal tem como primeira condição a copresença radical, a simultaneidade vista como contemporaneidade, a necessidade do abandono da concepção linear do tempo e a abolição da guerra e da intolerância já que são exemplos da mais radical negação da copresença. Parte, ainda, do reconhecimento da diversidade epistemológica do mundo e da pluralidade de formas de conhecimento além do conhecimento cientifico[34]. A epistemologia pós-abissal da ecologia dos saberes não parte do descrédito do conhecimento científico, mas sim de sua utilização não hegemônica, permitindo desta forma explorar a pluralidade interna da ciência, as práticas científicas alternativas e reconhecendo a necessidade da interação e interdependência[35]. O importante não é o conhecimento apenas abstrato, mas aquele que promova uma intervenção no real, no mundo, como são exemplo os conhecimentos indígenas que permitem a preservação da biodiversidade, uma espécie de pragmatismo epistemológico.

Neste ponto, também verificamos certa correlação com o pensamento de Foucault, que propõe a filosofia como teatro, dando importância para os lugares absolutamente outros, nas margens, indivíduos e lugares desviantes, o que denomina de heterotopias, o retomar o não dito, o resto, abrindo a possibilidade de novos usos, um uso anárquico e uma ação política revolucionária.

A necessidade da transgressão epistemológica e metodológica é destacada por Boaventura de Sousa Santos como uma forma de luta contra “o colete de força da ciência moderna”, ao qual teve que estar submetido ao desenvolver a elaboração escrita de sua tese de doutoramento, apesar de utilizar na prática elementos transgressores, como, por exemplo, deixando de se pautar pela obsessiva separação entre observação versus participação, e tomando diversas iniciativas, como interferir com sua opinião em ações e interações sob observação[36] para oferecer apoio jurídico, como fazer intervenções políticas e aconselhamento político a líderes comunitários[37], reconhecendo a importância da metodologia transgressora. Neste sentido, o A. entende que “a riqueza do material de investigação que reunia era afinal uma prova de que a Hidra da ciência moderna podia reconstituir-se a partir das feridas que a tinham mutilado”[38]. Em tal ocasião são questionados dois métodos tradicionais utilizados pela Sociologia, quais sejam, as entrevistas estruturadas e os inquéritos por questionário, por expropriarem os discursos e os conhecimentos autônomos dos entrevistados e inquiridos, transformando-os em matéria-prima para a construção de um conhecimento tido como superior e com grande poder de controle social, o que ocorreria com a própria Sociologia.[39]

Acerca da metodologia transgressiva, esta se articularia a uma teoria também transgressiva, ainda que espontânea, incipiente e intuitiva, e mesmo que esta teoria tenha ficado a dever à metodologia e ao método transgressor, já que, como afirma Boaventura de Sousa Santos, o método utilizado teria sido mais radical do que o subsequente desenvolvimento teórico, servindo contudo para a compressão do mesmo no sentido de “desenredar o positivismo oculto do marxismo convencional, mas também para questionar a crise paradigmática da ciência moderna” [40].

Aponta Boaventura de Sousa Santos para a transgressão utilizada, em suas palavras: [41]

A riqueza da experiência nada tinha que ver com as palavras rígidas e mortas da lista de observação. De fato, cheguei à conclusão de que o critério de observação, implícito na maior parte das check lists que consultei, tendia a orientar a atenção do investigador para a dimensão técnica da vida social e para o dispositivo externo, (…) e estes eram os aspectos que se tornavam menos importantes logo que a participação assumia a sua dinâmica própria. As check lists eram mecanicistas na sua construção e tendiam a impor uma visão mecanicista da realidade social. A busca de neutralidade e de detenção do controle por parte do sociólogo era o equivalente estrutural da dimensão técnica e do dispositivo externo da realidade social atrás referidos. E tal como qualquer perspectiva mecanicista envolvia uma ideologia expansionista e uma vontade de dominar, também a neutralidade do investigador era um meio de neutralizar a realidade social analisada. Além disso cheguei à conclusão de que o investigador só se conseguia controlar a si mesmo através do controle que exercia sobre os outros. Os tipos de violação das regras que a metodologia transgressiva possibilitou mostraram que esta era, em última análise, uma tentativa de libertar o objeto da ciência libertando, para isso, o cientista da ilusão de autocontrole.

A conclusão à introdução do livro “As bifurcações da ordem”, respondendo à pergunta se é possível um Direito emancipatório, contudo, é clara ao afirmar não ser possível, pois o Direito não seria nem emancipatório nem não-emancipatório, já que estes conceitos estariam relacionados não ao Direito, mas aos movimentos, às organizações e aos grupos cosmopolitas subalternos que recorrem à lei para levar as suas lutas adiante[42]. Referida análise encontra fundamento igualmente nas revoltas da indignação que parecem dar um não à proposta de um Direito emancipatório, ou seja, de uma prática não hegemônica do Direito[43], um Direito reconfigurativo, que poderia ser utilizado de modo a alterar as relações de poder e a reconfigurar a correlação de forças na sociedade, ao contrário, pois, do Direito configurativo[44]. Isso porque, na perspectiva dos indignados, o Direito é basicamente configurativo[45], contudo, no entender de Boaventura, as próprias revoltas da indignação geraram o Direito prefigurativo, de ocupação dos espaços públicos, que é autoatribuído e não imposto, um Direito de baixo para cima[46], a exemplo de dois outros direitos prefigurativos que existiram em algumas zonas libertadas durante o movimento de libertação anticolonial e em vigor nos territórios autônomos dos neozapatistas[47].

Seria possível postularmos por um outro direito e uma outra política, tal como postulam Boaventura de Sousa Santos e Michel Foucault, mesmo sob a égide do regime neoliberal?

Foucault postula por um novo Direito, antidisciplinar e liberto do princípio da soberania, um novo uso e possibilidade para o Direito e para a política após a desativação dos dispositivos a cargo do biopoder, em seu livro “Em defesa da sociedade”, propondo também a recuperação dos saberes sujeitados, os “conteúdos históricos que foram sepultados, mascarados em coerências funcionais ou em sistematizações formais”, desqualificados como saberes não conceituais, como insuficientemente elaborados, sepultados na erudição, “saberes ingênuos, saberes hierarquicamente inferiores, saberes abaixo do nível do conhecimento ou da cientificidade requeridos”[48], tais como o saber do doente, o saber do delinquente, o saber das pessoas, no sentido de um saber particular, um saber local, um saber diferencial. Trata-se do saber histórico das lutas, da “insurreição dos saberes” contra os efeitos de poder do discurso científico, em especial contra os efeitos centralizadores de poder[49], que são vinculados à instituição e ao funcionamento de um discurso científico.

Por sua vez, Boaventura de Sousa Santos postula por um Direito e uma política da globalização contra-hegemônica e do cosmopolitismo subalterno, dos oprimidos, insurgente[50], como formas de luta contra o fascismo social e a exclusão social, utilizando-se como base a reconstrução teórica do movimento zapatista, por um novo radicalismo nas lutas pelos direitos sociais. Partindo-se do reconhecimento de que o Direito ao lado do conhecimento são as duas principais manifestações do pensamento ou da linha abissal[51], os quais “embora distintas e operando de forma diferenciada, são mutuamente interdependentes”.(…) A linha abissal invisível separa de um lado a ciência, a filosofia e a teologia e de outro os conhecimentos populares, leigos, plebeus, camponeses e indígenas, “separa o domínio do Direito do domínio do não-direito, fundamenta a dicotomia entre o legal e o ilegal”, deixando de fora o território sem lei, fora da lei, do a-legal, ou onde não oficialmente vigoraria outro direito.

No entender de Boaventura de Sousa Santos[52], há um fascismo epistemológico, causando a ignorância acerca de outros saberes, não ocidentais, ou sua inexistência, destruição ou supressão, também denominado de epistemicídio, sendo combatidos através da ecologia dos saberes, a epistemologia da douta ignorância, aliada a aposta, tomando como exemplos Nicolau de Cusa, que reconhecia a importância do saber que nada se sabe, e Pascal, que postulava pela aposta no caso da impossibilidade de se confirmar a existência de Deus. Portanto, diante de uma pluralidade infinita de saberes, cada saber olhando a partir de sua própria perspectiva e desconhecendo os limites e possibilidades dos demais saberes (diferença epistemológica), há a necessidade do diálogo intercultural, da ecologia dos saberes, do diálogo entre os saberes, da comparação recíproca entre os saberes, buscando-se os limites e as possibilidades cruzadas, sendo necessária uma dupla abordagem, o trabalho de tradução e a artesania das práticas.[53] Bastaria, contudo, postular por uma filosofia à venda, ou neste mesmo mercado se encontrariam também a teologia, as humanidades, ou melhor, todos os conhecimentos produzidos pelo Ocidente dominante, contrários às epistemologias do Sul, considerando-se tal sul e norte, não são aqueles geográficos, mas os epistemológicos e políticos?

Foucault postula por um novo uso e possibilidade para o Direito e para a política após a desativação dos dispositivos a cargo do biopoder, enquanto que Boaventura de Sousa Santos postula por um Direito e uma política da globalização contra-hegemônica, pós-abissais, e pelo cosmopolitismo subalterno, dos oprimidos, insurgente[54], como formas de luta contra o fascismo social e a exclusão social, utilizando-se como base a reconstrução teórica do movimento zapatista, por um novo radicalismo nas lutas pelos direito sociais.

A arqueologia proposta por Foucault seria o método próprio da análise das discursividades locais e a genealogia, a tática que faz intervir, a partir dessas discursividades locais, os saberes dessujeitados, a fim de reconstituir o projeto de conjunto.[55] Segundo Foucault, a análise histórico-política, ao contrário da análise filosófico-jurídica de até então, permitiria descobrir a clivagem dos enfrentamentos e das lutas que as ordenações funcionais ou as organizações sistemáticas tiveram como objetivo justamente mascarar, sendo que com o aparecimento desses saberes locais das pessoas é que foi feita a crítica. Foi pelo acoplamento entre os saberes da erudição e os saberes desqualificados pela hierarquia dos conhecimentos e das ciências que se decidiu efetivamente, o que forneceu à crítica dos discursos destes últimos quinze anos a sua força essencial. Nesses saberes jazia a memória dos combatentes, aquela precisamente que até então tinha sido mantida sob tutela. Essas genealogias, como acoplamento desse saber erudito e desse saber das pessoas só foram possíveis com uma condição – que fosse revogada a tirania dos discursos englobadores, com sua hierarquia, contra a instância teórica unitária que pretenderia filtrá-los, hierarquizá-los, ordená-los em nome de um conhecimento verdadeiro.[56]

Inverte-se em tal obra a posição de Clausewitz, entendendo-se que, na verdade, a política é a guerra continuada por outros meios e que a decisão final só pode vir da guerra, ao passo que Boaventura de Sousa Santos postula que o Direito é a política por outros meios.

A concepção jurídica, liberal do poder político, segundo os filósofos do século XVIII, trabalha com a questão de um ato jurídico, ato fundador do Direito, como da ordem da cessão ou do contrato; poder como direito original que se cede, constitutivo da soberania e tendo o contrato como matriz do poder político. Esquema contrato-opressão, ou esquema jurídico – oposição entre legítimo e ilegítimo -, tal teoria jurídico-política da soberania data da Idade Média, sendo a reativação do direito romano em torno do problema da monarquia e do monarca – teoria da soberania -, que serviu de instrumento para justificação da constituição de monarquias feudais, e depois, de monarquias administrativas[57]. O esquema binário da guerra, da luta, do enfrentamento das forças como o fundamento da sociedade civil, a um só tempo princípio e motor do exercício do poder político, devendo ser abandonado o modelo jurídico de soberania para a análise correta das relações de poder. No lugar do discurso filosófico-jurídico que se ordena pelo problema da soberania e da lei, o discurso histórico-político que decifra a permanência da guerra na sociedade.[58] Propõe Foucault, no lugar da soberania, dominação, o Direito como instrumento dessa dominação, veículo de técnicas de sujeição polimorfas.[59]

Para Foucault, a guerra funciona sob e nas relações de poder, é a instância material da sujeição enquanto constituição dos súditos, exatamente o contrário de Hobbes no Leviatã. Foucault discorda da análise de Hobbes, considerada como uma falsa paternidade, pois o que denomina como guerra de todos contra todos não é uma guerra real e histórica, mas um jogo de representações, e a soberania se estabelece não por um fato de dominação belicosa, mas por um cálculo que permite evitar a guerra. Para Hobbes, há uma perda de liberdade em troca de um ganho de segurança, e ao mesmo tempo, uma submissão ao soberano, ou seja, o preço da paz é “não há paz sem sujeição”.[60]

Historicamente, partindo de baixo, os mecanismos de controle puderam intervir no tocante à exclusão de determinados comportamentos, tendo o sistema burguês encontrado seu interesse na técnica e no procedimento da exclusão. São mecanismos de exclusão, a aparelhagem de vigilância, a medicalização da sexualidade, da loucura, da delinquência, a micromecânica do poder, os quais, a partir de um certo momento, produziram lucro econômico, certa utilidade política, e por essa razão se viram naturalmente colonizados e sustentados por mecanismos globais e pelo sistema do Estado inteiro[61].

Surge nos séculos XVII e XVIII uma nova mecânica do poder que incide primeiro sobre os corpos, que se exerce continuamente por vigilância, absolutamente incompatível com as relações de soberania, já que a teoria da soberania é vinculada a uma forma de poder que se exerce sobre a terra muito mais do que sobre os corpos, sobre o deslocamento e a apropriação pelo poder não do tempo e do trabalho, mas dos bens e da riqueza. Este novo tipo de poder foi um dos instrumentos fundamentais da implantação do capitalismo industrial, este poder não soberano, é o poder disciplinar. [62]O discurso da disciplina é alheio ao da lei e ao das regras como efeito da vontade soberana. Traz um discurso que será o da regra, não da regra jurídica derivada da soberania, mas da regra natural, da norma, da normalização. Atualmente o poder se exerce ao mesmo tempo através desse Direito e dessas técnicas da disciplina; que esses discursos nascidos da disciplina invadam o Direito, que os procedimentos de normalização colonizem cada vez mais os procedimentos da lei, isso é que se denomina de sociedade da normalização. Propõe uma teoria da dominação[63], e ao invés da tríplice preliminar “lei”, “unidade” e “sujeito” (teoria da soberania), sugere “técnicas”, “heterogeneidade das técnicas” e seus “efeitos de sujeição” que fazem dos procedimentos de dominação a trama efetiva das relações de poder e dos aparelhos de poder. Aponta para o surgimento de um racismo de Estado, o qual a sociedade vai exercer sobre ela mesma, sobre seus próprios elementos, um racismo interno, o da purificação permanente, uma das dimensões fundamentais da normalização social no fim do século XIX e início do século XX, racismo biológico e centralizado. Houve então uma transformação das lutas de raças em lutas de classes.[64]

Ter saber é uma condição para ter poder, ou seja, houve um esquecimento perpétuo de si mesmo (pela nobreza), convidando Foucault à reabertura do saber, da própria memória, a tomada de consciência, a recuperação do conhecimento e do saber, para então colocar-se como sujeito da história.[65]

O Estado moderno promoveu o disciplinamento dos saberes no século XVIII, quando houve um combate dos saberes uns contra os outros, uma luta econômico-política em torno dos saberes que foi se tornando mais tensa e maior com o desenvolvimento das forças de produção e demandas econômicas, desenvolvendo-se em tal época processos de anexação, confisco, apropriação de saberes menores, particulares, locais, artesanais, pelos saberes maiores[66], ou seja, tentativas de generalização, eliminação e desqualificação de pequenos saberes, considerados inúteis, irredutíveis e economicamente dispendiosos, bem como ocorrendo a normalização desses saberes entre si e classificação hierárquica dos saberes, permitindo o controle dos mesmos.

Trata-se do empreendimento de normalização dos saberes técnicos, compreendendo seleção, normalização, hierarquização e centralização, o que corresponde ao que denomina “poder disciplinar”.  O século XVIII é o século do disciplinamento dos saberes, quando então a Filosofia deixa de exercer sua função de organização, comunicação dos saberes uns com os outros, e perde seu papel fundamental e fundador, efetivo, real, operacional no interior do desenvolvimento dos conhecimentos, encontrando-se à deriva, por isso também que alguns estudiosos afirmam ocorrer a morte da Filosofia após Hegel.

Nesse processo também se situaria a origem da Universidade nos séculos XVIII e início do século XIX como uma espécie de grande aparelho uniforme dos saberes, com uma função de seleção dos saberes, com uma espécie de monopólio de fato e de direito, desprezando e desclassificando o saber em estado selvagem, nascido alhures; ocorre uma mudança na forma do dogmatismo e no lugar da censura dos enunciados há, pelo contrário, uma renovação dos enunciados, a disciplina da enunciação, havendo um desbloqueio epistemológico, uma nova forma, uma nova regularidade na proliferação dos saberes, organizando-se um novo modo de relação entre poder e saber. [67] Há, pois, dois saberes: um saber disciplinado sob forma de disciplina histórica e outro, uma consciência histórica polimorfa, dividida e combatente, sendo esta a outra face da consciência política.[68]

Outro ponto em que parece poder haver uma convergência entre o pensamento de Michel Foucault e de Boaventura de Sousa Santos, é no fato de que este último afirma ter ocorrido a separação das concepções de democracia e revolução[69], e que precisaríamos reunir tais conceitos, almejando o que denomina “democratização da revolução ou revolução da democracia”. Foucault também coloca que a partir de Boulainvilliers foi possível o acoplamento dessas duas noções, a de constituição e a de revolução[70], propondo no lugar do selvagem, do homem natural, criado para constituir a sociedade antes de a sociedade existir, como fundador da sociedade e da soberania, com fundamento na troca, na reciprocidade e na bondade, substituindo tal concepção pela do bárbaro, o qual nunca cede sua liberdade e que surge tendo como pano de fundo não mais a natureza, mas a civilização, sendo seu vetor a dominação, a revolução e a barbárie. Trata-se, pois, de uma horda bárbara fundadora, e não do contrato social proposto por Rousseau. Houve, portanto, toda uma tentativa de eliminação de tal discurso do bárbaro, da mesma forma articulado com a tentativa de eliminação ou redução, colonização do elemento da guerra, a partir da Revolução Francesa, do discurso da história, retranscrito em crises e em violências.[71]

Segundo Foucault, posteriormente o tema da raça vai ser retomado por algo muito diferente, que é o racismo de Estado, articulado ao fenômeno fundamental do século XIX que é o biopoder, a assunção da vida pelo poder, uma espécie de estatização do biológico, colocando em xeque a teoria clássica da soberania[72]. Inverte-se a lógica, pois na teoria clássica da soberania, o direito de vida e de morte era um dos seus atributos fundamentais, fazer morrer e deixar viver. Contudo, devido às transformações do direito político do século XIX, surge um outro direito novo, que não vai apagar o primeiro, mas penetrá-lo, perpassá-lo, modificá-lo, um poder exatamente inverso: poder de fazer viver e de deixar morrer, instalando um novo direito, o direito de fazer viver e de deixar morrer.

Nos séculos XVII e XVIII apareceram técnicas de poder centradas no corpo individual, com foco na equação “disciplina = vigilância + treinamento”, procedimentos pelos quais se assegurava a distribuição espacial dos corpos individuais, sua separação, alinhamento, colocação em série e em vigilância e organização de um campo de visibilidade, com o fim de aumentar-lhes a força útil, técnicas portanto, de racionalização e de economia estrita de um poder, sistema de vigilância, de hierarquias, de inspeções, de escriturações, de relatórios (tecnologia disciplinar do trabalho). Durante a segunda metade do século XVIII, surge algo novo, uma outra tecnologia de poder, não disciplinar e que não exclui a primeira, mas a embute, a integra, a modifica parcialmente (mecanismos regulamentadores – biorregulamentação pelo Estado); vai utilizá-la implantando-se de certo modo nela e incrustando-se efetivamente graças a essa técnica disciplinar prévia. Agora a nova técnica não se dirige mais ao homem-corpo, mas ao homem vivo, ao homem-espécie, uma segunda tomada de poder massificante; no lugar da anatomopolítica do corpo humano, que manipula o corpo com fim de torná-lo dócil e útil, uma biopolítica da espécie humana, o biopoder, no lugar da tecnologia disciplinar do corpo a tecnologia regulamentadora da vida. Biopoder, como sendo um conjunto de processos como proporção dos nascimentos, óbitos, taxas de reprodução, fecundidade, natalidade, mortalidade, longevidade seriam os primeiros alvos de controle dessa biopolítica. Mecanismos mais sutis, mais racionais, de seguros, de poupança individual e coletiva, de seguridade. A biopolítica lida com a população como problema político e científico, biológico, problema de poder, a um só tempo[73]. Visa a modificar a morbidade, encompridar a vida, estimular a natalidade, estabelecer mecanismos reguladores, instalar mecanismos de previdência, com o fim de otimizar um estado de vida, mediante mecanismos globais, visando a estados globais de equilíbrio, de regularidade; o poder absoluto da soberania, poder fazer morrer, com essa tecnologia do biopoder transforma-se em um poder contínuo, científico que é o poder de fazer viver e deixar morrer – poder de regulamentação. O direito de intervir para fazer viver, para aumentar a vida, controlar seus acidentes, suas deficiências. Há a desqualificação progressiva da morte, tornando-se mais privada e escondida. A morte passa para o âmbito privado, o poder deixa de lado a morte, e passa a focar na mortalidade.

Esses dois mecanismos disciplinar e regulamentador não se excluem, mas se articulam. Há um elemento que vai se aplicar da mesma forma ao corpo e à população, que permite a um só tempo controlar a ordem disciplinar do corpo e os acontecimentos aleatórios de uma multiplicidade biológica, que é a norma. Vivemos na sociedade da normalização, onde se cruzam a norma da disciplina e a norma da regulamentação. O racismo inserido nos mecanismos do Estado, como mecanismo fundamental do poder, foi ocasionado pela emergência desse biopoder, isto é, não há funcionamento moderno do Estado que, em certo momento, em certo limite e em certas condições não passe pelo racismo.[74] Segundo Foucault, o racismo é o meio de introduzir afinal, no domínio da vida de que o poder se incumbiu, um corte: o corte entre o que deve viver e o que deve morrer, estabelecendo uma cesura do tipo biológico no interior de um domínio biológico. Quanto mais indivíduos anormais forem eliminados, mais a vida tornar-se-ia sadia e pura. A raça e o racismo são a condição de aceitabilidade de tirar a vida numa sociedade de normalização, função assassina do Estado. O racismo vai se desenvolver juntamente com a colonização, com o “genocídio colonizador”. Um racismo de guerra, novo no fim do século XIX, e o que faz sua especificidade é sua ligação à técnica do poder, à tecnologia do poder, ao funcionamento de um Estado que é obrigado a utilizar a raça, a eliminação das raças e a purificação da raça para exercer seu poder soberano. Outra singularidade no regime do Estado nazista, é que no limite, todos têm o direito de vida e de morte sobre o seu vizinho, por meio da denúncia, portanto, ocorre o desencadeamento do poder assassino e do poder soberano através de todo o corpo social, a política deve resultar da guerra e a guerra deve ser a fase final e decisiva que vai coroar o conjunto.[75] Vivemos na época da generalização absoluta do biopoder e do direito soberano de matar. Época do Estado racista, Estado assassino, Estado suicida.

É essencial uma nova proposta de democracia, partindo da insuficiência do modelo hegemônico de democracia liberal representativa, que não passa de uma democracia de baixa intensidade, com a distância crescente entre representantes e representados, já que estamos vivendo em verdadeira crise de legitimidade e em uma inclusão política abstrata feita de exclusão social. A democracia liberal representativa e sua expansão global coincidiu com a crise da dupla patologia nos países centrais, a patologia da participação e a da representação, a primeira vislumbrada pelo aumento do número do abstencionismo nas eleições, e a segunda pelos cidadãos cada vez menos se sentirem representados por seus supostos representantes.

Devemos reinventar a emancipação social conjugada com a invenção de novas cidadanias baseadas no recurso de uma sociologia das ausências, identificando-se silêncios, denunciando o que é silenciado, invisibilizado, desvalorizado e tornado inexistente para além da linha abissal, uma linha radical que divide a realidade social em dois universos distintos, impossibilitando a copresença nos dois lados da linha, e permitindo o aumento dos espaços públicos pelas populações marginalizadas, de modo que as vozes de todos sejam ouvidas, através de uma sociologia das emergências, identificando a resistência, princípios e práticas que demonstram outras experiências e outras democracias.

Há dois tipos de estratégias baseadas no duplo pilar de uma sociologia das ausências e de uma teoria da tradição de acordo com Boaventura de Sousa Santos:

  1. Mobilização de forma transgressiva ou subversiva de conceitos que originariamente foram elaborados em um contexto eurocêntrico; propõe conceitos alternativos baseados em estratégias como a hermenêutica diatópica.
  2. Multiculturalismo policêntrico, com base na relativização mútua e recíproca – processo de hibridização e mestiçagem que, a partir de recursos de origem diversa, local, translocal, criam formas autóctones ou nativas de representação, teorização de experiências, horizontes e práticas emancipatórias, como por exemplo a antropofagia de Oswald de Andrade, a tropicália.

Neste sentido a proposta de uma nova forma de democracia, partindo da insuficiência do modelo hegemônico de democracia liberal representativa, que não passa de uma democracia de baixa intensidade, e de uma inclusão política abstrata feita de exclusão social. Trata-se de uma democracia de alta intensidade, com fundamento na emancipação social conjugada com a invenção de novas cidadanias baseados no recurso a uma sociologia das ausências, identificando-se silêncios, e permitindo o aumento dos espaços públicos pelas populações marginalizadas, a fim de que a voz de todos seja ouvida. As versões emancipatórias do multiculturalismo baseiam-se no reconhecimento da diferença e do direito à diferença e da coexistência-construção de uma vida comum além das diferenças. Proposta de redefinição da política como política cultural. Os excluídos, os marginalizados devem ser o ponto de partida de um conhecimento reflexivo que não seja cúmplice do capitalismo global.[76]

O multiculturalismo tido como emancipatório e progressista, intercultural visa a alcançar a diversidade como uma nova dimensão das relações sociais, partindo do reconhecimento da diferença cultural que subjaz à ideia de interculturalidade, afirmando a alteridade e o processo de aprendizagem mútua, todos sendo vistos simultaneamente como educandos e educadores.

Uma democracia efetiva só poderá de fato ocorrer em uma sociedade com cidadãos com consciência verdadeira e uma autonomia individual, fortalecedores da resistência aos poderes do desenraizamento e a favor da produção do enraizamento, da valorização do que é próprio.

O multiculturalismo com a questão do respeito ao diferente, ao outro e à diferença liga-se, pois, à proposta de democracia radical, efetiva, contra-hegemônica, vinculando a democracia representativa, não mais suficiente, às democracias participativas, deliberativas, – a exemplo da experiência da América Latina, e em particular do Brasil – e culturais, pois pressupõe o respeito às diversas culturas e a todos os segmentos sociais.

Nossa principal esperança se encontra nos movimentos sociais, como fonte de globalização contra-hegemônica, nos dizeres de Boaventura Sousa Santos, e principal instrumento de pressão e cobrança ao poder público para o respeito aos direitos consagrados constitucionalmente, e no aperfeiçoamento de políticas públicas a fim de consagrar estes mesmos direitos na prática; contudo, torna-se imprescindível o diálogo intermovimentos, intercultural, verdadeiro procedimento de tradução intercultural (procedimento de tradução entre saberes de duas ou mais culturas diversas) e interpolítico, com o objetivo de ampliarem-se as forças, não agindo de forma fragmentada, não estabelecendo hierarquias, e ampliando com isso o conceito de alteridade e respeito à diferença por meio de procedimentos de aprendizagem mútua.

A ecologia dos saberes, como uma epistemologia desestabilizadora e pós-abissal partiria não do descrédito do conhecimento científico, mas sim do seu reconhecimento e da sua utilização não hegemônica[77], e ao se empenhar por uma crítica radical da política do possível, envolveria, ao contrário de uma ação conformista, uma ação com-clinamen, sendo tal conceito originário de Epicuro e Lucrécio, significando a capacidade de desvio dos átomos, como movimento espontâneo, logo também dos seres humanos. Contudo, ao contrário do movimento revolucionário, tal criatividade da ação com-clinamen não se assentaria em uma ruptura dramática, mas em um ligeiro desvio, tornando possíveis as combinações complexas e criativas entre os átomos, seres vivos e grupos sociais[78]

A ação com-clinamen encontra alinhamento com o pensamento pós-abissal diante de sua capacidade para atravessar as linhas abissais. A ecologia dos saberes é constituída por sujeitos desestabilizadores, dotados de uma subjetividade com especial capacidade, energia e vontade de agir com-clinamen.

Aqui se faz a conjugação necessária da ação com-clinamen com a abordagem poética do conhecimento e do reconhecimento da necessidade de se resgatar o vínculo na verdade indissolúvel entre Filosofia, Direito e Arte, rompido com o formalismo da modernidade, em especial, a conjugação do pensamento pós-abissal com as artes, ante seu caráter e função transgressores, permitindo-se a multiplicidade de leituras e a singularidade e diferença, essenciais ante a luta contra a monocultura dos saberes científicos. Neste sentido, destaca-se o conceito de clinamen de Harold Bloom[79], por estar relacionado justamente com a atividade poética, nas palavras de Boaventura, in verbis:

A noção de clinamen serve para explicar a criatividade poética como uma três-leitura que é antes trans-leitura, correspondendo à expressão misreading, um ler-mal que é também ler mais do que bem ou corrigir, nas palavras de Harold Bloom: “um poeta desvia-se do poema do seu precursor executando um clinamen em relação a ele”. [80]

Isso porque a poética permitiria desativar os dispositivos a cargo do biopoder, as funções meramente informativa e utilitária da linguagem, e encontrar espaço, um resto, onde um novo uso e novas possibilidades para a linguagem seriam possíveis. Assim, a arte, a criação são vistas como resistência, permitindo-se um resto entre os processos de subjetivação e desubjetivação, e novos usos e possibilidades para o Direito e para a política. Resgatando tal potencial das artes e a ligação das artes com o Direito, seria recuperada uma ligação na verdade indissolúvel que na modernidade, com o formalismo (e com o humanismo) foi rompida; à visão tradicional do Direito como ciência e técnica, puro, cartesiano, contrapõe-se uma visão alternativa que tem o Direito como poiético, como criação, fertilizado pelas demais disciplinas, por meio da transdisciplinaridade, e assim permanecendo vivo, fértil. A função de transgressão das artes necessária para a autopoiese do Direito, no sentido de sua constante renovação, precisando do elemento da diferença, da singularidade e da multiplicidade. A Arte nos permite o assombro, o êxtase, ter de volta a humanidade perdida, a re-humanização do Direito. O êxtase, o abandono de si, o desprezo de si de que já falava Nietzsche (o mais desprezível dos homens, aquele que não despreza mais a si mesmo), e é retomado por Foucault, como essencial no cuidado de si.

O problema do Direito é um problema de todo homem. Postula-se pela morte do Direito, na esteira da morte da Teoria Geral Direito, substituída pela Teoria do Direito, com forte apelo crítico e filosófico, morte de um certo tipo de direito, estéril, fechado em si mesmo e em suas certezas e dogmas, ao contrário do direito aberto e fertilizado por outros saberes. Destaca-se neste sentido o entendimento poético de Hölderlin ao interpretar a tragédia grega “Antígona”, valorizando a fluidez e o sfumato poético, valorizando a energia não verbal, que reverbera no que é dito, o alicerce estético da experiência e do conhecimento, conferindo à experiência estética um papel privilegiado. No mesmo sentido, entendemos a análise de Foucault, ao propor seu interesse pelas heterotopias, não pelas utopias, ou seja, pelos espaços absolutamente outros, nas margens, espaços e indivíduos desviantes, postulando por virar no avesso a narrativa e conseguir outra significação. Uma abordagem que leve em conta o não dito, o resto, possibilitando novos usos, um uso anárquico e dionisíaco, uma ação política revolucionária. Tais propostas em tudo se relacionam com a proposta de metodologia e teoria transgressoras de Boaventura de Sousa Santos, permitindo-se uma postura e uma abordagem abertas, uma epistemologia transgressora e libertadora, e um conhecimento-emancipação no lugar do conhecimento-regulação, uma luta contra o positivismo arqueológico[81] em busca de metodologias, epistemologias livres da tentativa de controle social e dominação de classe.

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[1] Boaventura de Sousa Santos, “As bifurcações da ordem. Revolução, cidade, campo e indignação, p.11 e ss.

[2] Boaventura de Sousa Santos, “Demodiversidade. Imaginar novas possibilidades democráticas”, p. 68 e ss.

[3] Boaventura de Sousa Santos, “Renovar a teoria crítica, reinventar a emancipação social”, p. 33 e ss.

[4] Boaventura de Sousa Santos, “O direito dos oprimidos”, p. 94.

[5] Ibidem, p. 21, p. 46, p. 47.

[6] Ibidem, p. 163-165.

[7] Ibidem, p. 173.

[8] Boaventura de Sousa Santos, “Renovar a teoria crítica e reinventar a emancipação social, p. 21 e ss.

[9] Boaventura de Sousa Santos, aulas magistrais, Universidade de Coimbra, 25.05.2018, “A arte e as epistemologias do sul – as imagens da libertação”.

[10]   Boaventura de Sousa Santos, “Reconhecer para libertar: os caminhos do cosmopolitanismo multicultural. Introdução: para ampliar o cânone do reconhecimento, da diferença e da igualdade”, p. 56.

[11] Boaventura de Sousa Santos, “Renovar a teoria crítica, reinventar a emancipação social”, p. 29 e ss.

[12] Boaventura de Sousa Santos, “Renovar a teoria crítica, e reinventar a emancipação social”, p. 63.

[13] Boaventura de Sousa Santos, “As bifurcações da ordem”, p. 31 e ss.

[14] Boaventura de Sousa Santos, “Epistemologias do Sul”, p. 453-454 e ss.

[15] Boaventura de Sousa Santos, “As bifurcações da ordem”, p. 31 e ss.

[16] Ibidem, p. 50, p. 109.

[17] Boaventura de Sousa Santos, “Demodiversidade. Imaginar novas possibilidades democráticas”, p. 21

[18] Boaventura de Sousa Santos, “As bifurcações da ordem”, p. 110, p. 358 e ss.

[19] Ibidem, p. 339.

[20] Ibidem, p. 307.

[21] Ibidem, p. 360.

[22] Ibidem, p. 29.

[23] Boaventura de Sousa Santos, “Demodiversidade. Imaginar novas possibilidades democráticas”, p. 19-20.

[24] Ibidem, p. 30.

[25] Boaventura de Sousa Santos, “As bifurcações da ordem”, p. 362.

[26] Ibidem, p. 371.

[27] Ibidem, p. 366.

[28] Boaventura de Sousa Santos, “Renovar a teoria crítica, reinventar a emancipação social”, p. 43 e ss.

[29] Ibidem, p. 47.

[30] Ibidem, p. 48-49.

[31] Boaventura de Sousa Santos, “Epistemologias do sul”, p. 448.

[32] Boaventura de Sousa Santos, “As bifurcações da ordem”, p. 30, 33, 38, 41 e ss.

[33] Boaventura de Sousa Santos, “Demodiversidade. Imaginar novas possibilidades democráticas”, p. 11.

[34] Ibidem, p. 46 e ss.

[35] Boaventura de Sousa Santos, “Epistemologias do sul”, p. 47 e ss.

[36] Boaventura de Sousa Santos, “O Direito dos oprimidos”, p. 307.

[37] Ibidem, p. 315.

[38] Ibidem, p. 213.

[39] Ibidem, p. 227-229.

[40] Ibidem, p. 365.

[41] Ibidem, p. 333, p. 335.

[42] Boaventura de Sousa Santos, “As bifurcações da ordem”, p. 110.

[43] Ibidem, p. 357 e ss.

[44] Ibidem, p. 358.

[45] Ibidem, p. 367.

[46] Ibidem, p. 368.

[47] Ibidem, p. 369.

[48] Michel Foucault, “Em defesa da sociedade”, p. 08.

[49] Ibidem, p. 08 e ss.; p. 10.

[50] Boaventura de Sousa Santos, “As bifurcações da ordem”, p. 50, p. 53 e ss.

[51] Boaventura de Sousa Santos, “Epistemologias do Sul”, p. 30-31.

[52] Ibidem, p. 460 e ss.

[53]  Ibidem, p. 460 e ss.

[54]  Ibidem, p. 50, p. 53 e ss.

[55]  Michel Foucault, “Em defesa da sociedade”, p. 08, p. 10-11.

[56] Ibidem, p. 16 e ss.

[57] Ibidem, p. 30.

[58] Ibidem, p.225, p. 228.

[59] Ibidem, p.23, p. 40.

[60] Ibidem, p.229 e ss.

[61] Ibidem, p. 26, 28-29, 142.

[62] Ibidem, p. 32 e ss.

[63] Ibidem, p. 38, 39 e ss.

[64] Ibidem, p. 67, p. 52-53. Marx: “mas nossa luta de classes, (…) nós a encontramos nos historiadores franceses quando eles narravam a luta das raças”.

[65] Ibidem, p. 130, 131,132.

[66] Ibidem, p. 150, 151-153

[67] Ibidem, p. 54-155.

[68] Ibidem, p. 157.

[69] Boaventura de Sousa Santos. Palestra Tucarena-PUCSP, Semana do livro Político.2017.

[70] Boaventura de Sousa Santos, “Epistemologias do Sul”, p. 162.

[71] Ibidem, p. 181-182, 198.

[72] Ibidem, p. 201.

[73] Ibidem, p. 205-207.

[74] Ibidem, p. 214.

[75] Ibidem, p. 218.

[76] Boaventura de Sousa Santos. “Reconhecer para libertar. Os caminhos do cosmopolitismo multicultural”.

[77]  Boaventura de Sousa Santos, “Epistemologias do Sul, p. 47 e ss.

[78]  Ibidem, p. 29 e ss.

[79]  Ibidem, nota 62, p. 29-30 e ss.

[80]  Ibidem, p. 462. Nas palavras novamente de Boaventura de Sousa Santos, ao comentar sobre a artesania das práticas como um dos procedimentos, ao lado do trabalho de tradução, das ecologias dos saberes, envolvendo também as artes:

“A preocupação com a dimensão ética e artística da transformação social pode incluir todos esses saberes e ainda as humanidades no seu conjunto, a literatura e as artes (…). a ecologia de saberes sinaliza a passagem de uma política de movimentos sociais para uma política de intermovimentos sociais”.

[81]  Boaventura de Sousa Santos, “O direito dos oprimidos”, p. 113, p. 115, p. 151.

 

 

*Paola Cantarini é advogada, professora universitária, artista plástica e poeta. Possui pós graduação em direito empresarial, direitos humanos, direito constitucional, mestre e doutora (Filosofia do direito) pela PUC-SP com doutorado sanduíche na Uminho (Braga, Portugal), doutora pela Unisalento (Lecce, Itália). Visiting Researcher na Universidade Scuola Normale de Pisa, com tutoria do professor Roberto Esposito. Pós doutorado na Univ. De Coimbra -CES, Tutor Boaventura de Sousa Santos. Pós doutorado na Unicamp, tutor Oswaldo Giacoia. Possui diversos artigos jurídicos e filosoficos e cinco livros publicados com destaque para “Teoria Poética do Direito com coautoria de Willis S. Guerra Filho e Teoria Erótica do direito.
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