Os ventos que sopram na Serra do Inácio – Piauí: quando os invisíveis têm direitos?

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Lido para Você, por José Geraldo de Sousa Junior, articulista do Jornal Estado de Direito

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Karla Araújo de Andrade Leite. Os Ventos que Sopram na Serra do Inácio – Piauí: quando os invisíveis têm direitos?. Dissertação de Mestrado. Teresina/Universidade Estadual do Piauí – UESPI/PPGSC, Campus Poeta Torquato Neto, 2024, 142 p.

 

Com alegria e com uma ponta de orgulho recebi e logo mergulhei numa proveitosa leitura deste trabalho acadêmico da Defensora Pública Karla Araújo de Andrade Leite Os Ventos que Sopram na Serra do Inácio – Piauí: quando os invisíveis têm direitos?.

A alegria vem de confirmar, o que já era um indicativo de seu exercício funcional na Defensoria Pública, a perspectiva de que o múnus público de seu ofício já trazia interpelações não só políticas mas epistemológicas para conduzir e fundamentar suas intervenções, atentas às condições sociais e também teóricas, razões para justificar o meu orgulho.

O resumo da Dissertação valida esse duplo sentimento, ao mesmo tempo que expõe o tema e os objetivos do trabalho:

Este trabalho desenvolveu pesquisa empírica, de orientação participante e interdisciplinar, insculpido no marco teórico do pensamento crítico dos direitos humanos e das teorias descoloniais, e objetivou a sistematização de uma atuação contracolonialista a ser articulada pelas Defensorias Públicas. Partiu de estudo de casos, após atendimento à população da Serra do Inácio – Piauí, que foi profundamente afetada pela instalação de parques eólicos a partir de 2016. O estudo demonstrou que o incentivo do Estado à instalação das usinas de energia eólica desconsiderou os seus impactos nefastos, entre eles o silenciamento da população local. A pesquisa qualitativa apontou que famílias inteiras viviam sem documentos pessoais, sem acesso a políticas públicas ou qualquer amparo social. Revelou que os moradores, que já viviam em situação de vulnerabilidade, foram inviabilizados pelas práticas colonialistas de incentivo ao capital. A existência dos textos normativos com garantias de direitos era insuficiente para a superação da desigualdade social acentuada pelas decisões políticas adotadas na região. A proposta da presente pesquisa pauta a invisibilidade dos povos considerados subalternos pela própria estrutura do Estado e da organização institucional que sustenta em suas condutas a colonialidade do poder, legitimando dinâmicas econômicas do eixo Sudeste-Sul, onde se fortaleceram e se consolidaram os grandes centros industriais do País, em detrimento das demais macrorregiões, que foram relegadas à periferia do sistema. O método da pesquisa-intervenção, que usa como arcabouço uma pesquisa qualitativa participativa, foi capaz de definir seu plano de atuação entre a produção de conhecimento e a transformação da realidade. Este enfoque metodológico participativo permitiu que o momento de intervenção também servisse à produção teórica, incluindo a própria instituição (Defensoria Pública) na análise. A abordagem se restringiu aos atendimentos realizados aos moradores dos municípios situados do lado piauiense da Serra do Inácio, Curral Novo do Piauí e Betânia do Piauí, entre os anos de 2019 a 2022. Também foram utilizadas informações e imagens publicadas em veículos de comunicação e por documentários. O desenvolvimento da dissertação perseguiu o objetivo de sistematizar uma atuação contracolonialista que pudesse verdadeiramente atender ao que determina a Constituição Federal de 1988, que desenhou em seu art. 134 uma instituição com a missão de promover os direitos humanos. Esta instituição, umbilicalmente relacionada ao regime democrático, é a Defensoria Pública. O estudo também foi guiado pelas compreensões do Professor José Geraldo de Sousa Júnior e as reflexões da coleção O Direito achado na rua, por ele coordenada, que traz estudos críticos que pensam o Direito como emancipação e o compreende como criação do social, defendendo o pluralismo jurídico e a condição de insurgência. Após sistematização das práticas adotadas no acompanhamento dos casos da Serra do Inácio, o trabalhou analisou 03 eixos de atuação que marcaram uma postura manifestamente contracolonialista da defensoria Pública, com propósitos emancipatórios do público atendido.

 

O estudo de Karla, nesses termos, se insere numa abordagem que adensa a perspectiva que associa a ação de assessoramento jurídico-popular no marco do pensamento decolonial. Procurei sinalizar essa relação em  https://estadodedireito.com.br/a-assessoria-juridica-popular-no-marco-do-pensamento-decolonial-direitos-e-saberes-construidos-nas-resistencias-populares/, ao fazer recensão do importante trabalho A Assessoria Jurídica Popular no Marco do Pensamento Decolonial. Direitos e Saberes Construídos nas Resistências Populares de Maria do Rosário de Oliveira Carneiro. Belo Horizonte: Editora Dialética, 2020.

Do mesmo modo, embora sem caber exatamente no recorte de experiências cartografáveis, pode ser identificada pelas designações mais gerais que demarcam a disposição de mobilizar o jurídico para assessorar os sujeitos que protagonizam a emancipação social. Também anotei essa perspectiva em outra recensão – https://estadodedireito.com.br/mapa-territorial-tematico-e-instrumental-da-assessoria-juridica-e-advocacia-popular-no-brasil/ – ao me debruçar sobre o estudo paradigmático, que bem poderia ser atualizado – Mapa Territorial, Temático e Instrumental da Assessoria Jurídica e Advocacia Popular no Brasil / José Antônio P. Gediel, Leandro Gorsdorf, Antonio Escrivão Filho, Hugo Belarmino, Marcos J. F. Oliveira Lima, Eduardo F. de Araújo, Yuri Campagnaro, Andréa Guimarães, João T. N. de Medeiros Filho, Tchenna Maso, Kamila B. A. Pessoa, Igor Benício, Virnélia Lopes, André Barreto – Curitiba/PR – Brasília/DF – João Pessoa/PB 2011. 90 p. ISBN: 978-85-62707-38-4.

Karla parte do território epistemológico de sua prática jurídica que é a Defensoria Pública. Desde esse território, são próximas, mas com especificidades, as possibilidades das práticas jurídicas emancipatórias. Tendo em vista um dos pressupostos de Karla – O Direito Achado na Rua – essas possibilidades pavimentam uma conexão naquele plano que já mencionei, o das condições sociais e das possibilidades teóricas.

Assim que, em trabalho de catalogação, realizado pela Defensoria Pública do Distrito Federal – a partir de seu programa editorial – tratei de demonstrar essa realção, por meio de categorias que serevm à Karla para seu fundamento teórico, conforme https://estadodedireito.com.br/o-direito-achado-na-rua-e-as-possibilidades-de-praticas-juridicas-emancipadoras/,  fazendo a análise de duas edições da Revista da Defensoria Pública do Distrito Federal.  V. 1 n. 3 (2019): Ordenamentos jurídicos, monismos e pluralismos: O Direito Achado na Rua e as possibilidades de práticas jurídicas emancipadoras. José Geraldo de Sousa Junior, Nair Heloisa Bicalho de Sousa , Alberto Carvalho Amaral ,Talita Tatiana Dias Rampim (Editores).  Endereço do link para a edição completa da Revista: http://revista.defensoria.df.gov.br/revista/index.php/revista/issue/view/8/RDPDF%20vol%201%20n%203%202019.

De toda sorte, estamos em face de um estudo, que até por sua determinação metodológica, se presta a qualificar o que tenho chamado, com outros colegas, no duplo plano, teórico e prático, de experiências que devemos compartilhar sobre acesso à justiça.

Para tanto, sugiro considerar como uma espécie de guia – https://estadodedireito.com.br/experiencias-compartilhadas-de-acesso-a-justica-reflexoes-teoricas-e-praticas,  com referências a REBOUÇAS, Gabriela Maia; SOUSA JUNIOR, José Geraldo de; CARVALHO NETO, Ernani Rodrigues de (Organizadores). Experiências Compartilhadas de Acesso à Justiça: Reflexões teóricas e práticas. Santa Cruz do Sul: Essere nel Mondo, 2016, 281 p. Texto Eletrônico. Modelo de Acesso World Wide Web (gratuito). www.esserenelmondo.com.br e REBOUÇAS, Babriela Maia; SOUSA JUNIOR, José Geraldo de; ESTEVES, Juliana Teixeira (Organizadores). Políticas Públicas de Acesso à Justiça: Transições e Desafios. Santa Cruz do Sul: Essere nel Mondo, 2017, 177 p. E-Book (gratuito). www.esserenelmondo.com.br.

Recentemente revisitei esse guia em condições de uma interlocução que se fez estratégica, ao ensejo de um debate de alcance inclusive internacional. A propósito, um texto de divulgação no qual resumo elementos dessa interlocução: https://brasilpopular.com/a-atuacao-das-defensorias-publicas-e-das-ouvidorias-externas-no-fortalecimento-da-democracia-participativa/.

Ali afirmo que a Defensoria Pública é, fora de dúvida, uma conquista da democracia e da sociedade brasileira. E os defensores e defensoras, são verdadeiros agentes da transformação, em sua missão de defender os direitos dos vulnerabilizados, assim mesmo designados, ao invés de vulneráveis, já que não se trata de um destino mas de uma condição, quando confrontam pois, as desigualdades sociais e promovem a inclusão social. Ao lado da justiça social, garantem a voz daqueles que mais precisam seja ouvida e seus direitos sejam respeitados.

O trabalho de Karla Araújo de Andrade Leite responde com substância a essa conquista. É expressão dela constitutiva. Isso transparece do seu resumo, já transcrito e do sumário que o organiza:

Sumário

  1. Considerações Iniciais
  2. Os Ventos que Sopram no Piauí

2.1       Serra do Inácio: o lugar e o não-lugar

2.2       Vozes ao Vento: a invisibilidade dos locais

2.3       Energia Eólica: alienação dos ventos piauienses

  1. Colonialidade do Poder: Vulnerabilidades e Invisibilidade Social na Serra do Inácio

3.1       As vulnerabilidades da Serra do Inácio

3.2       A invisibilidade social na Serra do Inácio

  1. Missão Contracolonialista da Defensoria Pública: Quando os Invisíveis têm Direitos?

4.1       Defensoria Pública: Entre o invisível e o visível

4.2       Missão Contracolonialista da Defensoria Pública: perspectiva necessária para promoção dos direitos humanos

  1. Considerações Finais

Referências

 

Estou muito de acordo com essa perspectiva, que encontro em posicionamentos de muitos defensores e defensoras, entre eles e elas, Karla Araújo. Aliás, assim também me posicionei quando da edição do livro Defensoria Pública e a Tutela Estratégica dos Coletivamente Vulnerabilizados. (Orgs): Lucas Diz Simões, Flávia Marcelle Torres Ferreira de Morais, Diego Escobar Francisquini. Belo Horizonte: Editora D’Plácido, 2019.

Com Alberto Carvalho Amaral, Defensor Público em Brasília e como minha colega professora na Universidade de Brasília Talita Tatiana Dias Rampim, contribuímos para a obra com o artigo “Exigências críticas para a assessoria jurídica popular: contribuições de O Direito Achado na Rua”, p. 803-826.   Na nossa abordagem, colocadas as questões pressupostas, focalizamos dois aspectos destacados para atender o plano da obra, que pede enfoque teórico e também prático: 1- A Defensoria Pública como necessário ator qualificado para o alargamento e a democratização do acesso à justiça; 2 – O projeto “Defensoras e Defensores Populares do Distrito Federal”: ação difusora e conscientizadora sobre direitos humanos, cidadania e ordenamento jurídico

No primeiro aspecto, para nós, o acesso à justiça constitui-se direito fundamental garantido pela Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada aos 5 de outubro de 1988 – CF/88 e não significa, necessariamente, acesso ao Judiciário. Partimos de uma visão axiológica da expressão “justiça”, que representa uma determinada ordem de valores e direitos fundamentais para o ser humano. Esse tema tem sido pesquisado por juristas e sociólogos, como Mauro Cappelletti e Bryant Garth , que consideram que o acesso à justiça pode ser encarado como o mais básico dos direitos humanos inseridos no contexto de um sistema jurídico moderno e igualitário, comprometido com a garantia (e não apenas com a proclamação) do direito de todos (https://estadodedireito.com.br/defensoria-publica-e-a-tutela-estrategica-dos-coletivamente-vulnerabilizados/).

Quando analisamos o desenho institucional conferido à Defensoria, verificamos a presença de fortes elementos democratizantes, que aproximam a instituição e sua prática a esse subcampo político-jurídico. Presença esta que notamos desde a constitucionalização de sua função essencial à justiça, passando pela natureza dos direitos e sujeitos que tutela e serve, até alcançar a sua arquitetura institucional.

A Defensoria Pública é uma instituição que figura como um dos principais atores para o alargamento e a democratização do acesso à justiça no Brasil. Comumente associada ao exercício de uma de suas funções constitucionais, a saber, a prestação de assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos (CF/88, artigo 5º, inciso LXXIV) – ou, atualmente, na tutela de grupos socialmente vulneráveis –, suas funções institucionais não se reduzem à dimensão da assistência judicial, mas, antes, a projetam como ator qualificado para a democratização da justiça no Brasil.

Isso advém, também, do processo de institucionalização do órgão, que inova ao ser introduzido em texto constitucional – atuação de constituinte originário que, posteriormente, será agregada por diversos outros países latino-americanos  – como “verdadeiro modelo organizacional” a ser “assumido efetivamente pelo Estado”, prestigiando uma concepção ampla de acesso à justiça, que situa seus esforços na diminuição das desigualdades sociais, concretizadas em contundentes e rotineiras violações interpenetrantes de estruturas monetárias, raciais, sexuais, locais, identitárias, culturais, enfim, de um complexo de variantes discriminatórios que, na realidade fática, complexificam as dificuldades de efetivar acesso à proteção de direitos essenciais para o exercício básico da cidadania .

Nesse espaço sistêmico da Justiça, apenas a Defensoria Pública pensada nos termos da Constituição de 1988, é a instituição que mais avançou nessa direção, teórica, política e funcionalmente (https://brasilpopular.com/participacao-popular-consultiva-no-conselho-de-defensoria-publica/).

Em entrevista que concedi ao Boletim Forum DPU da Escola Superior da Defensoria Pública, visando a incutir esse fundamento na formação dos quadros da instituição, como projeto e como programa, acentuei esse carisma (Defensoria Pública e Acesso à Justiça – Forum DPU V.3 N.11 ISSN: 2526-9828 Ano: 2017 – https://www.dpu.def.br/enadpu/forumdpu/edicao-11)

À pergunta sobre o potencial da DPU como instituição voltada para a garantia do acesso à justiça e quais os principais desafios a serem enfrentados pela DPU para a concretização deste potencial? Respondi não ser por acaso que, nas mobilizações para a institucionalização de defensorias, o social organizado tenha sido um fator determinante para a sua criação. Pense-se, por exemplo, o caso da Defensoria de Sâo Paulo para cuja institucionalização muito contribuiu a mobilização da sociedade civil. Por isso mesmo, em sua estrutura, é muito pertinente a atividade de sua Ouvidoria Externa, eleita, que traduz de alguma maneira o sentido de participação que nesse sistema o princípio democrático alcançou. Veja-se a esse respeito, a belíssima tese de doutoramento de Élida Lauris dos Santos, defendida em Coimbra(tive o privilégio de aprendizado ao participar da banca): “Acesso para quem precisa, justiça para quem luta, direito para quem conhece: dinâmicas de colonialidade e narra(alterna-)tivas do acesso à justiça no Brasil e em Portugal. Coimbra: [s.n.], 2013 ”.

Logo, na sequência, a questão sobre o potencial do processo de coletivização judicial para a garantia do acesso à justiça e quais riscos este processo pode apresentar? Minha resposta: já não se trata de potencial, mas de constatação de seu valor para a ampliação de acessos à Justiça se considerarmos as formas coletivas de abreviar esse acesso e de coletivizar as pretensões. Pense-se nas estratégias ampliadas de subjetivação ativa das ações de inconstitucionalidade, na formação de juízos de convencimento a partir da dinâmica de audiências públicas, de admissibilidade de terceiros não diretamente parte em causas (amicuscuriae), nas gestões para construção de ajustes de conduta e outras modalidades de pactuação para constituir obrigações e responsabilidades mediadas pela estrutura administrativo-judicial. O risco é o da judicialização da política e do ativismo decisionista, não confundidos com a competência alargada de aplicação construtiva de soluções judiciais, situações que têm revelado uma indevida substituição de razões do mediador (juízes, cortes judiciais, órgãos do sistema de justiça e do ministério público) em lugar das disposições legítimas de entendimentos razoáveis construídos pela participação ativa de coletividades e sujeitos coletivos (mecanismos de consulta prévia e informada, expertises sociais etc). Ou ainda a orientação para rejeitar a incriminação por desacato, delito previsto no artigo 331 do Código Penal, afronta o artigo 13 da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San Jose da Costa Rica), ao impedir que o cidadão manifeste-se criticamente diante de ações e atitudes dos funcionários públicos, no exercício de sua função, recomendado que Defensores Públicos sustentem a absolvição do indivíduo, no bojo das ações judiciais, utilizando como instrumento o controle de convencionalidade. Em estudo sobre essa incidência (CONTROLE DIFUSO DE CONVENCIONALIDADE: CASOS DE ATUAÇÃO DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, de Maria do Carmo Goulart Martins Setenta, Defensora Pública Federal em Salvador/BA, R. Defensoria Públ. União Brasília, DF n.14 p. 1-310 Jul/Dez . 2020), constata-se a aplicação do mecanismo do controle de convencionalidade como instrumento para a tutela dos direitos humanos, seja perante o Sistema Interamericano ou perante os Tribunais pátrios, porquanto se caracteriza em nova doutrina que prestigia os direitos humanos e promove uma interlocução entre o Direito Interno e o Direito Internacional.

Considero que a institucionalização das ouvidorias externas no corpo das defensorias é uma resposta contundente na direção da democratização do acesso à justiça e do debate que não pode ficar restrito corporativamente aos juristas. Por isso deve ser saudada a Lei Federal de 2009 que determina este formato de Ouvidoria Externa de Defensoria, mas só 17 das 27 defensorias cumprem a lei, que são: Acre, Rondônia, Pará, Maranhão, Piauí, Ceará, Pernambuco, Paraíba, Bahia, Mato Grosso, Distrito Federal, Goiás, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Por isso é notável a iniciativa da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul, por promoção de sua Ouvidora Externa Marina Ramos Dermann – (o Ouvidor atual Rodrigo de Medeiros, originado dos quadros da advocacia popular de movimentos sociais, foi nomeado depois de escrutínio do Conselho do órgão, avalisadopornota de apoio de 155 professores/as e acadêmicos/as de todo o país, carta de apoio de movimentos e entidades com 183 movimentos/entidades sendo mais de 120 do RS https://mst.org.br/wp-content/uploads/2023/03/Carta-Aberta-Apoio-a-Rodrigo-de-Medeiros-Para-Ouvidoria-da-DPE_RS-3.pdf, traduzindo a melhor forma de corresponder a um dever funcional tão democraticamente legitimado) – de constituição de um Conselho Consultivo da Ouvidoria-Geral da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul, como já realizado por outras Defensorias Públicas no País (SP, PR, BA e AC) e Defensoria Pública da União.

É verdade que a concretização dessa expectativa não é fácil e os obstáculos, às vezes, são mais internos do que externos. Acabo de receber do Ouvidor Externo da Defensoria Pública do Rio Grande do Sul Rodrigo Medeiros, material que expõe o grau desse obstáculo. Ele o exibe em bem fundamentado parecer (file:///C:/Users/HP/Downloads/Manifestacao_sobre_o_Parecer_n%20_133-2023_assinado%20(1).pdf) e manifesta a importância de posicionamento ampliado em nota que tornou pública e que reproduzo: “Recapitulando e infirmando sobre o processo de criação do Conselho Consultivo da Ouvidoria.  1. Foi juntado no processo o parecer, ainda da gestão anterior contrário à criação do Conselho, que deveria ser feito por lei estadual; 2. Veio para a Ouvidoria se manifestar e hoje demos entrada na manifestação. A @+55 51 9244-6276 também deu contribuições bem importantes ao texto; 3. Agora deve voltar ao relator e esperamos que se coloque em pauta para deliberação; 4. Defendemos a criação do Conselho por Resolução e utilizamos as manifestações já juntadas no processo, que a sociedade vem dando a esta criação.  Artigo do Prof. José Geraldo de Sousa Jr. , notas técnicas da Unisinos,  do Forum Justiça e CRESS-RS, nota do CRP, moção da VI Conferência Estadual de DH, etc”.

O texto de Karla Leite, escorreito e instigante, manifesta a mesma vivacidade que ela exibe no coloquial e no performático, em ambientes de debate, tal como pude testemunhar e me perceber mobilizado para os temas subjacentes à discussão da Dissertação, notadamente na correlação entre política e direitos humanos, em programas que ela modera juntamente com sua colega Gabriela Tunes: https://www.youtube.com/watch?v=FMaljeEODfk&t=249s, TV Trevo Brasil: DIREITOS HUMANOS E POLÍTICA – A ascensão da extrema direita no mundo; e de modo muito próprio, https://www.youtube.com/watch?v=zV379zY2HDk; Direito Achado na Rua – TV Trevo: Direitos Humanos e Política.

A Autora reivindica uma metodologia participativa e a realiza, mas de um modo sentipensante (Fals Borda), assim que logra estabelecer necessariamente a atitude diz ela, de “estranhar aquela realidade de opressão, identificada na Serra, valendo-se do fundamento teórico que lhe permite uma reflexividade que permitisse a promoção efetiva de direitos humanos…: A leitura dos direitos não poderia mais ser baseada unicamente em referências eurocêntricas, pois restariam desconectadas da verdade”. ´´E o que ela configura como virada ontológica, de modo a permitir (tal como sugere em sua concepção e prática O Direito Achado na Rua), a inclusão das vozes vulnerabilizadas na reivindicação de justiça.

Recolho, à fls. 127/128 uma síntese que define o trabalho:

Quando os invisíveis têm direitos? A resposta será levantada todas as vezes que a Defensoria Pública se deparar com um grupo social marginalizado pelas forças colonialistas. É preciso estar atento aos fatos, aos valores simbólicos do grupo social, e não negociar direitos alheios sob nenhuma hipótese. É preciso permitir que cada sujeito esteja ativo em seu próprio destino, decidindo conscientemente e livremente sobre se e quando poderá ceder a negociações, em termos dialogados, e não impostos. É preciso ter a natureza confiada pela Constituição Federal de 1988, uma instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados. É preciso, desta maneira, assumir a postura contracolonialista desejada pelo constituinte.

Com efeito, do que se trata, em suma, é tornar possível a aproximação do direito à realidade social, proporcionando o apoio à efetivação dos direitos dos grupos subalternizados, seja através de mecanismos institucionais, judiciais ou por mecanismos extrajudiciais, políticos e de conscientização. A aposta ultrapassa aspectos formais, do repertório jurídico tradicional e tenta compreender a realidade diante de sua complexidade, buscando, assim, ofertar respostas também complexas e abrangentes.

 

|Foto Valter Campanato
José Geraldo de Sousa Junior é Articulista do Estado de Direito, possui graduação em Ciências Jurídicas e Sociais pela Associação de Ensino Unificado do Distrito Federal (1973), mestrado em Direito pela Universidade de Brasília (1981) e doutorado em Direito (Direito, Estado e Constituição) pela Faculdade de Direito da UnB (2008). Ex- Reitor da Universidade de Brasília, período 2008-2012, é Membro de Associação Corporativa – Ordem dos Advogados do Brasil,  Professor Titular, da Universidade de Brasília,  Coordenador do Projeto O Direito Achado na Rua.55

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