Prazo prescricional para ajuizar a ação de petição de herança

Coluna Direito da Família e Direito Sucessório

 

 

 

  • Renata Vilas-Bôas

Nova posição do Superior Tribunal de Justiça sobre o prazo prescricional para ajuizar a ação de petição de herança

           No apagar das luzes de 2019, o E. Superior Tribunal de Justiça, por meio de sua Quarta Turma, manifestou-se num processo referente ao prazo prescricional da ação de petição de herança.

          Quando se trata de prazo prescricional, precisamos analisar cada direito ofendido para verificar em qual prazo se adequada, e se não houver previsão expressa cai na regra geral do prazo de 10 anos, conforme o art. 205 do Código Civil, vejamos:

Art. 205. A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.

          Como não existe a previsão expressa adotava-se então, a regra do art. 205 do Código Civil, contudo a divergência, com relação à ação de petição de herança, surgia com relação ao seu termo inicial. Ou seja, a partir de que momento deve começar a contagem desse prazo de dez anos. Alguns doutrinadores se manifestavam no sentido de ser do momento da abertura da sucessão, ou seja, quando do falecimento do autor da herança, ao passo que outros doutrinadores afirmavam categoricamente que deveria ser apenas de quando a pessoa tomasse conhecimento de sua condição de herdeiro. Ou seja, somente depois que fosse chancelado a sua condição de herdeiro é que o prazo passaria a correr. Nesse caso seria necessário ajuizar a ação de investigação de parentalidade para verificar se o autor da herança era ou não pai do pretenso herdeiro.

          Diante da divergência doutrinária a 3a. Turma do E. Superior Tribunal de Justiça, manifestou-se no sentido de que o prazo prescricional somente começava a contar quando do trânsito em julgado da ação de investigação de paternidade, vejamos a ementa exemplificativa da posição externada pela referida Turma:

PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. INTERPOSIÇÃO SOB A ÉGIDE DO CPC/1973. DIREITO SUCESSÓRIO. AÇÃO DE PETIÇÃO DE HERANÇA. ANTERIOR AJUIZAMENTO DE AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO.

  1. A petição de herança objeto dos arts. 1.824 a 1.828 do Código Civil é ação a ser proposta por herdeiro para o reconhecimento de direito sucessório ou a restituição da universalidade de bens ou de quota ideal da herança da qual não participou.
  2. A teor do art. 189 do Código Civil, o termo inicial para o ajuizamento da ação de petição de herança é a data do trânsito em julgado da ação de investigação de paternidade, quando, em síntese, confirma-se a condição de herdeiro.
  3. Aplicam-se as Súmulas n. 211/STJ e 282/STF quando a questão suscitada no recurso especial não tenha sido apreciada pela Corte de origem.
  4. Incide o óbice previsto na Súmula n. 284/STF na hipótese em que a deficiência da fundamentação do recurso não permite a exata compreensão da controvérsia.
  5. Recurso especial parcialmente conhecido e desprovido.

(REsp 1475759/DF, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/05/2016, DJe 20/05/2016)

          Até então achávamos que a divergência anteriormente existente tinha sido sanada, quando, no apagar das luzes de 2019, a E. 4a. Turma do Superior Tribunal de Justiça, manifesta-se no sentido de que o prazo prescricional para o ajuizamento da referida ação inicia-se da abertura da sucessão, independentemente se o herdeiro conhecia ou não a sua condição de herdeiro. Vejamos a reportagem extraída do site do E. Superior Tribunal de Justiça:

Foto: Pixabay

Prazo prescricional para ajuizar petição de herança corre a partir da abertura da sucessão

          ​​A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que o prazo prescricional para o ajuizamento de petição de herança corre a partir da abertura da sucessão, ainda que o herdeiro não saiba dessa sua condição jurídica ou não tenha conhecimento da morte do autor da herança.

          Com esse entendimento, o colegiado negou o recurso especial de um homem que pedia o reconhecimento da prescrição da petição de herança ajuizada por uma sobrinha para anular doações feitas pelo avô dela, que não incluíram seu pai – reconhecido como filho biológico em ação de investigação de paternidade.

          Segundo informações do processo, o avô da autora fez doações de todos os bens ao filho – tio da autora – em 1977 e 1984. Em 1993, o pai dela ajuizou ação de reconhecimento de paternidade, e o avô faleceu no curso do processo. Após a morte de seu pai, mas com o vínculo biológico já reconhecido judicialmente, a mulher ajuizou ação em 2011 para anular as doações feitas pelo avô, visando o recebimento de sua parte.

          O filho que recebeu todos os bens alegou a prescrição do direito de ação da sobrinha, uma vez que, diferentemente do entendimento das instâncias ordinárias, o prazo para o ajuizamento da petição de herança não contaria da data do trânsito em julgado da investigação de paternidade, mas, sim, do momento em que as ações judiciais poderiam ser propostas – ou seja, a partir da realização de cada uma das doações, há mais de 20 anos.

Transmissão de heran​​ça

          O relator do recurso no STJ, ministro Raul Araújo, aderiu aos fundamentos apresentados no voto vista da ministra Isabel Gallotti – para quem o entendimento de que o trânsito em julgado da sentença de reconhecimento de paternidade marca o início do prazo prescricional para a petição de herança conduz, na prática, à imprescritibilidade desta ação, causando grave insegurança às relações sociais.

          Em decisão unânime, os ministros da Quarta Turma definiram que, por meio da ação de petição de herança, busca-se a repartição daquilo que foi transmitido aos herdeiros, por força de lei, no momento da abertura da sucessão, conforme a regra do artigo 1.572 do Código Civil de 1916 (artigo 1.784 do CC/2002), vigente à época da sucessão. O dispositivo estabelece que, “aberta a sucessão, o domínio e a posse da herança transmitem-se, desde logo, aos herdeiros e legítimos testamentários”.

          No julgamento, o colegiado concluiu que é a partir do momento da sucessão que o herdeiro preterido – reconhecido ou não em vida – tem a possibilidade de ajuizar ação para buscar a sua parte da herança. Caso não reconhecido, caberá a ele, desde a abertura da sucessão, o direito de postular, conjuntamente à investigação de paternidade, a consequente petição de herança.

Condição de he​​rdeiro

          Para os ministros,​ a sentença que reconhece a paternidade possui efeitos ex tunc (retroativos), pois nesse caso a filiação sempre existiu. “Ostentando desde sempre a condição de herdeiro, ainda que não o saiba, o termo inicial para o ajuizamento da petição de herança ocorre imediatamente com a transmissão dos bens aos herdeiros”, ressaltou a ministra Gallotti.

          De acordo com o colegiado, a regra geral é a contagem do prazo de prescrição na data da lesão do direito, a partir de quando a ação pode ser ajuizada (actio nata); os casos com marco inicial diverso são excepcionados por lei.

          Na hipótese, a Quarta Turma verificou que o termo inicial da prescrição de petição de herança se deu com o falecimento do avô da autora, em 28 de julho de 1995. Assim, diante das regras dispostas no artigo 177 e seguintes do CC de 1916 (2.028 e 205 do CC/2002), o termo final para o ajuizamento da ação de petição de herança ocorreria em 11 de janeiro de 2013, dez anos após a entrada em vigor do Código Civil de 2002, tendo sido ajuizada tempestivamente em 4 de novembro de 2011.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): AREsp 479648

          Com essa nova posição, abre-se questionamento sobre qual das duas posições deve prevalecer, e assim, esperamos que a Segunda Seção do E. Superior Tribunal de Justiça seja provocada para se manifestar e termos a segurança jurídica necessária sobre esse tema.

 

 

renata vilas boas
* Renata Vilas-Bôas Advogada inscrita na OAB/DF 11.695. Sócia-fundadora do escritório Vilas-Bôas & Spencer Bruno Advocacia e Assessoria Jurídica. Professora universitária e na ESA OAB/DF; Mestre em Direito pela UPFE, Conselheira Consultiva da ALACH – Academia Latino-Americana de Ciências Humanas; Acadêmica Imortal da ALACH – Academia Latino-Americana de Ciências Humanas; Integrante da Rete Internazionale di Eccelenza Legale como conselheira internacional. Diretora de Comunicação da Rede internacional de Excelência Jurídica – RIEXDF e Presidente de comissão de Família da RIEXDF;  Colaboradora da Rádio Justiça; Presidente da Comissão Acadêmica do IBDFAM/DF; Autora de diversas obras jurídicas. Articulista do Jornal Estado de Direito. Embaixatriz da Aliança das Mulheres que Amam Brasília. Embaixadora do Laço Branco (2019/2020), na área jurídica. 

 

 

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