(I)moral

            Segundo os léxicos, moral significa respeito à moralidade e aos bons costumes, à decência e à honestidade. Diz-se, assim, que moral é tudo o que é decente e honesto, indicando um agir probo e ético.

            Durante muito tempo a moral se distanciou do Direito, afastando-se, desse modo, os seus conceitos. No período do positivismo estrito, que tem como um de seus pilares o austríaco Hans Kelsen, a validade das leis dependia, quase que exclusivamente, apenas da observância dos aspectos formais estabelecidos pela Constituição: editada a lei em conformidade com as regras para a sua elaboração, era ela válida. Não se fazia, portanto, uma análise crítica do conteúdo material das normas jurídicas, abstraindo-se de qualquer juízo de valor.

            Mas, os tempos mudaram. A legalidade dos regimes nazifascistas, que do ponto de vista formal se revelavam válidos, estarreceu o mundo, e mostrou a todos a insuficiência do positivismo e a necessidade de mudanças no eixo filosófico do Direito.

            Por isso, em boa hora evoluímos para o pós-positivismo, vertente filosófica do neoconstitucionalismo, que promoveu, dentre outros aspectos, a constitucionalização do Direito, a normatividade dos princípios e, fundamentalmente, a reaproximação entre o Direito e a moral.

            Sob essa nova realidade, uma norma jurídica, para ser válida e legítima, precisa ter um conteúdo ético e moral, conforme padrões razoavelmente aceitos pela coletividade.

            Exemplo emblemático, em nosso ordenamento, dessa nova perspectiva é a consagração, no art. 37 da Constituição Federal, do princípio da moralidade administrativa, segundo o qual o administrador, em seu atuar, deve observar o elemento ético de sua conduta, sabendo distinguir o bem do mal, e o honesto do desonesto. Assim, na condução da coisa pública, deve o agente agir sempre de forma decente e honesta, proibindo-se desvios, como a utilização do Estado para fins pessoais, visando atingir interesses particulares.

            Vê-se que, do ponto de vista conceitual e do direito objetivo, a moralidade é, sem sombra de dúvidas, a mola mestra que deve impulsionar todo o atuar do gestor da coisa pública.

            No entanto, do ponto de vista prático o que se vê é toda sorte de desvios e condutas imorais e ímprobas. Diuturnamente escândalos se sucedem, sejam mensalões, semanões, petrolões, dentre outros que não param de surgir. O que vemos é sempre a prevalência do interesse particular, privado, e do bolso daquele que administra os bens públicos.

            A carteira do administrador sempre pesa mais, isso quando não outros interesses. Para ilustrar, basta apresentar um fato recentemente noticiado no Rio de Janeiro.Foi amplamente divulgado nos veículos de comunicação locais o caso da nomeação de uma exuberante modelo para ocupar um cargo técnico e de confiança na Corregedoria do Tribunal Regional Eleitoral, assessorando um magistrado. O fato da nomeada ser uma bela mulher, e ter participado de um reality show erótico, não seria um problema, desde que tivesse ela a qualificação profissional adequada para a função. A questão é que, segundo informações que vieram a público, a nomeada não tinha sequer um curso superior, de modo que não preenchia os requisitos mínimos para ocupar o cargo. Nesse caso, interesses privados prevaleceram sobre o interesse público. Exposto publicamente o fato, o Presidente do Tribunal anulou a nomeação em razão do não preenchimento dos requisitos legais.

            Esse é apenas um dos muitos exemplos da não observância da moralidade, princípio tão caro ao Direito e à sociedade.E o que mais assusta, em verdade, é que isso parece não ter fim. É sempre mais do mesmo.

            Por essa razão, já chegou a hora de mudar. Não se pode mais, em pleno século XXI, manter-se tal mentalidade e postura. Os anseios sociais são cada vez maiores. A cobertura da imprensa, também. E a vinda a tona desses fatos apenas desmoraliza nossos Poderes e aqueles que, representando-os, acabam expostos e servindo de mau exemplo para a população.

            Os casos de corrupção que surgem diariamente, desde o segurança da fila de um banco, que aceita dinheiro para dar uma senha mais próxima no atendimento do cliente, até o presidente de uma importante estatal, que “desconhece” esquemas bilionários de desvio de dinheiro em contratos, são reflexos do que nossos representantes praticam a vista de todos, sem nenhum constrangimento. Com a exposição pública, ganhou notoriedade, e uma conotação anedótica, a frase “eu não sabia de nada”, mesmo que a autoridade tivesse o domínio do fato.

            Definitivamente, a mudança se faz necessária, pois a presente quadra não se mostra alvissareira. E ela deve vir de cima para baixo, para que se dê o verdadeiro exemplo. Caso isso não ocorra, e de maneira rápida, veremos, cada dia mais, a desmoralização dos Poderes, e a falta de credibilidade da sociedade, que apenas vai às urnas para cumprir um dever imposto pela Constituição, e não para exercer um direito cívico tão importante para a definição dos rumos do nosso país.

 Autor – Thiago Ferreira Cardoso Neves é professor da EMERJ e advogado do escritório Sylvio Capanema de Souza Advogados Associados.

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