Tarso de Melo
O valor destinado à manutenção do Museu Nacional é menos que a metade do que se gasta com limpeza e manutenção da frota de carros do Supremo Tribunal Federal. Menos que a metade. Ainda assim, o Museu Nacional não vinha recebendo aquele valor completamente. E a frota de carros de um tribunal que tem 11 ministros é apenas uma das despesas “curiosas” que são atendidas pelo mesmo cofre federal. Sim, o dinheiro é um só, mas a selva de rubricas em que a burocracia divide esse dinheiro acaba nos despistando e não percebemos as decisões políticas, os propósitos escusos e até mesmo as mesquinharias que fazem nunca faltar (muito) dinheiro aqui, sempre faltar (pouco) dinheiro ali. Hoje, quando tudo que resta é olhar para fotos do incêndio e do rescaldo, o que mais dói é contextualizar essa tragédia e perceber que um valor irrisório no orçamento da União poderia ter evitado mais essa derrota. Como já disse aqui, não é um acidente. É um projeto. O projeto de um país condenado a ser sempre o cenário lindo de histórias trágicas. O país em que a reclamação de alguma autoridade, caso mandem buscar seu cachorro no petshop com uma “viatura” empoeirada, vai ter muito mais peso do que todos os nossos gritos por justiça, democracia, saúde, educação, memória. É o encontro entre os males de hoje e os males do passado, aqueles que arrastamos carinhosamente de geração a geração. Neste tipo de conservação do passado, aliás, somos peritos: o pior da história do Brasil funciona perfeitamente, a céu aberto, para quem quiser visitar. Mas não é hora de ironia. Esse misto de ódio e vergonha ainda vai queimar em nossas cabeças por muito tempo.