A diretora presidente do jornal Estado de Direito e fundadora do projeto Direito no Cárcere, Carmela Grüne, entrevistou o Desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, Ricardo Carvalho Fraga, eleito para o cargo de vice-presidente do TRT4ª, Gestão Biênio 2018/2019, sobre a Reforma Trabalhista – Lei 13.467/17. Confira a entrevista na íntegra.
Como interpretar a Reforma Trabalhista, Lei 13.467/2017, frente aos princípios basilares do Direito do Trabalho?
A finalidade do Direito do Trabalho é a proteção do trabalho, através da pessoa do trabalhador. Com esta finalidade se contribui para a própria organização da sociedade. Este é o nosso aprendizado, acentuado especialmente após a criação da Organização Internacional do Trabalho, em 1919, logo ao final da Primeira Guerra Mundial . A história da OIT é rica, http://www.ilo.org/brasilia/conheca-a-oit/hist%C3%B3ria/lang–pt/index.htm e saberemos comemorar os seus primeiros dois séculos, em 2019 .
De que maneira o magistrado deverá aplicar o princípio da isonomia e do acesso à justiça a partir dessa nova Legislação Trabalhista?
O acesso ao Poder Judiciário tem sido estudado em todo o Mundo Ocidental, desde Mauro Cappelletti, entre outros. No Brasil, os avanços também são consideráveis. A nova Lei, certamente, será aplicada com o cuidado de preservação destes aperfeiçoamentos. A leitura da peça inicial da Ação Direta de Inconstitucionalidade, número 5766, é interessante e gratificante, a todos que respeitam a relevância deste tema
Levando em consideração a utilização de novos mecanismos de comunicação por E-Mails, WhatsApp, videoconferência e outros aplicativos, de que maneira as tecnologias alteraram as relações de trabalho e qual o impacto no teletrabalho?
A nova Lei trata do autônomo, sem trazer um conceito. Trata, ainda, do trabalho intermitente, com um conceito novo, a merecer promessas de uma Medida Provisória ou mesmo Projeto de Lei, com maior detalhamento e regras. Uma terceira figura, é o teletrabalho, com conceituação própria e nova. As primeiras controvérsias que surgirão serão sobre o controle ou não de seu tempo de trabalho, inexistente na “letra fria” da lei, novo artigo 62, inciso III, da CLT. Os casos concretos nos demonstrarão as eventuais semelhanças e diferenças com o atual trabalhador apontado como externo.
Todo direito do trabalho poderá ser negociado individualmente, após a entrada em vigor dessa Legislação Trabalhista? Para que servirá a negociação coletiva?
A nova Lei tem os temas que podem e os que não podem ser negociados. A negociação coletiva deverá servir, como hoje, para o aperfeiçoamento das relações sociais, acima de tudo, com novos avanços de civilidade e maior detalhamento das leis, gerais, à realidade, específica, de cada setor.
Com a criação de Comissões de Empregados, como fica o papel dos Sindicatos para que as relações de trabalho tenham garantias mínimas?
A organização dos trabalhadores dentro das empresas deve ser visto como uma continuidade do convívio entre colegas. Serve para este melhor relacionamento entre colegas, com o próprio melhor relacionamento e, igualmente, com as melhorias do dia a dia das condições de trabalho. Para as questões mais relevantes, é imprescindível a contribuição das organizações sindicais. Tem sido assim, com variantes, em todo o Ocidente.
A nova Legislação Trabalhista restringe a atuação do Juiz? Haverá restrição na análise de normas coletivas, execução trabalhista, edição de orientações e súmulas?
O Código Civil trata dos negócios jurídicos do artigo 104 até o 184. É difícil de imaginar que o Poder Judiciário fique aquém dos aprendizados do direito romano, sistematizados neste tema, no Código de Napoleão e outros dos anos 1800.
Diante das mudanças, qual a importância da conciliação na Justiça do Trabalho?
Desde muito, já se falava na maior relevância do tema da conciliação. O maior acesso à Justiça, em nossos Países, levou as estruturas dos Judiciários ao seu limite. Também por este motivo, a conciliação é uma alternativa. Mais recentemente, outro motivo torna-se visível. O direito processual mais participativo facilita e propicia a solução conciliada. A professora Ada Pelegrine Grinover aponta outros fundamentos no tema, Revista da Escola Nacional da AMB, Brasilia: ano III, número 5, maio de 2008. p 22 a 27, disponível também em Revista ENM 5.pdf acessado em agosto de 2014.
Qual o significado dos indicadores de transcendências para interposição de Recurso de Revista e qual a sua vinculação com o acesso à justiça?
A falta de celeridade é um dos maiores males da Justiça, no Mundo e no Brasil. Entre nós, tivemos vários debates, desde a súmula vinculante. Em tempo mais recente, na Justiça do Trabalho, houve a breve experiência da Lei 13.015, com os IUJs, incidentes de uniformização da jurisprudência. No dizer de um dos principais colaboradores para a elaboração do Novo Código de Processo Civil, era uma lei mais aprimorada que o próprio NCPC, com o qual tinha semelhança, Agora, com a Lei 13.467, retorna-se à figura da “transcendência”, já prevista antes e ainda não implementada. Os novos tempos nos dirão como ela conviverá com os debates sobre celeridade.
Como dar efetividade a gratuidade do acesso à justiça, frente aos novos artigos da CLT que dificultam o acesso e punem o trabalhador?
Neste momento, antes da vigência da Lei 13,467, se conhece a ação direta de inconstitucionalidade número 5766, mais uma vez lembrada. Ali, estão questionados alguns dispositivos mais restritivos que o próprio NCPC. A parte, ainda que beneficiária do benefício de justiça gratuita, poderá ser penalizada. Por ora, no momento em que se apresentam estas respostas, inexiste liminar ou outra decisão do Ministro Luis Barroso. O Juiz do Trabalho Francisco Meton, um dos primeiros comentadores da nova lei, ponderou que o texto legal não pode ser expressão de “discriminação e ódio”.
Quais os desafios que a administração do TRT 4ª Região, biênio 2018/2019, espera enfrentar?
A realidade posterior à denominada reforma trabalhista possibilita e exige a dedicação de todos os profissionais. Soluções para novas controvérsias serão construídas. A conciliação é um primeiro tema. A história não tem momentos em que a “roda pare”. Ela sempre gira, em algum sentido, ainda que não se consiga perceber, na observação menos atenta.
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