Trabalhador coagido a pedir demissão por ser ex-presidiário consegue converter sua dispensa para imotivada e recebe indenização por danos morais

A 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT/RJ) deu provimento ao recurso ordinário de um auxiliar administrativo que procurou a Justiça do Trabalho para anular o seu pedido de demissão e convertê-lo em dispensa imotivada, além de solicitar indenização por danos morais. De acordo com o trabalhador, ele foi obrigado pela empresa Serttel LTDA a pedir demissão, depois de ter ficado preso por mais de três meses. O colegiado seguiu por unanimidade o voto do relator do acórdão, desembargador Gustavo Tadeu Alkmim, que considerou duvidoso imaginar que um trabalhador egresso do sistema penitenciário fosse espontaneamente abrir mão de sua fonte de sustento.

O auxiliar administrativo relatou na inicial que foi admitido pela empresa no dia 17 de maio de 2011, para exercer suas funções na Cia. de Engenharia de Tráfego (CET-Rio). Afirmou que, no dia 31 de janeiro de 2013, apresentou-se na 7ª Delegacia de Polícia para prestar depoimento em um inquérito criminal e que foi preso de forma inesperada. Declarou que foi solto, no dia 8 de maio de 2013, por determinação da Justiça e que, ao comparecer na sede da empresa para trabalhar, no dia 10 de maio de 2013, foi informado de que não poderia trabalhar e que deveria retornar no dia 13 de maio de 2013. Segundo o trabalhador, ao retornar à empresa, na data informada, foi impedido novamente de retomar suas atividades e foi informado de que deveria aguardar em casa as determinações do empregador. Ressaltou que aguardou durante semanas sem êxito o chamado da empresa e que, durante esse período, entrou em contato diversas vezes por telefone com o departamento pessoal, sem conseguir uma solução para seu problema.

Narrou que, depois de inúmeras tentativas, conseguiu reunir-se, no dia 2/8/2013, com um representante e uma advogada da empresa. O trabalhador considerou a reunião um verdadeiro “terror psicológico” e acrescentou que a conversa foi uma verdadeira “lavagem cerebral”. Relatou que os representantes da empresa alegaram que não estavam satisfeitos com seus serviços e que, pelo fato de ele ter sido preso, poderiam demiti-lo por justa causa e, além disso, alegariam abandono de emprego. Segundo o auxiliar administrativo, ele enfatizou durante a reunião que não poderia ser demitido sem justa causa porque era integrante da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA) e, portanto, portador de estabilidade provisória. Ainda de acordo com o trabalhador, os representantes da empresa argumentaram que se ele solicitasse sua demissão, haveria a possibilidade de receber algum valor. O auxiliar administrativo afirmou que pediu sua demissão no dia 2/8/2013, contra sua vontade, e que não recebeu o pagamento do período que ficou impedido de trabalhar, de 10/5/2013 a 1º/8/2013.

A filial da Serttel LTDA no Rio de Janeiro afirmou em sua contestação que a carta de demissão foi escrita de próprio punho pelo trabalhador e que o mesmo pediu demissão imotivada por sua livre e espontânea vontade. Acrescentou que o pedido de demissão espontâneo por parte do auxiliar administrativo não obsta o rompimento do pacto laboral, mesmo durante o período de estabilidade inerente a um membro de CIPA eleito pelos trabalhadores, cuja estabilidade acabaria somente em 30/4/2014. Negou que o trabalhador tenha sido impedido de trabalhar e que ficou sem receber os salários no período de 10/5/2013 a 1º/8/2013. Ressaltou que ele recebeu todos os valores correspondentes à sua rescisão contratual.

A sociedade de economia mista Companhia de Engenharia de Tráfego (CET-Rio) alegou em sua contestação que o trabalhador prestou serviços como empregado da Serttel em suas dependências até 17/1/2013 e que a ação foi ajuizada mais de dois anos depois do término da prestação de serviço, caracterizando a prescrição total dos pedidos. Afirmou que a decisão do STF em relação ao RE 760931/DF afasta a responsabilidade subsidiária dos entes da administração pública quanto aos encargos assumidos por terceiros, devendo ser comprovada a sua conduta culposa no que se refere à ausência de fiscalização dos contratos para caracterizar a subsidiariedade.

Na primeira instância, a solicitação do trabalhador de anular seu pedido de demissão e convertê-lo em dispensa imotivada foi indeferida. De acordo com o juízo de origem, a rescisão contratual, além de ter sido homologada pelo sindicato da categoria, não apresentava nenhum tipo de irregularidade que tenha sido comprovada pelo trabalhador. Também foi indeferido o pedido de indenização por danos morais, já que não ficou comprovada a coação da empresa para que o trabalhador pedisse demissão. A primeira instância deferiu o pagamento dos salários que não foram pagos no período em que o trabalhador esteve preso (de 31/1/2013 a 8/5/2013) e também no período em que ficou impedido de trabalhar (de 10/5/2013 a 1º/8/2013). De acordo com o juízo de origem, a empresa não comprovou as faltas do auxiliar administrativo e, portanto, qualquer desconto por motivo de falta é considerado indevido. Por último, a sentença condenou a Serttel e a CET-Rio (subsidiariamente) a pagarem R$ 6 mil ao auxiliar administrativo.

Na segunda instância, o relator do acórdão, desembargador Gustavo Tadeu Alkmim, manteve a decisão de condenar a empresa Serttel a pagar, ao auxiliar administrativo, os salários referentes ao período em que foi impedido de trabalhar (10/5/2013 a 1º/8/2013). De acordo com o magistrado, a ex-empregadora não comprovou as faltas do trabalhador e, portanto, não poderia realizar descontos em seus salários.

Com relação à solicitação do trabalhador de anular seu pedido de demissão, o relator destacou que – levando em consideração o princípio da continuidade da relação de emprego – o trabalhador não tem interesse na extinção do contrato de trabalho, exceto quando a empregadora comete faltas graves.

Ainda de acordo com o magistrado, é duvidoso imaginar que um trabalhador egresso do sistema penitenciário fosse espontaneamente abrir mão de sua fonte de sustento. De acordo com o magistrado, é muito mais provável que a empresa – diante da possibilidade de ter que lidar com um possível criminoso e ciente da ausência de amparo legal para imposição da justa causa – não tenha tido outra opção a não ser pressionar o trabalhador a pedir demissão.

O relator do acórdão deferiu a anulação do pedido de demissão e o reconhecimento da rescisão imotivada por iniciativa da empregadora, além do pagamento das verbas rescisórias decorrentes. Foi deferida ainda uma indenização relativa às verbas salariais devidas no período compreendido entre a rescisão do contrato de trabalho e o fim da estabilidade provisória como cipeiro (2/8/2013 a 30/4/2014). Por último, o magistrado manteve a condenação subsidiária da CET-Rio, por considerar que cabe à administração pública provar que a fiscalização do contrato ocorreu de fato.

Por último, o magistrado deferiu R$ 5 mil de indenização por danos morais em função dos constrangimentos e humilhações aos quais o trabalhador foi submetido por ter sido impedido de retornar ao trabalho sem qualquer satisfação ou resolução da situação.

Nas decisões proferidas pela Justiça do Trabalho, são admissíveis os recursos enumerados no art. 893 da CLT.

O número do processo foi omitido para preservar a intimidade do trabalhador.

Fonte: TRT1

 

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