Relações interpessoais: poliamor ou poliafetividade

Edison Tetsuzo Namba

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Está muito em voga comentar-se sobre o poliamor ou poliafetividade. Diz-se que da realidade emergem novas formas de convivência. Entretanto, algumas observações devem ser feitas antes de se aceitar essa nova concepção de carinho.

Na Constituição Federal promulgada em 5 de outubro de 1988, no Capítulo VIII, “Da família, da criança, do adolescente, do jovem e do idoso”, em seu art. 226, “caput”, pontifica-se:

  • “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”.

Dessa forma, a entidade familiar é protegida, a qual pode emergir no mundo dos fatos pelo casamento ou pela união estável (art. 226, parágrafos 2º e 3º da Carta Magna).

Foto: Pixabay

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Em razão disso, o poliamor, ou seja, possibilidade de coexistirem duas ou mais relações afetivas paralelas, em que os seus partícipes conhecem e aceitam um aos outros, em uma relação aberta, podem prevalecer no namoro, no “ficar com outrem” ou, quem sabe, no “noivado”, pois bastam sentimentos recíprocos e vontade de levar adiante cada uma das relações lineares ou múltiplas para não haver qualquer infringência em nível da Lei Teto e infraconstitucional.

Toda a arquitetura legal para o matrimônio e a união estável não permite o poliamor.

É impeditivo e dá causa a nulidade, art. 1548, inciso II, do Código Civil, o casamento de pessoas casadas (art. 1521, inciso VI, do Código Civil), em outras palavras, alguém que contrai o matrimônio não pode ter, ao mesmo tempo, outro negócio jurídico como aquele, não há poliafetividade que legitime a situação.

Na união estável, igualmente, existe restrição para a sua formação, aplicando-se os impedimentos do art. 1521 do Código Civil, menos quando, no caso do já mencionado art. 1521, inciso VI, a pessoa casada esteja separada de fato ou judicialmente. Ou seja, se alguém está casado, não pode contrair união estável, a menos que esteja separado de fato ou judicialmente, não pode formar uma relação com base no poliamor.

Ademais, não constitui união estável e, sim, concubinato, relação não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar (art. 1727 do Código Civil).

Existe lógica no raciocínio, porquanto deva haver reconhecimento na união estável, deve-se, também, facilitar sua conversão no casamento, não se pode realizar isso se há algum impedimento matrimonial.

Lembre-se, ainda, que quem casa ou contrai união estável rege-se por regras de ordem pública, sendo assim, na primeira hipótese os cônjuges devem fidelidade um ao outro e respeito/consideração recíprocos (art. 1566, incisos I e V, do Código Civil), na segunda, devem guardar os conviventes lealdade e respeito um em relação ao outro (art. 1724 do Código Civil). Esses deveres são incompatíveis com suas abdicações ou aceitação de novo relacionamento paralelo.

Foto: Wikimedia Commons

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Na origem, tanto um como o outro são monogâmicos, não poligâmicos. Cada relacionamento, quando há o rompimento do casal, causa traumas intensos, não raras vezes na seara legal. Não é aconselhável, pois, estender todo o arcabouço legislativo de uma relação dual para outra poliafetiva, geradora de mais conflitos.

Se, num futuro próximo ou distante, grande parte da sociedade brasileira e/ou mundial, desejar o poliamor, deverá, em estatuto próprio, com amplo debate no Congresso Nacional, discutir a maneira de disciplinar os novos relacionamentos e seus limites.

Conclusão

No poliamor existe mais de uma pessoa que se relaciona com a outra. Existe cumplicidade nessa convivência e aceitação.

Não é conveniente, pura e simplesmente, estender os regramentos sobre o casamento e a união estável para a poliafetividade, porque existem contradições e dificuldade de adaptação da lei.

Melhor é criar um microssistema, disciplinando a formação, desenvolvimento e limites dessa nova forma de expressão da afetividade humana.

Edison Tetsuzo Namba
Edison Tetsuzo Namba é  Articulista do Estado de Direito. 50. Juiz de Direito em São Paulo. Mestre e Doutor em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Docente Formador da Escola Paulista da Magistratura (EPM). Docente Assistente da Área Criminal do Curso de Inicial Funcional da Escola Paulista da Magistratura – EPM (Concursos 177º, 178º, 179º e 180º). Docente Civil da Academia de Polícia Militar do Barro Branco (APMBB). Docente Civil da Escola Superior de Sargentos. Representante do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo no Comitê Regional Interinstitucional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas – São Paulo. Membro do Instituto de Direito de Família. Autor do livro Manual de bioética e biodireito, São Paulo: Atlas, 2ª ed. 2015.

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