Coluna Descortinando o Direito Empresarial
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Introdução
Definir o contrato internacional é uma tarefa árdua que envolve, inicialmente, dificuldades na reunião de suas características, pois não há, nas regras jurídicas e nas decisões jurisprudenciais, uma única e uniforme definição de contrato internacional.
Desta forma é necessário apontar as formas que a doutrina, a jurisprudência e as regras jurídicas estabelecem para conceitua-lo, para que ao final se consiga ter uma compreensão da amplitude do termo “contrato internacional”.
Os critérios jurisprudenciais de internacionalidade do contrato
A caracterização do contrato como internacional segundo a jurisprudência francesa ocorre quando “houver um fluxo e refluxo de bens ou mercadorias de um país para outro e, que este duplo movimento produza consequências recíprocas, quer num campo quer em outro”, ou seja, ocorrendo transferência de dinheiro entre Estados haveria contrato internacional. Seria, também, internacional o contrato que “põe em jogo interesses do comércio internacional” (Aquino, 2012, p. 752).
Uma definição bastante rigorosa de contrato internacional decorrente do acórdão da C. Cass., de 07.10.1980, no qual as partes tinham domicílio no mesmo Estado, na época de conclusão do contrato, embora este tenha sido executado num outro Estado. Este contrato não foi considerado como internacional, porque as partes submeteram o pacto à lei vigente no seu domicílio, não obstante conter referências à lei do país da execução. Este acórdão abandonou a preferência tradicional da jurisprudência do critério econômico, tomando como fulcro a lei material do foro, quando prima facie, pelo menos, era sustentável a aplicação de uma lei estrangeira para reger o contrato.
A jurisprudência venezuelana adotou uma posição ampla, afirmando que de acordo com a sua ordem jurídica o acordo das partes em submeter a uma lei estrangeira pode caracterizar o contrato como internacional (BONELL, 2001, p. 197).
Os critérios doutrinários de internacionalidade do contrato
Parte da doutrina portuguesa adota o critério econômico para caracterizar o contrato como internacional. E nesse espectro deve-se observa a posição de Collaço (1954, p. 28) que adota esse, afirmando que o contrato será sempre internacional quando ocorrer uma “(…) transferência de valores de país para país”, observando em particular o caso da compra e venda.
Já Pinheiro (1998, p. 379-381) afirma que este critério da transferência de valores não pode servir de base para caracterizar o contrato como internacional, pois no contrato de empreendimento comum ocorrem, normalmente, diversas transferências de valores e bens, entretanto estas transferências podem ser insignificantes ou mesmo inexistentes num contrato celebrado entre partes que desenvolvam as suas atividades em países diferentes e assim mesmo serem considerados internacionais bem como, ministra que em um contrato de joint venture entre empresas situadas num mesmo país pode ser considerado internacional desde que haja a transferência de valores. Afirmando que por si só o critério de fluxo e refluxo de valores não é suficiente para se classificar o contrato como internacional. Assim, para esse autor o contrato será internacional quando estiver em jogo interesses do comércio internacional.
Jacquet (1983, p. 255-256) entende que o contrato tem caráter internacional mesmo quando a relação entre as partes tenha sido submetida à lei do Estado da parte contratante, pois o pacto continha disposições referentes à lei do Estado onde o contrato foi cumprido.
Strenger define o contrato internacional de comércio como sendo
todas as manifestações bilaterais ou plurilaterais da vontade das partes, objetivando relações patrimoniais ou de serviços, cujos elementos sejam vinculantes há dois ou mais sistemas jurídicos extraterritoriais, pela força do domicílio, nacionalidade, sede principal dos negócios, lugar do contrato, lugar da execução, ou qualquer circunstância que exprima um liame indicativo de Direito aplicável (1986, p. 37).
Batista (1994, p. 56) disciplina que “há contratos celebrados entre pessoas de diferentes países que implicam o tráfego de bens e valores entre esses países e que, assim, podem ser chamados de internacionais, mas há outros, todavia, cujo caráter internacional é falso”.
Aquino (2012, p. 754) afirma que “para caracterizar o contrato como internacional é necessária à existência de qualquer elemento de estraneidade; assim, bastará à presença de um elemento estranho, como por ex., a nacionalidade das partes, o domicílio dos contratantes ou a localização do objeto”.
Assim, o contrato internacional
é aquele que os elementos significativos ou pertinentes não estão localizados no mesmo sistema jurídico, ou seja, o contrato internacional é o acordo vinculativo, assente sobre duas ou mais declarações de vontade (oferta ou proposta de um lado e de outro, a aceitação) contrapostas, mas perfeitamente harmonizáveis entre si, que visam estabelecer uma regulamentação unitária de interesses, desde que não alteradas as circunstâncias em que se deu a vinculação e que os elementos significativos ou pertinentes não estão localizados no mesmo sistema jurídico (Aquino, 2012, p. 763).
Em suma, o elemento caracterizador da internacionalidade do contrato deve ser revestido de relevância ao caso concreto.
Os critérios das convenções internacionais de internacionalidade do contrato
A Convenção das Nações Unidas sobre os Contratos de Compra e Venda Internacional de Mercadorias não define contrato internacional, mas para a sua aplicação, o contrato deve ser considerado como internacional, e para que isso aconteça as partes devem comprovar na altura da contratação que os seus estabelecimentos se localizam em Estados diferentes (Brasil em Ratificação, adesão em 03/04/2013 da Convenção das Nações Unidas sobre Contratos de Compra e Venda Internacional de Mercadorias – CISG, na sigla em inglês – que entrou em vigor 01/04/2014).
Aquino (2012, p. 756) afirma que
para a Convenção, no que tange à definição da internacionalidade do contrato de compra e venda, prevalece uma visão estrutural, que se atam aos dados objetivos e que não se vincula aos elementos subjetivos, ou seja, a posição relativa das partes (nacionalidade das partes, idioma da redação, moeda etc.), bem como aos de índole material ou do próprio contrato (a sua natureza civil ou comercial).
Assim, para que a Convenção seja aplicada as partes devem ter o conhecimento à época da celebração do contrato que ambas se encontravam com estabelecimento em países diferentes.
A Convenção de Roma de 1980 sobre a Lei Aplicável às Obrigações Contratuais disciplina em seu art. 1.º, n. 1, que o contrato será considerado internacional sempre que houver um conflito de leis.
Aquino (2012, p. 758) dispõe que
a implicação desta expressão desencadeia a internacionalidade de um determinado contrato, que se reporta a situações que tenham elementos de conexão com mais de uma ordem jurídica, ou seja, a Convenção traz em seu bojo a potencialidade de ser enquadrada em mais de um sistema jurídico. Este elemento de conexão é a ligação de um fato a um determinado sistema jurídico ou sistemas jurídicos.
Desta forma, para a caracterização da internacionalidade do contrato perante a Convenção de Roma reside no fato da existência de um elemento de estraneidade elegido pelas partes há época do contrato, imperando assim, a liberdade de escolha das partes.
A Convenção Interamericana sobre o Direito Aplicável aos Contratos Internacionais (CIDIP-V) dispõe seu art. 1, dispõe que o “contrato é internacional quando as partes no mesmo tiverem sua residência habitual ou estabelecimento sediado em diferentes Estados-Partes ou quando o contrato tiver vinculação objetiva com mais de um Estado-Parte”.
Assim, diante da complexidade de aspectos adotados para caracterização do contrato como internacional é necessário a análise casuística da relação jurídica para que se possa classifica-la como internacional ou não.
Os critérios de internacionalidade do contrato das ordens legais nacionais
A Lei austríaca de direito internacional privado, de 1978 define que a aplicação de certas leis nacionais sobre o direito internacional privado decorre das situações que tenham conexão ou laços com o estrangeiro (art. 1º).
A Lei de Introdução do Código Civil alemão (de 1986) demonstra que as situações que tenham conexão com o direito de outro Estado será internacional (art. 3º).
O Código Civil (de 1991) da Luisiana disciplina que a internacionalidade será caracterizada sempre que existir relação jurídica que apresente laços com vários Estados (art. 14).
A Lei Federal suíça disciplina que será internacional a relação jurídica que envolver matéria internacional ou em situação internacional (art. 1º).
O Código Civil de Quebec propõe que será internacional a relação jurídica que envolver mais de uma ordem jurídica e que será aplicada a lei que tiver conexão mais estreita com o contrato.
O Direito Brasileiro dispõe apenas que “para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem”, contudo se a obrigação se destinar “a ser executada no Brasil e dependendo de forma essencial, será esta observada, admitidas as peculiaridades da lei estrangeira quanto aos requisitos extrínsecos do ato”. A “obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente” (art. 9º da Lei de Introdução as Normas Brasileiras – LINB). Assim, não traz regra de conceituação dos contratos, apenas disciplina a lei aplicável ao contrato internacional.
O Brasil ratificou a Convenção das Nações Unidas sobre Contratos de Compra e Venda Internacional de Mercadorias. Não há na Convenção conceito de contrato internacional, mas a ideia de sua aplicação a partir da existência de domicílios dos contratantes situados em Países diferentes.
No âmbito do MERCOSUL há o protocolo de Buenos Aires sobre a jurisdição internacional em matéria contratual que prevê a sua aplicação se os contratantes tirem sede social ou domicilio em diferentes Estados-Partes do Tratado de Assunção ou, ainda, se uma das partes tiver domicílio no Estado-Parte e que haja cláusula de foro de eleição indicando a jurisdição em favor de um Juiz de um Estado-Parte.
Referências
AQUINO, Leonardo Gomes de. A internacionalidade do contrato. Doutrinas essenciais de direito internacional. Luiz Otavio Baptista e Valério de Oliveira Mazzuoli (coord). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 737-767, vol. 7.
BATISTA, Luiz Olavo. Dos Contratos Internacionais: Uma Visão Teórica e Prática. São Paulo: Saraiva, 1994.
COLLAÇO, Isabel Magalhães. Da compra e venda em direito internacional privado: aspectos fundamentais. Lisboa: AAFDL, 1954.
JACQUET, Jean-Michel. Principe d´autonomie et contrats internationaux. 2ª. ed. Paris: Econômica, 1983.
PINHEIRO, Luís de Lima. Joint venture: contrato de empreendimento comum em direito internacional privado. Lisboa: Cosmos, 1998.
STRENGER, Irineu. Contratos Internacionais do Comércio. 2ª. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1986.
Leonardo Gomes de Aquino é Articulista do Estado de Direito, responsável pela Coluna “Descortinando o Direito Empresarial” – Mestre em Direito. Pós-Graduado em Direito Empresarial. Pós-graduado em Ciências Jurídico Empresariais. Pós-graduado em Ciências Jurídico Processuais. Especialização em Docência do Ensino Superior. Professor Universitário. Autor do Livro “Direito Empresarial: teoria da Empresa e Direito Societário”.
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