Aury Lopes Junior é membro da comissão, instituída pelo Conselho Nacional de Justiça, que vai estudar, analisar e emitir nota técnica sobre o Novo Código de Processo Penal Brasileiro. Nesta terça feira (17) o jurista gaúcho comentou sobre a Lei 13.491/2017 em suas redes sociais. Confira a publicação na íntegra.
Além de retirar do Júri o julgamento dos crimes dolosos contra a vida de civil, praticados por militares das forças armadas em situações de verdadeiro “policiamento urbano” (situações previstas parágrafo segundo, incisos I,II e III do art. 9 do CPM), há uma outra modificação muito preocupante e que não está sendo repercutida: a nova redação do inciso II.
Antes o texto era:II. os crimes previstos neste Código, embora também o sejam com igual definição na lei penal comum, quando praticados:
Com essa redação, o legislador determinava que a justiça militar julgaria os militares (nas situações de atividade ou interesse militar definidos nas alíneas “a” a “f”) pela prática dos crimes previstos no CPM de forma exclusiva ou também na “lei penal comum”. Com isso, estavam afastados da competência da justiça militar os crimes previstos em leis penais especiais e, portanto, não contempladas no CPM. Eram os clássicos exemplos dos crimes de abuso de autoridade, tortura, associação para o tráfico, etc. todos crimes não previstos no CPM, mas apenas em leis penais extravagantes e que eram julgados na justiça comum. Se houvesse conexão entre um crime militar e outro crime previsto em lei especial, haveria uma cisão: o crime militar seria julgado pela justiça castrense e o crime não previsto no CPM seria julgado na justiça comum (estadual ou federal conforme o caso).
Agora, com a nova redação do inciso II, a situação mostrasse completamente diferente:
II – os crimes previstos neste Código e os previstos na legislação penal, quando praticados:Significa dizer que a Justiça Militar agora poderá julgar os crimes previstos no CPM e na legislação penal (comum e especial/extravagante). Dessa forma, há uma ampliação significativa da competência das justiças militares estaduais e federais, que passarão a julgar crimes não previstos no CPM como abuso de autoridade, tortura, organização criminosa, etc.
Neste ponto, houve um gravíssimo retrocesso. Não só pela falta de estrutura e condições de julgar crimes completamente alheios às atividades militares, mas também pelo risco de efetivo corporativismo, especialmente em relação a crimes como abuso de autoridade e tortura, onde em geral existe uma percepção e valoração por parte dos militares que é completamente distinta da população civil acerca da gravidade e tipificação dessas condutas.