O projeto dos “cemitérios universitários”

Laura Berquó

Laura Berquó

Mexendo no meu Instagram, encontrei postagens que fiz durante a pandemia. Naquele período, indignada com a possibilidade de sermos obrigados a retomar as aulas presenciais sem que todos — docentes e discentes — estivessem imunizados com ao menos a primeira dose da vacina contra o coronavírus (COVID-19), escrevi que o projeto do MEC parecia ser a criação de “cemitérios universitários”. Era um protesto contra uma possível necropolítica educacional.

Se houvesse a imposição, defendi que seria caso de praticarmos desobediência civil e mantermos nossas aulas virtuais. Também me recordo das chamadas “carreatas da morte”, no início da pandemia, quando em várias cidades pessoas protestavam contra o fechamento do comércio, mesmo diante da necessidade de evitar aglomerações.

A pandemia passou, mas ainda vivemos os reflexos não apenas da COVID-19, mas também do golpe de 2016 e da ascensão da extrema-direita no Brasil. Parece que, quando é ruim, vem em pacote.

Mesmo assim, é impressionante ver como tantas pessoas se compadecem e se solidarizam com políticos que ririam de sua falta de ar; com políticos que preferem prejudicar a economia com o tarifaço e que esquecem dos comerciantes e consumidores; e que, ainda assim, não hesitam em chorar publicamente, alegando problemas de saúde.

Eu nunca esqueço do projeto dos “cemitérios universitários”, que representava, para mim, o auge da maldade. Também me surpreende como parcelas da classe média baixa e da classe média tradicional vão às ruas pedir anistia e falar em Direitos Humanos, mas jamais se mobilizaram para reivindicar a liberdade de quem comete furto famélico. Sempre vi, de forma muito nítida, a face da classe média — predominantemente branca — que apoiava aquele governo insano.

Felizmente, os “cemitérios universitários” não se concretizaram como política oficial. Mas, ao ouvir o discurso de jovens que idolatram governos necrófilos e genocidas — muitos dos quais sequer teriam acesso ao ensino superior se não fosse o REUNI, que expandiu campi para o interior — percebo a inversão de valores. A vida, ou ao menos a sua qualidade, deixou de ser prioridade para boa parte dessa nova geração, marcada por um conservadorismo extremo e crescente.


Sobre a autora
Advogada e Professora da UFPB. Mestre em Ciências Jurídicas pela UFPB.
Ex-Conselheira Estadual de Direitos Humanos (Paraíba).
Membro do IAB Nacional e da ABMCJ-PB.
Articulista do Jornal Estado de Direito.

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