Renata Malta Vilas-Bôas, articulista do Jornal Estado de Direito
Nas novas composições de família tem, a cada dia, ficado mais frequente a presença dos animais domésticos. Gatinhos e Cachorrinhos invadiram os lares brasileiros e vieram para ficar.
E com essa “invasão” surgiram os gastos com os cuidados necessários como veterinário e vacinas, e aqueles gastos com aquisição de roupas e acessórios supérfluos.
Assim, se antes os animais domésticos tinham “funções” dentro da casa (gato era para caçar os ratos e o cachorro para afugentar os ladrões), agora essas funções ficaram em segundo plano, sendo que a afetividade que surgiu passou a ser o laço que mantes esses animais junto aos seus tutores.
No linguajar leigo fala-se em tutor não se usando mais a expressão “dono”.
E essa evolução decorre de como esses animais passaram a serem considerados ao longo dos anos.
Os tribunais têm-se debruçado sobre tal discussão, enquanto alguns julgados continuam a tratar os animais como coisa outros julgados já os insere em uma nova categoria.
Em recente julgado do TJDFT o entendimento da 6ª Turma foi de que o ex-cônjuge não está obrigado a dividir os gastos com o cachorro que não convive, vejamos:
Ex-cônjuge não é obrigado a dividir gastos de cachorro com o qual não convive
Em decisão unânime, a 6ª Turma Cível do TJDFT negou pedido da autora para que o ex-marido seja obrigado a dividir custos dos cuidados com cachorro que era de propriedade de ambos enquanto casados. Diante da comprovada desarmonia entre os dois e a consequente impossibilidade de convivência do réu com o animal, o colegiado concluiu que o ex-cônjuge não pode ser compelido a cumprir a obrigação.
No processo, a autora afirma que possui diversas despesas com o pet, de 11 anos de idade, cego e portador de leishmaniose. Diz não haver dúvidas de que, durante o casamento, o casal não media esforços para propiciar o melhor tratamento ao animal, comportamento que deveria continuar após o término da relação. Dessa forma, requer que seja declarada a copropriedade do bicho de estimação e que o réu passe a arcar com metade dos gastos custeados exclusivamente por ela, entre os meses de setembro de 2019 a maio de 2020. Além disso, solicita que o ex-cônjuge seja condenado a pagar, de forma continuada, um valor mensal equivalente à metade da média dos gastos mensais com os tratamentos veterinários, higiene e alimentação do animal.
O réu narra que o casal se separou após 16 anos de relacionamento e, desde então, mantiveram uma relação amistosa, até março de 2020, quando foi assinado o acordo de divórcio. A autora teria exigido que fosse pago R$ 100 mil pela propriedade exclusiva do cachorro e suas despesas. O réu informa que até a homologação do acordo concordou em pagar as despesas do pet e, logo em seguida, arcaria somente com o tratamento da leishmaniose. Conta que, nesse período, teria começado um novo relacionamento amoroso e a autora, então, passou a ajuizar demandas contra ele, no intuito de difamá-lo e prejudicar sua convivência com o filho. Além disso, reforça que ela se nega a permitir o acesso ao cachorro. Por fim, questiona os custos mensais com o animal e alega suposta elevação nos valores sem justificativa. Diante dos fatos, renuncia a seu direito de condômino, devendo ser isento do pagamento das dívidas, com base no art. 1.316 do Código Civil.
Em resposta, a autora destacou que o pagamento mensal vitalício decorreria da necessidade de conservação do bem – um cachorro idoso e portador de leishmaniose, motivo pelo qual não se trata de matéria relativa à Direito de Família ou contrato de constituição de renda, mas sim de concorrer com as despesas obrigatórias para a conservação do bem, nos limites de sua parte. Informa que comprovou o valor médio dos gastos com o cachorro e ressaltou que o relacionamento conturbado dificultaria a prestação de contas ou divisão de custos mensais, por isso solicitou uma espécie de pensão pré-estipulada. Por último, garante que não se opõe que o animal fique com o apelante nos dias e horários de convivência do pai com o filho.
Ao analisar o caso, o desembargador relator observou que “Atualmente, os animais são juridicamente classificados como bens móveis semoventes, posto que suscetíveis de se locomoverem por força própria sem alteração de suas características individuais (CC, art. 82), recebendo também valor econômico, tanto que são suscetíveis ao comércio”. Dessa forma, como bem móvel semovente advindo no curso do casamento, a declaração de copropriedade do pet deve ser apresentada em procedimento de sobrepartilha, junto ao juízo de família, “o que contudo não impede que seja examinada em caráter incidental na esfera cível, unicamente, para fundamentar eventual acolhimento ou não das pretensões indenizatórias dela alegadamente decorrentes”, continuou o magistrado.
O julgador destacou que a autora pretende o rateio do custeio do cachorro, enquanto o réu não deseja manter o compartilhamento da convivência com o pet, pois não seria possível gozar de sua companhia em razão dos litígios judiciais após o divórcio, inclusive com requerimento de concessão de medida protetiva de urgência, o que aumentou sobremaneira os conflitos entre eles. Com isso, o recorrente defende que o animal e seu custeio fiquem apenas sob responsabilidade de um deles. No entendimento da Turma, embora a propriedade do animal ainda não tenha sido regulamentada pela partilha de bens, diante inviabilidade do compartilhamento do convívio, incumbe àquele que assumiu sua posse exclusiva após o divórcio a integralidade das despesas com seu custei.
Os desembargadores esclareceram que, apesar do acordo de divórcio em que o ambos concordaram que o réu assumiria os custos com o tratamento do animal, com gastos semestrais estimados em torno de R$ 1.200, no acordo final, o MPDFT excluiu a cláusula referente ao cão do tópico de alimentos devidos pelo genitor ao filho, tendo em vista que a obrigação não teria caráter alimentar. Assim, as partes optaram por excluir do acordo toda e qualquer estipulação a respeito do pet. Com isso, não há que se falar em pagamento de despesas já custeadas pela autora, tampouco das futuras.
Por sua vez o E. Superior Tribunal de Justiça está analisando se o ex-companheiro tem que arcar com ajuda financeira para a subsistência dos animais, o processo foi retirado de pauta e não temos previsão de quando o julgamento será retomado.
De toda sorte, a expressão pensão alimentícia deve ser trocada por custeio das despesas do animal de estimação, pois a previsão da pensão alimentícia possui outro fundamento jurídico.
*Renata Malta Vilas-Bôas é Articulista do Estado de Direito, advogada devidamente inscrita na OAB/DF no. 11.695. Sócia-fundadora do escritório de advocacia Vilas-Bôas & Spencer Bruno Advocacia e Assessoria Jurídica, Professora universitária. Professora na ESA OAB/DF; Mestre em Direito pela UPFE, Conselheira Consultiva da ALACH – Academia Latino-Americana de Ciências Humanas; Acadêmica Imortal da ALACH – Academia Latino-Americana de Ciências Humanas; Integrante da Rete Internazionale di Eccelenza Legale. Secretária-Geral da Rede Internacional de Excelência Jurídica – Seção Rio de Janeiro – RJ; Colaboradora da Rádio Justiça; Ex-presidente da Comissão de Direito das Famílias da Associação Brasileira de Advogados – ABA; Presidente da Comissão Acadêmica do IBDFAM/DF – Instituto Brasileiro de Direito das Familias – seção Distrito Federal; Autora de diversas obras jurídicas. |
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