Renata Malta Vilas-Bôas, articulista do Jornal Estado de Direito
Quando estamos tratando de prisão de uma pessoa que é advogado o Estatuto da OAB – Lei no. 8.906/94 traz como previsão que o advogado não pode ser recolhido preso antes do trânsito e julgado da sentença penal condenatória, a não ser que seja em sala de estado-maior.
Conforme o Supremo Tribunal Federal, a Sala de estado-maior é uma sala e não pode ser confundida com cela ou cadeia, devera estar inserida em uma instituição militar. E essa previsão é apenas no caso de prisão cautelar. Quando ocorrer o trânsito em julgado da sentença penal condenatória não existe mais essa prerrogativa.
No caso específico analisado pelo Superior Tribunal de Justiça analisou-se se no caso de prisão de um advogado decorrente do não pagamento da pensão alimentícia também teria essa mesma prerrogativa.
E o resultado foi que a Segunda Seção entendeu que tal prerrogativa não pode ser aplicada à prisão civil do devedor de alimentos, devendo assim, ser garantido a ele a previsão inserida no Código de Processo Civil que prevê que o devedor de alimentos deverá ser assegurado a ele um local afastado dos presos comuns.
Lembrando que a prisão civil decorre não de uma ideia de punição mas sim de uma forma de que o devedor de alimentos tenha de se conscientizar para pagar a pensão alimentícia devida.
Vejamos a notícia veiculada.
Segunda Seção define que advogado devedor de pensão alimentícia não tem direito à prisão em sala de estado-maior
A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, entendeu que a prerrogativa da sala de estado-maior não pode incidir na prisão civil do advogado que for devedor de alimentos, mas deve ser garantido a ele um local apropriado, devidamente segregado dos presos comuns, nos termos do artigo 528, parágrafo 4º, do Código de Processo Civil.
Com a decisão, que pacificou divergências existentes entre as turmas de direito privado do STJ, o colegiado denegou a ordem de habeas corpus requerida por um advogado, o qual, atuando em causa própria, alegou que sua prisão civil por falta de pagamento de pensão alimentícia deveria ocorrer em sala de estado-maior ou, na falta desta, em regime domiciliar.
O juízo de primeiro grau determinou a prisão do advogado por dois meses devido ao não pagamento das pensões, especificando na ordem que ele deveria ser mantido separado dos presos comuns – decisão mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).
Legislador constituinte fez opção política pelo direito à subsistência
O relator do habeas corpus, ministro Luis Felipe Salomão, apontou que os membros da Segunda Seção do STJ vinham tendo posições diferentes em relação à possibilidade de abrandamento no cumprimento da prisão civil no caso de o executado ser profissional da advocacia.
Enquanto a maioria da Quarta Turma entendia que o benefício da sala de estado-maior deveria ser estendido à situação do advogado devedor de alimentos, a Terceira Turma negava a incidência dessa prerrogativa. Diante da divergência, o julgamento do caso foi afetado para a seção de direito privado.
Segundo o ministro Salomão, na ponderação entre direitos fundamentais – a liberdade e a dignidade do advogado devedor de obrigação alimentícia versus a tutela jurisdicional efetiva, a sobrevivência e a dignidade do credor –, o legislador constituinte fez a opção política de dar prevalência ao direito do alimentando, sem nenhuma ressalva.
“A autorização da prisão civil do devedor de alimentos é endereçada a assegurar o mínimo existencial ao credor. Admitir o seu cumprimento em sala de estado-maior ou de forma domiciliar, em nome da prerrogativa do profissional advogado, redundaria, no limite, em solapar todo o arcabouço erigido para preservar a dignidade humana do credor de alimentos”, declarou o relator.
Prerrogativa prevista no Estatuto da OAB é voltada para a prisão penal
O relator ressaltou, ainda, que a prerrogativa estipulada no artigo 7º, inciso V, do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) é voltada para a hipótese de prisão penal – precisamente, para as prisões cautelares determinadas antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
O ministro explicou que a prisão civil não constitui sanção penal, portanto, não ostenta a índole punitiva ou retributiva; em vez disso, é uma medida coercitiva, imposta com a finalidade de compelir o devedor a cumprir a obrigação de manter o sustento dos alimentandos, de modo que são inaplicáveis as normas que regulam o direito penal e a execução criminal.
“A aplicação dos regramentos da execução penal, como forma de abrandar a prisão civil, acabará por desvirtuar a técnica executiva e enfraquecer a política pública estatal, afetando a sua coercibilidade, justamente o móvel que induz a conduta do devedor alimentar”, concluiu o relator ao denegar a ordem de habeas corpus.
*Renata Malta Vilas-Bôas é Articulista do Estado de Direito, advogada devidamente inscrita na OAB/DF no. 11.695. Sócia-fundadora do escritório de advocacia Vilas-Bôas & Spencer Bruno Advocacia e Assessoria Jurídica, Professora universitária. Professora na ESA OAB/DF; Mestre em Direito pela UPFE, Conselheira Consultiva da ALACH – Academia Latino-Americana de Ciências Humanas; Acadêmica Imortal da ALACH – Academia Latino-Americana de Ciências Humanas; Integrante da Rete Internazionale di Eccelenza Legale. Secretária-Geral da Rede Internacional de Excelência Jurídica – Seção Rio de Janeiro – RJ; Colaboradora da Rádio Justiça; Ex-presidente da Comissão de Direito das Famílias da Associação Brasileira de Advogados – ABA; Presidente da Comissão Acadêmica do IBDFAM/DF – Instituto Brasileiro de Direito das Familias – seção Distrito Federal; Autora de diversas obras jurídicas. |
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