Alienação fiduciária em garantia
Em “tempos de crise” são muitos os relatos de pessoas que não conseguem arcar com as obrigações assumidas para a aquisição de um veículo automotor (o “melhor amigo” ou o sonho de muitos dos brasileiros). Momento em que soa oportuno – porque não dizer imperioso – alguns esclarecimentos sobre a famosa “alienação fiduciária em garantia” e os poderes que a legislação brasileira confere ao credor fiduciário.
A alienação fiduciária em garantia é uma modalidade de relação contratual comumente utilizada no Brasil para a aquisição de veículos automotores (quando o interessado em adquirir um “carro”, por exemplo, não possui a integralidade do valor necessário). O consumidor, depois de eleito o veículo que deseja adquirir, tem analisado seu crédito e – se aprovado – pode contratar um financiamento com uma instituição financeira (normalmente a que possui relacionamento com a revenda de automóveis, mas que também pode ser outra de eleição do comprador). Na modalidade de contrato ora observada, o comprador adquire a posse do veículo, já a propriedade será atribuída à instituição financeira – o “carro” serve de garantia ao valor financiado, até que efetivamente pagas todas as parcelas contratadas.
Nas situações mais “confortáveis”, o comprador que realiza o pagamento de todo o saldo devedor alcança a quitação do contrato e por sua vez terá direito a que a instituição financeira lhe atribua a propriedade sobre o bem móvel. Na prática, quando pagas todas as prestações: o banco deve comunicar ao DETRAN de que não mais existe razão para constar uma restrição no documento do veículo. Ufa, o comprador venceu o desafio e tornou-se proprietário!!! Eba, o Banco recebeu todos os valores contratados!!!
Por outro lado, cada vez maior o número de pessoas que acabam por enquadrar-se em situações “desconfortáveis”, caracterizadas especialmente pela impossibilidade (pelos mais diversos motivos) de arcar com as obrigações mensais decorrentes do financiamento de seu automóvel. Espaço para o surgimento de muitos mitos… Por vezes se ouve uma pessoa aconselhando o amigo enrascado: “a cada 3 ou 4 meses tu paga uma parcela que está atrasada, assim o banco não toma teu carro”; ou algo como: “o banco que se estresse, que entre na justiça e leve anos tentando cobrar o atrasado.”
Poderes conferidos aos Bancos
Aqui reside o perigo advindo da desinformação…. Por certo que neste pequeno texto não existe a pretensão de esmiuçar-se a alienação fiduciária (o que demandaria maior atenção, dedicação e espaço), mas sim ofertar algumas breves
informações àqueles que pretendem contratar, que contratam e, em especial, aqueles que adentram na dita “situação desconfortável” (de inadimplência). Assim, as próximas linhas serão dedicadas a alguns rápidos apontamentos sobre os poderes conferidos aos Bancos como meio de alcançarem os valores que lhe são devidos.
Como primeiro aspecto digno de referência tem-se que a Lei no. 13.043/14 (que deu nova redação ao Decreto-lei 911/69) alterou a caracterização da mora do devedor, na medida em que dispensou a notificação formal – fazendo com que uma mera correspondência com aviso de recebimento (AR) produza os mesmos efeitos para fins de levar-se a questão ao Poder Judiciário. Assim, a norma “simplificou” o caminho para que a instituição financeira possa fazer uso da popularmente conhecida “busca e apreensão”.
A Lei em questão, ademais, simplificou o procedimento, garantindo ao Banco maior agilidade na promoção, de ação de busca e apreensão (aqui se está observando o caso de veículos). Afirmação que pode ser embasada na observação de que o juiz pode liminarmente determinar a restrição judicial, que deverá constar na base de dados do DETRAN, a impedir que o possuidor do veículo possa aliená-lo até que se efetive a busca e apreensão. Cabe referir-se que a desburocratização para constituição do devedor em mora e a possibilidade de registro de restrições no veículo via RENAJUD não foram as únicas facilidades oportunizadas aos Bancos/Credores, outras como a possibilidade de pedido automático para outra comarca, diminuindo o tempo das tradicionais cartas precatórias podem ser mencionadas.
De cunho mais prático (e possivelmente “doído” para o consumidor) a lei estabelece que, em havendo descumprimento das obrigações assumidas pelo devedor (a depender do contrato pode ser o atraso de apenas uma prestação do financiamento), o credor pode promover ação de busca e apreensão. Faz-se oportuno referir que, assim que apreendido bem móvel, o juiz deve intimar a instituição financeira/credora para que o retire do local em que depositado. Registre-se que: a) na prática pode o Banco optar por não ingressar com a ação em razão do atraso de uma única parcela, mas, se o contrato permitir, não existe óbice para tanto; b) o ordenamento jurídico simplificou as exigências e agilizou o processo de busca e apreensão – que pode, em curto espaço de tempo, ter sensíveis efeitos na vida do devedor. Cuidado com os mitos (porque se espera que os amigos estejam apenas desinformados)!