Sociedades Limitadas, Macarronadas e Humoristas: a democracia dum jeito ruim

Artigo publicado na 45ª edição do Jornal Estado de Direito – http://issuu.com/estadodedireito/docs/ed_45_jed./

Gladston Mamede

Autor do Manual de Direito Empresarial e da coleção Direito Empresarial Brasileiro (Editora Atlas). Bacharel (1988) e doutor (1994) em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais, é membro do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais. Iniciou sua atuação acadêmica pela Filosofia do Direito. Atualmente dedica-se ao estudo do Direito Privado, com ênfase no Empresarial e Direito Contratual. Tem contribuições em outras disciplinas jurídicas, designadamente no Direito do Turismo.

            Como parte dos meus deveres para com o Direito, acompanho regularmente a publicação de leis e decretos e foi assim que tomei um susto quando vi a publicação da Lei n. 13.082, de 8.1.2015, que institui o Dia Nacional do Humorista. Não foi, contudo, um susto eventual, mas habitual, é preciso reconhecer. Não se pode esquecer que, na mesma pesquisa habitual, encontrei, em dezembro, a publicação da Lei n. 13.050, de 8.12.2014, que o dia 25 de outubro como Dia Nacional do Macarrão.

            Aliás, em 2014, o Congresso Nacional se debruçou reiteradamente sobre esse tema de suma importância para a vida brasileira: a instituição de dias, seguindo uma tradição que se repete ano a ano. Há outras matérias de suma importância que também ocupam a pauta do parlamento brasileiro, como é o caso da atribuição de nomes a pontes, viadutos, rodovias (ou trechos de rodovia) etc. Para se ter uma ideia, em 2014, ocuparam-se de denominações as seguintes leis federais:  13.042; 13.041; 13.040; 13.039; 13.038; 13.037; 13.036; e 13.035; todas de 28.10.2014; 13.016, de 21.7.2014; 13.013, de 21.7.2014; e 12.985, de 2.6.2014.

            Esses são apenas alguns sinais legislativos de uma cultura demagógica de atuação parlamentar. A homenagem dos dias é uma forma mesquinha de atuação política, salvo em casos especialíssimos, quando há uma causa por trás da homenagem, o que é raríssimo. Aliás, uma demagogia parlamentar que se reflete por toda a República e seu Aparelho de Estado, bastando recordar a insólita proliferação de comendas e medalhas, distribuídas à torto e à direito, fazendo com que milhares – quiçá milhões – sejam comendadores, raramente por algum mérito que não seja a bajulação.

            Enquanto isso, a diversos problemas legais que desafiam o país e que não são objeto do debate parlamentar, nem da construção legislativa. Entre todos eles, quero destacar um: a péssima regulamentação legislativa para as sociedades contratuais, com efeito direito sobre as sociedades limitadas, tipo societário mais comum, sendo utilizado por mais de 90% das sociedades brasileiras, desde microempresas, como padarias, armazéns, quitandas e botecos, chegando a grandes empresas de todos os setores, o que é exemplificado pela Microsoft Informática Ltda., Volkswagen do Brasil Ltda. ou Shell Brasil Ltda.

            Pensada nos anos 60, as normas do projeto de Código Civil de 1975 olham para o passado. Não se amoldam a situações comuns, como sociedades de dois, com igual participação societária, sócios que sejam pessoas jurídicas e situações similares. Há excessiva valorização de um tipo societário sem expressão econômica concreta – a sociedade simples [comum, ordinária] –, e intervenções burocratizadoras que simplesmente estão se tornando letra morta, salvo quando, levadas aos tribunais, criam confusão entre os envolvidos, bem como entre os operários jurídicos.

            O Congresso Nacional, na sua condição de Poder Legislativo Federal, já deveria ter percebido isso. Poderão dizer que, de certa forma, isso está sendo feito com o projeto de Código Comercial. Mas essa é uma proposta que, por sua abrangência, dificilmente irá avançar, sendo polêmica em si e por suas implicações.

            O que precisamos é de algo mais simples e imediato: um Estatuto Nacional das Sociedades Contratuais, uma norma específica, com trâmite específico, sendo discutida em si, ou seja, sem que sofra o ataque de outras matérias, embolando discussões desnecessárias. É o mérito que se viu no trâmite do Código de Defesa do Consumidor, do Estatuto do Idoso e de vários similares: microssistemas legislativos, cunhados para dar atenção e solução para determinado aspecto da vida brasileira.

            Seriedade parlamentar é urgente.

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