(Re)pensando a masculinidade: por uma democracia feminina.

Coluna (Re)pensando os Direitos Humanos, por Ralph Schibelbein*, articulista do Jornal Estado de Direito.

 

 

 

       Somos uma sociedade machista. Essa afirmação já é um dado comum em pesquisas acadêmicas, discussões em redes sociais ou conversa de bar. Porém conseguimos perceber também o fortalecimento da luta das mulheres pela equidade. Estamos assistindo a batalha das feministas pela emancipação feminina. Mas será que o nosso lugar é somente o de expectador?

       Desde o surgimento, na distante Grécia antiga, a democracia é identificada como masculina. No Brasil as mulheres só conquistaram o direito ao voto na decana de 1930. E de lá para cá, mesmo sendo maioria da população, são minoria nas candidaturas e, menor ainda é o número de representantes eleitas.

       Os homens há muito tempo possuem o lugar de fala hegemônico. Isso se mostra pela história em diferentes espaços, tempos e campos. Porém mesmo não sendo o principal alvo em uma sociedade misógina, será que esse modelo não faz mal também ao gênero masculino? Devemos reforçar que o recorte de gênero não é suficiente para explicar a opressão e exclusão histórica, mas não parece haver dúvida de que se comparados às mulheres, temos tido muitos privilégios nos últimos milênios.

       Diferentes autores e autoras já versaram sobre a dominação masculina. Embora atualmente tenhamos uma quantidade significativa de vertentes feministas que estudam o tema em profundidade, parece ter um nicho específico que é o olhar dos homens sobre a sociedade machista. A crítica e reflexão acerca dos prejuízos de nascermos, vivermos e reproduzirmos o modelo de uma sociedade desta forma. Como a frase célebre de Simone de Beauvoir diz que não se nasce mulher, mas torna-se mulher, também podemos refletir sobre o processo de construção do masculino. Como faz para tornar-se homem? Quais são os processos a que somos submetidos para fazer parte dessa parcela dominante da sociedade?

       Nesse sentido, o sociólogo Daniel Welzer-lang vai tratar da “casa dos homens”; que é o que ele chama de lugares monossexuados (pátios de colégios, clubes esportivos, cafés etc. (…) conjunto de lugares aos quais os homens se atribuem a exclusividade de uso e/ou de presença) onde através de uma reprodução se estrutura o masculino de maneira paradoxal e inculca nos pequenos homens a ideia de que, para ser homem, eles devem combater os aspectos que poderiam fazê-los serem associados às mulheres. (WELZER-LANG, 2001)

       Como se fossemos eternos adolescentes tentando se enturmar, reproduzimos de forma sistemática, comportamentos identificados como sendo de machos. Nessas relações heterocentristas é muito comum o reforço do heterossexismo, a homofobia e suas ligações com a dominação masculina. Qualquer semelhança ou associação ao feminino passa a ser alvo de rejeição. É representativo de inferioridade. Esse reduto machista também é fortemente percebido nas esferas de poder político.

       A partir desse domínio dos homens, as mulheres individual e coletivamente, sofrem uma série de violências. Desde as dimensões simbólicas e culturais até agressões físicas e o estupro. Porém, somando-se a luta feminista, uma parcela dos homens vem buscando (re)pensar o conceito e as práticas de masculinidade. Percebendo os prejuízos próprios e as injustiças com as mulheres que o machismo acarreta, há nichos que vem problematizando o papel do masculino na sociedade.

       Há exemplos de grupos para debater o tema, rodas de conversa, pesquisadores, produções midiáticas etc. Deixamos como exemplo o projeto “O silêncio dos homens”, documentário a partir de estudos, produções e encontros que trataram sobre o assunto.

       Mas um homem que acredita na equidade entre gêneros, apoia a emancipação feminina e luta pelos direitos das mulheres, pode considerar-se um feminista? Talvez a primeira coisa que se deva refletir nessa questão seja justamente contra o que aquele homem está lutando.

       Se busca uma sociedade mais justa, digna, igualitária e empática, ele pode ser reconhecido como um indivíduo que exerce seu papel ativo de cidadão. E provavelmente não será necessário de autointitular como feminista. Os homens que lutam contra o machismo que prejudica tanto os homens quanto as mulheres, mesmo que muitas vezes os seres do gênero masculino não percebam, estão contribuindo com a diminuição de uma masculinidade tóxica e, portanto, podem ser considerados pró-feministas.

       Segundo (WELZER-LANG, 2001) O termo pró-feminista foi adotado consensualmente entre os homens e as mulheres presentes no colóquio do GREMF em 1996 no Québec e buscava agrupar esses homens que se denominavam de anti-sexistas, masculinistas, marcar a solidariedade dos homens com as análises feministas e respeitar a autonomia do movimento das mulheres, deixando a elas a exclusividade do termo feminista.

       Em uma sociedade misógina, com a reprodução de comportamentos machistas, estariam os homens pró-feminismo prontos para abrirem mãos de determinados privilégios para contribuírem com a emancipação feminina? O que você topa perder para elas ganharem?

       Apenas 1 a cada 10 candidaturas para as prefeituras é de mulher. São 2.496 mulheres candidatas para o Executivo municipal num total de 19.141 candidatos (13% do total). Os nomes de mulheres na disputa a prefeito não são maioria em nenhum dos 33 partidos. Esses dados estão disponíveis no repositório de dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O baixo número de candidaturas de mulheres se repete na disputa para a Câmara Municipal.

       A partir de 2009, com a minirreforma eleitoral, a cota de no mínimo 30% para candidaturas de mulheres passou a valer. Mas infelizmente, ao compararmos essas eleições com as de 2012 e 2016, não vemos um aumento de participação feminina. Em 2020, as taxas mais altas de candidaturas femininas são, principalmente, de partidos à esquerda no espectro político, como PSTU, PSOL, PT. Mas vale destacar que ainda há uma predominância de mulheres brancas.

       A pesquisadora associada do LabGen-UFF Débora Thomé, doutora em ciência política e coautora do livro “Mulheres e Poder: Histórias, Ideias e Indicadores”, reitera que o financiamento da candidatura é um dos principais fatores relacionados à taxa de sucesso de um candidato. Precisamos ultrapassar a ideia do que Boaventura de Sousa Santos chama de tríade do atraso com o patriarcado, capitalismo e colonialismo. Precisamos de uma democracia mais feminina.

       Em Porto Alegre, na disputa pela prefeitura temos diferentes mulheres: Fernanda Melchionna, Manuela D´ávila e Juliana Brizola. Está aí uma excelente oportunidade para darmos passos e sair do vergonhoso último lugar do ranking dos países que menos possuem mulheres na política, em toda América latina. Por uma democracia mais feminina.

 

BEAUVOIR, Simone. O segundo sexo: fatos e mitos. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1960a.

THOMÉ, Débora. Mulheres e poder: histórias, ideias e indicadores. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2018.

WELZER-LANG, Daniel. A construção do masculino: dominação das mulheres e homofobia. Rev. Estudos Feministas. vol.9, n.2. 2001.

Documentário: O Silêncio dos Homens (2016) disponível no Youtube.

 

 *Ralph Schibelbein é Professor, Mestre em Educação (UDE/ UI – Montevidéu- 2016), onde estudou a relação da educação e dos Direitos Humanos com o processo de (re)socialização. Pós-Graduado em História, Comunicação e Memória do Brasil pela Universidade Feevale (2010), sendo especialista em cultura, arte e identidade brasileira. Possui licenciatura plena em História pelo Centro Universitário Metodista IPA (2008) e pela mesma faculdade é graduado também em Ciências Sociais (2019). Atualmente é Mestrando em Direitos Humanos na Uniritter e cursa licenciatura em Letras/Literatura (IPA). 

 

 

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