Prisão civil do devedor de alimentos: necessária ponderação

Coluna Direito da Família e Direito Sucessório

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Execução do devedor de alimentos

Uma vez fixados os alimentos, caso o devedor de alimentos não venha a efetuar o pagamento na forma acordada é possível promover a execução. E existem duas formas distintas de execução – a execução pelo rito da penhora no qual busca-se patrimônio do devedor e a execução pelo rito da prisão civil.
Pelo rito da prisão civil o devedor tem o prazo de três dias para efetuar o pagamento, provar que já o fez, ou apresentar a impossibilidade absoluta de fazê-lo.
Sob esse rito diversos são os questionamentos que vêm ocorrendo em nossos tribunais sobre como ele deverá ocorrer. Pois, apesar de já presente no Código de Processo Civil de 1973, esse rito nunca foi um consenso entre os processualistas.
Hoje iremos analisar o recém julgado pelo E. Superior Tribunal de Justiça RHC 91.642/MG, da Relatoria da Ministra Nancy Andrighi.
No caso específico temos uma filha maior de idade e que já encontra inserida no mercado de trabalho. O seu genitor, responsável pelo pagamento da pensão alimentícia deixou de fazer na forma integral. Ele já idoso e com sérios problemas de saúde.
O pagamento parcial da dívida enseja o pedido de execução – no caso pelo cumprimento de sentença – pelo rito da prisão civil.
E assim, foi feito, a credora promoveu o cumprimento de sentença para buscar os valores faltantes.
A justificativa apresentada pelo devedor de alimentos não convenceu o juiz e assim, foi impetrado o Habeas Corpus, tendo chegado ao STJ em grau de recurso.
A 3a. Turma do E. STJ ao analisar o caso concreto, reforçou o entendimento de que a discussão acerca da necessidade e possibilidade não é matéria de análise nem no Habeas Corpus e nem no cumprimento de sentença, pois o devedor de alimentos deveria ter manejado a ação revisional de alimentos para ser reanalisado o referido binômio ou como no caso concreto a credora de alimentos já atingiu a maioridade e está inserida no mercado de trabalho a ação cabível a ser maneja deveria ter sido a ação de exoneração de alimentos. Contudo o devedor quedou-se inerte e com isso não ajuizou nenhuma das duas ações.
Mas, também não fez o pagamento de forma integral.

Foto: Agência Brasil

Foto: Agência Brasil

Dessa forma, na análise do Recurso de Habeas Corpus, cujo objetivo era impedir a prisão civil, a 3a. Turma do STJ entendeu que nesse caso, não caberia a prisão civil e que o restante da dívida deveria ser paga mediante o rito da penhora.
Tal entendimento desmerece a prisão civil? Não, ao contrário, esse entendimento a fortalece, pois a prisão civil deve ser utilizada como a última forma coercitiva, quando se verifica que a pessoa não quer efetuar o pagamento, e não quando ela não pode, não dispõe de meios.
Assim, o fato de ter deixado atrasar as prestações (até as três últimas), não implica por si só que esse seja o rito mais adequado para ao caso concreto. É preciso levar em consideração outros vetores para escolher seguir por esse rito.
A análise do caso concreto é que será o norteador para o advogado escolher qual dos dois caminhos é o mais adequado.

Julgado do STJ

Vejamos o julgado do E. Superior Tribunal de Justiça:

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. PRISÃO POR DÍVIDA DE ALIMENTOS. BINÔMIO NECESSIDADE E POSSIBILIDADE. QUESTÃO NÃO EXAMINÁVEL EM HABEAS CORPUS. PAGAMENTO PARCIAL DA DÍVIDA. RELEVÂNCIA NA HIPÓTESE E NO CONTEXTO FÁTICO. CREDORA MAIOR E COM ATIVIDADE PROFISSIONAL REMUNERADA. DEVEDOR IDOSO E COM RESTRIÇÕES SEVERAS DE SAÚDE. PONDERAÇÃO DE VALORES. MÁXIMA EFETIVIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL, MENOR ONEROSIDADE DA EXECUÇÃO E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.

1- O propósito recursal é definir se deve ser suspenso o decreto prisional do devedor diante das alegações de inobservância do binômio necessidade/possibilidade, existência de depósito ou de constrição de parcela considerável da dívida, de que a credora atingiu a maioridade e passou a exercer atividade profissional remunerada e de que o devedor é idoso e portador de doenças incompatíveis com a reclusão em estabelecimento carcerário.
2- A inobservância do binômio necessidade/possibilidade na fixação, revisão ou exoneração de alimentos é matéria incognoscível na estreita via do habeas corpus. Precedentes.
3- A disponibilização ao credor, de forma voluntária ou mediante constrição judicial de valores, de parcela significativa da dívida, embora insuficiente, por si só, para impedir o decreto prisional, pode ser levada em consideração na formação do convencimento judicial em conjunto com outros elementos eventualmente existentes.
4- Na hipótese, o fato de a credora ter atingido a maioridade civil e exercer atividade profissional, bem como o fato de o devedor ser idoso e possuir problemas de saúde incompatíveis com o recolhimento em estabelecimento carcerário, recomenda que o restante da dívida seja executado sem a possibilidade de uso da prisão civil como técnica coercitiva, em virtude da indispensável ponderação entre a efetividade da tutela e a menor onerosidade da execução, somada à dignidade da pessoa humana sob a ótica da credora e também do devedor.
5- Recurso em habeas corpus conhecido e provido.
(RHC 91.642/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/03/2018, DJe 09/03/2018)

renata vilas boas
Renata Malta Vilas-Bôas é Articulista do Estado de Direito, advogada devidamente inscrita na OAB/DF no. 11.695. Sócia-fundadora do escritório de advocacia Vilas-Bôas & Spencer Bruno Advocacia e Assessoria Jurídica, Professora universitária. Professora na ESA OAB/DF; Mestre em Direito pela UPFE, Conselheira Consultiva da ALACH – Academia Latino-Americana de Ciências Humanas; Acadêmica Imortal da ALACH – Academia Latino-Americana de Ciências Humanas; Integrante da Rete Internazionale di Eccelenza Legale. Secretária-Geral da Rede Internacional de Excelência Jurídica – Seção Rio de Janeiro – RJ; Colaboradora da Rádio Justiça; Presidente da Comissão de Direito das Famílias da Associação Brasileira de Advogados – ABA; Presidente da Comissão Acadêmica do IBDFAM/DF – Instituto Brasileiro de Direito das Familias – seção Distrito Federal; Autora de diversas obras jurídicas.

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