O fim da separação: um novo recomeço!

Artigo veiculado na 26ª edição do Jornal Estado de Direito, ano IV, 2010.

 

Maria Berenice Dias*

Finalmente entrou em vigor a Emenda Constitucional 66/2010, que dá nova redação ao art. 226, § 6º da Constituição Federal de 1988. A partir de agora qualquer dos cônjuges pode, sem precisar declinar causas ou motivos, e a qualquer tempo, buscar o divórcio.
O avanço é significativo e para lá de salutar, pois atende ao princípio da liberdade e respeita a autonomia da vontade. Afinal, se não há prazo para casar, nada justifica a imposição de prazos para o casamento chegar ao fim.
De todo descababido obrigar pessoas que não mais se amam a preservar um vínculo inexistente. O novo comando legal, além de trazer proveito às partes, também vai produzir significativo desafogo do Poder Judiciário.
A mudança provoca uma revisão de antigos paradigmas, pois de uma só vez, elimina o instituto da separação, os prazos para a concessão do divórcio e a culpa no âmbito do Direito das Famílias.
A separação, ainda que consensual, só podia ser obtida depois de um ano do casamento. A separação litigiosa dependia da identificação de culpados, e somente o “inocente” tinha legitimidade para ingressar com a ação. Depois, era necessário aguardar um ano para converter a separação em divórcio. Já o divórcio direto estava condicionado ao prazo de dois anos da separação de fato. Ou seja, dependia de simples declaração de duas testemunhas de que o casal estava separado por este período.
Agora as pessoas nem precisam estar separadas – judicialmente, de corpos ou de fato – para pedir divórcio, não havendo a necessidade de aguardar o decurso de qualquer prazo. Quem está separado judicialmente, deve continuar a se qualificar como separados, apesar do estado civil que o identifica não mais existir. Assim, nada impede a reconciliação, com o retorno ao estado de casado (CC 1.577).

Foto: Pixabay

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Já a separação de fato e a separação de corpos preservam o interesse do casal, no caso de desejaram um tempo para pensar. Qualquer uma dessas providências suspende os deveres do casamento e termina com a comunicabilidade dos bens. A separação de corpos, inclusive, pode ser levada a efeito de modo consensual por meio de escritura pública. E, ocorrendo a reconciliação, tudo volta a ser como era antes. Sequer há a necessidade de ser extinta a separação de corpos. Porém, os bens adquiridos e as dívidas contraídas durante o período da separação são de cada um, a não ser que convencionem de modo diferente.
A mudança constitucional incide também sobre as ações que já tramitam no judiciário, porquanto não é possível o prosseguimento de demandas que buscam uma resposta não mais contemplada no ordenamento jurídico. Todos os processos de separação perderam o objeto por impossibilidade jurídica do pedido (CPC 267, inc. VI). Assim, cabe transformá-los em ação de divórcio. Somente na hipótese de haver expressa oposição de ambos os separandos à concessão divórcio deve o juiz decretar a extinção do processo.
Como para a concessão do divórcio não cabe a identificação de culpados, não haverá mais necessidade da produção de provas e inquirição de testemunhas. Eventualmente continuarão sendo objeto de discussão as demandas cumuladas como alimentos, guarda, partilha de bens, etc. Mas o divórcio cabe ser decretado de imediato.
Deste modo, merece ser festejada a nova ordem constitucional que veio atender ao anseio de todos e acabar com uma absurda exigência que só se manteve durante anos pela histórica resistência ao divórcio. Mas, ao fim e ao cabo, o aspecto mais significativo da mudança é o fim da injustificável interferência do Estado na vida dos cidadãos. Finalmente passou a ser respeitado o direito de todos de buscar a felicidade, que nem sempre está na manutenção de um casamento, mas, justamente, no seu fim, pois pode significar um grande e novo recomeço!

 

*Advogada especializada em Direito das Famílias e Sucessões. Ex-Desembargadora do Tribunal de Justiça-RS. Vice-Presidenta Nacional do IBDFAM. Autora do Manual de Direito das Famílias, publicado pela Editora Revista dos Tribunais. Sites www.mbdias.com.br e www.direitohomoafetivo.com.br.

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