Direitos Humanos nas entrelinhas das crônicas de Carlos Drummond de Andrade

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Literatura; livros; folhas

Coluna Lido para Você, por José Geraldo de Sousa Junior, articulista do Jornal Estado de Direito

 

 

       

 

PENIDO, Luiza de Andrade, Direitos Humanos nas Entrelinhas das Crônicas de Carlos Drummond de Andrade (Publicadas no Caderno B do Jornal do Brasil, entre 1969-70 e 1983-84), Dissertação de Mestrado. Orientador Menelick de Carvalho Netto. Brasília: Universidade de Brasília/CEAM/PPGDH-Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos e Cidadania, 2020, 184 p.

            Nesta Coluna Lido para Você, além de livros, tenho feito a leitura de teses, dissertações, monografias e relatórios de pesquisas, os últimos, que distingo pela qualidade, não apenas para referências aos pesquisadores, mas como sugestão a editores, vários deles destinatários da Coluna, logo que publicada no Jornal Estado de Direito.

            É bem o caso da dissertação de Luiza de Andrade Penido, que já me encantara desde que apresentada em banca de qualificação da qual fiz parte. Primeiro, pelo oferecimento do tema, articulando direitos humanos e literatura, nexo que me mobiliza, conforme se deduz das muitas recensões que elaborei aqui neste espaço, na medida em que vejo nessa relação – direito e direitos humanos, arte e literatura – uma racionalidade expressiva que permite ao discurso literário conduzir temas densos, e com linguagem persuasiva própria da retórica, traduzir o discurso epistemológico da ciência. E que é agora submetida a banca examinadora, composta por seu Orientador Professor Menelick de Carvalho Netto, pelas Professoras Mariana Martins de Carvalho e Sinara Zardo e por mim.

            Tal como tenho indicado nessa perspectiva, sigo a consideração de Roberto Lyra Filho, no plano filosófico-jurídico, ao referir-se às múltiplas atitudes e não unilaterais atitudes de conhecimento – a explicação científica, a fundamentação filosófica, a intuição artística e até a revelação pela experiência mística – conforme entre outros Filosofia, teologia e experiência mística, in Anais do VIII Congresso Interamericano de Filosofia. São Paulo: Instituto Brasileiro de Filosofia, vol. II, p. 145-150, 1974; Filosofia geral e filosofia jurídica em perspectiva dialética, in PALÁCIO, C., org. Cristianismo e história. São Paulo: Edições Loyola, p. 147-169, 1982; A concepção do mundo na obra de Castro Alves. Rio de Janeiro: Editor Borsoi, 1972; e de Eduardo Lourenço, no plano literário, com ele, lendo em Fernando Pessoa e seus heterônimos, a “tentativa desesperada de se instalar na realidade”, tanto que a literatura não é um delírio mas, simplesmente, “a apropriação da realidade por meio de outra linguagem”, como encontro em Mitologia da Saudade. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.

            É sim nas entrelinhas, nas metáforas, no imaginário literário que são capturados os discursos que disfarçam  os desejos de reforma social, política e religiosa e, que nem assim salvam os cérebros quando rolam as cabeças ao gume do carrasco, contra a Utopia, de Thomas More; a crítica ao governo e às leis, na fabulação de Jonathan Swift, em As Viagens de Gulliver, não fosse Lilipute uma paródia da Inglaterra,  e não se visse a contingência de guerra por não ter bastado inscrever no artigo primeiro da Constituição “que todos quebrarão os ovos pelo lado mais cômodo”; ou a contra-intuitiva desconstrução do real em Lewis Carroll, no maravilhoso país de Alice, até que esta pudesse inspirar uma sociologia das ausências e das emergências, em Boaventura de Sousa Santos (Pelas Mãos de Alice) e prestar-se a reconstituir os estudos sobre ciência, política e direito.

            É com essa chave de leitura que me debruço sobre a dissertação de Luiza, mobilizado a cada linha por essa tessitura discursiva, constitutiva do que João do Rio diria, “tange todas as cordas da vida” numa mistura de sonho, riso, lágrima, que toca o nosso cérebro no que ele pensa e que se manifesta, ainda João do Rio, na forma de “poesia da encantadora alma das ruas! (A alma encantadora das ruas. São Paulo: Companhia das Letras, 2016). E já vou captando as entrelinhas da escrita da dissertação, usando sua “pena alada”, desde o momento em que ela segue com Drummond, e Pedro seu marido a vida, de mãos dadas; ou, com os filhos, paradoxalmente, por amor, colhendo, “as tâmaras dos direitos humanos”, que a outros tem sido vedado colher pois, como é sabido, “quem planta tâmaras, não colhe tâmaras”. 

            Conforme o resumo, transcrito aqui para orientar o leitor, “a dissertação analisa como a temática de direitos humanos está expressa nas crônicas de Carlos Drummond de Andrade, publicadas no Jornal do Brasil nos períodos de outubro de 1969 a outubro de 1970 e setembro de 1983 a setembro de 1984. A seleção dos textos foi amparada na correspondência a dois momentos marcantes da ditadura civil-militar no Brasil: o governo Médici, fase conhecida como “anos de chumbo”; e a gestão de Figueiredo, caracterizada pelo crescimento das lutas pela democratização, como na campanha Diretas-já. A pesquisa qualitativa baseou-se em uma revisão bibliográfica sobre as relações entre direitos humanos e literatura para, em seguida, investigar o gênero crônica, sua relação com a opinião pública e com o contexto histórico. As crônicas drummondianas do período foram, então, categorizadas e analisadas conforme os direitos humanos que saltam do conjunto das publicações, a saber: direitos às liberdades; à cultura e ao patrimônio; à participação efetiva da mulher; direitos econômicos e sociais; à democracia e à participação política e social. Ao enfocar o perfil cronista e humanista de Drummond, o estudo revela como os direitos humanos estão consistente e recorrentemente presentes nas crônicas do autor, constituídas por entrelinhas comprometidas com valores democráticos e libertários que foram difundidos no café da manhã de leitoras e leitores brasileiros durante o autoritarismo”.

            Parto do pressuposto da Dissertação e, nesse terreno, se me socorro da crítica literária, meu guia de orientação, é sempre Antonio Candido, autor que também serve de referência para Luiza Penido. Em Retratos. São Paulo: Companhia das Letras, 1993, ele abre o conjunto de ensaios que formam a obra, com Drummond prosador, no qual, tratando de escritos em prosa que o próprio Drummond chamava de crônicas, e que Candido mais categoriza como crônica entre aspas dado o extravasar rígido dos escritos para o alcance de ensaios, para mostrar que neles “os movimentos livres do pensamento e da imaginação vinculam estreitamente à reflexão cheia de consequências” realizando uma “prosa que se apresenta como algo irrelevante” mas que inesperadamente desliza “para reflexões de um alcance e densidade” dos que “ensaiam o pensamento”.

            Isso dá sentido ao que a Autora caracteriza como as entrelinhas nas quais decidiu escavar os seus achados, numa prospecção razoável, porque, de novo voltando a Antonio Candido, dessa feita citado por André Dick (Drummond na visão de Antonio Candido (http://unisinos.br/blogs/ihu/invencao/drummond-na-visao-de-antonio-candido/), o crítico surpreende no poetaum problema de identidade ou de identificação do ser, de que decorre o movimento criador da sua obra na fase apontada, dando-lhe um peso de inquietude que a faz oscilar entre o eu, o mundo e a arte, sempre descontente e contrafeita”, expondo um constrangimento,  “constrangimento (que só poderia tê-lo encurralado no silêncio) só é vencido pela necessidade de tentar a expressão libertadora, através da matéria indesejada”. Ou seja, Drummond se horrorizaria em relação à sua própria personalidade, à medida que é atraído pelo eu, o que lhe traria um “constrangimento”, que só pode ser vencido pela “expressão libertadora”.

            Leal ao seu ofício, o escritor, diz Pedro Tierra em Pesadelo, obra que foi objeto de um Lido para Você (https://estadodedireito.com.br/pesadelo-narrativas-dos-anos-de-chumbo/), faz brotar tal como ele divisa o papel da literatura, uma narrativa para além do simples relato da ação que brota da experiência e das vontades coletivas”. Ele cumpre seu papel de intelectual engajado: “identificado com a necessidade de transformações sociais, será sempre presa dessa angústia de fazer parte de algo que remete a sonhos coletivos, a vontades coletivas. Talvez para compensar a doença profissional da solidão”. .     

            Penso que posso oferecer uma confirmação que valide essa possibilidade de prospecção nas entrelinhas. Para isso me socorro em Noel Delamare, pseudônimo e alter ego de Roberto Lyra Filho (Cancioneiro dos sete mares. Revista Humanidades nº 11, ano III. Brasília: Editora UnB, novembro/janeiro 1986/1987, p. 43-50), quando caracteriza um poeta maior e acentua as linhas que o definem, a despeito de diversas e eventualmente opostas e apesar das suas eventuais contradições de classe, temperamento e roteiro. Na categorização de Noel Delamare, Drummond repercute todas as linhas, desde “a solidariedade, voltada para as transformações da estrutura… participa da luta, para remodelar, à altura do tempo, o ideal permanente de liberdade; e que, nisto, porém, não abandona a esfera íntima do homem, na procura da felicidade, dentro do vórtice da História, se expressando como ‘aquele sentimento do mundo’; seja quando se apresentam “solistas e coral da humanidade pelas espirais da transcendência”.

            A Dissertação se desenvolve ao impulso de uma escritura elegante, conduzida por meio de um roteiro muito bem sustentado, em duplo arranjo, enquanto exercício qualificado do ofício jornalista e enquanto enquadramento literário, não fora a Autora competente nos dois fundamentos. Isso traz para o texto a combinação dos dois elementos que Ortega y Gasset considerava condição para o exercício do intelectual, do pensador: o sistema como sua ética; a clareza, como sua cortesia.

            Do ofício de jornalista a Autora exercita aquela lição já estabelecida entre os grandes. Ajustada aqui ao seu propósito analítico, recupero a Lição do Jornalista Luiz Cláudio Cunha, quando na UnB, recebeu o título de Notório Saber outorgado pelo Conselho Universitário. Presidindo a sessão, trouxe da cerimônia para o livro que registrou, a convicção de “que no percurso do homenageado o que o evento designa, num ambiente acadêmico, é o encontro do saber notório com a prática. A isso se referiu o Professor Gonzaga Motta em seu discurso construído desde o memorial de propositura da outorga do título. E esse encontro, aferiu o memorialista (p. 53-73), acentua o caminho que mais nitidamente assinala o percurso de Luiz Cláudio Cunha. Um caminho nobre: apostar nos direitos humanos como um paradigma transdisciplinar e universal. Um compromisso que é mais político que técnico. Uma trilha que perpassa o campo profissional e o acadêmico, reunindo todos eles sob o paradigma maior dos direitos humanos e do desenvolvimento social. Um caminho muito mais complexo e desafiador do que a simples dicotomia rasteira entre a prática e a disciplina.  Todos temos que lembrar, assim Luiz Cláudio abriu o seu discurso (p. 17-46), porque a memória da humanidade é um patrimônio de todos e de cada um de nós e, se nem sempre sabemos, todos lembramos. Todos precisamos lembrar. Mas o jornalista, como o historiador, além de lembrar, tem o dever de contar. Para mim, que presidi a cerimônia, foi esse o grande sentido da manifestação do homenageado, tal como designei em minha manifestação, que a Organizadora trouxe para o livro dando-lhe como título: a lição do jornalista” (https://estadodedireito.com.br/todos-temos-que-lembrar-a-licao-e-a-missao-do-jornalista/).

            Mas o texto de Luiza, ao lado disso, impregnado das aproximações que lhe autorizam o domínio das Letras, cerze o seu argumento como o fio diretor das crônicas examinadas nas quais ela entrealinha o arremate material de sua alta confecção: o olhar que captura o humano, no arranjo empático na alteridade emancipatória instituída por novos sujeitos de direitos que se afirmam na esfera pública na qual e por causa da qual realizam a obra inacabada de criação da democracia, e nessa tessitura, em Drummond, nas crônicas estudadas, delas extraindo o suporte de teorias críticas da História, do Direito e dos Direitos Humanos:  Walter Benjamin, Tzvetan Todorov, Lynn Hunt, Norberto Bobbio, Jürgen Habermas,  Joaquín Herrera Flores,  David Sánchez Rubio, autores que se esmeram em estabelecer as interconexões político-epistemológicas que o campo requer, para em sua complexidade, sem idealizações ou infradialetizações, apreenderem os direitos humanos, diz ela (p. 29), nas tensões  das “lutas sociais travadas em busca de dignidade, entendida não como simples acesso aos bens, mas como um acesso igualitário e não hierarquizado em definições prévias de posições privilegiadas para alguns poucos e subordinação para os demais”. E continua: “A desigualdade nas condições materiais e imateriais de acesso são, dessa forma, motivações para os embates, que se convertem em resultados provisórios – os direitos humanos, sempre de acordo com cada contexto social. A declaração de direitos, formalizada e pública, surge, então, para confirmar as mudanças experimentadas por uma sociedade, ainda que não haja concordância completa entre os sujeitos na exata ocasião da declaração sobre o conteúdo desses direitos ou sobre a própria importância de declará-los”.

            Bem que aqui, para minha surpresa, considerando o lugar funcional e teórico de onde a Autora parte, tenha ela, com seu Orientador Menelick de Carvalho Netto, com Roberto Lyra Filho e comigo, inferido, no que se revela uma boa jurista crítica, essa dimensão do político-social no qual, diz Menelick, “a democracia só é democrática quando constitucionalmente construída, a Constituição só é constitucional quando democrática pois a legitimidade impõe que a igualdade seja entendida como direito à diferença e direito à liberdade de cada um”. No que Lyra Filho, seguido por mim, na configuração conceitual e prática do que viemos a denominar O Direito Achado na Rua, tenhamos indicado como o humanismo que se realiza no processo histórico, pela enunciação de uma legítima organização social da liberdade, processo que a Autora apreendeu, muito propriamente, como “enunciação de direitos com viés emancipatório pela sociedade, ao compreender que se trata de um projeto coletivo, e não individual, fundado na consciência sobre a demanda por novos e novos direitos até então não pensados, em um círculo em que a aquisição de um patamar de direitos leva a outro, e ao reconhecimento de novos e novos sujeitos”.

            É nesse processo que a Autora encarta, agora já armada para desentranhar de seus contextos as entrelinhas dessas emergências, o que faz a partir das crônicas de Carlos Drummond de Andrade, “o enlace entre direitos humanos e literatura”, que em seu narrador-autor-guia, é feito de sentimento do mundo, talvez porque, conforme ele próprio se revela, “de um modo geral falo em minhas crônicas do que me revolta” (p. 82). E a revolta, mostrou Albert Camus (O Homem Revoltado), é o núcleo onde se instala o sentimento de injustiça que, em Drummond, com as contradições de um pensamento forjado em seu tempo, diz a Autora, carrega uma proposta para “novos modos de ver, mostrando sua expectativa por uma experiência mais humanista” (p. 133).

            A Dissertação contribui de forma inédita, criativa e também literariamente, para os estudos e a crítica da obra do grande escritor e poeta, ao oferecer esse recorte que serve também para pôr em relevo a resistência ao obscurantismo e ao autoritarismo de um tempo: os encontros entre os direitos humanos e as crônicas drummondianas. Este, aliás, o título do item central do capítulo terceiro que constitui o cerne do trabalho da Autora: Direitos humanos nas entrelinhas drummondianas.

            Localiza-se nesse estudo a nota de singularidade que eu já havia intentado assinalar discorrendo sobre Direito e Cinema, mesmo numa aproximação mais geral, ainda quando inaugure vertentes de interesse para o conhecimento do Direito e suas formas de difusão, incluindo o ensino e a educação jurídicas. As relações entre Direito, Arte, Literatura, Teatro e Cinema formam uma Paidéia em alcance clássico e dispõem de um catálogo expressivo para o confirmar (https://estadodedireito.com.br/coluna-lido-para-voce-direito-no-cinema-brasileiro/).

            Ou, em sentido mais específico (https://estadodedireito.com.br/criminologia-e-cinema-semanticas-castigo2/), ao aludir a filmes que formam o repertório que capta dimensões complexas de interditos e sanções sociais, traduzindo com vivacidade a semântica do castigo que se insere, aqui curiosamente tendo empregado a mesma metáfora aplicada por Luiza Penido,  nas entrelinhas discursivas de sua função jurídico-política, desvendando o que ao fim e ao cabo, realiza, lembra Evandro Lins e Silva, uma espécie de aterrorizante cerimônia punitiva, não porque “restabelece justiça”, mas porque “reativa o poder” (De Beccaria a Filippo Gramática (Uma visão global da história da pena). Rio de Janeiro: Edição do Autor, 1991).

            Com o apoio das fontes, especialmente os diários, a Dissertação perscruta o sentimento do mundo nos jornais (Capítulo IV, um tanto biografia, um quanto processo de criação), para atribuir relevância a achados do cronista no cotidiano para onde ele aponta e “mantém sua lente humanista” (p. 138). Assim, pode dizer-se do cronista, o mesmo que Lucien Febvre, forte na concepção dos Annales, propõe para o seu campo ao trazer sentimentos e emoções para a pesquisa histórica (VELLOSO, Monica Pimenta.  História, literatura e memória: uma discussão sobre universos fronteiriços. MOUSEION, nº 11, jan-abril, 2012, p. 4-22. ISSN 1981-7207), denotando que o historiador não vagueia ao acaso como um trapeiro à procura de achados, mas parte com uma intenção precisa, um problema a resolver, uma hipótese de trabalho a verificar (FEBVRE, Lucien. Combates pela história. 3ª. Ed., Lisboa: Editorial Presença, 1989).

            Assim é que, se tiver razão Martha Nussbaun (Justicia poética: la imaginación literaria y la vida pública. Santiago: Editorial Andrés Bello, 1997), em reivindicar uma justiça poética aludindo a sensibilidade, enquanto capacidade de se colocar no lugar do outro, é o caso de me perguntar e também de perguntar à Autora da Dissertação, é confiável conhecer e apreender o mundo subjetivamente? Há uma redução de alcance, ou uma inacessibilidade epistemológica para conhecer e apreender o mundo literariamente? A posição de que trata Herrera Flores, tal como citado pela Autora, interdita ao artista o poder propor soluções para o mundo, ficando limitado aos obstáculos do caminho mesmo sentindo a náusea, ou vestido de branco e assim, circunscrito a aforismos e rimas?

            Fechando esses comentários, não apenas vale marcar uma outra singularidade que se faz preciosa por ser este talvez, um dos últimos trabalhos de pesquisa com acesso ao enorme acervo de documentos da Casa de Rui Barbosa, (“Instituição preservacionista, com papel ímpar para o país, e que ora resiste para sobreviver”, nota 18, p. 161) se se consumar como se anuncia a extinção da Instituição na política de desmonte da Cultura, praticada pelo desgoverno instalado no País.

            Por isso que chamo a atenção para o Anexo. Nele se contêm, em arquivo que as conservam, as imagens de crônicas publicadas no Jornal do Brasil e analisadas na dissertação, apresentadas por ordem cronológica de publicação estão compiladas em:

https://drive.google.com/open?id=1-0kGGC2GdGq7hRHASuPxFpz7aM5e_NBO Fonte: Fundação Casa de Rui Barbosa, RJ.

            Sinto que Luiza Penido, com seu trabalho sensível, traz com delicadeza, e não só com esse gesto, um fecho para a sua Dissertação que vale como um desagravo, algo que ela traduz no mesmo sentimento de injustiça que move o Autor de sua estima, e que o projeta, diz um de seus interpretes,  para o “máximo de espírito do tempo e da consciência possível com relação à sua época” (p. 144).  Mas também, para fazer mais transparente, com o recorte interpretativo que a ele oferece, dirigido a desvendar nas entrelinhas, o seu engajamento político-social (p. 157), aquela irradiação com que Drummond de Andrade, simplifica em fragmentos para melhor entendimento até do pipoqueiro da esquina (metáfora que o seu Orientador usa com tanta frequência para facilitar suas lições sobre constitucionalismo)  dos temas densos de direitos humanos, ou das muitas maneiras de iluminar ( a Autora diz lançar luzes, p. 163) dos Caminhos de João Brandão. Não se trata, para seguir um comentário de Antonio Candido, a propósito dessas crônicas, de desenvolver um certo tipo de reflexão, para dar sentido a estímulos aparentemente fúteis ou desligados daquilo que forma a matéria central do exercício de pensamento. Nelas, como indica o próprio Drummond, ou como demonstra esta Dissertação, enquanto se mescla conto e testemunho, “meu amigo João Brandão vive sua vida entre a rotina palpável e a aventura imaginária, e eu vou cronicando seu viver com a simpatia cúmplice que me inspiram o ser comum e sua pinta de loucura mansa, pois na terra alucinada que nos tocou, ainda é virtude (até quando?) cumprir sem violência o mandamento do existir”.

            Tudo se passa, diz a Autora, ao encerrar o seu texto, como “uma forma de alumbramento, um meio de lutar e de alimentar as certezas, reacender o ânimo, resgatar no âmago as forças para enfrentarmos os fundamentalismos de 2020 por meio de palavras que iluminem”.

  

José Geraldo de Sousa Junior é Articulista do Estado de Direito, possui graduação em Ciências Jurídicas e Sociais pela Associação de Ensino Unificado do Distrito Federal (1973), mestrado em Direito pela Universidade de Brasília (1981) e doutorado em Direito (Direito, Estado e Constituição) pela Faculdade de Direito da UnB (2008). Ex- Reitor da Universidade de Brasília, período 2008-2012, é Membro de Associação Corporativa – Ordem dos Advogados do Brasil,  Professor Titular, da Universidade de Brasília,  Coordenador do Projeto O Direito Achado na Rua.55

 

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