Artigo veiculado na 27ª edição do Jornal Estado de Direito, ano IV, 2010.
Carmela Grüne*
O Jornal Estado de Direito apresentou ao Major César Augusto Pereira da Silva, Diretor do Presídio Central de Porto Alegre a sugestão de realização mensal de atividades culturais que vão desde a elaboração de palestras na área jurídica, sarau, prática de yoga a grupo de pesquisa em Filosofia e Direitos Humanos.
O objetivo é oferecer formas de utilizar o tempo dos apenados em benefício de atividades que desenvolvam capacidades e potencialidades para melhorar a auto-estima, a consciência crítica, o espírito cívico. Infelizmente, o Presídio Central pelas atuais condições que envolvem uma série de fatores, dentre os quais: a dificuldade de oferecer atividades laborativas a um maior número de pessoas e a superlotação que hoje supera a capacidade de quase duas mil vagas, recebendo mais de cinco mil inquilinos, número que o enquandra na maior superlotação de detentos da América Latina. O fato é que são os mais fracos (em situação de vulnerabilidade), que acabam sendo penalizados duplamente (pelo crime cometido e pelos reflexos causados da ineficiência do Processo Penal). Não retirando a responsabilidade das falhas/erros cometidos por aqueles que infringiram a lei, mas crimes, como os de colarinho branco, possuem tanta demora na sua investigação que fogem da repressão.
É importante salientar o excelente trabalho que a Brigada Militar faz dentro do Presídio Central, e, na pessoa do Major Augusto, parabenizo toda equipe que cuida dos apenados, pois mesmo diante de condições difíceis, conseguem “literalmente” manter a ordem no caos.
A primeira atividade do Jornal no Presídio Central aconteceu dia 14 de setembro, com a presença do Major Augusto. Nos reunimos com os detentos, responsáveis pela área jurídica de cada galeria, para que juntos pudéssemos debater o tema “O tempo razoável do Processo Penal” com a advogada criminalista, Karla Sampaio (foto). Foram muitos questionamentos e manifestações de insatisfação em relação ao trabalho da mídia quando estende a pena à família do preso. Confesso que saí de lá muito feliz, por saber que de alguma maneira o Jornal Estado de Direito poderá oportunizar essas atividades.
Tendo consciência da dificuldade de cativar pessoas para um trabalho voluntário, faço aqui o convite para que participem! Todas as atividades serão controladas para que, posteriormente, recebam certificado contendo as palestras e atividades das quais colaboraram. Ao apresentar a idéia para um grupo de amigos, um deles perguntou “O que você ganha com isso?”, imediatamente sorri e disse, humanidade, conhecimento, o sentir o outro. Percebi na pergunta que, necessariamente, para me dispor a fazer um trabalho como esse, teria que ter algum estímulo externo… A experiência de conviver com realidades, mundos tão diferentes, dão o tom ao Direito que precisamos.
As razões que movem a minha sensibilidade e que ilustram as páginas do Jornal com belas fotografias são frutos da importância em alongar o passo de projeção, pois considero que diagramar é a arte de dar vida aos textos. Toda vez que escrevo tenho que pensar como dizer de maneiras diferentes porque devemos insistir na necessidade de popularizar o Direito.
Vejo o papel do Jornal Estado de Direito como um grande potencializador da palavra, das idéias, da cidadania e principalmente do resgate do “sentir” o direito como parte da nossa cultura. Fico feliz em ver que a cada edição contamos com mais articulistas que nos ajudam semeando idéias e expressões, dando sentido para um direito que ainda é muito artificial.
Encerro agradecendo a todas as empresas que manifestadamente expressam o seu compromisso com o futuro do Direito e consequentemente com o futuro da humanidade investindo no conhecimento. Enquanto tivermos a capacidade para pensar, nós não estaremos presos, nosso maior patrimônio está dentro de nós, basta ativá-lo.
*Editora responsável pelo Jornal Estado de Direito. Mestranda em Direitos Sociais e Políticas Públicas pela UNISC. www.twitter.com/carmelagrune