Os posicionamentos de Ives Gandra Martins da Silva Filho
No final deste mês de fevereiro (25/02), o Ministro Ives Gandra Martins da Silva Filho tomou posse como presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Três dias depois, em entrevista a jornal de grande circulação no país, deu declarações que assustaram toda a sociedade, inclusive, os próprios juízes do trabalho, organizados na Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA).
Os posicionamentos do Presidente do TST causaram no mínimo estranheza, por externar uma forte carga ideológica, contrária às funções da Justiça do Trabalho. O Ministro Ives Gandra defendeu a flexibilização das leis trabalhistas e a terceirização das atividades fins das empresas.
A Constituição brasileira estabelece como fundamento da República os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa. Há de existir uma relação que componha estes valores. Principalmente em momentos de crise, que as partes mais vulneráveis são atingidas com mais força, requerendo um papel firme das instituições.
O trabalho é um direito social (art. 6º, da CF) e logo a justiça que tem o papel de resguardá-lo, terá a frente, agora, pessoa com entendimento de que haveria uma conduta “paternalista”, em prol dos trabalhadores.
A defesa feita pelo Presidente do TST, de se delegar os direitos trabalhadores, cada vez mais à esfera da negociação coletiva entre estes e as empresas, significa também abrir mão de uma competência constitucional da Justiça do Trabalho (art. 144, da CF). Mas além disso, demonstra um pensamento, no mínimo, temerário, tendo em vista o quadro atual de crise econômica vivenciada e, mais, a condição de desigualdade entre as partes envolvidas.
A ANAMATRA se contrapôs de maneira firme em relação a isso, afirmando em sua nota:
“Redução, derrogação ou negociação prejudicial de direitos trabalhistas, pela via negocial coletiva, somente está autorizada nos estreitos limites daquilo que foi excepcionado pela Constituição Federal. Qualquer passo em outro sentido tende a ser, na prática, retrocesso social eivado de desconformidade constitucional e convencional”.
Sobre a terceirização de atividade fim, isto significa reforçar um mecanismo, infelizmente, utilizado por certos empregadores, para dificultar a prova da relação de trabalho e terminar por fugir de suas obrigações perante as trabalhadoras e os trabalhadores. Esta defesa vinda de certos setores econômicos é até compreensível, embora não se disfarce a evidente má-fé. Contudo, tal declaração partir da maior representação da Justiça do Trabalho no país, é preocupante.
As relações de trabalho
A ANAMATRA está correta em afirmar em sua nota que as declarações do Presidente atraem “ranço de preconceito” e que servem para enfraquecer a imagem da Justiça do Trabalho, especialmente, quando criticou as indenizações na esfera trabalhista. O Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho é claro ao dizer que é de competência do Presidente zelar pelas prerrogativas e pela imagem pública do Tribunal e dos Ministros (art. 35, X).
O Brasil ainda é um país de muitas desigualdades sociais. E isto se reflete também nas relações do trabalho. Negar isto é negar a realidade. Ou é se colocar ao lado dos que concentram poder econômico, não contribuindo para superação destas desigualdades e para efetivação de direitos.
Há muita precarização nas relações de trabalho. Por motivos diversos, a fiscalização não alcança de forma mais contundente este problema. Ainda há aqui no país diversas denúncias de trabalho escravo e análogo a escravo. São diversos “brasis”, em que as ideologias do “desenvolvimentismo” e/ou do “livre mercado” ajudam a justificar a exploração e a violação de direitos. Assim, flexibilizar, fragilizar ou precarizar, neste contexto, podem significar a mesma coisa.