O concurseiro – aqui entendido como aquele que se prepara para prestar concursos públicos – sofre! O concurseiro é aquela pessoa que, para dedicar-se aos estudos visando ingressar na carreira pública, restringe (ou mesmo abdica) a convivência com entes queridos; os momentos de lazer; o tempo de sono, entre outros. Indivíduo que por vezes enfrenta o desafio de estudar após uma longa jornada de trabalho ou que lida com a falta de recursos financeiros decorrentes da “opção de apenas estudar”.
Ao concurseiro – que, na visão deste que vos escreve, realiza trabalho hercúleo – não são impostos “apenas” complexos certames seletivos, eliminatórios e classificatórios, mas, por vezes, também, pesados abalos morais e materiais em razão da má prestação de um serviço público que ocasiona a necessidade de anulação de um concurso – que, em um exercício imaginativo, seria comparável a obrigar Hércules a enfrentar a Hidra de Lerna (um mostro de várias cabeças) de mãos nuas. A frustração em questão, diferente da comparação com os trabalhos do Herói Grego, ultrapassa as barreiras da imaginação, ou da mitologia, e configura uma realidade sensível.
Na data de 26 de abril de 2016, por exemplo, o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região decidiu pela anulação da prova objetiva seletiva do Concurso para o Cargo de Juiz Substituto. No Aviso nº 14/2016, o respectivo Tribunal aclarou que a decisão deu-se:
“(…) por ter sido constatado prejuízo ao princípio de isonomia entre os candidatos, diante da concessão de 10 minutos de tempo adicional pela Comissão Examinadora, sem a devida comunicação aos candidatos que prestavam provas nos Prédios 6 e 14 da PUCMINAS; por ser constatado que, dentre as 100 questões elaboradas, pelo menos 26, em tese, não aferem o real conhecimento dos candidatos, considerando-se 12 contrárias ao art. 36 da Resolução 75/2009 do Conselho Nacional de Justiça e ao item 10.4, do Capítulo X do Edital (questões de nº 7, 11, 18, 25, 32, 36, 51, 56, 57, 81, 86 e 87), 11 questões com conteúdo semelhante às do Concurso de 2010 (questões nº 6, 10, 15, 28, 29, 35, 40, 70, 71, 72 e 98), e 3 questões alteradas após o transcurso de 1h30min de prova (questões 24, 60 e 65), sem o correspondente aviso em todas as salas.”
Aqui, para fins de evitar-se qualquer interpretação equivocada: não se pretende uma crítica a atuação do Excelentíssimo Senhor Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região e da Comissão do Concurso Público 01/2015 – que decidiu pela anulação de uma prova objetiva seletiva que, “além de recheada, foi coberta de defeitos”. Muito pelo contrário: a decisão, salvo melhor juízo, foi a mais acertada possível!
A questão é: como pode o Estado realizar de forma tão “defeituosa” um concurso público para um dos cargos de maior relevância em nossa sociedade? Observe-se que o Presidente do Tribunal do Trabalho identificou ao menos 26 questões (de um total de 100) que não se prestavam a aferir o conhecimento dos candidatos, sendo que muitas destas nem sequer respeitavam a Resolução 75/2009 do CNJ e o próprio Edital do concurso. E, recorde-se: o concurso público consiste em um serviço por parte do Estado! Quando pergunta-se: e o respeito com o concurseiro?
Por certo a grande maioria dos que prestaram o concurso devem ter se sentido ofendidos, pois toda sua dedicação aos estudos foi “recompensada” com um certame que – de tão “torto” – teve a “prova objetiva seletiva” anulada. E, aqueles que – possivelmente mesmo enfrentando dificuldades financeiras – investiram em cursos preparatórios e nas famosas (e por vezes custosas) revisões de véspera? E mais: qual a sensação daqueles que, para realizar a famigerada prova objetiva, arcaram com elevados custos de passagens aéreas, hospedagem, transporte e alimentação?
Tratar-se da sensação alheia é exercício arriscado (ou até mesmo desmedido), razão pela qual tem-se por aqui focar nos prejuízos materiais sofridos por alguns dos participantes de concursos públicos que se deparam com a anulação ou cancelamento de provas ou de concursos. Podem os candidatos buscar a reparação pelos danos sofridos? O poder judiciário manifesta-se reiteradamente no sentido de ser possível o pedido de reparação pecuniária por abalos materiais! Inclusive, em caso recente, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, no processo nº 71005667878, condenou uma “organizadora” de concurso público a indenizar uma candidata, em razão do cancelamento do certame, pelas “milhas de programa de fidelidade com companhia aérea” despendidas.
Assim, que o concurseiro saiba: a anulação ou cancelamento de parte, ou de todo, de um concurso público implica no dever, do responsável pelo fato, de reparar os danos sofridos. Se não há respeito, ao menos há o direito de reparação pecuniária…