Direito: promessa de paixão na era Contemporânea

Artigo veiculado na 27ª edição do Jornal Estado de Direito, ano IV, 2010

 

Sergio Ricardo Fernandes de Aquino*

O momento presente denota uma perspectiva que nos permite refletir sobre o significado de Ser humano, qual seja, a ausência do Outro. A vida e seus múltiplos significados, aos poucos, esmaecem diante da perda de interações entre as pessoas. Essa condição exige uma postura crítica nesse cenário que descaracteriza aquilo que nos une e possibilita alcançar outros patamares civilizacionais.

Foto: Carlos Bailon

Foto: Carlos Bailon

O Direito aparece como fenômeno humano capaz de integrar os indivíduos, organizar a vida – individual e/ou coletiva -, bem como proteger essa manifestações. Entretanto, com a perda de determinados valores nos quais orientam a conduta das pessoas, o Direito perde essas características. Percebe-se que o Ser humano não se torna a fonte de sua preocupação ou criação. Essa postura é assumida por outra entidade também elaborada pela cultura: a Economia.

Segundo uma Economia Neoliberal, não existe ponderação entre os meios e fins da ação humana, especialmente quando essa é provocada pelo Direito. Não se percebe a diferença entre valores fundamentais e instrumentais. A Economia, segundo o pensamento do filósofo alemão Max Scheler, insere-se nos valores instrumentais.

Todavia, nosso estilo de vida influenciado pelo alto consumo – mesmo os seres humanos podem se tornar objetos mercantis – e o endeusamento do interesse particular dificultam a execução da finalidade do Direito para servir como elemento de resistência contra essa força na qual corrompe ao invés de auxiliar os Cidadãos e os Estados a promoverem a paz e o desenvolvimento integral de seus personagens.

Alie-se a essa fragilidade outra perspectiva igualmente preocupante: a falta de Operadores do Direito (Juízes, Promotores, Advogados) e Juristas (Acadêmicos) nos quais enfrentem esse debate com a seriedade e profundidade necessárias diante de uma realidade que, cada vez mais, se torna complexa.

Essa exigência de compreensão requer um diá- logo, no mínimo, interdisciplinar para se visualizar as conexões teóricas e práticas entre o Universo Jurídico e os demais ramos do conhecimento a fim de trazerem à Sociedade respostas satisfatórias para os conflitos que aparecem diante de cada Bacharel em Direito.

A partir desse cenário indaga-se: o incremento da violência, as perdas de identidades e identificações, a ausência de preocupação do Estado com o Cidadão e a distância do Cidadão com os questões públicas são elementos nos quais estão presentes nos debates do Direito com outros ramos do conhecimento? A resposta parece, em parte, negativa.

Visualiza-se a necessidade de um Direito preocupado não apenas com suas técnicas e os efeitos de sua clausura dialogal. O Século XXI evidencia a procura de outro modo de viver além deste que privilegia a sobrevida. As pessoas voltam a se tornar o fundamento de preocupação dessas instituições nas quais existem para preservar aquilo que evidencia nossa capacidade de CON-vivermos e criarmos os meios e espaços para uma vida pacífica.

A crítica para a existência de um Direito adequado ao nosso tempo precisa confrontar seus modos de existência, especialmente quando criou a ilusão de que a Lei é sinônimo de Direito, é eterna e, ainda, tem a pretensão de ser a tábua de salvação da humanidade.

Entretanto, para que a crítica seja construtiva e traga novos horizontes para se DES-cobrir os novos arquipélagos de esperança, ao rememorar as lições do Professor Joaquim Herrera Flores, é necessário que os Operadores do Direito e os Juristas saiam do Monte Olimpo e enxerguem o que é o Ser humano: imperfeito e finito. Essa tarefa é árdua e não se coaduna com a estagnação mental produzida por práticas burocráticas viciosas dos escritórios de advocacia, dos gabinetes de juízes e promotores e, também, de professores que não se preocupam com os efeitos desse cenário à formação e educação dos novos bacharéis.

A compreensão dos novos significados da vida cotidiana que demandam proteção do Direito está além daqueles modelos de Estado, Economia e, especialmente, participação das pessoas nas demandas públicas, que insistem em se caracterizar como eternos e impedir o desenvolvimento humano.

As barreiras territoriais estão desaparecendo e as comunidades se unindo – muito embora ainda se prevaleçam os laços obrigacionais e econômicos – e a tecnologia, ao mesmo tempo, nos unem e se torna nosso novo oráculo. Surge, aos poucos, um sentido de Fraternidade que acolhe o Outro como seu complemento. A diferença se torna o ponto central de um Estado democrático.

Se o Direito não acompanhar, inclusive sob seu caráter de Ciência, as mudanças nos quais ocorrem todos os dias desse novo século, questiona-se: o que ele pretende proteger? A vida e os meios de integração humana? Acredita-se pouco provável, pois, relembrando o Professor Dr. Luis Alberto Warat, esse “Direito” torna-se tão-somente uma promessa de paixão, ou seja, algo que não pode ser cumprido porque esqueceu-se do ponto central de sua existência: a Condição (dialogal) Humana.

 

*Doutorando e Mestre em Ciências Jurídicas pela UNIVALI.

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