Dignidade da pessoa humana: programa Mais Médico

Edison Tetsuzo Namba

 

Vida e dignidade

A existência da vida é pressuposto para a dignidade. Sem vida, não há dignidade. Ela é essencial para sua concreção. Existe dificuldade em se saber o início da vida. Para alguns, ela existira com a união dos gametas feminino e masculino; para outros, com o nascimento com vida; há, ainda, os que acreditam num desenvolvimento de fases para saber-se quando a vida começa.

Foto: Unsplash

Saber quem é a pessoa humana contemplada na Constituição Federal, art. 1º, inciso III, é outra controvérsia. Para os conservadores, pessoa, num sentido amplo, já existira com a concepção, no corpo da mulher ou fora dele. O embrião pré-implantatório seria intocável. Os liberais acreditam na disposição do embrião naquela condição, pois ainda não foi inserto no corpo de alguém do sexo feminino. Essa vertente subdivide-se: a) há os que defendem o manuseamento pleno e b) apenas até o 14º dia útil.

Tendo sido inserta na Carta Magna, a dignidade da pessoa humana é um princípio geral de direito, precisa ter concretude. Em si, é um conceito legal indeterminado ou, para quem prefere conceito jurídico indeterminado. Em sendo assim, deve-se completar seu conteúdo para saber-se quando se está diante dela.

A dignidade é notada quando se tem todos os direitos e garantias preservados, tais como a honra, a imagem, a intimidade, o labor, o lazer, a privacidade, a saúde, a segurança dentre outros. Existe uma sistemática constitucional e infraconstitucional a possibilitar o nascer, crescer e desenvolver do ser humano.

Programa “mais médico” e a dignidade da pessoa humana

A fim de se assegurar um desses direitos, criou-se o programa “mais médico”. A justificativa da contratação, principalmente de cubanos, era expandir o atendimento daqueles que necessitavam de assistência a sua saúde, pois não havia médicos brasileiros para tanto. Seriam localidades distantes ou de difícil acesso.

Gradativamente, esses profissionais estrangeiros vieram ao nosso país e ganhavam um valor relativamente satisfatório, pouco mais de R$ 11.000,00, quantia almejada por muitas pessoas no Brasil, face à má remuneração de muitos postos de atendimento e hospitais.

Recentemente, verificou-se que a realidade não era bem assim. Os cubanos vinham para o Brasil e deixavam a maior parte do que ganhavam com Cuba. Ficavam com aproximadamente 30% do que auferiam. Situação que se aproximava à escravidão, pois tinham de ajudar suas famílias e sustentarem-se aqui.

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Com a saída deles daqui, outra constatação foi feita: havia médicos interessados em trabalharem nos lugares por eles ocupados. Em pouco tempo, preencheu-se a lacuna deixada pelos cubanos. Isso mostra que havia uma demanda contida. Médicos brasileiros estavam esperando uma oportunidade para serem inseridos no mercado de trabalho, seja onde fosse. Não se olvide, há aproximadamente 12 milhões de brasileiros desempregados.

Algumas faculdades e universidades, sensíveis a esse contexto, anteciparam formaturas, para possibilitar que os recém-formados tivessem chance de inscreverem-se no programa antes ocupado por não brasileiros.

Ocorreu uma triste experiência. Sob o pretexto de levar a saúde, e assim efetivar o princípio geral da dignidade, para várias pessoas em lugares, por vezes, longe e inacessíveis, houve detrimento de outros indivíduos que vieram ao Brasil e esperavam ajudar, pelo contrato assinado no país de origem. Eles ficaram numa situação paupérrima, próxima à escravatura, com receio dos governantes do país donde vinham, porquanto poderiam sofrer represálias.

Numa sociedade pós-contemporânea, onde se discute sobre a inteligência artificial, nanotecnologia, investigação de outros mundos (Marte, exemplificativamente), não se pode tolerar mais esse tipo de contratação.

 

Conclusão

A dignidade da pessoa humana pressupõe a vida. Sem vida não há dignidade, sem dignidade, não há vida.

Ela, em si, é um conceito jurídico, ou legal, indeterminado, em termos abstratos, um princípio geral de direito, deve ter concretude, ser dinamizada.

Um dos direitos que auxilia na dignidade é o direito à saúde. Sem médicos, enfermeiros, enfim, profissionais preparados, com aparelhos, tecnologia e medicamentos adequados não há possibilidade de desenvolvimento com qualidade de existência.

Todavia, sacrificar outras pessoas para obter-se esse direito não cabe mais nos dias hodiernos, onde se mira anseios mais elevados, desconformes com pagamentos ínfimos e escravocratas.

A bioética é importante nesse momento, em que se concilia o bem estar com a “pseudo-autonomia” das pessoas, quando elas não têm possibilidade de opinarem sobre o destino de seus ganhos. Isso não pode ser aceito passivamente. Deve haver consequências para os países e seus governantes.

 

Edison Tetsuzo Namba
Edison Tetsuzo Namba é  Articulista do Estado de Direito. 50. Juiz de Direito em São Paulo. Mestre e Doutor em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Docente Formador da Escola Paulista da Magistratura (EPM). Docente Assistente da Área Criminal do Curso de Inicial Funcional da Escola Paulista da Magistratura – EPM (Concursos 177º, 178º, 179º e 180º). Docente Civil da Academia de Polícia Militar do Barro Branco (APMBB). Docente Civil da Escola Superior de Sargentos. Representante do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo no Comitê Regional Interinstitucional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas – São Paulo. Membro do Instituto de Direito de Família. Autor do livro Manual de bioética e biodireito, São Paulo: Atlas, 2ª ed. 2015.

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