No dia 21 de julho, a Corte Europeia de Direitos Humanos (CtEDH) emitiu seu julgamento no caso Kulinski e Sabev v. Bulgária, no qual decidiu que a proibição geral e automática ao direito de voto dos presos na Bulgária é medida desproporcional que viola os direitos humanos. Relevante notar que a Constituição do Brasil, em seu artigo 15, inciso III, também proíbe os condenados por sentença criminal transitada em julgado de votar enquanto durarem os efeitos da condenação. Essa proibição é similar àquela declarada ilegal pela CtEDH.
Os autores do processo são dois nacionais da Bulgária: Krum Kulinski e Asen Sabev. Condenado por vandalismo, Kulinski cumpriu pena entre 6 de novembro de 2008 e 30 de dezembro de 2009. Condenado por roubo e homicídio em 2003, Sabev está cumprindo uma sentença de prisão perpétua, com possibilidade de comutação. Enquanto ambos estavam detidos, eleições para congressistas do Parlamento Europeu e do Parlamento Búlgaro ocorreram. Contudo, de acordo com a Constituição da Bulgária, todos os prisioneiros do país não possuem direito de voto enquanto estiverem cumprindo pena, de forma de nenhuma urna de votação esteve disponível para Kulinski e Sabev na penitenciária.
Diante disso, eles iniciaram uma ação contra a Bulgária na CtEDH pretendendo a revogação do dispositivo constitucional que impede o exercício do direito de voto por condenados no território búlgaro. Segundo eles, a Constituição búlgara viola o artigo 3º do Primeiro Protocolo Adicional à Convenção Europeia de Direitos Humanos, que afirma o seguinte: “As Altas Partes Contratantes obrigam-se a organizar, com intervalos razoáveis, eleições livres, por escrutínio secreto, em condições que assegurem a livre expressão da opinião do povo na eleição do órgão legislativo”.
Em seu acórdão, a CtEDH determinou que a lei constitucional em questão constitui uma limitação ao direito de voto das pessoas detidas na Bulgária. Para tanto, ela passou a analisar se o referido diploma legal respeita os critérios de legalidade a serem observados nos casos de limitações ou restrições do exercício de direitos humanos.
Estado de Direito
Primeiramente, a Corte destacou que a proibição ao voto de prisioneiros na Bulgária foi adotada com o propósito legítimo de promover o Estado de Direito e a responsabilidade cívica dos nacionais búlgaros. Contudo, a CtEDH concluiu que limitação ao voto imposta pela Bulgária é desproporcional em relação aos objetivos que ela pretende alcançar. A decisão observou que a suspensão do direito ao voto dos penitenciários ocorre por meio de uma proibição geral e inequívoca, que é aplicável a todas as pessoas condenadas e que se encontram em detenção.
A Corte observou que a lei interna da Bulgária obsta o direito ao voto de pessoas condenadas independentemente das circunstâncias individuais de cada um dos detidos e ignorando outros elementos relevantes como a conduta dos condenados e a gravidade das infrações cometidas. Em resumo, a Bulgária impôs uma proibição geral, automática e indiscriminada do direito humano ao voto de pessoas detidas, fato que torna essa medida inegavelmente desproporcional e, portanto, ilegal.
Brasil
No Brasil, o artigo 15, inciso III da Constituição de 1988 também possui uma proibição ao voto demasiadamente genérica e inequívoca. Esse dispositivo impede o voto de pessoas condenadas a todos os tipos de infração legal de natureza penal, seja crimes dolosos, culposos e até mesmo contravenções penais. Essa proibição alcança, assim, toda e qualquer condenação criminal definitiva, sendo que seus efeitos se limitam ao período de duração das respectivas penas (Cf. CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional, 14ª ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2008, p.830-831).
Aplicando a decisão proferida no caso Kulinski e Sabev v. Bulgária ao artigo 15, inciso III da Constituição de 1988 concluiu-se que esse dispositivo é também desproporcional e, assim, ilegal à luz do direito humano ao voto.
De forma similar à Constituição búlgara, a Carta Magna brasileira também impõe uma proibição ao voto automática e indiscriminada, aplicável a todos aqueles que sofreram uma condenação criminal com trânsito em julgado, pelo tempo que essa condenação estiver surtindo efeito. A Constituição de 1988 não faz qualquer distinção no tocante às circunstâncias individuais de cada um dos condenados.
Autor: Bruno de Oliveira Biazatti
Fonte: Centro de Direito Internacional