Coluna Assédio Moral no Trabalho
Ainda sobre Bullying e aprendizado: a responsabilidade do professor na humilhação social entre os alunos
Já debatemos o fenômeno Bullying como violência física ou verbal, repetitiva e intencional entre crianças e adolescentes, em sede escolar. (1)
Prontamente discutimos o fenômeno Bullying como distorcida ferramenta pedagógica manejada por docentes numa hipotética busca da perfeição e virtuose.
Neste ínterim, questionaremos a qualidade da relação professor-aluno como estratégia de enfrentamento do Bullying.
Em primeiro, imprescindível recordar-se que, independentemente de qualquer finalidade pedagógica, de fato há crianças e adolescentes que são humilhados pelos próprios professores.
Está-se a afirmar que, inúmeros educadores restam por comportarem-se imoralmente perante os educandos.
Assim, inseridos num contexto geral, praticam o Bullying, ignorando a violência praticada, a humilhação social sofrida e a vitimização de seus alunos.
Por infelicidade, o status de docente não obstaculiza um comportamento assediador. Neste sentido:
“Ou ainda, como nos conta com tristeza uma amiga que assistia à aula de certo professor que, num dado momento, visando obter atenção e ‘amizade’ da turma, dirige-se a uma aluna vestida de roxo, cuja diferença em termos de massa corporal era notória (chamada literalmente de gordinha), dizendo: ‘Oi hematoma gigante’. O que dizer de situações como esta?” (2)
Não se cuidará todavia, desta peculiar situação mas sim, da violência advinda dos professores para imposição das regras escolares e coibição da indisciplina e como este referencial reflete-se nas relações entre os próprios alunos.
Um terror psicológico sobrevindo daqueles que deveriam intervir moralmente e prosseguir na inserção destes educandos nos valores éticos, seguramente, repercute no Bullying.
Acossos tendentes a disciplinar alunos – castigos, expulsões de sala de aula, admoestações etc. – são elementos a ponderar-se quando se analisa o cenário seguinte do Bullying entre pares. Neste sentido:
“Fica evidente pela análise dos resultados encontrados que meninos e meninas, quanto mais evoluem para não considerar a regra em função da autoridade, e portanto, a não legitimar as ações da autoridade como sempre justas, mais apontam para uma violência escondida: o desrespeito advindo das figuras de autoridade. No nono ano as respostas atingem a maior expressão: são 26,96% de sujeitos que às vezes se consideram desrespeitados por seus professores.” (2)
Não se ignora a complexidade do tema. Questionar-se contudo, o relacionamento docente-discente e seu impacto no fenômeno do Bullying é cogente para um exame mais exaustivo.
Com efeito, tem-se uma integração assimétrica de poder pautada, por vezes, num modelo referencial de superioridade, intimidação, prepotência e intranquilidades em geral.
O exercício do controle para manter o “bom comportamento”, a estigmatização de alunos ou toda uma classe como problemática, a autoridade repressiva, a incursão do medo etc. não se coaduna com um moderno processo de aprendizagem.
Descortina-se um ambiente violento que, por óbvio, não se encerra na exclusiva socialização professor-aluno.
Indagar-se sobre a verdadeira função do professor em sala de aula e seus desafios laborais é fundamental para um discurso pedagógico. Quebrar tabus relacionados a rigidez, hierarquia e disciplina também. Tudo com vistas a consequente visão sobre o fenômeno do Bullying. Neste sentido:
“A prevenção pode ser iniciada por meio da capacitação dos profissionais, com o objetivo de compreender o bullying, bem como o conhecimento de estratégias de intervenção e prevenção, tais como: refletir sobre os valores humanos como ética, cidadania e moral; valorizar o diálogo, respeito e as relações de cooperação; criação de um serviço de denúncia de bullying; criação de um estatuto contra o fenômeno; e encontros com a família.” (3)
O ensino escolar presta-se à edificação de um indivíduo desenvolvido cognitiva e afetivamente. Em ambiente democrático, solidário, instigante, que dialoga com questionamentos não somente o processo de aprendizagem é bem sucedido como também, a socialização vê-se positivada, reduzindo a possibilidade de destrutivos comportamentos assediantes, de quem quer que seja.
REFERÊNCIAS:
(1) O fenômeno bullying principiou a ser estudado na década de 1970 pelo pesquisador sueco Dan Olweus.
(2) Tognetta, L. R. P., & Vinha, T. P. (2010). Até quando: bullying na escola que prega a inclusão. Educação, 35(3), 449-464.
(3) Toro, G. R. R., Neves, A. S., & Rezende, P. C. M. (2010). Bullying, o exercício da violência no contexto escolar: reflexões sobre um sintoma social. Psicologia: Teoria e Prática, 12(1), 123-137.
Ivanira Pancheri é Articulista do Estado de Direito, Pós-Doutoranda em Direito Penal pela Universidade de São Paulo (2015). Graduada em Direito pela Universidade de São Paulo (1993). Mestrado em Direito Processual Penal pela Universidade de São Paulo (2000). Pós-Graduação lato sensu em Direito Ambiental pela Faculdades Metropolitanas Unidas (2009). Doutorado em Direito Penal pela Universidade de São Paulo (2013). Atualmente é advogada – Procuradoria Geral do Estado de São Paulo. Esteve à frente do Sindicato dos Procuradores do Estado, das Autarquias, das Fundações e das Universidades Públicas do Estado de São Paulo. Participa em bancas examinadoras da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo como Professora Convidada. Autora de artigos e publicações em revistas especializadas na área do Direito. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Penal, Processual Penal, Ambiental e Biodireito. |
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