Artigo veiculado na 26ª edição do Jornal Estado de Direito, ano IV, 2010.
Bruno Espiñeira Lemos*
O jornal britânico The Guardian em sua edição de 21 de julho próximo passado, nos fez lembrar de um evento histórico que terá lugar no dia 28 de julho deste ano de 2010, na ONU, e que tratará do “direito humano à água”.
O referido debate ocorrerá em virtude de uma resolução apresentada em 17 de junho à ONU pelo embaixador da Bolívia na referida organização, apoiada por 23 (vinte e três) outros países, na qual se pretende ver discutida e aprovada dita proposição na qual reconhece o direito de acesso à água potável e ao saneamento, como um direito humano fundamental.
O referido artigo aponta para um cenário mundial no qual cerca de 2 bilhões de pessoas vivem em áreas de carência de água no mundo, assim como 3 bilhões delas não tem água encanada a menos de um quilômetro da sua moradia. Soma-se ao cenário composto no periódico, a morte de uma criança a cada oito segundos em virtude de doenças provocadas por água de má-qualidade ou mesmo por sua própria falta, fenômenos estes perfeitamente evitáveis se suas famílias pudessem “pagar” por água limpa. Ali se faz contar também a informação de que recente relatório do Banco Mundial, prevê que no ano de 2030, a procura por água no mundo irá exceder a oferta em mais de 40%, a predizer um “sofrimento terrível” e eu diria a mais, para grande parcela da humanidade.
O problema ao que se pode perceber de modo claro é o foco de mercadoria que ainda se direciona à água no mundo. Nesse diapasão, todas as soluções e decisões de órgãos como o próprio Banco Mundial, o Conselho Mundial da Água e da Organização Mundial do Comércio trazem ínsitas ou diretamente soluções de mercado. E os países “desenvolvidos” que tanto defendem a alimentação, a “segurança alimentar” como um direito humano universal, esquecem que o direito à água engloba aquele direito e se faz mesmo ainda mais importante.
A água como propriedade pública deve servir de paradigma para todas as nações desenvolvidas, em desenvolvimento ou mesmo em situação de desenvolvimento vulnerável. Mais que uma simples necessidade, a água é um direito natural, um direito inato de todos os povos, pois a água compõe a vida e a sua própria fonte. A humanidade deve caminhar no sentido de afastar da água, o componente de mercadoria que somente interessa e é imposto por poucas e grandes corporações que influenciam governos.
Enfim, a água cada vez mais se torna uma fonte gigantesca de poder. A evolução e a segurança da própria humanidade tornam imperioso que o controle dos recursos hídricos, aqui se considerando a água e o próprio saneamento básico, saiam das mãos de poucos, para que possam seguir como bem pertencente a todos, blindados contra qualquer forma de apropriação que não seja em benefício da própria humanidade assim considerada.
* Advogado. Procurador do Estado da Bahia. Mestre em Direito – UFBa. Doutorando em Direito – UBA. Prof. Direito Constitucional. Ex-Procurador Federal.