As sedes do Poder Judiciário
Existem lugares nas cidades os quais as pessoas certamente prefeririam não frequentar, caso essa fosse uma opção. Não se pode imaginar que uma pessoa em sã consciência queira procurar a sede de um hospital para passar seus momentos de ócio ou descanso, a não ser que estejamos falando de voluntários que buscam esses lugares para um propósito despojado de visitar aqueles que, por estarem ali, acabam não recebendo a visita de mais ninguém, o que apenas comprova a hipótese levantada. O mesmo se pode dizer dos velórios, dos aterros sanitários, das cadeias públicas e de muitos outros lugares que a nossa memória talvez nos esteja ajudando a lembrar.
Lugares como tais, que não costumam receber frequentadores voluntários, a não ser que ali trabalhem, são as sedes do Poder Judiciário; os fóruns e Tribunais. Os prédios que abrigam as diversas Justiças do país são locais para onde vão apenas cidadãos que buscam solução para alguma mazela que acometeu a si próprio e à sociedade, em algum instante da vida. Estudos procuram mensurar qual o nível de c
onfiança da população nas instituições judiciárias, como é o caso da Fundação Getúlio Vargas e seu ICJBrasil – Índice de Confiança na Justiça Brasileira – pesquisando qual o nível de confiança que o cidadão deposita na instituição judiciária e no cumprimento de seu papel.
O aumento da litigiosidade, a preocupação por dotar outras instituições públicas ou privadas do poder de solucionar contendas, com o fito de mitigar o impacto do crescente número de processos que diariamente são apresentados aos julgadores, a exposição cada vez mais frequentes de Delegados, membros do Ministério Público, Advogados, Magistrados na mídia indica que a população, cada vez mais, busca solução para seus problemas nas barras dos tribunais.
Com isso, não há como negar que os Tribunais, incluindo no termo todos os representantes do Poder Judiciário e os demais atores que ali trabalham, trazem em seu múnus uma importante função na sociedade contemporânea.
A função dos Tribunais na sociedade

Boaventura de Sousa Santos
Esse papel é estudado com muito cuidado pelo Professor português Boaventura de Sousa Santos (Os Tribunais nas Sociedades Contemporâneas – O Caso Português), que coordenou o trabalho de Maria Manuel Leitão Marques, João Pedroso e Pedro Lopes Pereira e mostrou que hoje em dia o Poder Judiciário tem assumido a importante função de protagonismo político, trazido a reboque de uma inconteste visibilidade social.
Mais interessante é notar que isso pode ser considerado inédito em relação a participação social do Poder Judiciário. A história recente de tal Poder não indica a influência tão próxima de Magistrados no cenário político e social como se vê nos dias atuais.
O Professor Boaventura e os autores por ele coordenados, deixam claro que:
“(…) um pouco por toda a Europa e por todo continente americano, os tribunais, os juízes, os membros do Ministério Público, as investigações da polícia criminal, as sentenças judiciais surgem nas primeiras páginas de jornais, nos noticiários televisivos e são tema frequente das conversas entre cidadãos.”
(Na obra, os autores citam a expressão Magistrados do Ministério Público, talvez por uma diferença de organização judiciária existente entre Brasil e Portugal).
Os Tribunais atuais
Não se nega que os tribunais sempre tiveram uma ou outra forma influir na sociedade, onde suas decisões eram tomadas, mas dois aspectos diferenciam aqueles tempos dos modernos. O primeiro é que antigamente tais decisões se destacavam pelo seu conservadorismo, por evitar tocar mérito mais progressistas e pela incapacidade de acompanhar processos mais inovadores de transformação social, econômica e política. O segundo é que as intervenções foram bem mais esporádicas no passado.

Hoje em dia questões como legitimidade, capacidade e principalmente a independência do Poder Judiciário são defendidas de uma maneira mais veemente, ainda que mantida alguma timidez, perante os outros dois poderes, como forma de confrontar eventuais desmandos do poder soberano, a coisificação do indivíduo, o fomento da pobreza pelo populismo, ganhando maior forma o que se chama de judicialização dos conflitos políticos.
Os pesquisadores que se interessam pelo estudo jurídico, social, político e econômico não devem se enganar e notar que os rostos de Magistrados, membros do Ministério Público, Advogados, Autoridades Policiais cada vez mais constantes nas capas de jornais e revistas são sinais de uma comoção social importante e marcante nos tempos dessas ciências.
Viver esses tempos com consciência do processo social que se apresenta é não deixar passar despercebido a mudança de paradigma que se descortina não só no Brasil, mas também em todo o mundo moderno que conosco compartilha traços científicos e culturais.