Jornal Estado de Direito
O nome é um diferenciador entre as pessoas e é um dos atributos dos direitos da personalidade que toda pessoa tem. Afinal ele é um marco na vida da criança, e via de regra, ira acompanha-la durante toda a sua vida.
Dar o nome ao filho ou a filha muitas vezes significa homenagear pessoas queridas – como parentes avó e avô – ou como personalidades de destaque (jogador de futebol, cantora, etc.). E temos ainda a criatividade para compor nome dos filhos com a junção do nome da mãe com o nome do pai. Já vi até o pai dar nome da filha da sua primeira namorada… Mas, vingar-se da mãe colocando o nome de anticoncepcional na filha é uma novidade. E bem ofensiva.
No caso específico o pai saiu para registrar a criança com um nome acordado entre ele e a mãe, contudo quando o pai chegou no cartório colocou o nome de Diane – que e o nome do anticoncepcional que a mãe da criança tomava e mesmo assim ficou grávida. Pois acreditava que a mãe tinha parado de tomar o anticoncepcional para engravidar.
Primeiro ponto e um alerta para todos: Nenhum anticoncepcional é um método 100% garantido, isso significa dizer que mesmo seguindo todas as orientações médicas, na forma correta, a mulher ainda assim pode engravidar. Isso porque, mesmo sendo um método seguro a efetividade e de 99%, ou seja, não é 100% – e isso significa que alguém – mesmo tomando a pílula direitinho irá engravidar.
Segundo ponto: Se o homem não quiser ser pai, que ele também tome as providências cabíveis para isso, pois para ocorrer uma gestação é preciso ter duas pessoas… Qualquer um que não se cuidar, corre o risco de engravidar e ser pai, mesmo “sem querer”.
Terceiro ponto: Qualquer que seja o caminho escolhido pelos pais, a criança não é responsável por isso e não pode ser penalizada.
O Superior Tribunal de Justiça precisou analisar um caso em que o pai saiu para registrar o nome da criança com o nome acordado entre eles e acabou registrando com o nome do anticoncepcional que a mulher tomava quando estava engravidou.
Nesse caso, o Superior Tribunal de Justiça entendeu sobre a possibilidade de alteração do nome porque houve uma quebra do pacto realizado entre mãe e pai para que esse registrasse pelo nome escolhido entre o casal.
Considerando que pai e mãe tem o mesmo poder familiar, um não se sobressaindo sobre o outro a escolha do nome dos filhos é do casal, e uma vez acordado um nome, o outro não pode – a seu bel prazer alterá-lo, ainda mais, nesse caso que fez a opção de colocar o nome de forma ofensiva e pejorativa.
A nossa legislação parte da ideia da imutabilidade do nome, sendo apenas uns poucos casos que a lei autoriza essa mudança. Dessa forma, a genitora da criança precisou buscar a defensoria pública para que essa movesse a ação para alterar o nome da criança.
E cerca de quatro anos depois veio o resultado positivo. Superior Tribunal de Justiça, por sua 3ª. Turma, proferiu a decisão para que fosse possível a mudança desse nome, buscando assim proteger a criança e vedar que o pai pudesse escolher o nome de forma aleatória ofendendo assim, também o princípio da boa-fé.
Vejamos a ementa do referido julgado:
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. DIREITO AO NOME.
ELEMENTO ESTRUTURANTE DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. MODIFICAÇÃO DO NOME DELINEADA EM HIPÓTESES RESTRITIVAS E EM CARÁTER EXCEPCIONAL. FLEXIBILIZAÇÃO JURISPRUDENCIAL DAS REGRAS. ATRIBUIÇÃO DE NOME AO FILHO. EXERCÍCIO DO PODER FAMILIAR QUE PRESSUPÕE BILATERALIDADE E CONSENSUALIDADE. INADMISSÃO DA AUTOTUTELA. ATO DO PAI QUE, DESRESPEITANDO CONSENSO DOS GENITORES, ACRESCE UNILATERALMENTE PRENOME À CRIANÇA POR OCASIÃO DO REGISTRO.
VIOLAÇÃO DOS DEVERES DE LEALDADE E BOA-FÉ. ATO ILÍCITO. EXERCÍCIO ABUSIVO DO PODER FAMILIAR. MOTIVAÇÃO SUFICIENTE PARA EXCLUSÃO DO PRENOME INDEVIDAMENTE ACRESCIDO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA MÁ-FÉ, INTUITO DE VINGANÇA OU PROPÓSITO DE ATINGIR À GENITORA.
IRRELEVÂNCIA. CONDUTA CENSURÁVEL EM SI MESMA.
1- Ação proposta em 31/08/2017. Recurso especial interposto em 24/09/2019 e atribuído à Relatora em 19/08/2020.
2- O propósito recursal é definir se é admissível a exclusão de prenome da criança na hipótese em que o pai informou, perante o cartório de registro civil, nome diferente daquele que havia sido consensualmente escolhido pelos genitores.
3- O direito ao nome é um dos elementos estruturantes dos direitos da personalidade e da dignidade da pessoa humana, pois diz respeito à própria identidade pessoal do indivíduo, não apenas em relação a si, como também em ambiente familiar e perante a sociedade.
4- Conquanto a modificação do nome civil seja qualificada como excepcional e as hipóteses em que se admite a alteração sejam restritivas, esta Corte tem reiteradamente flexibilizado essas regras, permitindo-se a modificação se não houver risco à segurança jurídica e a terceiros.
5- Nomear o filho é típico ato de exercício do poder familiar, que pressupõe bilateralidade, salvo na falta ou impedimento de um dos pais, e consensualidade, ressalvada a possibilidade de o juiz solucionar eventual desacordo entre eles, inadmitindo-se, na hipótese, a autotutela.
6- O ato do pai que, conscientemente, desrespeita o consenso prévio entre os genitores sobre o nome a ser de dado ao filho, acrescendo prenome de forma unilateral por ocasião do registro civil, além de violar os deveres de lealdade e de boa-fé, configura ato ilícito e exercício abusivo do poder familiar, sendo motivação bastante para autorizar a exclusão do prenome indevidamente atribuído à criança que completará 04 anos em 26/05/2021 e que é fruto de um namoro que se rompeu logo após o seu nascimento.
7- É irrelevante apurar se o acréscimo unilateralmente promovido pelo genitor por ocasião do registro civil da criança ocorreu por má-fé, com intuito de vingança ou com o propósito de, pela prole, atingir à genitora, circunstâncias que, se porventura verificadas, apenas servirão para qualificar negativamente a referida conduta.
8- Recurso especial conhecido e provido.
(REsp 1905614/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/05/2021, DJe 06/05/2021)
E em seu voto a Ministra Nancy Andrighi destaca que:
Trata-se de ato que pressupõe bilateralidade, salvo na falta ou impedimento de um dos pais (art. 1.631, caput, do CC/2002), e consensualidade, ressalvada a possibilidade de o juiz solucionar eventual desacordo existente entre eles (art. 1.631, parágrafo único, do CC/2002). Não é ato, pois, que admita a autotutela. (…)
Trata-se de ato que violou o dever de lealdade familiar e o dever de boa-fé objetiva e que, por isso mesmo, não deve merecer guarida pelo ordenamento jurídico, na medida em que a conduta do recorrido configurou exercício abusivo do direito de nomear a criança. (…)
E com isso o nome da criança volta a ser o escolhido pelos pais em conjunto, que foi Valentina. Pena que para isso precisou demorar QUATRO anos para ter o direito ao nome escolhido pelos pais.
*Renata Malta Vilas-Bôas é Articulista do Estado de Direito, advogada devidamente inscrita na OAB/DF no. 11.695. Sócia-fundadora do escritório de advocacia Vilas-Bôas & Spencer Bruno Advocacia e Assessoria Jurídica, Professora universitária. Professora na ESA OAB/DF; Mestre em Direito pela UPFE, Conselheira Consultiva da ALACH – Academia Latino-Americana de Ciências Humanas; Acadêmica Imortal da ALACH – Academia Latino-Americana de Ciências Humanas; Integrante da Rete Internazionale di Eccelenza Legale. Secretária-Geral da Rede Internacional de Excelência Jurídica – Seção Rio de Janeiro – RJ; Colaboradora da Rádio Justiça; Ex-presidente da Comissão de Direito das Famílias da Associação Brasileira de Advogados – ABA; Presidente da Comissão Acadêmica do IBDFAM/DF – Instituto Brasileiro de Direito das Familias – seção Distrito Federal; Autora de diversas obras jurídicas. |
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