124 – Semana –  Cheque, protesto e dano moral

Leonardo Gomes de Aquino é articulista do Jornal Estado de Direito e responsável pela Coluna Descortinando o Direito Empresarial.

 

 

 

124 – Semana –  Cheque, protesto e dano moral

 

Informativo de Jurisprudência

Informativo n. 0616

Publicação: 17 de janeiro de 2018.

 

PROCESSO REsp 1.677.772-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 14/11/2017, DJe 20/11/2017
RAMO DO DIREITO DIREITO CIVIL, DIREITO DO CONSUMIDOR
TEMA Protesto de cheques prescritos. Irregularidade. Higidez da dívida. Possibilidade de manejo de ação de cobrança fundada na relação causal e de ação monitória. Abalo de crédito inexistente. Dano moral não caracterizado.

 

DESTAQUE
O protesto irregular de cheque prescrito não caracteriza abalo de crédito apto a ensejar danos morais ao devedor, se ainda remanescer ao credor vias alternativas para a cobrança da dívida consubstanciada no título.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Cumpre ressaltar, inicialmente, que o apontamento de cheque a protesto mostra-se viável dentro do prazo da execução cambial – que é de 6 (seis) meses contados da expiração do prazo de apresentação –, desde que indicados os devedores principais (emitente e seus avalistas). Em relação aos coobrigados (endossantes e respectivos avalistas), o art. 48 da Lei n. 7.347/1985 impõe que o aponte a protesto seja realizado no prazo para apresentação do título ao sacado. Não observados esses prazos, perde o portador o direito de sujeitar à ação cambial executiva os coobrigados. Nada obstante, permanece ao credor a faculdade de protestar o cheque, indicando o nome dos devedores principais (emitente e respectivos avalistas), enquanto o título se revestir dos requisitos da certeza, liquidez e exigibilidade, ou seja, enquanto não prescrita a ação cambiária executiva – orientação essa consolidada pelo STJ por ocasião do julgamento do recurso especial repetitivo n. 1.423.464-SC. Especificamente quanto ao protesto considerado “indevido”, não se desconhece a existência de julgados deste Tribunal que afirmam que o dano moral, nessa situação, se caracteriza in re ipsa. Todavia, a jurisprudência desta Corte, de um modo geral, vem evoluindo para permitir que se observe o fato concreto e suas circunstâncias, afastando o caráter absoluto da presunção de existência de dano moral indenizável. No âmbito do protesto irregular de título de crédito, o reconhecimento do dano moral está inequivocamente atrelado à ideia do abalo do crédito causado pela publicidade do ato notarial, que, naturalmente, faz associar ao devedor a pecha de “mau pagador” perante a praça. Todavia, na hipótese em que o protesto é irregular por estar prescrita a pretensão executória do credor, havendo, porém, vias alternativas para a cobrança da dívida consubstanciada no título, não há se falar em abalo de crédito, na medida em que o emitente permanece na condição de devedor, estando, de fato, impontual no pagamento. Nesse contexto, enquanto remanescer ao credor a faculdade de cobrança da dívida – seja por meio do ajuizamento de ação cambial por locupletamento ilícito, de ação de cobrança fundada na relação causal, e ainda, de ação monitória – permanece o devedor na condição de inadimplente, razão pela qual não está caracterizado abalo de crédito apto a ensejar dano moral.

 

Vamos analisar as regras 

       Síntese do contexto fático gerador da decisão

       Cuida-se de recurso especial interposto por MARILENE JOSE DA COSTA VIEIRA, com fundamento nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional.

       Ação: declaratória de nulidade de protesto de título c/c pedido de compensação por danos morais, ajuizada pela recorrente em face de BANCO MORADA S/A – FALIDA, devido ao protesto de 2 (dois) cheques prescritos, que foram emitidos em decorrência de contrato de mútuo celebrado entre as partes.

       Sentença: julgou improcedentes os pedidos.

       Acórdão: manteve a decisão unipessoal do Relator, que negou seguimento à apelação interposta pela recorrente, nos termos da seguinte ementa (e-STJ fl. 156):

“AGRAVO INTERNO. RESPONSABILIDADE CIVIL. PROTESTO DE CHEQUE PRESCRITO. Higidez da pretensão de cobrança da dívida nele representada. Abuso do direito. Inexistência. Aplicação do verbete n° 236, da Súmula de Jurisprudência deste Tribunal. Decisão mantida. Recurso desprovido”.

       Recurso especial: alega violação dos arts. 33 e 48 da Lei 7.357/85, 186 e 927 do CC/02, bem como dissídio jurisprudencial. Sustenta que o protesto dos títulos foi ilegal, pois realizado depois de expirado o prazo de apresentação para pagamento, caracterizando dano moral in re ipsa.

       Prévio juízo de admissibilidade: o TJ/RJ inadmitiu o recurso especial, o que ensejou a interposição de agravo em recurso especial, que fora provido para melhor exame da matéria em debate.


Analise das questões jurídicas

       A Lei 9.492/97 – a chamada “Lei do Protesto Notarial” – os documentos hábeis ao protesto foram ampliados, passando a incluir, para além dos títulos de crédito, “outros documentos de dívida”, consoante a literalidade do art. 1º do mencionado diploma legal.

       “O documento hábil a protesto extrajudicial é aquele que caracteriza prova escrita de obrigação pecuniária líquida, certa e exigível”, por isso os documentos para serem protestados devem possuir a característica de executoriedade, ou seja, que seja possível de ser executado.

       O cheque por ser uma ordem de pagamento à vista, dependente existência de fundos disponíveis. O art. 4º  da lei do cheque determina que “o emitente deve ter fundos disponíveis em poder do sacado e estar autorizado a sobre eles emitir cheque, em virtude de contrato expresso ou tácito. A infração desses preceitos não prejudica a validade do título como cheque.” E a existência de fundos disponíveis é verificada no momento da apresentação do cheque para pagamento. Desta forma, consideram-se fundos disponíveis: a) os créditos constantes de conta-corrente bancária não subordinados a termo; b) o saldo exigível de conta-corrente contratual; c) a soma proveniente de abertura de crédito.

Foto: Pixabay

       É certo que a execução do cheque independe do protesto, observando as seguintes regras:

Art . 47 Pode o portador promover a execução do cheque:

I – contra o emitente e seu avalista;

II – contra os endossantes e seus avalistas, se o cheque apresentado em tempo hábil e a recusa de pagamento é comprovada pelo protesto ou por declaração do sacado, escrita e datada sobre o cheque, com indicação do dia de apresentação, ou, ainda, por declaração escrita e datada por câmara de compensação.

  • 1º Qualquer das declarações previstas neste artigo dispensa o protesto e produz os efeitos deste.
  • 2º Os signatários respondem pelos danos causados por declarações inexatas.
  • 3º O portador que não apresentar o cheque em tempo hábil, ou não comprovar a recusa de pagamento pela forma indicada neste artigo, perde o direito de execução contra o emitente, se este tinha fundos disponíveis durante o prazo de apresentação e os deixou de ter, em razão de fato que não lhe seja imputável.
  • 4º A execução independe do protesto e das declarações previstas neste artigo, se a apresentação ou o pagamento do cheque são obstados pelo fato de o sacado ter sido submetido a intervenção, liquidação extrajudicial ou falência.

       Nos termos do art. 33 da Lei 7.357/85, o portador deve apresentar o cheque ao Banco sacado – ou câmara de compensação – dentro de 30 (trinta) dias, a contar da data da emissão, em se tratando de cheque para ser pago na mesma praça, ou de 60 (sessenta) dias, quando se tratar de cheque emitido para pagamento em praça diversa da emissão. Não observados esses prazos, perde o portador o direito de sujeitar à ação cambial executiva os endossantes e respectivos avalistas, se o título é devolvido por insuficiência de fundos, de acordo com o disposto no art. 47, II, da Lei 7.357/85.

       Não observados esses prazos, perde o portador o direito de sujeitar à ação cambial executiva os coobrigados. Nada obstante, permanece ao credor a faculdade de protestar o cheque, indicando o nome dos devedores principais (emitente e respectivos avalistas), enquanto o título se revestir dos requisitos da certeza, liquidez e exigibilidade, ou seja, enquanto não prescrita a ação cambiária executiva – orientação essa consolidada pelo STJ por ocasião do julgamento do recurso especial repetitivo n. 1.423.464-SC

       Assim, para não perder o direito em face dos endossantes e seus avalistas o credor deverá ser promovido pelo credor ainda dentro do prazo de apresentação, novamente sob pena de perda da eficácia executiva frente a estes coobrigados.

       Por isso, o credor possuí a faculdade de efetuar o protesto do cheque, indicando o nome dos devedores principais (emitente e respectivos avalistas), enquanto o título se revestir dos requisitos da certeza, liquidez e exigibilidade, ou seja, enquanto não prescrita a ação cambiária executiva.

       O STJ possui o seguinte entendimento acerca do direito de protestar: “sempre será possível, no prazo para a execução cambial, o protesto cambiário de cheque, com a indicação do emitente como devedor” (AgRg no REsp 1.326.087/SP, 3ª Turma, DJe de 15/04/2016; REsp 1.297.797/MG, 3ª Turma, DJe de 27/02/2015; REsp 1.231.856/PR, 4ª Turma, DJe de 08/03/2016 e Resp 1.423.464/SC, 2ª Seção, DJe de 27/05/2016).

       Sendo assim, o cheque poderá ser protestado: a) dentro do prazo de apresentação, se indicados os nomes de endossantes e seus avalistas; b) dentro do prazo da execução cambial, se indicados apenas os nomes do emitente e respectivos avalistas, prazo esse que, de acordo com o disposto no art. 59 da Lei 7.357/85, é de 6 (seis) meses, contados após a expiração do prazo de apresentação do título ao sacado.

       Após estas hipóteses o protesto será irregular.

       Mas será que o protesto irregular será capaz de gerar dano moral?

       Como é cediço, como regra, para a caracterização do dano moral são necessários os seguintes elementos: a) o ato, b) o dano, c) nexo de causalidade entre o ato e o dano, e d) o dolo ou a culpa do agente causador do dano. Demais disso, toda e qualquer responsabilidade civil repousa na ofensa a um bem jurídico.

       O dano moral tem sido entendido como lesões a atributos da pessoa, enquanto ente ético e social que participa da vida em sociedade, estabelecendo relações intersubjetivas em uma ou mais comunidades. Ou, como já decidiu esta Corte, o dano moral consiste em “atentados à parte afetiva e à parte social da personalidade” (REsp 1426710/RS, Terceira Turma, julgado em 25/10/2016, DJe 09/11/2016). Mas é importante ressaltar que não é qualquer acontecimento que atente aos direitos de personalidade em geral é apto a gerar dano de cunho moral.

       É claro que apesar da via executória estar prescrita a Lei do cheque permite ainda a proteção do direito por meio da ação de locupletamento ou ação baseada no direito causal e a jurisprudência permite ainda o uso da ação monitoria.

       O protesto irregular de cheque prescrito não caracteriza abalo de crédito apto a ensejar danos morais ao devedor, se ainda remanescer ao credor vias alternativas para a cobrança da dívida consubstanciada no título.

 

Como a situação poderia ser cobrada em Concurso Público:

Antônio Saruê teve seu nome enviado ao protesto, por dívida vencida e não paga, que tem como documento comprobatório o título de crédito denominado cheque. Assim, segundo a jurisprudência do STJ e a legislação brasileira, assinale a alternativa correta

A)O protesto irregular de cheque prescrito não caracteriza abalo de crédito apto a ensejar danos morais ao devedor, se ainda remanescer ao credor vias alternativas para a cobrança da dívida consubstanciada no título.

B)O protesto irregular de cheque prescrito caracteriza abalo de crédito apto a ensejar danos morais ao devedor, se ainda remanescer ao credor vias alternativas para a cobrança da dívida consubstanciada no título.

C)Enquanto o título de crédito se revestir dos requisitos da certeza, liquidez e exigibilidade, ou seja, enquanto não prescrita a ação cambiária monitoria o protesto será regular.

D)Na hipótese em que o protesto é irregular por estar prescrita a pretensão executória do credor, havendo, porém, vias alternativas para a cobrança da dívida consubstanciada no título, há que se falar em abalo de crédito, na medida em que o emitente permanece na condição de devedor, estando, de fato, impontual no pagamento.

 

Gabarito: letra A.

Justificativa: REsp 1.677.772-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 14/11/2017, DJe 20/11/2017

 

 

Leonardo Gomes de Aquino
* Leonardo Gomes de Aquino é Articulista do Estado de Direito, responsável pela Coluna “Descortinando o Direito Empresarial” – Mestre em Direito. Pós-Graduado em Direito Empresarial. Pós-graduado em Ciências Jurídico Empresariais. Pós-graduado em Ciências Jurídico Processuais. Especialização em Docência do Ensino Superior. Professor Universitário. Autor do Livro “Direito Empresarial: teoria da Empresa e Direito Societário”.
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