Sociologia do novo constitucionalismo latino-americano: debates e desafios contemporâneos

Lido para Você, por José Geraldo de Sousa Junior, articulista do Jornal Estado de Direito.

 

Sociologia do novo constitucionalismo latino-americano: debates e desafios contemporâneos / [Organizadores], Gustavo Menon, Maurício Palma, Douglas Zaidan. –São Paulo: Edições EACH, 2022.1 ebook ISBN 978-65-88503-38-6 (recurso eletrônico) DOI 10.11606/97865885033861 Acesso: https://www.livrosabertos.sibi.usp.br/portaldelivrosUSP/catalog/view/939/851/3088.

 

 

Recebi de meu colega, amigo e co-autor em muitas incidências editoriais o PDF da obra objeto deste Lido para Você. Na nota noticiosa diz Gladstone Leonel da Silva Junior: “A destituição do presidente Castillo no Peru e a crise gerada nos permite refletir sobre uma Constituição peruana que inviabiliza um governo sem maioria no Congresso. Esta conjuntura e o debate recente ressalta a importância da obra que aqui apresento: “Sociologia do Novo Constitucionalismo Latino-americano”, organizada pelos professores @douglaszaidan , Gustavo Menon e Maurício Palma e publicada pelo Programa de Pós-graduação em Integração da América Latina da USP. Tive a satisfação de escrever com o grande parceiro e professor @josegeraldosousajr , o artigo que abre essa obra e traz reflexões realizadas há alguns anos cujo título é: CONSTITUCIONALISMO ACHADO NA RUA A PARTIR DA AMÉRICA LATINA: ELEMENTOS INICIAIS. Existem vários outros artigos importantes e consistentes ao debate proposto. O acesso ao livro é integral e gratuito, disponível no link na Bio nos stories”.

Gladstone vai ao ponto em sua nota. Em toda a América Latina vivemos tempos interpelantes, tensos, no embate entre o horizonte histórico de descolonização e as recrudescências autoritárias do processo capitalista de acumulação, que em sua exacerbação neoliberal, fomenta a emergência de radicalismos políticos ao extremo da direita ideológica.

No Brasil, felizmente, e em método democrático movido pelo sufrágio, estamos agora na transição para o resgate da democracia e dos direitos humanos ao impulso utópico da emancipação. Na Argentina, que mais cedo encaminhou-se para esse movimento, há ainda sobressaltos e a vice-presidente  Cristina Kirchner acaba de ser sentenciada com o acréscimo de “inabilitação perpétua” de seus direitos políticos, em outra extravagância do lawfare, que embora desmascarado em sua ocorrência no Brasil para impedir o Presidente Lula de participar de eleições, ainda produz consequências graves.

Gladstone anota o que se passa nesse instante no Peru. Ainda que a comunicação corporativa e muitos analistas, entre eles progressistas, convirjam para uma interpretação que desabona Castillo, caracterizando-o como protagonista de um auto-golpe, na América Latina há vozes que identificam mais um movimento da direita para arrancar da governança um dirigente de extração popular. A acadêmica peruana, quéchua, Shyrley Peña (aliás, minha orientanda no doutoramento em Direitos Humanos e Cidadania da UnB), considera ter havido uma ação destituinte contra a esquerda latinoamerica (https://youtu.be/nVmqTUDURFM). “Pedro Castillo foi vítima de um contra-golpe da extrema-direita, ela afirma em depoimento apara o canal Expresso 61.

 Nesse mesmo diapasão a manifestação do presidente mexicano Andrés Manuel López Obrador que vê na crise política do Peru  “los intereses de las élites económicas y políticas” que, desde el inicio del Gobierno de Pedro Castillo, han mantenido “un ambiente de confrontación y hostilidad” en su contra” (https://elpais.com/mexico/2022-12-07/lopez-obrador-achaca-la-crisis-en-peru-a-los-intereses-de-las-elites-economicas-y-politicas.html).

Assim que, pondo sob suspeição uma difundida convergência de posicionamentos que se associaram para afastar o presidente, numa orquestração de hostilidades que nunca disfarçou a rejeição das elites de la Costa, contra a gente de la Selva y de la Sierra (campesinos e indígenas),  já começam a crescer las protestas en Perú que piden disolver el Congreso y liberar a Pedro Castillo (https://actualidad.rt.com/actualidad/451329-crecen-protestas-peru-piden-disolver-congreso-liberar-castillo):

Los seguidores de Castillo demandan que lo liberen y lo restituyen en la Presidencia, que Dina Boluarte salga de la jefatura de Estado tras su designación como mandataria por el Parlamento, que el Congreso sea disuelto, que se convoque a una Asamblea Nacional Constituyente para reformar el país y se realicen elecciones generales.

Dadas as características da obra replico o texto da Apresentação assinada pelos Organizadores Gustavo Menon, Maurício Palma e Douglas Zaidan, que a explicam e sumariam o conteúdo de cada texto e respectiva autoria ou co-autoria:

A partir  das  décadas  de  1980  e  1990,  com os movimentos  de  redemocratização,  o constitucionalismo latino-americano  observou  a  promulgação  de  constituições  em  diferentes países  em  que  novas  demandas  se  expressaram  para  a  afirmação  do  princípio  da  dignidade humana e a materialização de direitos fundamentais, afastando-se de experiências ditatoriais. Por outro  lado,  as  formações  do  mais  recente  constitucionalismo  latino-americano  merecem uma análise sociologicamente distinta. Com efeito, elas parecem ser fruto de um processo de engajamento da 

Sociedade civil  e  da  articulação  de  diferentes  classes  sociais, havendo  a proposição  de  novas  categorias  de  direitos  constitucionais  e  de  tentativa  de  se  romper  com dinâmicas  imperialistas.  Ao lado disso,  em  determinados  Estados  da  região,  crescem  forças conservadoras políticas e jurídicas de oposição aos novos horizontes oriundos de constituições e organizações de movimentos sociais. Nesse   diapasão,   influenciadas   por   categorias europeias,   as   constituições   latino-americanas  surgidas  a  partir  dos  anos  1980  podem  ser  compreendidas  como  expressões  do processo de  redemocratização, disputas e rearranjos entre as frações de  classes dominantes e reproduziram, em grande medida, “compromissos institucionais e respostas jurídicas forjadas a partir de problemas formatados pelo discurso jurídico europeu, reeditando na América Latina uma   ideologia   constitucional   que   apresenta   dificuldades   quanto   à   realização   de   suas promessas. Exemplos  são  os  constitucionalismos brasileiro  de  1988,  o  guatemalteco de  1985  e  o  argentino,  nos  termos  de  sua  reforma constitucional de 1994. Com  a  ascensão  de  governos  de  esquerda  na  América  do  Sul,  diante  do  contexto  da virada do milênio, novas cartas constitucionais foram promulgadas a partir de processos com notória  participação  popular. As  atuais  constituições  da  Venezuela(1999),  Equador(2008), Bolívia(2009) e, mais recentemente, de Cuba(2019), buscam apresentar perspectivas inéditas para  o  constitucionalismo da  região,  objetivando  romper  com  o  legado  e  a  herança  do constitucionalismo europeu. Impulsionadas por demandas populares, as novas constituições e os    debates    constituintes    levam    em    consideração    elementos    de    multiculturalidade, plurinacionalidade e, ao mesmo tempo, tentam superar as dinâmicas entre países ricos e pobres (BARBOSA,  Maria  Lúcia;  TEIXEIRA,  João  Paulo  Allain.  Neoconstitucionalismo  e  Novo  Constitucionalismo Latino-Americano:  dois  olhares  sobre  igualdade,  diferença  e  participação. Revista  Direito  e  Práxis  [online]. 2017,    v.    8,    n.    2    [acessado:    01    de fevereiro de 2022],pp.    1113-1142.    Disponível    em: <https://doi.org/10.12957/dep.2017.23083>.

No Chilee no Peru, respeitando-se as particularidades de cada país, amplos setores de esquerda defendem uma nova formação constitucional que consiga romper com as teses neoliberais, uma vez que as atuais constituições foram celebradas em um contexto de forte violência  política  e  social  e  que,  sobretudo,  inviabilizam  a  formulação  de  políticas  públicas mais  amplas.  A  proposta  constituinte  chilena,  a  qual  até  mesmo  reconheceria  o  Chile  como nação  plurinacional  e  assentaria  direitos  constitucionais  de  inéditas  dimensões,  em  termos mundiais, foi rejeitada no referendo de 04 de setembro de 2022, sendo que as consequências de tal evento ainda devem ser debatidas. Pode-se aduzir que  a  experiência constitucional latino-americana mais recente, ainda, observa  um  cenário  de  cruzamento  de  crises,  em  que  os  efeitos  da  pandemia  de  COVID-19 acentuaram as contradições socioeconômicas dos países do sul global. Políticas de austeridade, violações de direitos humanos e a emergência de novos atores, redes e organizações, pautando os direitos civis, políticos e sociais, emergem como fenômenos transversais para se pensar os limites, dilemas e contradições que são apresentados no horizonte do novo constitucionalismo. Assim,  Estados  nacionais  e  instituições  constitucionais  lidam  corriqueiramente  com pressões  oriundas  de  entidades  empresariais,  elites  políticas  locais,  outros Estados,  atores e redes transnacionais de movimentos sociais, cada qual com suas demandas, que podem incluir o desmoronamento dos edifícios constitucionais ou a ampliação da participação política e da democracia. Tendo  esse  complexo  contexto  como  pano  de  fundo,  este  livro  articula  investigações sociológicas que tenham como ponto fulcral a análise da democracia e do constitucionalismo na  região,  a  fim  de  realçar  elementos  de  especificidades,  contradições,  divergências  e convergências,  bilaterais  ou  multilaterais,  para  se  pensar  as  singulares  experiências  do constitucionalismo  na  América  Latina.  Passemos, assim,  a  explorar  brevemente  as treze contribuições desta obra, a fim de aguçar o interesse da leitora ou do leitor. Leonel da Silva Júnior e José Geraldo de Sousa Júnior iniciam o livro trazendo uma reflexão sobre o constitucionalismo latino-americano  à  luz  da  corrente  do  Direito  Achado  na  Rua,  um “Constitucionalismo Achado na Rua”, como propõem. Realizam tal tarefa por meio de uma ampla reconstrução teórica, sociológica e histórica, iniciando com uma revisão da própria noção de Direito Achado na Rua, esta entendida como espaço de criatividade democrática, jurídica e política. O Constitucionalismo Achado na Rua parte da tensão entre democracia e constituição e alça  a  pluralidade  de  sujeitos  ao  patamar  de  poder  constituinte.  O novo constitucionalismo latino-americano,  enquanto  popular,  é  colocado  ao  lado  de  experiências  revolucionárias históricas, como a Constituição de 1976 que se seguiu à Revolução dos Cravos. Para os autores, deve  a  constituição  prover  sentido  político  ao  direito,  garantindo  legitimidade  a  sujeitos subalternos inseridos na luta de classes, num processo de construção e modificação social do direito posto, o que poderia culminar, inclusive, em uma “constituinte achada na rua”. De qualquer  maneira,  o  constitucionalismo  latino-americano  deve  decolonizar-se,  garantindo espaço  constitucional a  movimentos ligados a lutas políticas populares. Passam os autores, a partir  do  texto  de  Fajardo  (2015),  a  analisar  experiências  do  constitucionalismo  latino-americano  desde  a  década  de  1980,  concordando  que  o  mais  recente  movimento  na  região formou   atores   constituintes   concretos   vindo   debaixo,   especialmente   se   analisadas   as constituições  equatoriana,  boliviana  e  venezuelana. O  caso  brasileiro  passa  a  ser  enfocado. Neste, a constituição encontrar-se-ia  aberta a  certos sujeitos populares, devendo a luta social ser  reconhecida,  academicamente,  como  a  constituir  a  soberania  popular:  “O constitucionalismo Achado na Rua vem aliar-se à Teoria Constitucional que percorre o caminho do retorno à sua função social em um primeiro momento, para quem sabe constituir força para extravasá-la”. Para os autores, após o “soluço” de 2016 a 2019, o Brasil deveria  retomar  os rumos do constitucionalismo achado na rua, e o constitucionalismo latino-americano estar “a serviço” da população subalterna. O segundo capítulo de Caneparo dos Anjos aborda graves violações de direitos humanos direcionadas às minorias. Segundo a autora, eventos do século XX propulsionaram a formação de um aparato internacional de proteção às minorias e incentivo à proteção da autodeterminação dos  povos,  discutindo  o  aparente  conflito  entre  autodeterminação  e  o  direito  dos  Estados, concebendo tal princípio como sendo dos povos, i.e., não estatal, exemplar na Carta Africana de  Direitos  Humanos  e  dos  Povos.  A  autodeterminação  é  apresentada  como  substrato concretizador  dos  direitos  humanos.  O  artigo,  para  tanto,  expõe  o  surgimento  do  direito  dos povos,  trazendo  à  baila o  Pluralismo  de  Rawls.  A  autodeterminação  é  apresentada  como princípio  jurídico  de  direito  internacional  Público  desde  quando  agasalhado  pela  Liga  das Nações,  tendo  sido  realçado  a  partir  da  Carta  da  ONU  e  de  importantes  Resoluções  de  sua Assembleia.  A  autodeterminação  dos  povos,  nessa  esteira,  é  apresentada  como  parte  da  luta anticolonialista e até mesmo como parte do jus cogens. Trabalha a espinhosa noção de minoria, discutindo  como  o  termo  foi  tratado  por  acadêmicos  como  Toscano  e  Wagley  e  Harris,  bem como por diferentes tratados internacionais, incluindo o Pacto Internacional dos Direitos Civis e  Políticos  e  a  Declaração  das  Nações  Unidas  sobre  os  Direitos  das  Pessoas  Pertencentes a Minorias Nacionais ou Étnicas, Religiosas e Linguísticas, está sendo entendida como soft law.

Na sequência, Fernanda Ravazzano Lopes Baqueiro realiza um trabalho de sociologia constitucional ao abordar as mudanças político-sociais da América Latina e seus reflexos em reformas no campo do Direito Processual Penal, propondo “um direito “da” e “para” a América Latina”. Reflete, nesse diapasão, de maneira crítica, sobre categorias jurídicas importadas de países  ricos  e  defende,  com  Choukr,  uma  “refundação”  do  sistema.  Ao  tratar  sobre  a investigação defensiva enquanto conexa às dinâmicas latino-americanas, a estratégia da autora mostra-se decolonial,  pois, aborda  particularidades  regionais,  como  a  exploração  dos  povos originários e de suas terras, a pobreza extrema, movimentos imperialistas e  capitalistas, bem como  movimentos  de  redemocratização  e,  por  outro  lado, vozes  autoritárias.  Apresenta,  por fim,  relações  específicas  entre  a  Corte  Interamericana  dos  Direitos  Humanos,  a Constituição Federal  brasileira  e  o  Supremo  Tribunal  Federal acerca  da  figura  da  investigação  defensiva, aduzindo não bastar mudanças legislativas desacompanhadas de mudanças de “mentalidade”, o que, no caso brasileiro, pode-se provar pela suspensão, pelo STF, da vigência de mecanismos normativos ligados a um sistema penal acusatório já existentes em lei regularmente aprovada e sancionada nas competentes searas do processo legislativo. Pinheiro,  ao  seu  turno, no  quarto  capítulo, reflete  amplamente  sobre  a formação do chavismo e do constitucionalismo venezuelano, focando seu texto na explicação da noção de democracia protagónica   e   fazendo   considerações   sobre   tal   experiência. Anota   ser   a promulgação da constituição venezuelana bolivariana um produto típico do chavismo, marcado pela ascensão popular contra políticas neoliberais. Observa que a América do Sul experimentou diferentes  respostas  a  tais  políticas,  tendo  Bolívia,  Equador e  Venezuela promulgado  novas Constituições  à  época.  Mais  especificamente,  a  constituição  venezuelana  teria  como  linha a ideia  da  democracia  participativa  protagónica,  a  qual  estaria  entre  os  tipos  democráticos representativo  e  participativo,  com  prevalência,  para  o  autor,  desse  último  tipo.  Para  tanto, expõe  a  forma  do  Estado  comunal,  apresentando  inclusive  uma  ilustração  para  explanar  a descentralidade  da  participação,  no  qual  o  Poder  Público  e  o  Poder  Popular  devem  seguir  o princípio da corresponsabilidade. Apresenta o processo e a constituição venezuelana como uma tentativa  de  transição  ao  socialismo. Na  conclusão,  o  autor  aponta  déficits  da  democracia protagónica, como  problemas  jurídicos  que  impedem  o  desenvolvimento  dos  conselhos comunais,  exemplificados  em  prevalências  institucionais  do  Poder  Público  no  financiamento dos conselhos comunais. Finaliza seu texto equiparando a experiência venezuelana com outros clássicos episódios históricos de modificação da soberania popular por classes populares, como a Revolução Francesa de 1789 e a Revolução Russa de 1917, vislumbrando-a, portanto, como um m         arco no desenvolvimento constitucional mundial no que tange a participação popular. O texto de Ñunez Santamaria e Valle Franco narra trajetórias da relação entre Executivo e   Corte   Constitucional no   Equador. Apontam   que   o   Estado   conta   com   vinte   textos constitucionais  em  sua  história,  mas  que  nem  todos  previram  o controle  concentrado  de constitucionalidade, sendo que apenas nos de 1998 e 2008 haveria a possibilidade de expulsão de  normas  do  ordenamento  jurídico  por  parte  do  Judiciário.  A  questão  central  do  artigo  diz respeito ao grau de impacto do aumento das faculdades do Judiciário por meio do instituto do controle   concentrado para   a   democracia equatoriana,   tendo,   como   pano   de   fundo, movimentações do Executivo. Para tanto, o trabalho realiza revisão da literatura sobre a tensão existente  na  relação  entre  democracia  e  constitucionalismo,  trazendo  abordagens  clássicas como as de Kelsen e  Ferrajoli, bem como a noção de “Abusive Judicial Review” de Landau. Tem-se  que,  abstratamente,  o  ativismo  judiciário  poderia  ou  não  ser  deletério  à  democracia, devendo-se observar casos concretos. Num segundo momento, os autores analisam o impacto ao legislativo do arcabouço normativo do controle de constitucionalidade, demonstrando como era  delicada  a  questão  do  controle  difuso  no  texto  constitucional  de  1998,  e  expondo  as dinâmicas do sistema atual, um híbrido de controle difuso e concentrado, a partir de leis como a Orgánica  de Garantías Jurisdiccionales y  Control  Constitucional,  a  qual  parece  guardar  a prevalência do que foi legislado, atentando os autores para possíveis autoritarismos por parte dos juízes da Corte Constitucional do país advindos do desenho normativo. Ainda no Equador, Gustavo Menon trata dos direitos da natureza na atual Constituição de Montecristi, enfocando atores sociais conectados à causa e a importância na ressignificação da  relação ser  humano  e natureza.  Traça,  para  tanto,  caminhos  da  academia, de movimentos sociais e a atuação do sistema ONU na elaboração de tratados internacionais sobre o tema. Em particular, aborda como foi versada a questão dos direitos da natureza na tradição liberal anglo-saxã, com referências a clássicos como Locke, Montesquieu e Tocqueville, Bentham e Thoreau. Menon,  em  contrapartida, aduz  que  o  princípio  do Buen  Vivir,  consagrado  na  constituição equatoriana, representaria a recuperação de uma cosmovisão ancestral, advinda do sul global, capaz de ressignificar a relação humana com a natureza, contra o eurocentrismo moderno e os legados do neoliberalismo na região. Os movimentos indígenas, com efeito, colocariam o ser humano  como  parte  do  ambiente  natural,  não  sendo  a  natureza  uma  coisa  externa; toda a natureza,  portanto  não  reificada,  seria  vista  como  um  ser  vivo  que  se  entrelaça  com  a socialização humana, voltando a ser compreendida como “mãe” da humanidade. “Plenitude” (sumak) e “viver” (kawsay), de origem  indígena, representaria a relação harmoniosa  a  ser vivida. Especificamente sobre a Constituição equatoriana de 2008, sustenta ter sido plasmada com  ampla  participação  de  movimentos  sociais,  possuindo  mecanismos  constitucionais  que representaram a cosmovisão indígena. O movimento constitucional equatoriano é apresentado como  não  eurocêntrico,  uma  vez  que  agasalha  manifestações  culturais  indígenas,  reconhece línguas indígenas como oficiais, confere participação popular e, nos termos dos artigos 71 a 74, há  reconhecimento  da  natureza  como  sujeito  de  direitos.  O  autor  coloca  o  debate  sobre  se, enquanto sujeito de direitos, haveria deveres para a natureza, mas entende que esta os cumpre, devendo haver  curatela  estatal  para  sua  preservação,  nos  termos  dos  artigos  395  e  400  da Constituição. No desfecho do texto, Menon apresenta a grande contradição equatoriana, isto é, as tensões entre normas e fato: ainda que o Estado reconheça a natureza como sujeito de direitos e preveja mecanismos constitucionais e institucionais, há a dependência profunda do país dos recursos  oriundos  da  exploração  de  petróleo,  sendo  que  mecanismos  legais,  já  em 2013, garantiam inclusive a exploração de petróleo em regiões de povos indígenas, como ocorreu no caso do Parque Yasuní. Os dilemas do Equador, em um cenário de dupla dependência (petróleo e dólar), assim, são apresentados diante de um flagrante descompasso entre o regime do buen viver e as políticas econômicas equatorianas, intimamente acopladas na lógica da exploração e exportação de produtos primários. A história do caso chileno é analisada por Paloma Pitre no sétimo capítulo. Para a autora há  uma  série  de  contradições  em  curso no processo  da Convenção  Constituinte.    O estalido social de 2019 apontou uma série de críticas ao modelo pinochetista herdado da ditadura. No entanto, o rechaço da proposta do texto constitucional em 04 de setembro de 2022 demonstrou as fraquezas, dilemas e impasses do recente governo de Gabriel Boric.  Em seguida, Carlos F. Domínguez  Avila  &  Hugo  Cárdenas  Vera  aprofundam  a  análise  da  experiência  chilena sinalizando  para  as  debilidades,  ameaças  e  oportunidades  desse  processo  insólito.  Apontam para a correlação de forças e, ao mesmo tempo, concluem que a ideologia neoliberal ainda se faz fortemente presente nas relações sociais daquele país. Projeta-se um futuro em aberto nas grandes alamedas chilenas. Ainda na região andina, Henry Durante Machado aponta para os principais avanços da nova Constituição boliviana, positivada a partir de intensas lutas sociais dos povos indígenas daquele país. Sob uma perspectiva decolonial, o autor sinaliza para os desafios da construção de um Estado Plurinacional na Bolívia e do fomento da cosmovisão indígena do Suma Qamaña.

Em  El  Salvador, Douglas  Zaidan  e  Maurício  Palma  apresentam  as  intervenções  do governo  Nayib  Bukele  na  Suprema  Corte  salvadorenha.  Neste  sentido,  o  estudo  aponta  para medidas autoritárias e “populistas” do mandatário em meio a um cenário de desalinhamento dos  poderes  constituídos.   Regatando a  recente  história  política  das  últimas  décadas, a investigação  examina  a  crescente  onda  de  debilidade institucional  e,  simultaneamente,  o contexto de erosão democrática do país centro americano, sublinhando a presidência de Bukele e suas ofensivas diante do frágil e incipiente sistema de justiça salvadorenho. Moura de Oliveira, Wanderley Gomes e Duarte Lima de Barros apresentam o décimo primeiro capítulo visando  comparar,  institucionalmente, a  figura  constitucional  do  foro privilegiado, que traduzem como “jurisdictional privilege”, em 24 Estados latino-americanos, entre os  quais  Bolívia, Guatemala,  Venezuela,  Argentina,  Chile,  México,  Perue  Uruguai. A comparação tem como premissa considerações sobre o caso brasileiro: o texto parte, com efeito, das  conclusões  de  Gomes  Neto  e  Carvalho  (2021),  segundo  as  quais  o  instituto,  no  Brasil, serviria como escudo de punição para políticos importantes, amparando-se, ainda, no trabalho de O’Donnell (1996) no que tange o conceito de instituição e sua afirmação de que, na América Latina,  as  instituições  informais  devem  ser  também  observadas. Trata-se  de  um interessante trabalho  de  sociologia  constitucional,  uma  vez  que  revolve  sob  a  questão  dos  fatores  que exercem influência para a existência de referido instituto, utilizando-se, para tanto, de métodos quantitativos e qualitativos ao analisar os designs constitucionais da região. Os autores afirmam que  a  transição  democrática  criou  na  região  instituições desconhecidas  de  outras  realidades estatais – nesse  diapasão,  o  texto  aduz  ser  inadequada  a  compreensão  de  fenômenos  do  Sul global utilizando-se de ferramental teórico lastreado no Norte global. As realidades expostas acentuam  a  presença  de  um  Judiciário  forte  na  região,  mais  provavelmente  em  função  das necessidades de legitimidade e transparência advindas de transições Num segundo momento, é explorada a ideia de que a transição incompleta à democracia afeta a “qualidade institucional” nos  países  latino-americanos,  representada,  mais  especificamente,  pelo  mecanismo  do  foro privilegiado  (“jurisdictional privilege”).  Num  terceiro  passo,  após  tais  descrições  e explorações, são apresentadas as conclusões a partir do método de pesquisa. Mesclando-se os dados  e  a  pesquisa  qualitativa,  tem-se  que  quanto  mais  caem  os  indicadores  de  qualidade institucional, mais aumenta o número de autoridades protegidas pelo foro privilegiado na região (uma correlação negativa, portanto).O  capítulo de  Isabel  dos  Anjos,  a  partir  de  leituras  críticas,  aponta  para  a  formação histórica social e econômica do Brasil e da Colômbia. Para a autora, precisamos observar nosso passado colonial com intuito de perceber as relações de exploração que marcam os dias de hoje. Partindo  de  um  estudo  comparado,  Isabel aponta  em  seu  texto para  ousadias  e esperanças encabeçadas pelo movimento negro brasileiro e na atuação das mobilizações afro-colombianas. Destaca  como  as  políticas  de  cotas  e  o  engajamento  desses  setores  são  cruciais  para democratização d o campo jurídico e, sobretudo, no avanço da cidadania na região. Por  fim,  o  último  capítulo  do  livro, de  Guilherme  Roman  Borges, livre-docente  em direito pela USP e professor de Direito na Universidade Católica de Brasília (UCB), sinaliza para a  emergência  dos  estudos  descoloniais  diante  da  realidade  brasileira. Resgatando a historicidade das ciências jurídicas, o autor aponta para a necessidade de olhar para as vozes subalternas na construção de normas e, sobretudo, para o aprofundamento da recente e tardia democracia brasileira. Assim, esse  livro  reúne  pesquisas,  discussões  e  formulações  embrionárias  iniciadas a partir da realização do 45º Encontro Anual da ANPOCS, realizado de 19 a 27 de outubro de 2021. Na oportunidade, tivemos o privilégio de debater as primeiras investigações no Simpósio de  Pesquisas  Pós-Graduadas  de  Sociologia  do  constitucionalismo latino-americano  (SP40), coordenado  Gustavo  Menon  (USP  e  UCB)  e  Carina  Rodrigues  (UFPE).  Neste  sentido, agradecemos à ANPOCS pelo apoio na realização de tal Simpósio. Ao mesmo tempo, essa obra converge com as produções da linha I do Programa de Pós-graduação em Integração da América Latinada  Universidade  de  São  Paulo  (PROLAM-USP)  e,  de  modo  concomitante,  com  a produção  acadêmica  de  excelência  que  está  sendo  realizada  pelos  docentes  e  discentes  do Programa  de  Pós-Graduação  em  Direito  (PPG-DIR)  da  Universidade  Católica  de  Brasília (UCB). Assim, agradecemos aos coordenadores destes programas, Prof. Dr. Júlio Cesar Suzuki (PROLAM-USP) e  Prof.  Dr.Maurício  Dalri  Timm  do  Valle  (PPG-DIR/UCB)  pelo apoio  e condução de pesquisas interdisciplinares sobre nosso lugar no mundo: a América Latina. Além disso, estendemos os agradecimentos ao Editorial EACH/USP que, a partir da atuação de sua editora-chefe, Profa. Dra. Isabel Italiano, promoveu a publicação da presente obra. Registramos aqui, dessa forma, também, nossas saudações aos grupos de pesquisa envolvidos na produção e  fomento  desse  e-book,  tal  como  o DECLEN –Decolonizing  and  Comparing  Legal Experiences Network (Rede de Descolonização e Comparação de Experiências Jurídicas)e o Grupo de Estudos de História, Direito, Democracia e Estado na América Latina (GEHDDEAL), ambos alocados no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito da UCB. Em síntese, estamos diante de uma contribuição formulada em rede e a partir da atuação de pesquisadoras e pesquisadores de diferentes partes do Brasil, contando também com docentes que atuam nos Estados Unidos, Equador e Chile. Observadas as investigações em conjunto e feitos os devidos agradecimentos, há que se referir que os  capítulos, neste livro, perfazem reflexões sobre eventos muito recentes. Novos acontecimentos devem ampliar os limites, contradições e possibilidades nos artigos e  os  autores  podem,  futuramente,  modificar  suas  próprias  concepções  ao  refletir  sobre  os eventos  aqui  abordados.  Justamente por  tal  motivo,  a  presente  obra,  que  cobre  fenômenos sociológicos distintos e complexos, pode ser encarada como marco para o desenvolvimento de novos  estudos  sobre  o  constitucionalismo latino-americano  e  como  convite  ao  leitor  para reflexões sobre  nossa  Pátria  Grande.  A  transversalidade  de  questões  ambientais,  de  direitos humanos, da qualidade e natureza da democracia na região, tal qual apresentadas nos textos, com efeito,   abrem,   de fato,   dilemas a   serem   analisados   por   outros   desenvolvimentos acadêmicos no que tange, fundamentalmente, a compreensão das correlações de forças políticas e econômicas e o papel das instituições e movimentos estatais e não estatais para a realização ordinária das constituições atuais e para o constitucionalismo do futuro. A  presente  obra, desse  modo,  deve  ser  encarada  como  um  convite  para  que  o constitucionalismo latino-americano   possa   ser   encarado   com   a   profundidade   que   sua complexidade exige – e longe de preconcepções rasas oriundas do norte global.

 

O livro traz todas as referência para qualificar os organizadores e as autoras e autores, numa síntese biobliográfica. Ao final há registros fotográficos dos organizadores-autores para completa identificação. E para os pesquisadores um índice remissivo, minimalista, com alguns dos termos que os organizadores consideraram atribuir relevância.

Fiquei muito contente de ter um texto meu em co-autoria com Gladstone Leonel da Silva Junior. Ele abre a edição afinado com o recorte sociológico que foi o seu fio condutor. Os Organizadores se empenharam na Apresentação em atribuir relevo ao nosso enfoque, reconhecendo a consistência que O Direito Achado na Rua já logrou estabelecer, a partir da fortuna crítica de suas contribuições para a teoria do direito em 30 anos de construção de formulação teórico-política.

Não é emulativa essa distinção. Agora ao final de 2022 a Revista de Direito do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da UnB lançou edição especial inteiramente dedicada a O Direito Achado na Rua e sua Contribuição para a Teoria Crítica do Direito – (v.6 n. 2 (2022): Revista Direito. UnB |Maio – Agosto, 2022, V. 06, N. 2 Publicado: 2022-08-31. O Direito Achado na Rua. Contribuições para a Teoria Crítica do Direito. Edição completa PDF (https://periodicos.unb.br/index.php/revistadedireitounb/issue/view/2503). Sobre essa edição conferir em Jornal estado de Direito: http://estadodedireito.com.br/30425-2/.

Nesse e em outros trabalhos vai transparecer que muito da fortuna crítica dessa proposta teórica se concentra no cuidado de perceber os “achados” que têm permitido a atualização de suas linhas de pesquisa. O Constitucionalismo Achado na Rua pode ser considerado um desses achados.

Na edição comemorativa da Revista Insurgência 8 n. 2 (2022): Dossiê: “IPDMS, 10 anos de história e desafios”. Julho a dezembro de 2022. Organização do dossiê: Carla Benitez Martins, Diego Augusto Diehl, Luiz Otávio Ribas e Ricardo Prestes Pazello. DOI: https://doi.org/10.26512/revistainsurgncia.v8i2. Publicado: 31.07.2022 (http://estadodedireito.com.br/dossie-ipdms-10-anos-de-historia-e-desafios/) tive o ensejo, a propósito dessa designação, de alinhar os pontos que foram demarcando sua origem e desenvolvimento.

A partir da publicação, no Dossiê, do artigo de Leura Dalla Riva (p. 406-421), doutoranda em Diritto Comparato e Processi di Integrazione pela Università degli Studi della Campania Luigi Vanvitelli, Italia. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Especialista em Direito Ambiental e Sustentabilidade pela Faculdade Educacional da Lapa (FAEL). Bacharel em Direito pela Universidade Regional de Blumenau (FURB). Pesquisadora do CONSTINTER-FURB e da REDEMARX, que tem como título Bem viver e o “Constitucionalismo Achado na Rua”: um olhar a partir da teoria da ruptura metabólica, fui fazendo o alinhavo desse percurso, inteiramente aberto. Meus alunos de graduação na UnB, da disciplina Pesquisa Jurídica, neste semestre 2/2022, estão preparando para a wikipedia o verbete Constitucionalismo Achado na Rua (assim como seus colegas de semestres anteriores já editaram os verbetes Direito Achado na Rua, Roberto Aguiar e Sujeito Coletivo de Direito. Na mesma agenda programática os alunos de pós-graduação (Mestrado e Doutorado), da disciplina O Direito Achado na Rua, da Faculdade de Direito e do Centro de Estudos Avançados Multidisciplinares, da UnB, estão preparando o volume 7 da Coleção Direito Vivo, da Editora Lumen Juris, cuja retranca é O Direito Achado na Rua (o vol. 2 da Coleção é O Direito Achado na Rua: Concepção e Prática; o vol. 5 O Direito Achado na Rua: Emergências, Revisitações e Travessias; o 7, em edição O Direito Achado na Rua: Sujeitos Coletivos de Dirteito; o 7º O Direito Achado na Rua: Constitucionalismo Achado na Rua.

Voltando ao meu ensaio de recensão sobre o Dossiê do IPDMS, tomo o Resumo do artigo de Leura Dalla Riva. Assim, temos que a Autora parte de uma análise da crise ecológica hodierna como resultado da ruptura metabólica existente  entre  seres  humanos  e  natureza  e  suas  consequências,  este  artigo  focaliza  o desenvolvimento  do  novo  constitucionalismo  latino-americano  como  um  movimento “achado na rua”. A pesquisa tem como problema de pesquisa: em que medida o novo constitucionalismo   latino-americano   abre   caminhos   para   a   superação   da   ruptura metabólica ao consagrar a ideia de Bem Viver? Para tanto, utiliza-se abordagem dedutiva. Primeiramente,  aborda-se  a  categoria  “ruptura  metabólica”  com  especial  foco  na exploração da natureza na América Latina, o que envolve a abordagem de questões como capitalismo dependente no continente e o histórico extrativismo. Num segundo momento, analisa-se qual o papel das constituições da Bolívia e do Equador como construtoras de um  constitucionalismo  achado  na  rua  e  apresentam-se  as  origens,  conceitos  e  aspectos principais da ideia de “Bem Viver” a partir dos povos latino-americanos. Por fim, aborda-se em que aspectos essas constituições apontam para a superação da ruptura metabólica em prol da ideia de Bem Viver.

Esse texto vem se agregar a um bem constituído modo de pensar o constitucionalismo, enquanto constitucionalismo achado na rua, tal como temos os pesquisadores do Grupo de Pesquisa com a mesma denominação – O Direito Achado na Ria (certificado no Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPQ), tal como o mais atualizado, até aqui, percurso dos estudos com essa concepção, conforme descrito a seguir.

Desde logo, uma mais estendida e circunstanciada aproximação entre O Direito Achado na Rua e o Direito Insurgente, foi apresentada pelo professor De la Torre Rangel, durante o Seminário Internacional O Direito como Liberdade 30 Anos do Projeto O Direito Achado na Rua, em sua contundente comunicação Constitucionalismo Achado na Rua en México: de los acuerdos de San Andrés al concejo indígena de gobierno (De la TORRE RANGEL, 2021).

As experiências registradas no México, tendo como base as lutas sociais por emancipação, têm o caráter de uma revisão crítica da historiografia do país, na percepção da insurgência e do processo instituinte de direitos, repondo o tema do constitucionalismo desde baixo, nas anotações de planos e acordos estabelecidos nos embates para estabelecer projetos de sociedade. Relevo para os acordos de San Andrés, pela conformação constitucional que os caracterizam.

Como anota a peruana Raquel Yrigoyen Fajardo (YRIGOYEN, 2011), aferindo as experiências constitucionais na América Latina, incluindo o Canadá, há um primeiro ciclo caracterizado como “constitucionalismo multicultural” (Canadá, 1982), (Guatemala, 1985), (Nicarágua 1987) e (Brasil, 1988). O segundo ciclo referente ao “constitucionalismo pluricultural” (Colômbia, 1991), (México e Paraguai, 1992), (Peru, 1993), Bolívia e Argentina, 1994), (Equador, 1996 e 1998) e (Venezuela, 1999). E o terceiro ciclo, finalmente, é reconhecido pelo alcance de um “constitucionalismo plurinacional”, a partir das inovadoras Constituições do (Equador, 2008) e (Bolívia, 2009), nas quais, diz Raquel, já se trata de um ciclo pluricultural, plurinacional e ecológico, nas quais “se pluraliza a definição de direitos, a democracia e a composição dos órgãos públicos e as formas de exercício do poder”.

Raquel Yrigoyen, que já inscrevera em sua concepção a tese de um constitucionalismo plurinacional, tem avançado fortemente, desde seu diálogo com as cosmogonias e cosmovisões dos povos ancestrais, em direção a um constitucionalismo ecológico ou eco-constitucionalismo (YRIGOYEN, 2021), sem contudo abdicar de suas teses originais sobre o pluralismo jurídico.

Ainda que nessa passagem o foco da leitura do pluralismo jurídico, desde a leitura de Raquel Yrigoyen, compreendido propriamente como pluralismo jurídico igualitário (consulte-se entre outros estudos, os escritos fundamentais com aberturas inéditas para a aplicação dessa categoria, de Boaventura de Sousa Santos – sempre presente nas atividades do IIDS -, até o mais recente de Antonio Carlos Wolkmer e de Maria de Fatima S. Wolkmer, (WOLKMER; WOLKMER, 2020), se dirija aos povos indígenas e originários, essa acepção, orientada “por uma racionalidade jurídica diferente”, que nela, alcança também os ronderos campesinos, em enfoque autoral bem conhecido:

Outro claro ejemplo de racionalidade jurídica diferente, resulta em palavras de               Yrigoyen, la de las Rondas Campesinas, que si bien nacen em uma primera etapa, como respuesta a uma demanda de seguridade, frente al robo y el abigeato se traduce finalmente, en prácticas sociales de auto administración de justicia” (SONZA, Bettina. 1993).

Tal como dissemos eu e meu colega Antonio Escrivão Filho (ESCRIVÃO FILHO; SOUSA JUNIOR, 2019), mais que reconhecimento de direitos, tais ciclos tratam do grau de abertura à efetiva participação constituinte das distintas identidades, aliado à efetiva incorporação de seus valores sociais, econômicos, políticos e culturais não apenas no ordenamento jurídico, mas no desempenho institucional dos poderes, entes e entidades públicas e sociais.

Ou seja, a partir do que atualmente, com as experiências constituintes em curso na América Latina, com as novidades trazidas pela proposta de Constituição do Chile, aprofundam-se temas emergentes de um constitucionalismo em chave decolonial, que para Antonio Carlos Wolkmer em texto publicado há poucos dias – Notas para Pensar la Descolonización del Constitucionalismo en Latinoamérica in Constitucionalismo en clave descolonial / Amélia Sampaio Rossi … [et al.].; Liliana Estupiñán- Achury, Lilia Balmant Emerique, editoras académicas. — Bogotá: Universidad Libre, 2022.

A novidade agora vem do Chile, e aponta para o que Wolkmer identifica como propostas de um constitucionalismo crítico na ótica do sul global referida a aportes do constitucionalismo transformador de que fala Boaventura de Sousa Santos, do constitucionalismo andino, pluralista, horizontal decolonial, comunitário da alteridade, ladino-amefricano e, ainda, do constitucionalismo achado na rua.

É a partir dessa perspectiva, algo que deixo como sugestão ao autor para suas pesquisas futuras considerando que o que vou dizer não se colocava quando o trabalho foi publicado. Ou seja, a partir do que atualmente, com as experiências constituintes em curso na América Latina, aprofundar temas emergentes de um constitucionalismo em chave decolonial.

Disso cuida Antonio Carlos Wolkmer em texto publicado há poucos dias – Notas para Pensar la Descolonización del Constitucionalismo en Latinoamérica in Constitucionalismo en clave descolonial / Amélia Sampaio Rossi … [et al.].; Liliana Estupiñán- Achury, Lilia Balmant Emerique, editoras académicas. — Bogotá: Universidad

Para Wolkmer, “la propuesta de un constitucionalismo crítico bajo la óptica del sur global puede ser contemplada en los aportes innovadores de la propuesta del consti tucionalismo transformador de Sousa Santos, B. de y de las variaciones presentes que tienen en cuenta las epistemologías del sur y, más directamente, del constitucionalismo andino, ya sea en la vertiente del constitucionalismo pluralista (Yrigoyen Fajardo, 2011; Wolkmer, 2013, p. 29; Brandão, 2015), del constitucionalismo horizontal descolonial (Médici, 2012), constitucionalismo comunitario de la alteridad (Radaelli, 2017), constitucionalismo crítico de la  liberación (Fagundes, 2020), constitucionalismo ladino-amefricano (Pires, 2019) o aún del constitucionalismo hallado en la calle (Leonel Júnior, 2018)”.

Realmente Gladstone Leonel Junior trouxe essa designação, ainda sem a aprofundar em seu livro de 2015, reeditado – Novo Constitucionalismo Latino-Americano: um estudo sobre a Bolívia, 2a. Edição. SILVA JUNIOR, Gladstone Leonel. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, (SILVA JUNIOR, 2018).

Na segunda edição, novas questões ensejam novas análises para a construção de um projeto popular para a América Latina a partir do que a experiência na Bolívia e em outros países nos apresenta. Das novidades dessa edição, a Editora e o Autor destacam: Um capítulo a mais. Esse quarto capítulo debate “O Constitucionalismo Achado na Rua e os limites apresentados em uma conjuntura de retrocessos”. A importância do mesmo está na necessidade de configurar um campo de análise jurídica que conjugue a Teoria Constitucional na América Latina com o Direito Achado na Rua, situando então, o Constitucionalismo Achado na Rua.

O livro, aliás, pavimenta o caminho para estudos e pesquisas nessa dimensão do constitucionalismo e o próprio professor Gladstone Leonel, em sua docência na Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense, criou a disciplina “O Constitucionalismo Achado na Rua e as epistemologias do Sul”, ofertada no programa de pós-graduação em Direito Constitucional na UFF.  O programa da disciplina e maiores informações podem ser obtidos no seguinte site: http://bit.ly/2NqaABn.

Resenhei esse percurso em http://estadodedireito.com.br/novo-constitucionalismo-latino-americano-um-estudo-sobre-bolivia/. Claro que em O Direito Achado na Rua: Concepção e Prática, volume 2, cit., no capítulo (Parte IV): O Direito Achado na Rua: Desafios, Tarefas e Perspectivas Atuais, já inscrevemos uma anotação programática nessa direção, ao indicar (p. 224): que “Essas experiências refletem uma espécie de ‘Constitucionalismo Achado na Rua’, em que os atores constituintes, os protagonistas desses processos, que envolveram povos indígenas, feministas, campesinas e campesinos, trabalhadoras e trabalhadores e setores historicamente excluídos, arrancam do processo constitucional novas formas de pluralismo jurídico e conquistas de Direitos”.

Com Gladstone eu também trabalhei o tema, procurando fixar a sua mais precisa enunciação. Assim, em Revista Direito e Práxis, On-line version ISSN 2179-8966 (http://old.scielo.br/scielo.php?pid=S2179-89662017000201008&script=sci_abstract&tlng=pt). LEONEL JUNIOR, Gladstone  and  GERALDO DE SOUSA JUNIOR, José. A luta pela constituinte e a reforma política no Brasil: caminhos para um “constitucionalismo achado na rua”. Rev. Direito Práx. [online]. 2017, vol.8, n.2, pp.1008-1027. ISSN 2179-8966.  https://doi.org/10.12957/dep.2017.22331, valendo o resumo: “A crise política brasileira, evidenciada a partir de junho 2013, enseja novas reflexões para a conjuntura recente. A reforma do sistema político é necessária e um das formas de viabilizá-la é por meio de uma Assembleia Constituinte. Sobretudo, se observado os movimentos político-jurídicos dos últimos 15 anos nos países da América Latina. Cabe refletir sobre o momento e as possibilidades dessa aposta pautando-se em um ‘constitucionalismo achado na rua’”.

Quase que simultaneamente, também com Gladstone publicamos em La Migraña… Revista de Análisis Político, nº 17/2016. Vicepresidencia del Estado Plurinacional de Bolívia: La Paz, o artigo La lucha por la constituyente y reforma del sistema político em Brasil: caminhos hacia um ‘constitucionalismo desde la calle’.

Com essas referências, alcança-se o patamar que, juntamente com Antonio Escrivão Filho (ESCRIVÃO FILHO; SOUSA JUNIOR, 2016), especialmente no Capítulo V – América Latina, desenvolvimento e um Novo Constitucionalismo Achado na Rua, páginas 123-150), enunciamos, vale dizer, que o Constitucionalismo Achado na Rua vem aliar-se à Teoria Constitucional que percorre o caminho de retorno a sua função social. Uma espécie de devolução conceitual para a sociedade, da função constitucional de atribuir o sentido político do Direito, através do reconhecimento teórico-conceitual da luta social como expressão cotidiana da soberania popular. Um reencontro entre a Teoria Constitucional, e o Direito compreendido como a enunciação dos princípios de uma legítima organização social da liberdade (p. 149).

Com pesquisadores do Grupo de Pesquisa O Direito Achado na Rua (Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq), organizamos o livro O Direito Achado na Rua: questões Emergentes, revisitações e travessias (SOUSA JUNIOR, 2021), um capítulo é dedicado ao tema: Constitucionalismo Achado na Rua, com os temas A Democracia Constitucional e a Proposta para um Constitucionalismo Inclusivo no Brasil, de Bárbara R. R. C. de Oliveira, Jean Patrício da Silva, João Paulo Santos Araújo, Samuel Barbosa dos Santos e Betuel Virgílio Mvumbi; e O Constitucionalismo Achado na Rua, os Sujeitos Coletivos Instituintes de Direito e o Caso APIB na ADPF nº 709, de Marconi Moura de Lima Barum, Mauro Almeida Noleto, Priscila Kavamura Guimarães de Moura e Renan Sales de Meira.

É sempre estimulante poder construir com os compromissos de engajamento, sobretudo epistemológico, escoras teóricas para anaçar nessas emergências, revisitações e travessias, em arcos de cooperação não apenas orgânicos – os Grupos de Pesquisa – mas nos encontros conjunturais com aliados acadêmicos nos eventos, disciplinas e projetos que nossos coletivos de ensino, extensão e pesquisa proporcionam.

É nesse ambiente que podemos localizar abordagens instigantes que acolhem os achados desse processo, assimilando-os as suas estruturas de análise e de aplicação, e prorrogando seu alcance heurístico para novos níveis de discernimento. Assim, nesse recorte aqui realizado, o texto de Antonio Carlos Bigonha (Subprocurador-Geral da República, atua na 2a. Seção do Superior Tribunal de Justiça, proferindo pareceres em Direito Privado. Foi presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (2007/2011) e coordenador da 6a. Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais da PGR (2019/2021), além de destacado compositor, pianista e mestre em Música pela Universidade de Brasília. O texto, originalmente publicado na página do IREE, Instituto para Reforma das Relações entre Estado e Empresa, foi reproduzido pelo Expresso 61 (https://expresso61.com.br/2022/02/17/darcy-ribeiro-a-unb-e-o-constitucionalismo-achado-na-rua/), com o título Darcy Ribeiro, a UnB e o constitucionalismo achado na rua:

A interpretação constitucional que setores retrógrados da magistratura e do Ministério Público adotaram para o exercício arbitrário de suas prerrogativas e atribuições, ao longo dos últimos 30 anos, faria corar monges de mármore, para usar uma expressão muito referida pelo ministro Gilmar Mendes, em sessões de julgamento no STF. Desconheço em que fonte foram beber seu fundamento teórico, fruto talvez de uma corrupção semântica, resultado da leitura equivocada da matriz germânica ou estadunidense. Neste contexto, o Direito Achado na Rua afirma-se como um poderoso vetor hermenêutico, uma abertura capaz de barrar os exageros do neoconstitucionalismo e oferecer novas epistemologias que conduzam à interpretação da Constituição e das leis do País para a afirmação e o fortalecimento dos direitos humanos, segundo uma agenda comprometida com os interesses do nosso povo. E ouso supor que Darcy Ribeiro e Machado Neto subscreveriam, novamente, esta virada hermenêutica.

 

Em comunicação oral realizada no GT 12- Constitucionalismo achado na rua, por ocasião do Seminário Internacional O Direito como Liberdade – 30 Anos do Projeto O Direito Achado na Rua, Menelick de Carvalho Netto e Felipe V. Capareli, com o título “O Direito Encontrado na Rua, a Luta por um Constitucionalismo Plural e Inclusivo, e a necessidade de enfrentar o risco autoritário de uma política simplista e privatizante. Visão dicotômica do Estado e do Direito” (Revista da Defensoria Pública do Distrito Federal (RDPDF, 2019, vol. 1, n. 2) – Dossiê Ordenamentos jurídicos, monismos e pluralismos: O Direito Achado na Rua e as possibilidades de práticas jurídicas emancipadoras), também extraem consequências dessa dimensão constitucional estabelecida na rua.

É com esse acumulado que chegamos ao Seminário Internacional O Direito como Liberdade: 30 Anos do Projeto O Direito Achado na Rua, realizado em Brasília, na UnB, em dezembro de 2019. No programa toda uma seção (Seção III) para o tema Pluralismo Jurídico e Constitucionalismo Achado na Rua. Esse material veio para o volume 10 da Série O Direito Achado na Rua: Introdução Crítica ao Direito como Liberdade. Brasília: Editora UnB/Editora da OAB Nacional, 2021. Na seção podem ser conferidos os textos: Pluralismo Jurídico Comunitário-Participativo: processos de descolonização desde o Sul, de Antonio Carlos Wolkmer; A Contribuição do Direito Achado na Rua para um Constitucionalismo Democrático, de Menelick de Carvalho Netto; Constitucionalismo Achado na Rua em México: de los acuerdos de San Andrés al concejo indígena de gobierno, de Jesús Antonio de la Torre Rangel; O Direito à Alimentação como um Direito Humano Coletivo dos Povos Indígenas, de Raquel Z. Yrigoyen Farjado; e Constitucionalismo Achado na Rua: reflexões necessárias, de Gladstone Leonel Júnior, Pedro Brandão, Magnus Henry da Silva Marques (SOUSA JUNIOR, 2021).

É importante “recordar que o constitucionalismo é permanente tentativa de se instaurar e se efetivar concretamente a exigência idealizante que inaugura uma modernidade no nível da organização de uma sociedade complexa, incapaz de lançar mão de fundamentos absolutos e que, por isso, só pode legitimar seu próprio sistema de direitos na medida em que os potenciais podem se reconhecer como coautores e autoras das normas que os regem. Ou seja, ou o direito é constitucionalmente achado na rua e nas ruas, e com as ruas, é construído e reconstruído de forma plural e inclusiva, ou, sem dúvida, tende-se a privatizar o próprio Estado, mediante a colonização do direito por uma lógica simplista binária de cunho plebiscitário e na da democrática, pois infensa a qualquer eficaz de bate”.

Para o constitucionalista português J. J. Gomes Canotilho, em sede de debate que envolve teorias de sociedade, teorias de justiça e teorias constitucionais, cuida-se de ter atenção à multiplicidade de sujeitos que se movem no debate constitucional contemporâneo que tende a abrir expectativas de diálogo político estruturado na linguagem do direito, gerando na expressão dele, “posições interpretativas da Constituição” que emergem desse processo  e formam uma luta por posições constituintes, luta que continua depois de aprovada a constituição (CANOTILHO, J. J. Gomes. Cf. Entrevista que me concedeu: Pela Necessidade de o Sujeito de Direito se Aproximar dos ‘Sujeitos Densos’ da Vida Real.  Constituição & Democracia. Brasília: Faculdade de Direito da UnB, n. 24, julho de 2008, p.12-13), luta travada pela disposição a ir para o meio da rua, pois “do outro lado da rua, o ‘direito achado na rua’ e, perante o sangue vivo que brota dos vasos normativos da realidade e a sedução de um direito outro, ao direito formal das constituições, códigos e leis, compreende-se que o discurso hermenêutico dos juristas mais não seja que um manto ocultador do insustentável peso do poder” (CANOTILHO, 2008a).

Ao final uma nota para novas aproximações a partir do diálogo que a instigante reflexão do professor Jesús Antonio de la Torre Rangel provoca, considerando que a sua obra atual, em ser uma continuidade adensadora de pressupostos epistemológicos para a crítica jurídica, é um completo catálogo de experiências confirmadoras do direito alternativo, do uso alternativo do Direito, do pluralismo jurídico e, ao fim e ao cabo, do direito insurgente, que surge do povo, pela emergência de sujeitos coletivos de direitos (SOUSA JUNIOR, 1990), que se inscrevem nos movimentos sociais, protagonistas de sua própria experiência de humanização e de emancipação, já que o humano é projeto, experiência na história (ESCRIVÃO FILHO; SOUSA JUNIOR, 2019a): “El derecho insurgente, del que trata este libro, forma parte de um processo de liberación de la alienación u opresión; se opone a la legalidade de la injusticia. Em el texto hemos destacado, sobre todo, las luchas indígenas y campesinas, por la autonomia y la defensa del território, como uma práctica jurídico-política de pueblos índios y campesinos; práctica en que [se materializa] el derecho que nace del pueblo como derecho insurgente”.

Minha colaboração com Gladstone Silva Junior portanto, vem de antes e recorta algumas das direções que dão densidade ao conceito. O nosso capítulo em Sociologia do novo constitucionalismo latino-americano: debates e desafios contemporâneos, não é nem a última, nem a única palavra nesse tema.

 

 

 

José Geraldo de Sousa Junior é Articulista do Estado de Direito, possui graduação em Ciências Jurídicas e Sociais pela Associação de Ensino Unificado do Distrito Federal (1973), mestrado em Direito pela Universidade de Brasília (1981) e doutorado em Direito (Direito, Estado e Constituição) pela Faculdade de Direito da UnB (2008). Ex- Reitor da Universidade de Brasília, período 2008-2012, é Membro de Associação Corporativa – Ordem dos Advogados do Brasil,  Professor Titular, da Universidade de Brasília,  Coordenador do Projeto O Direito Achado na Rua.55

 

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