Quem nos representa?

pessoas com dúvidas

Fonte: Bol Uol

Crise de representatividade no país

O filósofo Jean-Jacques Rousseau, no séc. XVII, já afirmava:

“O povo inglês pensa ser livre; está muito enganado, pois só o é durante a eleição dos membros do parlamento; tão logo estes são eleitos, ele é escravo, é nada”.

Esta conhecida assertiva cabe bem aos nossos dias. Em 2013/2014, foram vistos diversos cartazes escritos “não me representa”, nas várias manifestações de rua. Já em 2016, tem-se a polêmica com o pedido de impeachment da Presidenta da República, feito pela Ordem dos Advogados do Brasil-OAB.

Há um consenso que existe uma crise de representatividade no país. Todavia, não há uniformidade sobre o que fazer, a partir desta constatação. Este problema não é de hoje e só se agrava. Nossa Constituição afirma que o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente (§ único, do art. 1º, da CF).

Mas a própria Constituição torna falacioso este dispositivo, quando diz que mecanismos de democracia direta, como plebiscito e referendo, dependem de autorização do Congresso Nacional (art. 49, XV, da CF). Ao se verificar a Lei nº 9.709/1998, que trata do plebiscito, do referendo e da iniciativa popular, se percebe a dificuldade que é exercer a democracia direta no Brasil.

lutas sociais

Fonte: cafehistoria.ning.com

Quando surgiu o tímido Decreto nº 8.243/2014, que instituiu a Política Nacional de Participação Social – PNPS e o Sistema Nacional de Participação Social – SNPS, houve grande resistência dos setores mais conservadores do país. Tímido, porque instituía esta participação, predominantemente, de forma consultiva. Saiu da pauta política, sem a maior parte da população entender sobre do que se tratava.

Existe um distanciamento dos representantes de seus representados. Aqueles assumem os mandatos e fazem coisas a revelia de quem representam e, até por vezes, contrárias às funções que devem exercer. Exemplo claro disto, foi o episódio do pedido de impeachment da Presidenta feito pela OAB.

As redes sociais demonstraram um racha de posições a favor e contra dentro deste segmento profissional. As manifestações nas sedes das seccionais da OAB e o protesto que recebeu os representantes da Ordem no Congresso Nacional, também expuseram a insatisfação de boa parcela da classe.

Quem acompanha as eleições da OAB sabe que, infelizmente, gira muito entorno de questões corporativas. Vale ressaltar que algumas delas são de importância para a democracia, como a defesa das prerrogativas. A quebra do sigilo profissional de 25 advogados pela “Operação Lava jato”, por exemplo, é uma violação de prerrogativas. Mas enfim, não se debate grandes pautas da política nacional.

 

Mãos para cima

Fonte: Jornal GGN

Defesa do Estado Democrático de Direito

Isto é de se lamentar, tendo em vista que a OAB tem o dever de defesa da Constituição, do Estado democrático de direito, dos direitos humanos e da justiça social, por exemplo (art. 44, I, da Lei nº 8.906/1994). Será que parte dos advogados e advogadas, que votaram nesta atual constituição da OAB, participariam das eleições da mesma forma, se soubessem que levariam a instituição a pedir o impeachment? Os episódios dos últimos dias põe em dúvida isto. Não só o bom senso, mas o respeito à categoria, impeliria os representantes a ouvirem os representados em questão de tal magnitude, que não foi centro do debate de suas eleições.

O que se espera de uma Instituição, que tenha como papel a defesa da Constituição e do Estado democrático de direito, é que não os violem. Dessa maneira, deve se ter o maior cuidado para que isto não seja posto em questão. No episódio do impeachment, parece que este cuidado não foi tomado.

Não se defende e nem se aperfeiçoa a democracia passando por cima dela ou a limitando. A crise da democracia representativa, seja na OAB, no Legislativo ou no Executivo, não deve servir pra violá-la.

Importante aproveitar o momento para implantar efetivos mecanismos de democracia direta. O ordenamento jurídico sempre prevê o controle e a participação social. Mas a realidade sempre colocou em cheque o respeito a estes princípios. A reforma política é um caminho. Mas não pode ser feita por quem não deseja desconcentrar o poder.

Vive-se um momento de suma importância para a democracia brasileira. As instituições devem ter zelo por certas conquistas e coragem de se desencastelar, para que o país possa enfrentar os reais problemas que afligem a maior parte da população.

 

Rodrigo de MedeirosRodrigo de Medeiros Silva é Articulista do Estado de Direito – formado em Direito pela Universidade de Fortaleza, pós-graduando em Direito Civil e Processo Civil, no Instituto de Desenvolvimento Cultural (Porto Alegre-RS). Foi assessor parlamentar na Câmara dos Deputados e na Câmara Municipal de Fortaleza. Foi advogado do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, de Sindicatos de Servidores Públicos Municipais e de Trabalhadores Rurais. Atuou na área do Direito da Criança e do Adolescente na Pastoral do Menor e no Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Ceará. Prestou serviço Association pour le Développemente Economic Regional- ADER, junto às comunidades indígenas cearenses Jenipapo-Kanindé, Pitagury, Tapeba e Tremembé. Participou do Fórum em Defesa da Zona Costeira do Ceará-FDZCC na defesa de comunidades de pescadores. Contribuiu com o Plano Diretor Participativo do Município de Fortaleza pela OAB-CE.  Também prestou consultoria à Themis-Gênero e Justiça, em Porto Alegre-RS. Integra a Comissão Nacional de Acesso à Justiça do Conselho Federal da OAB e o Conselho Consultivo da Ouvidoria da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul. É membro da Rede Nacional dos Advogados e Advogadas Populares-RENAP, Fórum Justiça-FJ e Articulação Justiça e Direitos Humanos-JUSDH. É consultor da UNESCO junto à Secretaria-Geral da Presidência da República.

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