Coluna Latinitudes
“Construímos muros demais e pontes de menos”
(Isaac Newton)
Nesta edição, a coluna traz uma reflexão sobre um tema que envolve não só a América Latina, mas a própria história da humanidade, que desde os tempos mais primórdios, lida com a questão dos limites físicos de territórios.
Esses limites físicos são inerentes da noção básica de propriedade. Jean-Jacques Rousseau escreveu em sua obra “A origem da desigualdade entre os homens” que a concepção de propriedade nasceu quando o homem teve a ideia de cercar um terreno qualquer e dizer “isto é meu”, fazendo obstáculos para que ninguém tomasse a sua então propriedade a partir dali.
O verdadeiro fundador da sociedade civil foi o primeiro que, tendo cercado um terreno, lembrou-se de dizer “isto é meu” e encontrou pessoas suficientemente simples para acreditá-lo. Quantos crimes, guerras, assassínios, misérias e horrores não pouparia ao gênero humano aquele que, arrancando as estacas ou enchendo o fosso, tivesse gritado a seus semelhantes: ‘Defendei-vos de ouvir esse impostor; estareis perdidos se esquecerdes que os frutos são de todos e que a terra não pertence a ninguém’. (Ob. Cit. )

Foto: Wikimedia Commons
Cercar… cercas, grades, fortes, muralhas, muros. A história da humanidade, quando pensamos em propriedade, é feita de limites físicos. E assim como a propriedade privada, os Estados também se valem desses empecilhos que parecem muitas vezes até absurdos e caricatos, já que existem fronteiras legais e a própria noção de soberania pra proteger o seu território e impedir a entrada fora das regras impostas.
Essas regras muitas vezes na história ultrapassaram as questões de controle de fronteira e de fluxo de entrada e a saída de pessoas. Os muros já serviram pra segregar os vassalos da linhagem nobre, nos tempos medievais, já serviram pra controlar quem podia ou não transportar carga e pagar tributos maiores ou menores como foi uma das funções da grande muralha da China e, é triste, mas verdade, já serviram pra separar além de famílias e uma nação inteira, todo o mundo, representado em dois pólos ideológicos antagônicos, na época da construção do muro de Berlim.
Exemplos não faltam, e todos são bem tristes, afinal, é um pouco difícil, e não é temerário afirmar que é mesmo quase impossível, imaginarmos que uma medida drástica como esta pode nascer num cenário social harmônico. O muro então sempre é ligado ao um conflito, seja de guerra declarada ou, em relação à nossa América Latina, em especial, visto como alternativa para dirimir problemáticas migratórias.

Foto: Commons
Dentre os nossos vizinhos que adotaram essa medida, trazemos como o exemplo do “muro da vergonha”, como é popularmente chamado o que é situado em Lima, no Peru, e que divide a cidade entre região central e periferia composta por ocupações irregulares, o que levou a comparar com os muros construídos nos arredores das favelas do Rio de Janeiro em 2009 – estes sob o pretexto de proteger de invasões as matas que circundam as áreas – e também, já num outro contexto, temos também na América Latina o muro construído entre as fronteiras de Equador e Peru, como parte das negociações de paz após a guerra de Cenepa de 1995.
Além desses, mas como forma de barrar a imigração ilegal, encontramos um muro de 1,3 km e 5 metros de altura entre as cidades de Posadas, na Argentina e Encarnación, no Paraguai. E, nesta região, a coluna destaca que em uma de nossas edições, conhecemos a identidade híbrida dos Brasiguaios e a história do fluxo migratório que desencadeou alguns conflitos fronteiriços que culminaram em várias medidas tributárias e legais e, além disto, levou a ser apresentada uma proposta de construção de muro também, assim como na fronteira do Paraguai com a Argentina.

Muro entre Tijuana e San Diego.
Foto: Wikimedia Commons
E, claro, a coluna não pode se olvidar de destacar o muro mais comentado da região, e um dos mais famosos do mundo, embora não exista ainda de fato, mas que há muito vem sendo cogitado; o muro que separaria os Estados Unidos do México tem sido alvo de muitas discussões.
Já na fronteira Argentina/Paraguai, foi feita uma petição requerendo a demolição do muro, que já conta com mais de 8 mil assinaturas da população local e, com relação à proposta de muro entre Brasil e Paraguai, ela segue disponível na plataforma do e-cidadania, mas não alcançou até hoje os 20 mil apoios necessários para q a ideia seja aceita como sugestão legislativa popular e levada ao debate entre os congressistas.
Isto nos leva à conclusão de que os muros não detém o apoio da população em geral, que parece preferir seguir, a priori, pelos caminhos da diplomacia, do diálogo e que acredita no poder da soberania e das Leis.
O ser humano é gregário por natureza, e muros não fazem mesmo parte dos nossos instintos, e nem deveriam mesmo; uma vida sem muros é bem melhor, e o quanto puderem ser evitados, devem ser.
Amicus autem protinus te vider! Até a próxima, amigos!
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Portal E-Guia do estudante. Disponível em https://guiadoestudante.abril.com.br/especiais/jean-jacques-rousseau/.
ROUSSEAU, Jean-Jacques. Discurso sobre a origem da desigualdade entre os homens. 1754. Disponível em: http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/desigualdade.pdf.
REPORTAGEM. El Comercio. Vários. Cenepa: 23 años después de la guerra. Disponível em: https://www.elcomercio.com/actualidad/cenepa-guerra-peru-frontera-militares.html
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Olivia Ricarte é Articulista do Estado de Direito. Servidora pública em Boa Vista-RR. Bacharel em Direito pela UNIFENAS/MG, foi bolsista do CNPQ em programa de iniciação científica. Foi advogada, é ex membro da comissão da mulher da OAB/RR. É especialista em Direito Constitucional pela Escola Superior de Direito Constitucional e em Filosofia e Direitos Humanos pela PUC. Integrou a Câmara de mediação e arbitragem Sensatus/DF. É graduanda em ciências sociais pela UFRR, é presidente regional da Rede Internacional de Excelência Jurídica. É coautora da obra “juristas do mundo”, lançada em 2017 em Sevilha, Espanha. Foi condecorada com as medalhas de mérito pela contribuição a ciência pelas universidades de Bari, na Itália e Porto, de Portugal. |
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