O que temer!?!

Coluna Valdete Souto Severo

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Execução de líderes

A onda de violência real consentida e praticada por quem deveria impedi-la não é nova. A vereadora do Rio de Janeiro, Marielle Franco, líder na luta pelos direitos humanos, assassinada no dia 14/03/2018, soma-se a uma lista triste e assustadora:

Paulo Sérgio Santos, morto em 08/07/2014 – líder quilombola na Bahia;
Simeão Vilhalva Cristiano Navarro, morto em 01/09/2015 – líder indígena no Mato Grosso;
Edmilson Alves da Silva, morto em 16/02/2016 – Líder comunitário em Alagoas
José Conceição Pereira, morto em 14/04/2016 – líder comunitário Maranhão;
José Bernardo da Silva, morto em 27/04/2016 – líder do MST em Pernambuco;
Almir Silva dos Santos, morto em 08/07/2016 – líder comunitário no Maranhão;
João Natalício Xukuru-Kariri, morto em 19/10/2016 – líder indígena em Alagoas;
Waldomiro costa Pereira, morto em 20/03/2017 – Líder MST no Pará;
Luís César Santiago da Silva, morto em 15/04/2017 – líder sindical no Ceará;
Valdenir Juventino Izidoro, morto em 04/06/2017 – líder camponês em Rondônia;
Eraldo Lima Costa e Silva, morto em 20/06/2017 – líder MST em Recife;
Rosenildo Pereira de Almeida, morto em 08/07/2017 – líder comunitário/MST;
José Raimundo da Mota de Souza Júnior, morto em 13/07/2017 – líder quilombola/MST na Bahia;
Fabio Gabriel Pacifico dos Santos, morto em 19/09/2017 – líder quilombola na Bahia;
Jair Cleber dos Santos, morto em 24/09/2017 – líder movimento agrário no Pará;
Clodoaldo dos Santos, morto em 15/12/2017 – líder sindicalista sindipetro RJ;
Jefferson Marcelo, morto em 04/01/2018, Líder comunitário no Rio de Janeiro;
Valdemir Resplandes, morto em 09/01/2018 – líder MST no Pará;
Leandro altenir Ribeiro Ribas, morto em 19/01/2018 – Líder Comunitário no Rio Grande do Sul;
Márcio Oliveira Matos, morto em 26/01/2018 – líder do MST na Bahia;
Carlos Antonio dos Santos, morto em 08/02/2018 – líder do movimento agrário no Mato Grosso;
George de Andrade Lima Rodrigues, morto em 23/02/2018 – líder comunitário em Recife;
Paulo Sérgio Almeida Nascimento, morto em 13/03/2018 – líder comunitário no Pará.

Em relação à Marielle, não há notícia de algum resultado das investigações acerca de seus algozes. Trata-se de um silêncio eloquente.

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Intervenção militar

Enquanto o Estado silencia sobre a execução daqueles que ousam desafiar quem detém o poder, Michel Temer se pronuncia, em encontro com empresários e políticos na diretoria da Fecomércio (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) de São Paulo, na capital paulista, no último 26 de março(1). Afirma que o golpe de 1964 foi fruto de vontade popular de centralização de poder, e que o Brasil precisa novamente de poder centralizado para voltar a crescer. Faltar com a verdade não é novidade em declarações como essa, basta pensar nos cerca de 153 milhões gastos pelo governo federal em propaganda em favor da reforma da previdência, apontada pela própria PGR como enganosa(2).
Não é preciso conhecer muito da história para saber que o golpe de 1964 não foi resultado de ânsia popular. Ao contrário, a tomada de poder pelos militares se deu, inclusive, para evitar a consolidação das propostas democráticas contida nas chamadas “reformas de base”.
Ainda assim, as declarações de Temer são assustadoras. Seja pela possibilidade de imaginarmos que o ser humano que ocupa a cadeira da Presidência da República realmente acredite em uma solução como essa, para o Brasil de 2018, seja pelo caráter simbólico de suas declarações.
Já estamos vivemos a intervenção militar no Rio de Janeiro e a violência real contra opiniões político-partidárias vem sendo estimulada por pessoas públicas, como Geraldo Alckmin, quando afirma que o “PT ‘colhe o que planta’”, quando se refere aos ataques a tiros a caravana de Lula(3), ou Bolsonaro, quando sugere que algumas mulheres merecem ser estupradas.
Em entrevista publicada pela Carta Capital, Vladimir Safatle faz uma observação fundamental: em 1964, a esquerda foi a última a perceber que as instituições não estavam mais valendo, que havíamos rompido o frágil pacto de convivência democrática(4). Não podemos repetir o mesmo equívoco em 2018.
Estamos há seis meses do pleito eleitoral, com a possibilidade de que um dos candidatos com mais intenção de voto seja impedido de participar do certame; com intervenção militar no Rio de Janeiro e com um ocupante do cargo de Presidente da República que se pronuncia publicamente minimizando o horror da ditadura militar no Brasil.
É preciso reagir. Cobrar solução para os crimes contra quem defende direitos humanos. Denunciar condutas que fazem apologia à violência, real ou simbólica. E, sobretudo, agir: sair às ruas, escrever, ocupar espaços de discussão e articular uma resistência que impeça que a história se repita, novamente como tragédia.

Referências

(1) http://bit.ly/2pM8qhq
(2) https://glo.bo/2GgLOAR
(3) http://bit.ly/2pJ3uL5
(4) http://bit.ly/2GhqnPQ

 

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Valdete Souto Severo é Articulista do Estado de Direito – Mestre em Direitos Fundamentais, pela Pontifícia Universidade Católica – PUC do RS. Doutora em Direito do Trabalho pela USP/SP. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Trabalho e Capital (USP) e RENAPEDTS – Rede Nacional de Pesquisa e Estudos em Direito do Trabalho e Previdência Social. Professora, Coordenadora e Diretora da FEMARGS – Fundação Escola da Magistratura do Trabalho do RS. Juíza do trabalho no Tribunal Regional do Trabalho da Quarta Região.

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