O princípio do planejamento familiar sofrendo limitações mediante interpretação do Superior Tribunal de Justiça

Coluna Direito da Família e Direito Sucessório, por Renata Vilas-Bôas, articulista do Jornal Estado de Direito

 

 

 

 

        Dentre os princípios que regem o direito das famílias temos o princípio do planejamento familiar. Por esse princípio temos que a família é livre para se constituir, em qualquer uma de suas espécies, e além disso, cabe ao casal decidir se terão filhos ou não e quantos filhos.

        Esse princípio encontra-se expresso na Constituição Federal de 1988 e acaba refletindo em diversas áreas. Assim, quando estamos falando em realizar uma laqueadura ou fazer uma vasectomia, é esse princípio que está por trás.

        Contudo, como todo e qualquer princípio ele pode sofrer limitações, e no caso específico, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que esse princípio pode ser mitigado quando tenta-se impor a um plano de saúde arcar com os custos de um tratamento de fertilização in vitro.

        E foi esse o entendimento e a decisão exarada pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, quando entendeu que a cláusula contratual do plano de saúde que veda expressamente a cobertura de tratamento de fertilização in vitro, não é abusiva. Vejamos a reportagem extraída do site do referido tribunal:

        Quarta Turma afasta cobertura de fertilização in vitro com exclusão expressa no plano de saúde

​       Por unanimidade, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que não é abusiva a negativa de cobertura, pelo plano de saúde, de tratamento de fertilização in vitro.

        Para o colegiado, determinar cobertura obrigatória da fertilização in vitro pode trazer indesejável repercussão no equilíbrio econômico-financeiro dos planos, o que prejudicaria os segurados e a própria higidez do sistema de suplementação privada de assistência à saúde.

        “A fertilização in vitro não possui cobertura obrigatória, de modo que, na hipótese de ausência de previsão contratual expressa, é impositivo o afastamento do dever de custeio do mencionado tratamento pela operadora do plano de saúde”, afirmou o relator, ministro Marco Buzzi.

        Exclusã​​​o expressa

        No caso julgado, o contrato continha cláusula que excluía expressamente o tratamento pleiteado pela beneficiária.

        A controvérsia teve origem em ação ajuizada por usuária de plano que, em razão de problemas de saúde (endometriose), teve recomendação médica de tratamento para engravidar por meio da técnica de fertilização in vitro.

        Em primeiro grau, o pedido foi julgado improcedente, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo deu provimento ao recurso da mulher para obrigar o plano a custear o tratamento, sob o argumento de que é possível interpretação abrangente acerca do alcance do termo “planejamento familiar” contido na legislação para incluir a fertilização in vitro.

        Equilíb​​rio

        Para o ministro Marco Buzzi, as controvérsias envolvendo a cobertura de tratamentos pelos planos de saúde devem contemplar tanto o efetivo atendimento às necessidades clínicas dos pacientes/contratantes quanto o respeito ao equilíbrio financeiro das instituições de saúde suplementar.

        Segundo o relator, a Resolução Normativa 192 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) indica que a inseminação artificial e o fornecimento de medicamentos de uso domiciliar não são de cobertura obrigatória, conforme o disposto nos incisos III e VI do artigo 10 da Lei 9.656/1998.

        Para Buzzi, não seria lógico que o procedimento médico de inseminação artificial fosse de cobertura facultativa e a fertilização in vitro, que possui característica complexa e onerosa, tivesse cobertura obrigatória.

        Prec​​edentes

        “A interpretação deve ocorrer de maneira sistemática e teleológica, de modo a conferir exegese que garanta o equilíbrio atuarial do sistema de suplementação privada de assistência à saúde, não podendo as operadoras de planos de saúde serem obrigadas ao custeio de procedimentos que são, segundo a lei de regência e a própria regulamentação da ANS, de natureza facultativa, salvo expressa previsão contratual”, observou.

        Ao citar diversos julgados, o ministro destacou que o entendimento predominante no STJ é de que os planos não têm a obrigação de custear a fertilização in vitro. Ele lembrou julgado recente da Terceira Turma (REsp 1.794.629) que deu provimento ao recurso de uma operadora para desobrigá-la de custear o tratamento.

Podemos ainda transcrever a ementa da decisão da Quarta Turma da relatoria da Ministra Isabel Galotti sobre o tema:

        AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. FERTILIZAÇÃO IN VITRO. NEGATIVA DE COBERTURA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. AGRAVO NÃO PROVIDO.

  1. A operadora de plano de saúde não está obrigada a proceder à cobertura financeira do tratamento de fertilização in vitro requerido pelos beneficiários, na hipótese de ausência de previsão contratual, uma vez que tal procedimento não se confunde com o “planejamento familiar” de cobertura obrigatória, nos termos do inciso III do artigo 35-C da Lei 9.656/98. Precedentes.
  2. Agravo interno a que se nega provimento.

        (AgInt no REsp 1834692/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 18/02/2020, DJe 27/02/2020)

renata vilas boas
*Renata Malta Vilas-Bôas é Articulista do Estado de Direito, advogada devidamente inscrita na OAB/DF no. 11.695. Sócia-fundadora do escritório de advocacia Vilas-Bôas & Spencer Bruno Advocacia e Assessoria Jurídica, Professora universitária. Professora na ESA OAB/DF; Mestre em Direito pela UPFE, Conselheira Consultiva da ALACH – Academia Latino-Americana de Ciências Humanas; Acadêmica Imortal da ALACH – Academia Latino-Americana de Ciências Humanas; Integrante da Rete Internazionale di Eccelenza Legale. Secretária-Geral da Rede Internacional de Excelência Jurídica – Seção Rio de Janeiro – RJ; Colaboradora da Rádio Justiça; Ex-presidente da Comissão de Direito das Famílias da Associação Brasileira de Advogados – ABA; Presidente da Comissão Acadêmica do IBDFAM/DF – Instituto Brasileiro de Direito das Familias – seção Distrito Federal; Autora de diversas obras jurídicas.

 

 

 

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