Manifestações do Estado de exceção contemporâneo: nas pegadas do nazismo

Luciana Ferreira Lima*

Marcelo José Ferlin D’Ambroso**

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Resumo: o estudo parte do destaque de pontos importantes das ideias de Carl Schmitt quanto ao fundamento e legitimidade que pregou às decisões do poder soberano em situações excepcionais, abordando, ainda, seu pensamento sobre ditatura e a democracia, em análise das funções políticas do Führer, enquanto detentor do poder político supremo, e o papel da ordem jurídica no estado de emergência. Num segundo momento, se busca contextualizar as diversas acepções de estado de exceção e sua aplicação para os tempos atuais, a partir de Giorgio Agamben, no que importa à Filosofia Política, conjugando retratos que fazem também outros autores como Luigi Ferrajoli, elucidando como reconhecer as manifestações do estado de exceção contemporâneo e como a política está controlada pelo capital. Conclui-se propondo formas de enfrentamento e resistência para preservação do Estado de direito e resgate da efetiva representatividade da democracia.

Palavras-chave: Nazismo. Estado de exceção. Biopolítica. Homo sacer. Poderes selvagens. Produção legislativa corrompida. Capitalismo. Desumanidade. Indiferença. Democracia representativa.

 

Abstract: the study the study draws attention to the important points of Carl Schmitt’s ideas about the foundation and legitimacy he preached to the decisions of sovereign power in exceptional situations, also addressing his thinking about dictatorship and democracy, analyzing the Führer‘s political functions, while holder of supreme political power, and the role of the legal order in a state of emergency. In a second moment, it seeks to contextualize the several aceptions of state of exception and its application in current times, starting from Giorgio Agamben, in what matters to Political Philosophy, combining portraits of the state of exception that also do other authors like Luigi Ferrajoli, elucidating how to recognize the manifestations of the contemporary state of exception and how political is controlled by capital. It concludes by proposing forms of confrontation and resistance in order to preserve the democratic State of Law and rescue of effective representativity of democracy.

Key-words: Nazism. State of exception. Biopolitics. Homo sacer. Wild powers. Corrupted legislative production. Capitalism. Inhumanity. Indifference. Representative democracy.

 

Resumen: el estudio parte del destaque de puntos importantes de las ideas de Carl Schmitt en cuanto al fundamento y legitimidad que predicó a las decisiones del poder soberano en situaciones excepcionales, abordando, aún, su pensamiento sobre dictadura y la democracia, en el análisis de las funciones políticas del Führer, cómo poseedor del poder político supremo, y el papel del orden jurídico en el estado de emergencia. En un segundo momento, busca contextualizar las diversas acepciones de estado de excepción y su aplicación para los tiempos actuales, a partir de Giorgio Agamben, en lo que importa a la Filosofía Política, conjugando retratos que hacen también otros autores como Luigi Ferrajoli, elucidando cómo reconocer las manifestaciones del estado de excepción contemporáneo y cómo la política está controlada por el capital. Se concluye proponiendo formas de enfrentamiento y resistencia para preservación del Estado de derecho y rescate de la efectiva representatividad de la democracia.

Palabras Clave: Nazismo. Estado de excepción. Biopolítica. Homo sacer. Poderes salvajes. Producción legislativa corrompida. Capitalismo. Inhumanidad. Indiferencia. Democracia representativa

 

Introdução: Carl Schmitt, Giorgio Agamben, Hannah Arendt e Michel Foucault – o nazismo, a biopolítica e o homo sacer

A temática do estado de exceção está em grande discussão na comunidade acadêmica. Trata-se de uma preocupação não somente das Ciências Jurídicas, mas também das Ciências Sociais, Políticas e, até mesmo, Econômicas, pois a determinação ou caracterização de uma situação excepcional atinge diretamente os atores sociais e reflete em vários aspectos da vida em sociedade.

O presente estudo parte da análise da evolução do pensamento schmittiano no contexto da teoria política e suas acepções de estado de exceção, as funções políticas do Estado e o papel da normatividade em condições de excepcionalidade, abordando, num segundo momento, as acepções contemporâneas da expressão a partir de Giorgio Agamben, as manifestações atuais de excepcionalidade que se fazem sentir e as soluções possíveis de resistência.

Conceitos políticos estruturantes da teoria de Schmitt, em especial suas concepções sobre ditadura e democracia, serão estudadas da perspectiva de realismo exacerbado do autor, culminando na sua defesa pretensiosa de afastamento da normatividade jurídica para a ascensão legítima do soberano: o Führer, com todas as dramáticas consequências que isso veio a provocar depois.

Foto: Wikimedia Commons

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As teorias schmittianas circundam o debate entre liberdade e igualdade, autoridade e democracia. Noções estas que têm como base o poder do Estado Soberano, diante de uma situação excepcional, uma vez que o direito não teria força para garantir o que Schmitt chama de “verdadeira democracia” ou “democracia pura”. Paradoxalmente, Schmitt acreditava que tudo isso era um caminho necessário para a democratização, uma vez que o sistema parlamentarista e a democracia não teriam ligação nenhuma. Como filiado ao partido nazista, apreciou a exceção sob a perspectiva teórica e vivenciou a excepcionalidade no momento em que foi preso pelas Forças Aliadas em 1945, ao final da Segunda Grande Guerra.

No pensamento de Carl Schmitt, como se explanará adiante, estado de exceção não é somente qualquer ordem de necessidade ou estado de sítio, mas um conceito a ser visto em sentido amplo, abrangendo também as decisões tomadas pelo soberano em situações extraordinárias e não previstas pelo direito.

O uso consagrado da expressão corresponde a uma situação de extrema emergência, calamidade ou grave ameaça à ordem constitucional democrática, que legitima o Estado a impor a suspensão temporária de direitos e garantias constitucionais, para que as decisões do Poder Soberano, que se fazem necessárias para o retorno da normalidade, sejam dotadas de eficiência. A expressão se vincula, pois, a uma situação excepcional, atípica, de caráter temporal e emergencial.

Contudo, essa interpretação de estado de exceção não é a única, pois as acepções utilizadas na doutrina contemporânea compreendem uma visão ampla do termo, com o fim de abranger o maior número de situações excepcionais possíveis. Assim, incluem-se no núcleo dessa terminologia outros termos, até mesmo usados como sinonímia, tais como: “estado de emergência”, “estado de sítio”, “estado de urgência”, “estado de alarme”, “estado de prevenção”, “estado de guerra interna”, “suspensão de garantias”, “lei marcial”, “poderes de crises”, “poderes especiais”, “toque de recolher”, etc. (DESPOUY, 2010, p. 80).

Atualizando o significado para os dias atuais, Agamben busca em Carl Schmitt a acepção de estado de exceção.

Com efeito, em sua obra “Homo Sacer: o poder soberano e a vida nua I”, Agamben (2002, p. 14) traz o conceito dos gregos de zoé, como vida nua, vida animal (ou, nas palavras de Hannah Arendt, o que concerne à esfera privada, oikos) e de bios como vida política, vida em grupo (Aristóteles – ou, também segundo Hannah Arendt, a esfera pública, polis).

Para desenvolver as manifestações do estado de exceção pós Segunda Guerra, o autor em epígrafe busca no Direito Romano arcaico a figura do homo sacer (homem sagrado), aquele que atentava contra as divindades e, por isto, cometia um delito grave, afetando a Pax Deorum, razão pela qual era declarado sagrado, ou seja, entregue às divindades e excluído da proteção do Direito e, nesta condição, matável e insacrificável, de modo que qualquer um podia mata-lo sem que cometesse crime – parricidi non damnatur.

Tal instituto arcaico é lembrado para demonstrar a vida nua do homo sacer ligada ao Estado como poder soberano, que retirava daquele que fosse assim declarado toda proteção jurídica, vinculando a pessoa à biopolítica.

Foto: Wikimedia Commons

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Agamben traz o holocausto como exemplo de estado de exceção, demonstrando como a Alemanha nazista, confundindo no führer – chefe de Estado (poder soberano), os conceitos de soberania e nação, a quem competia, em última instância, decidir quem era privado de cidadania (como na sacratio da Roma antiga – sacer esto), ou seja, o Estado incluindo o sujeito na ordem jurídica apenas para retira-lo da proteção desta ordem, lançando-o numa espécie de anomia. Eleito o povo judeu como referente negativo da raça ariana, a cidadania foi dele excluída e de outros grupos selecionados, ou seja, restaram excluídos da comunidade política (desnacionalização) e declarados, em similitude ao Direito Romano arcaico, homo sacer, isto é, vidas matáveis e insacrificáveis, cuja morte não representava homicídio.

Portanto, a solução final engendrada pelos nazistas corresponde à desnacionalização, mostrando na pessoa excluída da vida política a figura do homo sacer (vida nua). Por outras palavras, a nacionalidade é desnudada como uma máscara que vincula a pessoa à soberania (identificada com o poder), cuja retirada significa a desproteção jurídica (anomia).

Michel Foucault desenvolve o conceito de biopolítica esclarecendo tratar-se do exercício de poderes e dispositivos disciplinares sobre o indivíduo diretamente em seu corpo, de modo que o poder chega no corpo como um biopoder. Menciona, ademais, que a sociedade gera estruturas de poder, uma microfísica de poder além da lei.

Aprofundando a temática, se percebe a vida nua (bios) ligada ao Estado na forma que Hannah Arendt menciona como confusão entre vida nua e vida política (zoé), trazendo o espaço de operação da biopolítica, ou seja, o indivíduo ligado pelo nascimento ao Estado, à nação e à cidadania.

Como resultado, surge o poder de exceção, que aplica o ordenamento jurídico desaplicando-o (abrindo o campo), incluindo a vida mediante sua exclusão da comunidade política (homo sacer – vida nua, matável e insacrificável). O campo (anomia), visto como momento em que a lei se declara inaplicável, é, pois, o espaço de exercício do estado de exceção.

Com isto se aproxima o conceito de estado de exceção contemporâneo relativamente à aplicação e suspensão do Direito[1].

 

O pensamento de Carl Schmitt na análise do Estado de Exceção: a gênese do jusnazismo

Entre os anos de 1927 e 1932, Schmitt critica duramente o parlamento, se opondo ao nazismo, pregando o fim da existência desse sistema de governo e da separação dos poderes, tecendo críticas também às declarações de direitos fundamentais e ao Estado de Direito.

Já no ano seguinte, em 22 de abril de 1933, Heidegger escreve uma carta para Schmitt, convidando-o a contribuir com o nazismo. Schmitt aceita o convite e se filia ao partido nazista, pois a sua proposta de indeterminismo jurídico para fazer frente ao poder econômico e as crises encontrou grande receptividade na concepção nacional-socialista, já que os nazistas viam tanto na Constituição quanto nas demais normas jurídicas, um obstáculo às ações do partido e do Führer. (ALVES; OLIVEIRA, 2012)

Carl Schmitt foi de grande opositor ao nazismo ao grande jurista do Terceiro Reich e defensor de Adolf Hitler. E nesse período, de 1933 a 1939, é que o antissemitismo e a ideologia nazista fazem-se presentes em sua obra:

Sus declaraciones injuriosas contra los judíos eran aún peores. Ya en 1933, como gesto de obediencia a los nazis publicó un libro titulado Estado, Movimiento, Pueblo, en el que decía: “Un extraño a nuestro género puede realizar todos los esfuerzos para lucir como un pensador crítico y penetrante; tal vez pueda leer libros y escribir libros; pero piensa y entiende en términos distintos, porque es de un género distinto, y su pensamiento mas significativo sigue estando determinado por las condiciones existenciales de su género”. (SCHMITT apud MÜLLER, 2014, p. 67, grifo do autor).

Assim, seguia afirmando que a relação do pensamento judeu com o espírito e o trabalho alemão era uma “relação parasitária e astuciosa”. (RÜTHERS, 2016, p. 156)

Schmitt, como estadista que era, defendia a ideia de um Estado imponente, forte e aclamado pelo povo, posicionando-se radicalmente contra as ideias difundidas pelo Estado Liberal.

Em sua obra “O valor do estado e o significado do indivíduo” (1914), Schmitt se recusa a aceitar o arquétipo liberal das garantias dos direitos individuais, uma vez que o Estado Soberano, ao estabelecer o direito, não pode admitir a autonomia individual dos cidadãos, sob pena da ineficácia da ordem jurídica vigente. (ALVES; OLIVEIRA, 2012)

Nesse sentido afirma Schmitt “que al Estado de derecho liberal no le interesa la justicia, sino la legalidad formal, em tanto que al Estado nazista le interesa la justicia, que exige el castigo de los criminales.” (SCHMITT apud ZAFFARONI, 2017, p. 92).

O direito, no pensamento schmittiano, por si só, era desprovido da coerção necessária para a sua efetivação, por isso o direito necessitava da força coercitiva, a qual o Estado é detentora, pois somente assim haveria equilíbrio entre a normativa jurídica e os indivíduos.

Dessa forma, todo o direito alemão deveria ser dominado pelo espírito do nacional-socialismo e cada interpretação teria que ser no mesmo sentido do nacional-socialismo. (RÜTHERS, 2016, p. 63)

Assim nascia a defesa de Carl Schmitt de uma ordem estatal totalitária, fincada na soberania do Estado em detrimento da autonomia do indivíduo, com o fim maior de implementar e efetivar o direito por meio da força.

Adiante, em sua obra intitulada o “Romantismo Político” (1919), Schmitt critica o idealismo político, que sustenta a primazia da ética sobre a política, no qual as pessoas se submetem pelo bem da comunidade. Para ele, essa visão romântica da política é incapaz de estabelecer parâmetros normativos partilhados, tendo em vista a sujeição da realidade às exigências do interesse estético do indivíduo, fazendo com que este indivíduo se torne o centro absoluto de fundação da ordem.

Schmitt declara abertamente que qualquer forma de liberalidade ou autonomia do indivíduo resultaria na ruína das formas políticas e na incapacidade para oferecer uma direção essencial a esta experiência.

 

A ditadura e a exceção schmittianas: a deturpação do Direito

Nos anos que se seguem, Schmitt teoriza suas ideias sobre a exceção, a ditadura e o presidencialismo, destacando a necessidade desses institutos serem utilizados em substituição à normalidade normativa, ao Estado de Direito e ao parlamentarismo.

Schmitt começa a tracejar sua teoria política autoritarista em sua obra “A ditadura” (1921). Inicia seus preceitos afirmando que o fato de toda ditadura conter uma exceção a uma norma não quer dizer que seja uma negação causal de uma norma qualquer.

Este conteúdo dialético, presente no conceito da ditadura, se enraíza na medida em que a ditadura nega a norma cuja dominação deve ser assegurada na concretude política.

Dessa forma, para ele é perfeitamente possível a coexistência desses elementos opositores, ou seja, a norma que se pretende realizar e o método de sua realização. Não há possibilidade de separação das normas de direito das normas de realização do direito.

A ditadura alcança o status de modelo de supressão jurídica, pois permite a dominação de um procedimento jurídico que compromete um resultado concreto. Assim, por exemplo, a ditadura elimina totalmente o respeito ao direito de autonomia e a liberdade do indivíduo, se esta autonomia obstaculiza outro direito primordial à garantia da soberania do Estado:

Desde luego, quien no ve en la medula de todo derecho más que semejante fin, no está en situación de encontrar un concepto de dictadura, porque para el todo o ordenamiento jurídico es simplemente una dictadura, latente o intermitente. (SCHMITT, 1999, p. 27, grifo nosso).

Nesse contexto, afirma a existência simultânea da ditadura e do Direito, pois ela representaria o instrumento para alcançar as finalidades previstas na normatividade, mesmo que para isso atuasse de forma díspar e contraditória ao normativismo jurídico.

Schmitt traz essa concepção finalística do direito com base nos escritos de Rudolf Von Ihering que afirma ser o direito o salvador da sociedade e, caso este for incapaz de fazê-lo, a força deverá ser imposta, fazendo o que for necessário e imprescindível para manter a segurança da sociedade.

Por esta ótica, o Direito é concebido como uma ideia prática, isto é, designa um fim, e, como toda a ideia de tendência, é essencialmente dupla, porque contém em si uma antítese, o fim e o meio. Não é suficiente investigar o fim, deve-se também saber o caminho que a ele conduz:

(…) O direito não é uma ideia lógica, porém ideia de força; é a razão porque a justiça, que sustenta em uma das mãos a balança em que pesa o direito, empunha na outra a espada que serve para fazê-lo valer. (IHERING, 2009)

Para Carl Schmitt, o Estado como detentor legítimo da força, é o protetor e salvador da sociedade. Daí abstrai-se outro entendimento schmittiano: o poder do soberano possui legitimidade jurídica para suspender o direito e instalar uma ditadura, permitindo assim um estado de exceção. Para o ditador não há condicionantes, existe apenas a primazia de extinguir, a todo custo, qualquer obstáculo que impeça a concretização do direito.

Para tanto, o ditador poderia valer-se de dois modelos de ditadura: a ditadura comissária, que objetiva trazer de volta a normalidade a uma determinada ordem jurídica existente, ou seja, num primeiro momento ocorre o afastamento da ordem constitucional, com o objetivo de reestabelecer as condições normais para posterior regresso da efetividade dessa mesma normativa constitucional. Por fim, o ditador poderia valer-se de uma ditadura soberana, que visa criar uma nova ordem jurídica constitucional. Neste caso, o estado de exceção se converte na ab-rogação da Constituição e não apenas na sua suspensão, como no caso da ditadura comissária.

 

O estado de emergência e o espaço jurídico vazio: o campo de operação da ditadura soberana

Carl Schmitt, enquanto teórico do estado de emergência, publica seu livro chamado “Teologia Política” (1922), no qual concebe a outorga de poderes ao governo que, em princípio, não teriam limites:

(…) una vez declarado el estado de emergencia, es claro que la autoridad constituida del Estado sigue existiendo, mientras que el derecho retrocede… La decisión exime a esa autoridad de toda restricción normativa y la hace absoluta em el verdadero sentido de la palabra. Em un estado de emergencia, la autoridad suspende la ley sobre la base de un derecho de proteger su propia existencia. (SCHMITT apud MÜLLER, 2014).

Diante da excepcionalidade, pode-se vislumbrar quem é o soberano: aquele que decidirá sobre o estado de exceção. Desta forma, o conceito de exceção, no pensamento de Schmitt, é muito mais amplo do que a simples decretação de estado de emergência ou estado de sítio. Tão amplo que tal concepção não pode advir da norma abstrata, mas sim da própria situação fática de excepcionalidade. Logo, toda a decisão do Estado em uma situação de emergência não provém da lei, mas emana da situação de excepcionalidade. Conclui-se que o Estado não possui limites na norma jurídica para atuar, conforme propunha a doutrina liberalista veementemente atacada por Schmitt.

Refutando a abstração do dever-ser presente na norma jurídica, o ser, manifestado nos fatos da vida real, possui, em sua essência, um caráter excepcional. A ordem jurídica provém de uma normativa concreta, que é incapaz de antever decisões tomadas em um estado de emergência. Portanto, as decisões que o Estado toma se originam da excepcionalidade (espaço autônomo de decisão sobre os critérios do agir político) e não da normatividade.

Tal espaço autônomo de decisão política corresponde exatamente ao espaço jurídico vazio, conforme afirmava a teoria positivista – para os positivistas da época, esse espaço jurídico vazio seria um conjunto de fatos sociais que não são compreendidos pelo Direito, pois a ele não interessa. Schmitt sustenta sua tese de que as decisões do Estado estão fundadas na excepcionalidade, dizendo que nesse mesmo espaço jurídico vazio também se encontram fatos não tutelados pelo Direito, não porque a ele não interessa, mas porque não conseguiu prevê-los de antemão, criando, dessa forma, um espaço autônomo da decisão política.

Não se trataria do mero exercício da força por parte do Estado, ou de uma arbitrariedade em face da ordem jurídica vigente. Seria uma decisão “legítima”, pois não há, na norma positiva, qualquer parâmetro para reconhecer antecipadamente uma determinada situação como excepcional.

 

O conceito schmittiano de democracia pura e a incompatibilidade com o sistema de representação parlamentar

Democracia é um regime político que representa a maneira pela qual a unidade do povo se manifesta. Para Schmitt (2006), existem dois princípios que regem as formas políticas: a identidade e a representação.

O regime político estruturado no princípio de identidade depende da existência da atuação política do povo em sua concretude. Pressupõe que o povo seja uma unidade política.

Já o princípio da representação parte da ideia de que não é possível encontrar uma unidade política do povo como tal, pois não há uma identidade real. Por isso, a atuação política do povo tem que estar representada por um número determinado de pessoas.

A democracia é, para Carl Schmitt, identidade entre dominadores e dominados, entre governantes e governados. Essa igualdade substancial é requisito essencial da democracia. Para ele, não há uma diferenciação qualitativa, mas sim uma igualdade e homogeneidade democrática, onde todos devem permanecer. Essa é a chamada “democracia pura”, fundada numa pretensa igualdade absoluta (homogênea).

Na “democracia pura”, não há necessidade de representação, pois só alguém que não está presente pode ser representado (SCHMITT, 2006, p. 238), o que não seria o caso do povo. Por isso, Schmitt critica duramente o sistema parlamentar, conceituando-o como um organismo desarranjado e composto por facções particulares que não possuem capacidade política de assegurar a unidade do Estado:

A situação do sistema parlamentar tornou-se hoje extremamente crítica, porque a evolução da moderna democracia de massas transformou a discussão pública, argumentativa, numa simples formalidade vazia… Os partidos (que de acordo com o texto da Constituição escrita, nem existem oficialmente) atualmente não se apresentam mais em posições divergentes, com opiniões passíveis de discussão, mas sim como grupos de poderes sociais ou econômicos, que calculam os interesses e as potencialidades de ambos os lados para, baseados nesses fundamentos efetivos, selarem compromissos e formarem coalizões”. (SCHMITT, 1996, p. 08)

Para Schmitt, o caráter representativo do parlamento não é expressão de democracia, pois não atende aos interesses do povo, mas apenas de uma parcela da sociedade ali representada. Como se vê, o discurso não é inocente, pois faz da análise crítica a demagogia que substanciará a ideia de que a democracia pura ou real só existiria mediante a existência de um “povo homogêneo”, que tem vontade de existência política, uma vez que o poder do Estado emana do povo nas democracias. O indivíduo que governa só, possuiria a confiança do povo para fazê-lo.

Schmitt afirmava que o sistema partidário, no caso representado pelo partido comunista e pelo partido nacional-socialista, ameaçava o poder soberano, representado na figura do Führer. Defendia, assim, a suspensão da atividade parlamentar e a concentração das funções legislativas nas mãos do presidente do Reich que, sendo eleito pelo povo, deteria a sua confiança e estaria acima das organizações e burocracias dos partidos, o homem do povo e não do partido!

O posicionamento antinormativista de Schmitt ressalta a debilidade da crença liberal na força da legalidade. Exclusivamente com a materialização de uma ordem autoritária seria possível fazer frente às ameaças ao governo republicano. Sustentou que o extermínio e a prisão dos opositores de Hitler estavam dentro dos poderes legítimos do Führer.

Neste ponto, vale lembrar a obra de Karl Binding e Alfred Hoche, penalistas germânicos que fundamentaram o Direito Penal nazista, intitulada “A licença para a aniquilação da vida sem valor de vida”, pelo qual pregavam que a “vida indigna de ser vivida” podia ser definida pelo soberano como tal (que decide sobre o estado de exceção neste caso) e que, por conseguinte, podia ser morta sem que houvesse homicídio (vida matável e insacrificável, homo sacer, parricidi non damnatur), inaugurando a biopolítica moderna: decisão sobre o valor ou desvalor da vida.

Ao longo da história do regime totalitário podemos ver que a defesa de um estado de exceção teve consequências sérias, complexas e lastimáveis. Diante disso, podemos extrair duas máximas schmittianas a serem desconstruídas:

1) é necessário armar a democracia pura de instrumentos efetivos contra aqueles que a colocam em risco, mesmo que para isso seja necessário sobrepor-se à lei, à Constituição e aos direitos humanos e fundamentais (SCHMITT, 1932), e;

2) o soberano possui o poder supremo de decidir em uma situação excepcional. Poder este que é legal e legítimo, uma vez que o soberano age afastando a lei, em frente a uma situação de exceção, que não foi prevista no próprio direito, visando exatamente reestabelecer a normalidade para o retorno da aplicabilidade e efetividade do direito (SCHMITT, 1922).

Em síntese, segundo Schmitt, o Direito vem do poder (teologia política) e o poder que faz o Direito não está preso por ele, pois rompe o ordenamento jurídico quando quiser, de acordo com quem decide, ou, por outras palavras, quem tem o poder, capital ou poderio bélico e, como corolário, quem segue a norma não manda, na pretensa “homogeneidade democrática” com a suposta identidade entre dominantes e dominados.

Percebe-se, pois, o estado de exceção desnudado, na faceta primitiva da construção jurídica que levou a Alemanha nazista a engendrar o holocausto e causar a morte de mais de 60 milhões de pessoas na 2ª Guerra, enfeixando no Führer e no séquito de genocidas que o acompanhava o poder soberano capaz de estabelecer o estado de exceção total e a aplicação fática e direta do conceito de “campo” nos campos de concentração. Desde então, mais de setenta anos se passaram, todavia, a prática do estado de exceção permanece, embora com um novo verniz e novas formas sub-reptícias de se instalar nos governos contemporâneos.

A teoria do estado de exceção é, agora, revitalizada para, em contraposição total às ideias de Carl Schmitt, identificar e combater as manifestações perversas do estado de exceção na atualidade que seguem comprometendo o avanço das democracias e a consecução do bem-estar social.

 

Como reconhecer o estado de exceção contemporâneo

Tendo em consideração esse breve e sintético histórico, a evolução do conceito de exceção para os dias atuais evoca a suspensão antijurídica do ordenamento como técnica de governo na política contemporânea para controle social. Pelas palavras de Agamben, a criação voluntária de um estado de emergência permanente, embora não declarado no sentido técnico, como prática essencial dos Estados contemporâneos, mesmo nas democracias, como paradigma de governo na política. E prossegue dizendo que “(…) as medidas excepcionais encontram-se na situação paradoxal de medidas jurídicas que não podem ser compreendidas no plano do direito, e o estado de exceção apresenta-se como a forma legal daquilo que não pode ter forma legal” (AGAMBEN, 2004, p. 11-12).

Hannah Arendt, citada por Agamben, fala na política totalitária[2], aquela que dispensa o consensus iuris para sua legitimação, autorizando a extensão dos poderes enfeixados na figura do Chefe do Poder Executivo, atribuindo-lhe a tarefa de legislar. Tal enfeixamento de poderes representa, por outras palavras, o populismo vertido nas chamadas leis plenipotenciárias (JUNQUEIRA, 2017). Não obstante, a releitura do estado de exceção contemporâneo comporta a manifestação de forma sutil da lei de plenos poderes através da ativação ou desativação de instituições (v.g., avanços e recuos do Congresso no exercício do poder de legislar, fazendo-o contra a vontade popular, ou deixando de fazê-lo quando o povo deseja que faça, ou quando o Executivo se apropria da atividade legislativa sem nenhuma oposição do parlamento), chegando-se neste ponto na perversão da soberania popular, justamente o ponto de indiferença entre violência e o Direito que acaba positivada na norma produzida nestas condições.

Esse retrato do estado de exceção pode ser reconhecido em diversas acepções: para Agamben, um absolutismo contemporâneo; para Bobbio, novos despotismos; para Luigi Ferrajoli, poderes selvagens, aqueles que rejeitam limites e regras do estado de Direito; para Rui Cunha Martins, disfuncionalidades, desativação de propriedades de controle constitucional e legal (apud ARAÚJO, 2017, p. 92-3).

Foto: Shane T. McCoy, U.S. Navy

Foto: Shane T. McCoy, U.S. Navy

As possibilidades de aplicação do estado de exceção podem ser vertidas para o mal, como no nazismo, ou na justificativa de combate ao terrorismo (como Guantânamo), ou no chamado Direito Penal do Inimigo[3], ou, para algo mais dissimulado e atual, na produção legislativa corrompida. Em contrapartida, a aplicação positiva da expressão comporta a visão crítica, objeto deste estudo, no sentido de reconhecer as parcelas de exceção que acontecem nas democracias contemporâneas, a exceção permanente e disfarçada como paradigma de governo despótico, e que deve ser combatida.

Nestas manifestações contemporâneas do estado de exceção, Luigi Ferrajoli, com muita propriedade, ao mencionar o consenso social (populismo) com a violação da letra ou do espírito da Constituição, como fonte para legitimar abusos e deslegitimar controles, fala na rejeição a limites e neutralização de regras, funções e instituições de garantias, aprofundando-se numa democracia falida e minada pela intolerância ao pluralismo, à oposição parlamentar, às instituições, aos sindicatos e ao sistema de vínculos impostos a qualquer poder[4]. Interessante rever a teoria schmittiana contrária ao liberalismo, de que o poder do soberano não possui limites, para perceber que o neoliberalismo dela se apropria, recriando uma suposta “hegemonia democrática” – a diferença com o nazismo é que se assumia a prática explicitamente enquanto nos dias atuais está dissimulada.

Portanto, evidencia-se o estado de exceção através do exercício de parcelas do poder que excedem os limites constitucionais ou, nas palavras de Rafael Valim, em referência à Marie-Laure Basilien-Gainche[5], “parcelas de poder que, lícita ou ilicitamente, escapam aos limites estabelecidos pelo Estado de Direito”. No Brasil, pode-se citar como exemplos, particularmente as medidas fruto de recente produção legislativa corrompida (ilegítima), como a reforma trabalhista, a intenção de reforma da previdência, a medida provisória vertida em lei de desoneração tributária das petroleiras até 2040, o congelamento de gastos sociais por vinte anos, a proposta de Emenda Constitucional que suprime do Poder Judiciário a iniciativa para o Estatuto da Magistratura, o projeto de lei de alteração da Lei de Introdução ao Direito Brasileiro (LINDB) que inviabilizará, na prática, a invalidação de atos e contratos da Administração Pública pelo Poder Judiciário (retrocesso de duzentos anos no Direito Administrativo), o veto integral ao projeto de lei que disciplinava a negociação coletiva no serviço público etc. Legislação esta que, se permanecer vigente e interpretada segundo critérios juspositivistas dogmáticos, levará não só ao retrocesso social, como a um grave desequilíbrio na estrutura do Estado brasileiro, com consequências nefastas de difícil previsão.

De modo que os conceitos de estado de exceção, campo, consensus populi x consensus iuris, disfuncionalidades e poderes selvagens estão todos entrelaçados e se completam, tornando possível desnudar as manifestações dissimuladas do estado de exceção contemporâneo na atualidade.

 

Estado de exceção, capitalismo, desumanidade e indiferença

 Já advertia Gustav Radbruch[6] sobre a estagnação do jurista, do profissional do Direito pelo juspositivismo dogmático[7], diante de normas injustas e ilegítimas, que, neste caso, é um agravante porque faz com que a produção legislativa contrária ao Estado de Direito não seja questionada e, pior, acabe recebida como legítima pela sociedade (FERRAJOLI, 2011). Assim, aprofundam-se os poderes selvagens e o Estado acaba funcionando como exceção permanente, ativando-se e desativando-se as instituições e as propriedades de controle constitucional-legal de acordo com a vontade soberana do mercado, representado pelas autoridades públicas a seu serviço numa espécie de democracia sem povo, pois a decisão sobre o estado de exceção é tomada, na verdade, pelo mercado[8] (VALIM, 2017).

O dispositivo de segurança de controle social contemporâneo de validação desta conduta é a massmedia, na sociedade do espetáculo (em que a segurança cognitiva se revela pela expectativa em relação à conduta do outro – CERRUTTI, 2009). Ou, nas contundentes palavras de AGAMBEN (2015, p. 119-20) a propaganda do costumeiro e descarado discurso legitimante da crise econômica:

Nada é mais nauseante do que o descaramento com que aqueles que fizeram do dinheiro a sua única razão de vida agitam periodicamente o fantoche da crise econômica, e os ricos vestem, hoje, roupas austeras para alertar os pobres de que sacrifícios serão necessários para todos. Igualmente estupefaciente é a docilidade com que aqueles que se tornaram tolamente cúmplices do desequilíbrio da dívida pública, cedendo ao Estado todas as suas economias em troca de BOT, recebem sem pestanejar a admonição e se preparam para apertar o cinto. E, no entanto, qualquer um que tenha conservado alguma lucidez sabe que a crise está sempre em curso, que ela é o motor interno do capitalismo em sua fase atual, assim como o estado de exceção é hoje a estrutura normal do poder político. E assim como o estado de exceção requer que haja porções sempre mais numerosas de residentes desprovidos de direitos políticos e que, no limite, todos os cidadãos sejam reduzidos a vida nua, do mesmo modo a crise, tornada permanente, exige não apenas que os povos do Terceiro Mundo sejam sempre mais pobres, mas também que um percentual crescente de cidadãos das sociedades industriais seja marginalizado e sem trabalho. E não há Estado dito democrático que não esteja atualmente comprometido até o pescoço com essa fabricação maciça de miséria humana.

Foto: Agência Brasil

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Agamben (2002, p. 186) lembra que o projeto democrático-capitalista consubstanciado na eliminação das classes pobres nada mais faz do que transformar as populações do terceiro mundo[9] em vida nua (indigna de ser vivida – ou em licença para aniquilação da vida sem valor de vida, nas palavras de Karl Binding e Alfred Hoche), pois o Direito e o Estado estão permitindo a acumulação infinita de capitais, produzindo desigualdade social em nível muito superior à escravidão ou ao feudalismo, com controle da vida política pelo mercado e pelo capital financeiro (especulativo).

Ao fim e ao cabo, o capitalismo aqui identificado como poder político manipulador faz com que as pessoas se tornem indiferentes ou, nas palavras de István Meszaros (2011, p. 98-99), desumanizadas, e alheias a enxergar o estado de exceção que as exclui da proteção jurídica, como também, por outro viés, as dessensibilizam para um dos absurdos do nosso tempo, o convívio indiferente à realidade chocante dos moradores de rua, das pessoas que sobrevivem da mendicância e das favelas ao redor das cidades.

 

Conclusão

Como ensina o Prof. Dr. Carlos Piedra Buena, da Universidad del Museo Social Argentino, a ponta do iceberg não mostra o que está por baixo, que deve ser melhor investigado. Aprofundando, pois, nas conclusões deste breve artigo, deve-se entender as manifestações do estado de exceção contemporâneo como sintomas de algo mais além do que se vê, considerando-se uma de suas prováveis causas o déficit de representatividade, a falência da democracia contemporânea, id est, nas palavras de Rafael Valim, a democracia sem povo, ditada atualmente pelo mercado e exercida por políticos profissionais que exacerbam seu mandato.

Segundo Luigi Ferrajoli, a violação de princípios de uma democracia pode derrubá-la sem golpes de Estado, rebeliões ou dissenso. Nesse quadro de ausência de limites e controles, os poderes acabam se concentrando e acumulando em formas absolutas, tornando-se poderes selvagens, impondo-se a necessidade de defender, repensar e refundar o sistema de garantias constitucionais, para uma nova democracia representativa. Como uma das soluções possíveis a esse estado de exceção contemporâneo, Fran Alavina (2017), em referência ao livro Profanações, de Agamben, em sentido contrário à sacralização feita à pessoa declarada homo sacer (consagrada à divindade), fala em profanar a democracia, no sentido de desconsagrá-la, retirando-a do plano teológico-político e inacessível para trazê-la de volta ao plano do uso comum, recuperando-a ao cidadão e vinculando ao povo a representatividade perdida, extirpando a figura do político profissional.

Certo, no entanto, que, sem educação política do povo, a concretização dessa profanação da democracia se torna difícil, devendo, enquanto isso não acontece, prosseguir-se na visão crítica e no trabalho do intérprete e aplicador da lei no resgate da norma corrompida para o estado de Direito, identificando as normas viciadas e produzidas no contexto de estado de exceção.

Outra forma de vencer o estado de exceção é encontrar o ponto certo de regulamentação do mercado, evitando que a volatilidade de investimentos manipulada pelo capital financeiro especulativo determine os rumos políticos de um país.

Por fim, pensar na legitimidade do Estado Institucional Contemporâneo, quando se constatam atos de governo de afastamento da normatividade e relativização da ordem jurídica humanística, nos faz refletir a história, num sentimento de um genuíno “déjà vu”. Nos ascende um sentimento de que estamos às portas do inferno de Auschwitz ou Nuremberg… Somente observando… E que, a qualquer momento, a falácia democrática, sob o manto do Estado Democrático que não é mais democrático e nem de Direito, nos empurrará porta adentro.

 

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Notas:

[1] Agamben (2002) exemplifica o campo com as zonas de segurança de aeroportos, as favelas, os comatosos, conclamando o leitor a identificar os campos na sociedade em que vivemos.

[2] Lembrando que os totalitarismos obtiveram amplo consenso (consensus omnium) – mas a ideia de uma “vontade geral boa” (Rousseau) é uma ilusão, pois os sentimentos comuns são frágeis e mutáveis.

[3] Direito Penal do Inimigo: o idealizador da expressão é o alemão Günther Jakobs (1985), ao referir os inimigos do Estado, em referência ao terrorismo. Para ele, o Direito Penal seria reservado aos criminosos, enquanto que os declarados inimigos do Estado ficariam excluídos da proteção jurídica (homo sacer?). Sem aprofundar, faço referência ao artigo “Poderes corrompidos: a inconstitucionalidade da tragicômica medida provisória 808-17” (JUNQUEIRA, 2017), para indagar se, no Brasil, com a reforma trabalhista, os trabalhadores e os sindicatos foram declarados inimigos do Estado?

[4] Reporto-me aos debates do grupo de estudos de Filosofia do Direito da Escola Judicial do eg. TRT da 4ª Região, em Porto Alegre – RS, no ano de 2017, particularmente em referência às brilhantes palestras do Desembargador GILBERTO SOUZA DOS SANTOS.

[5] BASILIEN-GAINCHE, Marie-Laure. État de droit et états d’exception: une conception de l’État. Paris: PUF, 2013, p. 37, apud VALIM, 2017.

[6] Em sua célebre carta “Cinco minutos de Filosofia do Direito” (RADBRUCH, 1979, p. 415)

[7] Alysson Leandro Mascaro, que desponta atualmente no Brasil como jusfilósofo crítico, em aula magistral na Escola Judicial do eg. TRT da 17ª Região, em Vitória – ES, em 25.08.2017, alertou para essa indispensável necessidade de visão crítica do Direito, referindo os juspositivismos como 95% do pensamento jurídico atual, ou seja, o Direito posto (pelo Estado) e o profissional intérprete “boca da lei” naturalizando o óbvio da vida, operando no tempo presente (lei de hoje), citando o exemplo hipotético do divórcio – pensamento a favor do divórcio enquanto a lei for a favor, mas, se a lei mudar, muda o pensamento também, representando a versão patológica da indiferença quanto ao conteúdo normativo das leis. A esse respeito já lecionava Antônio Carlos Wolkmer na década de 90:

“Torna-se significativa a percepção da tradição hegemônica de um ‘senso comum teórico’ (quer seja jusnaturalista, quer seja positivista) claramente dogmático e conservador, quando se procede a uma reflexão crítico-desmistificadora das origens, da evolução e da funcionalidade do pensamento jusfilosófico brasileiro. Não sem razão, nesse sentido, assevera José Eduardo Faria, que a cultura jurídica brasileira é marcada por (…) uma visão formalista do Direito, destinada a garantir valores burgueses e insistindo em categorias formuladas desde a Revolução Francesa (como, por exemplo, a univocidade da lei, a racionalidade e a coerência lógica dos ordenamentos, a natureza neutra, descritiva e científica da dogmática etc.), reproduz um saber jurídico retórico, cuja superação é de difícil consecução, pois é justificadora e mantenedora do sistema político, entreabrindo a visão do Direito apenas como um instrumento de poder. Daí, por extensão, seus princípios fundamentais se identificarem com um dogmatismo que pressupõe verdades perenes e imutáveis, capazes de exercer o controle social sem sacrifício de sua segurança e aparente neutralidade”. (WOLKMER, 1991, p. 112)

[8] Exemplo gritante disso, sem adentrar na justiça ou injustiça dos fatos, são os picos a que chegou a Bolsa de Valores de São Paulo e o dólar no Brasil, de forma inversamente proporcional, como no impeachment da ex-Presidente Dilma Rousseff, quando a bolsa cedeu abaixo de 30000 pontos e o dólar passou ao câmbio de 4 por 1, enquanto na condenação do ex-Presidente Lula, o dólar caiu mais de 2 pontos percentuais, a 3,15 por 1, e a bolsa atingiu recorde de 84000 pontos, mostrando, claramente, a manipulação política e popular pelo capital financeiro especulativo.

[9] Não se trata de prognóstico aleatório, Zygmunt Bauman alerta: “Hans Peter Martin e Harald Schumann, especialistas em economia do Der Spiegel, calculam que, se continua a tendência atual, 20% da (potencial) força laboral global bastará para ‘manter em marcha a economia’ (seja o que seja que isto signifique), fato que reduzirá os outros 80% da população laboral do mundo à categoria de economicamente redundante.” (BAUMAN, 2011, p. 28 – trad. livre)

 

 

*Doutoranda em Ciências Jurídicas pela Universidad del Museo Social Argentino – Buenos Aires/Ar. Mestranda em Cuestiones Contemporáneas en derechos humanos pela Universidad Pablo de Olavide – Sevilha/Es. Mestre em Direitos Humanos e Fundamentais pelo Centro Universitário FIEO – Osasco/SP. Especialista em Direito e Comunicação Digital pelas Faculdades Metropolitanas Unidas – FMU – São Paulo/SP. Especialista em Direito Civil e Processual Civil pelo Instituto Paranaense de Ensino – Maringá/PR. Bacharel em Direito pela FAPE – Faculdade de Presidente Epitácio/SP. Pesquisadora do Grupo de Estudos de Direito das Minorias (GEDIM) do UNIFIEO (CNPQ – Certificado pela Instituição). Integrante do Grupo de Estudos Constitucionais (GEC) do Instituto Brasileiro de Direito Constitucional (IBDC). Professora universitária em cursos de graduação e pós-graduação. Advogada. E-mail: lucianaflima.adv@gmail.com.
**Desembargador do Trabalho (TRT da 4ª Região – RS), ex-Procurador do Trabalho, ex-Presidente Fundador e atual Diretor Legislativo do IPEATRA – Instituto de Estudos e Pesquisas Avançadas da Magistratura e do Ministério Público do Trabalho, Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina, Doutorando em Ciências Jurídicas pela Universidad Social del Museo Social Argentino, Mestrando em Derecho Penal Económico pela Universidad Internacional La Rioja, Pós-graduado pela Escola Superior da Magistratura do Estado de Santa Catarina, Pós-graduado em Trabalho Escravo pela Faculdade de Ciência e Tecnologia da Bahia, Especialista em Relações Laborais pela OIT (Università di Bologna, Universidad Castilla-La Mancha), Especialista em Direitos Humanos (Universidad Pablo de Olavide e Colégio de América), Especialista em Jurisdição Social (Consejo General del Poder Judicial de España – Aula Iberoamericana), Coordenador do Grupo de Estudos de Filosofia do Direito da Escola Judicial do TRT4, Professor convidado da Pós-Graduação de Direito Coletivo do Trabalho e Sindicalismo da UNISC – Universidade de Santa Cruz do Sul, e de Direito do Trabalho e Processo do Trabalho da UCS – Universidade de Caxias do Sul e UNISINOS – Universidade do Vale dos Sinos.

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