Aborto

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Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

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Discussão reacesa

Reacendeu-se a discussão da descriminalização do aborto em razão da decisão do Supremo Tribunal Federal, no Habeas Corpus nº 124306/RJ – Rio de Janeiro, pela Primeira Turma, em 9.8.2016, para excluir a incidência dos arts. 124 a 126 do Código Penal, que tipificam a prática como crime, do seu âmbito de incidência a interrupção voluntária da gestação efetivada no primeiro trimestre.

Na Constituição Federal coloca-se na condição de garantia inviolável o direito à vida (art. 5º, “caput”). Por essa razão, não haverá pena de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, inciso XIX (art. 5º, XLVII, “a”).

Na própria Carta Magna, pois, existe uma exceção para a morte de alguém, ser pena e em caso de guerra declarada. Não seria inconstitucional, portanto, o legislador infraconstitucional estabelecer outras exceções.

Aplicações da lei

Em se tratando de aborto, pode-se interromper a gravidez quando não há outro meio de salvar a vida da gestante (art. 128, inciso I, do Código Penal) e se a gravidez resulta de estupro e o abordo é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal (art. 128, inciso II, do Código Penal).

Existe outra possibilidade, criada pelo Supremo Tribunal, qual seja, no julgamento da ADPF nº 54, de 12.4.2012, decidiu-se, por maioria de votos, julgar procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade da interpretação segundo a qual a interrupção da gravidez de feto anencéfalo é conduta tipificada neste inciso.

Outra questão que será debatida no Tribunal Nacional é a retirada do feto acometido por Zika Vírus.

Tudo isso mostra que o aborto, em certas situações, deve ser feito, não para relativizar a vida humana, mas fazer com que ela progrida de maneira hígida e com bem estar para todos.

Princípios e normas

Em relação ao tema, trata-se da retirada do feto por não se desejar a continuidade da gravidez.

Existem princípios e normas incidentes na questão.

De um lado, sob o aspecto bioético, ter-se-ia a autonomia da mulher, é dela o corpo e, por conseguinte, poderia decidir sobre realizar, ou não, a interrupção da gravidez. De outro, estaria em jogo a necessidade de não se causar mal a um inocente (princípio da não-maleficência).

Além disso, deveria se optar pelo bem-estar da mulher, quem sabe até emotivo, porque não está preparada para ser mãe e, por outro, da criança, que tem direito a viver, afinal, não escolheu aquela condição, de nascente (princípio da beneficência).

Situações complexas

Na seara do biodireito, em termos legais, se a mãe não corre risco de vida, não foi estuprada e a criança está hígida, não há anteparo legislativo para a intervenção.

A situação é mais complexa que se imagina.

No primeiro caso, a mulher desejar exercer sua autonomia, poderá haver um pai que não deseja o aborto. A controvérsia deverá ser levada ao Judiciário, que deverá, com rapidez, solucionar o problema. Quem sabe até, com prejuízo da família que se formou ou formaria.

No segundo, talvez, colocar a criança em adoção, porquanto há tantos casais e pessoas desejando um (a) filho (a), sem possibilidade de concretizarem seu sonho mais acalentado.

Na terceira hipótese, crê-se a mais difícil, permitir o aborto indiscriminadamente traria consequências, não raras vezes, desastrosas; não permitir em certos casos seria inconveniente.

Acaso quem deseje fazer o aborto estivesse esclarecido de tudo que pode ocorrer com seu ato. Estivesse com suporte psicológico e, quem sabe, psiquiátrico, poderia haver melhor conscientização para ato tão importante. Evitar-se-ia, ainda, clínicas clandestinas, com sequelas e mortes de muitas mulheres, afora o sentimento de culpa e vergonha, para as sobreviventes.

Não se pode privar o parceiro ou a parceira de envolver-se com a decisão. Abortar, como envolve um futuro filho, não pode ser uma decisão unilateral. Se ele nasce, o casal será responsável por sua criação, por conseguinte, nada melhor que decidirem sobre o produto da concepção.

Caso tudo isso fosse desprezado, sem amparo emocional e técnico para a gestante, pelo menos, causar-se-ia, provavelmente, uma série de buscas de clínicas para se eliminar o produto de sexo descomprometido. Não se acredita seja essa a intenção, nem mesmo, das feministas. Equivaler-se-ia o aborto a um mero método anticoncepcional, após formação do embrião, sem respeito ao fluxo natural contínuo da natureza humana.

Conclusão

Poder-se-ia alargar as hipóteses de aborto, não só nos casos de risco da vida da gestante, de estupro e anencefalia, porém, isso deve ser feito de maneira consciente e responsável, com consentimento de um ou mais envolvidos no processo de gestação, caso contrário, isso trará o risco de se vulgarizar a interrupção do desenvolvimento humano.

 

 506Edison Tetsuzo Namba é Articulista do Estado de Direito – 48. Juiz de Direito em São Paulo. Mestre e Doutor em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Docente Formador da Escola Paulista da Magistratura (EPM). Docente Assistente da Área Criminal do Curso de Inicial Funcional da Escola Paulista da Magistratura – EPM (Concursos 177º, 178º, 179º e 180º). Docente Civil da Academia de Polícia Militar do Barro Branco (APMBB). Representante do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo no Comitê Regional Interinstitucional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas – São Paulo e no Comitê Estadual para a Erradicação do Trabalho Escravo. Autor do livro Manual de bioética e biodireito, São Paulo: Atlas, 2ª ed. 2015.

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