Observatório da Constituição e da Democracia

Coluna Lido para Você

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Observatório da Constituição e da Democracia, C & D. Brasília: Faculdade de Direito da UnB/Sindjus-DF (Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário e do Ministério Público em Brasília). Grupo de Pesquisa Sociedade, Tempo e Direito-STD. Ano I, número 1, janeiro de 2006…ano IV, número 35, julho/agosto de 2010.

Esta Coluna Lido para Você, se propõe, desde seu lançamento, oferecer leituras de livros, relatórios de pesquisa, dissertações e teses, como sugestões para leitores, pesquisadores, diletantes e editores. Ela indica, pois, textos de interesse imediato para leitura e estudo, mas indicações para a atenção editorial, considerando a extensa e qualificada rede de leitores fortemente motivados para o conhecimento dos temas e matérias que aguçam o seu interesse intelectual.

O Lido para Você da edição desta semana traz uma leitura singular. Uma referência a 35 números de um tabloide mensal de 24 páginas, editado no período de 4 anos, por um Coletivo de Pesquisadores vinculados aos Grupos de Pesquisa Sociedade, Tempo e Direito – STD e O Direito Achado na Rua, da Faculdade de Direito da UnB (Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq).

Revista C & D

Revista C & D

O C & D foi criado a partir de uma expectativa inicialmente surgida no ambiente de pesquisa do STD, nutrida pela singular aspiração de seus pesquisadores – estudantes e professores – de que seu afazer acadêmico não restasse meramente cerebral, alienado das mobilizações do real e da práxis social exigentes e interpelantes, se tornando, nefelibata.

Natural que, na UnB, os pesquisadores vivenciassem a convocação de Darcy Ribeiro, formulador do projeto da universidade e seu primeiro Reitor, para que ela se fizesse necessária, isto é, apta a dialogar com o saber civilizatoriamente constituído, mas mobilizado para compreender e procurar oferecer soluções para os problemas da sociedade e do povo (A Universidade Necessária. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1975; Universidade para quê?. Brasília: Editora UnB, 1986).

Assim, em diálogo com seus colegas do Grupo de Pesquisa O Direito Achado na Rua, que, além da capacitação de assessorias jurídicas de movimentos sociais, por meio da Série O Direito Achado na Rua e do curso de introdução ao direito desenvolvido pela modalidade a distancia com esse objetivo, mantinha uma coluna num jornal da cidade, com essa denominação – O Direito Achado na Rua publicando semanalmente uma página inteira com respostas a perguntas de leitores sobre temas jurídicos elaboradas por alunos de graduação matriculados em disciplina de produção de textos (a disciplina é denominada PAD – Prática e Atualização do Direito, com conteúdo variável, neste caso, com o conteúdo designado Direito Achado na Rua, cf. em SOUSA JUNIOR, José Geraldo de; COSTA, Alexandre Bernardino; MAIA FILHO, Mamede Said, Orgs, A Prática Jurídica na UnB. Reconhecer para Emancipar. Brasília: Faculdade de Direito da UnB/Ministério da Educação/Ministério da Justiça, Coleção Prática Jurídica vol. 1, 2007, com a publicação de vários textos da Coluna O Direito Achado na Rua, do Jornal Tribuna do Brasil). Logo se chegou ao consenso que poderia ser feito o mesmo, com mais adensamento, como um tablóide mensal encartado no mesmo Jornal (Tribuna do Brasil), combinando a pesquisa acadêmica aplicada a questões de interesse social imediato e em linguagem de comunicação social.

Entre a ideia e as seguidas reuniões entre os pesquisadores dos dois Grupos de Pesquisa, logo se chegou a uma proposta que foi negociada com a direção do Jornal, muito satisfeita com o bom acolhimento da coluna dos estudantes de graduação e avaliando que o suplemento mensal, com o cabedal proposto, elevaria a inserção do Jornal no competitivo grupo de diários mais tradicionais, agora com um robusto conteúdo para os exigentes leitores da Capital Federal.

Foi assim que teve início, em janeiro de 2006, o primeiro número do C & D. No livro A experiência da Extensão Universitária na Faculdade de Direito da UnB, organizado pelo Professor Alexandre Bernardino Costa. Brasília: Faculdade de Direito da UnB, Coleção O Que se Pensa na Colina, vol. 3, 2007, há um ensaio, de autoria coletiva (p. 243-277), no qual os autores apresentam os resultados e uma síntese temática dos 16 primeiros números da publicação. Remeto a essa publicação.

Aqui faço ênfase a dois aspectos. O primeiro para recuperar a configuração do expediente do projeto, que se manteve estável do primeiro ao ultimo número editado. Logo uma Coordenação acadêmica de professores/orientadores do dois GPs, inicialmente Alexandre Bernardino Costa, Cristiano Paixão, José Geraldo de Sousa Junior, Menelick de Carvalho Netto e Miroslav Milovic. Miroslav depois deixaria o grupo Coordenador e seria substituído por outros docentes, recordando entre eles Valcir Gassen e mais ao final Juliano Zaiden. Havia também uma Comissão Executiva composta por um grupo variável de estudantes de pós-graduação e de professores visitantes e um extenso Grupo de Integrantes do Observatório, anotados no expediente de cada edição. Integraram a Comissão Executiva do n. 1: Giovanna Maria Frisso, Janaína Lima Penalva da Silva, Leonardo Augusto Andrade Barbosa, Marthius Savio Cavalcante Lobato, Paulo Henrique Blair de Oliveira e Ricardo Machado Lourenço Filho; e do n. 35, a edição derradeira: Daniela Marques de Moraes, Mariana Cirne, Noemia Porto e Ricardo Lourenço Filho. Entre todos e todas, ao longo de quarto anos, incluindo o Coletivo de Integrantes, um qualificado grupo de pesquisadores hoje, todas e todos mestres e doutores, a maioria forte em suas escolhas profissionais e em geral, professores e professoras distribuídos e distribuídas nas melhores instituições educacionais do País e do Exterior.

Como quer que seja, apenas os 4 primeiros números saíram sob a forma de suplemento de uma edição dominical mensal do Jornal Tribuna do Brasil e logo essa forma se tornou inviável, prevalecendo para o encerramento da parceria razões econômicas com as quais não aceitamos os termos advindos.

Todavia, mantivemos o conceito de tabloide e o configuramos com uma alteração do formato inicial até o número 35, quando interrompemos o projeto. Sempre com 24 páginas e as seções estabelecidas desde o primeiro número.

Agora, entretanto, com novas parcerias para assegurar o financiamento da edição, principalmente o SINDJUS-DF, que, imediatamente, acudiu ao convite, até porque eu mantinha em sua Revista há anos, uma coluna mensal de opinião, que sobreviveu enquanto a Revista foi editada e impressa. Também a Associação Nacional dos Procuradores da República que contribuía com a aquisição de exemplares para serem distribuídos aos seus associados; com a mesma disposição a ANAUNI (Associação Nacional dos Advogados da União), durante algum tempo a FENADADOS, o Sindicato dos Bancários do DF e alguns Escritórios de Advocacia.

Os recursos dessas parcerias, garantida a independência da edição, asseguravam cobrir os custos de diagramação e de impressão. Também a contratação de um jornalista (durante todo o projeto tivemos o concurso de um grande e experiente jornalista brasileiro Luis Recena Grassi, que foi correspondente em Paris, em Moscou e no México, Editor de grandes veículos de comunicação, chegou a ser Presidente da EBC). Ele nos ajudava a aprimorar texto, organizar conteúdo e nos fazer legíveis. Há memórias antológicas dessa orientação e de sua argúcia editorial. Lembro aqui três episódios. Para limpar o texto ele dizia: “suprimam toda palavra que termine em mente. Livrem-se dos advérbios, façam amizade com os substantivos. Vocês juristas tomam o incidental como essencial, invertem a hierarquia do texto. Perdem um tempo enorme nos pressupostos e o leitor desiste de ler antes de chegar à conclusão. O/as jornalistas, ao contrário, lançam no primeiro parágrafo o núcleo informativo do texto pois, caso o leitor não chegue ao fim da leitura, já terá recebido a informação importante”. Recena sempre respeitou nossos textos, mas às vezes precisava fazer caber na diagramação todo o material. Uma ocasião foi inesquecível. Era o fechamento da edição e um autor-coordenador estava bravo uma vez informado de corte em seu texto. Recena quis se justificar e o colega logo obtemperou: “já li e reli a matéria e eu estou bravo não porque você cortou, mas porque eu não consigo encontrar o que você cortou”. Convimos que o Editor tinha razão, parece que a parte cortada não fez falta ao texto.

Revista C & D

Revista C & D

O C & D manteve, durante todo o período de sua circulação, uma mesma arquitetura editorial, com seções bem definidas e permanentes: uma para indicar o tema da edição; textos de análise, em geral relacionados ao tema ou temas (às vezes mais de um) da edição; uma entrevista com pensadores de referência, ocupando as duas páginas centrais do tabloide; uma seção denominada Observatório do Legislativo, outra denominada Observatório do Judiciário, uma terceira denominada Observatório dos Movimentos Sociais e uma quarta denominada Observatório do Ministério Público, esta assinada por algum membro da ANPR, invariavelmente indicados a partir de afinidades com a linha editorial da publicação. Nomes muito destacados do ambiente politico-jurídico-funcional assinaram essa seção: Nicolao Dino C. Costa Neto, Ubiratan Cazetta, Luiza Cristina Fonseca Frischelsen, Mônica Nicida Garcia, Antonio Carlos Bigonha, Raquel Elias Ferreira Dodge, Eugênio José Guilherme de Aragão, Hélio Telho Corrêa Filho, Paula Bajer Fernandes Martins da Costa, Luiz Moreira, entre os mais frequentes. Eventualmente, havia uma seção para Notas de Correspondentes para registro de visitas acadêmicas ou relatórios de missões. Por exemplo, n. 22 Timor-Leste e a Decretação do Estado de Sítio, assinada por Adilson José Paulo Barbosa; n. 30, Aonde Chega a Crise, a propósito das mudanças econômicas nos EUA e seus impactos na realidade universitária norte-americana, assinada por Fábio de Sá e Silva (Fábio hoje dirige um instituto de estudos brasileiros na Universidade de Oklahoma); número 31,  a Itália como Fronteira, no contexto de desafios, inclusive migratórios, para a configuração da União Europeía, em texto de Cristiano Paixão; ou n. 32, As Diferentes Melodias da América, sobre as diferenças nas suas semelhanças da arte e da música no continente, assinada por Ana Luiza.

O C & D trazia em todos os números uma coluna muito relevante: a de Boaventura de Sousa Santos. Ali foram publicados textos emblemáticos. Destaco dois: no n. 24, Raposa Serra do Sol – Brasil: Demarcação de Território Indígena em Perigo. O texto serviu de base para uma petion on line file://localhost/(http/::www.petiononline.com:tirssjg:petion.html), que eu encabecei visando ao julgamento no STF, mas que foi elaborada por Boaventura e que repercutiu claramente na formação de convicções no julgamento da ação no Supremo; a outra peça, no n. 32, Justiça Social e Justiça Histórica, elaborada a meu pedido para incidir sobre as mentalidades por ocasião do julgamento no STF da ADPF n. 186, que examinou a constitucionalidade das cotas raciais adotadas na UnB para ingresso de negros na universidade. Uma publicação reduzida desse texto foi também publicada na Seção Tendências, do Jornal Folha de São Paulo. Presente ao julgamento (eu era o Reitor da UnB à época do julgamento) e posso testemunhar que todos os ministros e ministras citaram o texto de Boaventura em seus votos que asseguraram unanimidade no reconhecimento desse instrumento de inclusão e de reparação social.

Uma preciosidade do C & D, que por si já mereceria toda a atenção de editores. As entrevistas nas duas páginas centrais do tabloide. Algumas raras, assim, por exemplo, a de Luis Alberto Warat (n. 8) e a de Joaquín Herrera Flores (n. 23), certamente as duas últimas grandes manifestações desses dois expoentes do pensamento jurídico crítico contemporâneo. As páginas de C & D, com essas entrevistas, e os temas nelas abordados, constituem um repositório inestimável. Para visualizar algumas dessas referências, consultem no drive a seguir indicado, preservado graças ao zelo de Paulo Rená, sempre presente nas reuniões de fechamento das edições, algumas das edições desse material magnífico, do qual sempre me valho para a construção de meus textos; https://drive.google.com/folderview?id=0B5uBt99PdGHCdkpwZXpLSXQyWWM.

Pelo drive dá para aferir as opções temáticas de cada edição, sem preocupação de indicar todas: A Constituição Ameaçada; Constituição: Uma Ameaça à Governabilidade?; Perigo: Cerco ao Direito do Trabalho?; Judiciário e Democracia; O que o Povo Deve Fazer para Legislar; Segurança Pública, Direitos Humanos e Democracia; Eleições e Democracia; Os Novos Caminhos da Arte e do Direito; Direito Internacional dos Direitos Humanos; Educação; Direito e Gênero; A Questão Indígena; Direito e Saúde; Crescimento Econômico não Garante Inclusão; Democracia e Mídia; América Latina – Desafios para a Democracia; Anistia; Conquistas Ameaçadas; A Construção Social do Direito; Constituição: 20 Anos (I); Religião e Estado Democrático; Ações Afirmativas e Inclusão; Raposa Serra do Sol: Demarcação em Perigo; Os Poderes e o Poder da Lei; Universidade: Autonomia e Função Social; Constituição Federal 20 Anos (II); Criminologia: Estado, Sociedade e Lógica Punitiva; Direito e Bioética; Crise Política no DF. Em torno a esses temas centrais eram mobilizados os pesquisadores para aproximações que com eles dialogassem, embora outras matérias eventualmente amadurecidas no processo de construção temática ganhassem espaço de publicação, em cada edição.

Relativamente aos entrevistados, chamo a atenção para o rico catálogo reunido por C & D: Marcus Faro de Castro, Menelick de Carvalho Netto, Lélio Bentes Corrêa, Padre José Ernanne Pinheiro, Edilene Pajeú, José Eduardo Campos de Oliveira Farias Gláucia Falsarrelli (Foley), Marcelo Lavenére Machado, Roberto A. R. De Aguiar, Luis Alberto Warat, Antonio Augusto Cançado Trindade, Fábio Konder Comparato, Nilcéa Freire, Timothy Mulholand, Eugênio Bucci, Nielsen de Paula Pires, Paulo Abrão, Carlos Maria Cárcova, Antonio José Avelãs Nunes, Sueli Gandolfi Dallari, L. Carlos Sigmaringa Seixas, José Geraldo de Sousa Junior, Paulo Bonavides, Joaquin Herrera Flores, J. J. Gomes Canotilho, Flávio Dino, Alexandre Bernardino Costa, Cristiano Paixão, Ela Wiecko de Castilho, Débora Diniz, Tatiana Lionço, Oswaldo Giacoia Júnior, Carmem Silveira de Oliveira, Giácomo Marramao, Michael Dukakis.

Essas entrevistas são um tesouro a descobrir. Tenho me socorrido de vários achados que elas contêm, na medida em que contribuem para interpretar e construir narrativas no contexto crítico atual que recorta o social e o jurídico no Brasil. Vou destacar dois excertos, um da entrevista de Avelãs Nunes e outro da de Carlos Cárcova, para mostrar o perfeito enquadramento de situações graves, no passado e ainda correntes:

Em Avelãs Nunes (C & D n. 21, abril de 2008, pp. 12-13):

Num ensaio instigante e de ampla circulação o senhor qualificou a tentativa européia de criar uma norma fundamental comum, de “constitucionalização do neo-liberalismo”. Por que essa iniciativa fracassou e quais as chances de retomada desse projeto ainda sob impulso neo-liberal?

Hoje, ao menos no quadro europeu, parece claro que a social-democracia assumiu muito consciente e empenhadamente a sua função de gestão leal do capitalismo. E vem assumindo cada vez mais a inspiração doutrinal, os métodos e os objectivos políticos do pensamento neoliberal dominante, não fosse ela a principal responsável pelo processo de integração europeia que, segundo alguns observadores, “teve como efeito tornar praticamente impossível qualquer alternativa ao neoliberalismo” (é a opinião de Ignacio Ramonet). Como escreveu Um dissidente do Partido Socialista francês (George Sarre) defendeu, durante o debate preparatório do referendo sobre a chamada Constituição Europeia, que “ a Europa transformou-se no joker de uma esquerda sem projecto nem reflexão”, uma “esquerda que não tem outro projecto para além da construção europeia, a Europa”, uma esquerda que, para ser credível e não assustar os mercados, defende e pratica “uma política ainda mais à direita do que a direita”.

O menos que se pode dizer é que o estado social (que, desde o final da Segunda Guerra Mundial, foi a menina dos olhos da social-democracia europeia) não vive hoje na Europa uma hora feliz. E os resultados estão à vista: taxas de crescimento muito baixas; precariedade do emprego; desemprego acentuado (prolongado para os jovens e os desempregados com mais de 45 anos); deslocalização de empresas; deterioração acentuada dos resultados no que toca à distribuição funcional do rendimento (a parte dos rendimentos do trabalho passou, na UE/15, de 65% em 1980 para 57% em 2005); desigualdades crescentes, com manchas de pobreza significativas, mesmo nos países mais ricos; prática generalizada de dumping fiscal, social e salarial; baixa dos níveis salariais e dos níveis de protecção social.

Esta é a Europa construída, em grande parte, por obra dos dirigentes socialistas e sociais-democratas europeus, quase sempre à custa de conciliábulos entre ‘élites’, retirando à ponderação do voto popular as opções de fundo tomadas. E é hoje inquestionável que esta ‘Europa’, construída sob a invocação beata do modelo social europeu, acabou por se transformar, para os povos europeus, como observou Bernard Cassen, num verdadeiro “cavalo de Tróia da globalização neoliberal”.

A chamada Constituição Europeia, não acrescentando nada de novo, pretendia apenas consolidar este acquis communautaire através da sua constitucionalização. E como ela seria praticamente inalterável (por tal exigir a vontade unânime dos países da UE) este acquis ficaria como que fora do quadro das opções políticas, transformado em verdade indiscutível, definitiva, válida para todo o sempre como o é o capitalismo para os defensores do fim da história.

Muitos europeus (entre os quais me incluo) entendem que, mais do que a questão de saber se seria correcto ou não falar-se de Constituição Europeia (e esta é sem dúvida uma questão importante, no plano jurídico e, sobretudo, no plano político), a questão decisiva residia em saber se a Europa que queremos é a que estava desenhada naquele projecto de ‘constituição’. Na minha opinião, a resposta é NÃO. Os europeus e o mundo inteiro precisam de uma outra Europa, uma Europa governada por princípios de solidariedade social e não a Europa orientada pela livre concorrência, que aceita (resignada, ou exultante) a “violência da concorrência (…) sem regulação nem limite”; uma Europa dos direitos sociais e do progresso social e não a Europa da precariedade do trabalho, da desigualdade crescente, da exclusão social, que quer fazer andar duzentos anos para trás o relógio da história; uma Europa livre de tutelas e capaz de definir os seus objectivos na cena internacional e não a Europa de joelho dobrado perante o império norte-americano; uma Europa dos cidadãos e dos trabalhadores, e não a Europa dos negócios e do capital financeiro; uma Europa (e um mundo), em suma, em que o mercado não substitua a política, a concorrência não substitua a cidadania, a eficiência e a competitividade não substituam o direito e a justiça. Para tanto, é imperioso que a União Europeia, enquanto comunidade de estados soberanos e iguais, seja uma comunidade de povos e de culturas, uma comunidade de afectos, coesa e solidária, uma comunidade de valores democráticos, acima de tudo fiel a um dos objectivos estratégicos iniciais, uma comunidade de paz, uma comunidade promotora da paz, através do combate ao subdesenvolvimento, ao racismo, à pobreza, à exclusão.

Pela minha parte, apesar de os tempos presentes não alimentarem grandes optimismos, quero acreditar que a construção da Europa continua a ser um projecto em aberto. Porque o neoliberalismo não é o fim da história. E porque os caminhos da história não passam por aqui.

Em Carlos Cárcova (C & D . n. 20, março de 2008, pp. 12-13):

O Senhor integrou como membro o Conselho de Justiça da Província de Buenos Aires. Exatamente numa época em que as demandas sociais por justiça acabaram identificando nos juízes, um grande obstáculo às reivindicações de direitos. A expressão “que se vayan todos” traduz bem o repúdio social à incapacidade dos juízes e do direito positivo de assimilarem ou mesmo compreenderem o alcance dessas demandas. Afinal, que fazem os juízes quando julgam?

En el año 96, la Ciudad Autónoma de Buenos Aires se dictó su propia Constitución, la más avanzada de la República, y constituyó mediante elecciones sus propias autoridades, con un Jefe de Gobierno -denominación elegida- y una Legislatura. En cuanto al Poder Judicial la Constitución local previó la creación de un Consejo de la Magistratura integrado por tres abogados elegidos por los matriculados, tres representantes de los legisladores que no deben ser legisladores y tres jueces. Yo integré el primer Consejo que tuvo a su cargo organizar desde cero, una nueva jurisdicción que, por ahora, sólo cuenta con dos fueros, uno con competencia Contencioso-Administrativa y otro con competencia Contravencional y de Faltas. Los fueros ordinarios como el civil, penal, laboral, son en la Ciudad, propios de la jurisdicción nacional, pero esta es una situació anómala, resultado de la transición en curso, que más tarde o más temprano deberá modificarse con su traspaso a la justicia local. Mi mandato duró de 1998 a 2002. Cuando mis colegas de entonces y yo nos retiramos de la función pues no hay reelegibilidad, dejamos la justicia funcionando a pleno. Los fallos de los jueces Contencioso-Administrativos, se han distinguido por un marcado activismo judicial y por una gran sensibilidad frente a los problemas sociales. También el Tribunal Superior de Justicia de la Ciudad ha cumplido un papel interesante renovando la jurisprudencia mediante decisiones de alta significación. A esta altura es preciso introducir una segunda aclaración: La consigna “que se vayan todos” estuvo claramente dirigida a los políticos, sea del partido que fueran. Era una consigna más que discutible desde una posición democrática y transformadora, con un tufillo algo facistoide, pero que prendió en la gente, frente a una situación de ingobernabilidad extrema, de una crisis económica sin precedentes y de un saqueo ilegítimo de los ahorros de la ciudadanía, cuyos depósitos en cuentas corrientes bancarias, cajas de ahorro, acciones, plazos fijos, etc. fueron incautados. ¿Qué hizo la ciudadanía? Confió en los jueces y colapsó los juzgados con recursos de amparo (mandatos de seguranza). La Corte Suprema de entonces, de mayoría menemista, intentó legitimar las decisiones expropiatorias del Ejecutivo, pero la Justicia de Primera y Segunda Instancia siguió haciendo lugar a los amparos y declarando la ilegitimidad de las medidas. Luego el Gobierno fue dictando medidas tendientes a arbitrar entre ahorristas y banqueros y lentamente se llegó a acuerdos que significaron recuperar parte sustancial de los dineros reclamados. En cuanto al desprestigio de la Justicia, debe consignarse que estuvo fundamentalmente acotado a la denominada justicia federal, que era la encargada de juzgar a los funcionarios y perseguir la corrupción. Esa fue constituida en épocas del menemismo bajo un signo de marcado clientelismo político, (todavía no había concursos para la designación de magistrados). La mayoría de esos jueces ya han renunciado y los nuevos provienen de concursos cuya legitimidad no se ha cuestionado. En mi opinión, para concluir, durante la crisis del 2001/2, la ciudadanía buscó protección en la Justicia y, por lo general, la obtuvo.

Revista C & D

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Finalizo, nesta nota, dirigida aos leitores habituais de Lido para Você, mas de modo muito especial, entre eles, aos editores, sugerindo a importância de preservar as estruturas de observação, muito presente no projeto do C & D e também como sugestão aos pesquisadores para que se debrucem sobre a contribuição que o projeto ofereceu para o entendimento de uma conjuntura marcante na história constitucional e democrática brasileira.

Porque, conforme anotamos, na abertura do numero 1, desse vigoroso projeto, observar é, antes de tudo interferir. Um observatório representa uma tentativa de atuação e análise critica de uma sociedade plural, complexa, rápida e pulsante como a brasileira. Num contexto em que novos sujeitos de direito se afirmam, re-significando o cenário político e procurando inserir demandas por reconhecimento, qualquer observação que tenha compromisso com a seriedade, pluralidade, rigor critico e independência deve passar por duas construções fundamentais da contemporaneidade: a democracia e a constituição.

Esse compromisso nos moveu intelectualmente numa quadra de profundo apreço, quase diria, amor mesmo pela democracia e pela constituição. E ele se agiganta agora, desde 2016, quando a democracia e a constituição se encontram ameaçadas por perigo real, de desconstitucionalização e de desdemocratização. Esse compromisso é antídoto para os vírus que ainda que se instalem, acabam sempre, expurgados dos corpos (físicos ou sociais) bem nutridos e melhor ainda constituídos, tal é a energia utópica que os movimentos sociais emancipatórios inscreveram no belo projeto de sociedade forte na Constituição brasileira.

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José Geraldo de Sousa Junior é Articulista do Estado de Direito, possui graduação em Ciências Jurídicas e Sociais pela Associação de Ensino Unificado do Distrito Federal (1973), mestrado em Direito pela Universidade de Brasília (1981) e doutorado em Direito (Direito, Estado e Constituição) pela Faculdade de Direito da UnB (2008). Ex- Reitor da Universidade de Brasília, período 2008-2012, é Membro de Associação Corporativa – Ordem dos Advogados do Brasil, Professor Associado IV, da Universidade de Brasília e Coordenador do Projeto O Direito Achado na Rua.

 

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